Quem não conhece ou não cantou a marcha carnavalesca “Touradas de Madrid?”. Não foi só nos bailes carnavalescos de outrora que ela fez sucesso. João de Barro, o Braguinha, e o médico Alberto Ribeiro, autores da música talvez não imaginassem que um dia ela seria cantada por cerca de 200 mil vozes num estádio de futebol. E isso aconteceu. Foi no dia 13 de julho de 1950, no Maracanã, quando a Seleção Brasileira massacrou a Seleção Espanhola por 6 x 1, em jogo válido pela Copa do mundo disputada em nosso país. Essa é a melhor recordação que temos daquela competição, em que na final perdemos o título para o Uruguai, num jogo que gostaríamos de nunca mais lembrar.
A cada gol brasileiro o canto da torcida: "Eu fui às touradas de Madri e conheci uma espanhola natural da Catalunha. Queria que eu tocasse castanholas e pegasse um touro à unha. Caramba, caracoles, sou do samba, não me amoles pro Brasil eu vou partir. Isso é conversa mole pra boi dormir. Para-tchim-bum-bum-bum. Para-tchim-bum-bum-bum. Eu fui às touradas em Madri. Para-tchim-bum-bum-bum. E quase não volto mais aqui-i-i pra ver Peri-i-i, beijar Ceci. Para-tchim-bum-bum-bum....."
A marcha eternizou-se naquele momento mágico e ali ganhou força a tradição do canto da massa apaixonada por futebol em todos os estádios do país. Foi uma experiência inesquecível, para nunca mais ser esquecida. A melodia parecia ter sido feita sob encomenda para aquele jogo, em que o extraordinário Zizinho, ao marcar três gols, ditou o ritmo para o bailado. Pena é que aquele time cheio de craques não tenha sido campeão. A base da equipe treinada por Flávio Costa era: Barbosa - Augusto e Juvenal – Bauer - Danilo e Bigode – Friaça – Zizinho – Ademir - Jair e Chico.
O canto das torcidas nos estádios acompanha o futebol brasileiro desde os primórdios, com músicas como “1 x 0”, de Pixinguinha e Benedito Lacerda, de 1919, que foi receber letra 74 anos depois, escrita pelo mineiro Nelson Ângelo, que o gravou com participação de Chico Buarque. E os cânticos corintianos que homenageavam Cláudio e Baltazar, nos anos 40 e 50. Mas, indiscutivelmente foi a partir da goleada contra a Espanha, que o canto ganhou projeção e até hoje serve para extravasar a empolgação dos torcedores.
Em 1918, quando o América do Rio de Janeiro era um clube de grande popularidade e torcida, o compositor Francisco Teles o contemplou com a marcha esportiva "Ale-Guá”, cujo refrão repetia o grito das torcidas da época: "Ale-guá, guá, guá, hurrah! hurrah!"
O jornalista Mauricio Azevedo, autor do mais completo trabalho sobre relações entre música e futebol, aponta o chorinho “Flamengo”, de Bonfiglio de Oliveira, como a primeira musica abordando o tema. Mas há quem garanta que ela foi dedicada ao bairro e não ao time. Já o pesquisador José Ramos Tinhorão cita a polca “Amadores da Pelota”, de Borges Teixeira, gravada entre 1913 e 1915 como a primeira música dedicada ao futebol.
O jornalista mineiro Beto Xavier, escreveu o livro “O futebol no país da música", onde em 400 páginas relaciona mais de 350 músicas que falam, direta ou indiretamente de futebol. A inspiração para escrever o livro surgiu com a música de Jorge Bem Jor, “Fio Maravilha”, que transformou o ex-jogador do Flamengo num mito futebolístico.
Segundo Beto Xavier, entre todos os times brasileiros, o Flamengo é o mais cantado. Depois vem o Corinthians. Ele confirma que o choro “1 x 0”, de Pixinguinha e Benedito Lacerda, foi a primeira composição feita no Brasil falando de futebol.
Durante todos esses anos é praticamente incontável o número de músicas feitas para clubes de futebol e a Seleção Brasileira. Muitas delas se tornaram célebres e são repetidas até hoje como o “Pra frente Brasil” e “Voa Passarinho”. E até as escolas de samba cantam nas passarelas carnavalescas as glórias dos grandes clubes do país do futebol.
A torcida do Flamengo tem sido a mais criativa nos últimos tempos. A música “Poeira”, cantada por Ivete Sangalo já fez sucesso nas arquibancadas rubro-negras. E mais recentemente “Ninguém cala esse chororô” e “Creu”, em alusão a vitória sobre o Botafogo no último Campeonato Carioca e as lamentações alvinegras. (Texto e pesquisa: Nilo Dias)