O Sport Club Internacional de Porto Alegre, hoje um dos mais poderosos clubes de futebol do mundo, comemora no próximo sábado, dia 4 de abril, 100 anos de excelentes serviços prestados ao desporto nacional. E na véspera desse grande acontecimento surgiram novos fatos esclarecedores da história desse clube vencedor. Até agora, a versão oficial era de que em 1908 os jovens irmãos Henrique e José Poppe Leão e o primo Luiz Madeira Poppe, comerciantes paulistas, descendentes de italianos da Lombardia, chegaram a Porto Alegre atraídos pelo rápido desenvolvimento da cidade, onde abriram uma loja de venda de roupas.
Mas, uma recente pesquisa feita pelo historiador colorado Tiago Vaz está fazendo com que a história do Internacional seja repensada e reescrita. Entre as novidades mostradas na pesquisa se sabe que Henrique não era paulista, mas fluminense, natural de Niterói, que se transferiu ainda jovem para São Paulo, onde seus irmãos nasceram. E não era comerciante, mas, sim, jornalista, ligado ao Partido Republicano Riograndense (PRR).
A pesquisa de Tiago Vaz mostra que foi em 1901 que a família Poppe mudou-se para Porto Alegre, possivelmente porque o pai morrera em São Paulo. Eles teriam chegado a capital gaúcha, provavelmente de barco ou de trem, porque naqueles tempos ainda não existiam estradas interestaduais.
A mãe, Leonilda, e os filhos, Henrique, o mais velho dos irmãos Poppe, então com 20 anos, José, Carlos, Adelaide e Luiz, vieram a convite de Thomé Castro Madeira, irmão de Leonilda. Ele morava na cidade e trabalhava no cartório do Supremo Tribunal, com trânsito nos principais círculos sociais. Mas até hoje não se sabe ao certo se foi só esse o motivo que trouxe Henrique Poppe Leão para o Sul. Talvez o falecimento do pai, pois existem relatos que citam somente o nome de sua mãe após a chegada da família em Porto Alegre.
Segundo relato do delegado de Policia aposentado, Carlos Bandeira Poppe, de 73 anos, filho de Luiz Madeira Poppe, Leão seria um sobrenome artístico, em homenagem à mãe, e o nome real do fundador do S.C. Internacional era Henrique Madeira Poppe, Henrique Poppe Júnior ou Neto, ou só Henrique Poppe.
E foi assim que Henrique chegou a Porto Alegre, sendo apenas mais um jovem forasteiro na cidade, pouco conhecido. Durante os primeiros anos ele, que em São Paulo trabalhou no jornal “O Estado de São Paulo”, teve de se contentar com um emprego de balconista na loja de artigos importados “Ao Preço Fixo”, precursora da atual “Lojas Americanas”, e na época um dos mais concorridos pontos do comércio na Rua dos Andradas.
Na loja era possível encontrar uma enorme variedade de artigos: panelas, roupas, tapetes e tudo mais que era importado da "América" (do Norte) e da Europa. As mercadorias chegavam pelo porto de Santos. Em São Paulo funcionava a maior sede da loja, que se espalhou pelas principais capitais brasileiras até chegar a Porto Alegre, no final do século XIX.
Não se sabe ao certo, quanto tempo Henrique trabalhou nesta loja. Foi entre 1901 e 1909. Ao sair de lá, tornou-se funcionário da Secretaria do Conselho da Intendência (Prefeitura). Depois, por influência do tio Thomé Castro Madeira, filiou-se ao PRR e passou a escrever para o jornal “A Federação”. Ainda trabalhou nos jornais “Echo do Povo”, “O Diário”, “Gazeta do Povo”, “O Exemplo” e “A Rua”, onde foi chefe de redação.
Na versão até a pouco dada como verdadeira, consta que um ano depois da chegada em Porto Alegre, os irmãos Poppe resolveram participar mais ativamente da vida da cidade. Adeptos do futebol, esporte que já era praticado em São Paulo desde o fim do século XIX, procuraram se associar em algum clube, mas teriam sido vítimas do preconceito.
Segundo a versão conhecida, a preferência foi pelo Grêmio, que já existia há seis anos, mas se fechou para eles. O mesmo teria acontecido no outro time, o “Fussball” e nas associações de remo, de tiro e de tênis, sempre sob a desculpa de que era gente recém chegada, pouco conhecida e sem nenhuma indicação de pessoas ilustres da cidade.
Sem outras opções e determinados a praticarem esportes, resolveram fundar um clube que tivesse como regra fundamental o combate ao preconceito. Mas estas novas pesquisas desmentem isso e mostram que os irmãos Poppe nunca procuraram o Grêmio para jogar, pois tinham conhecimento que se tratava de um clube fechado. Tiago Vaz reforça essa tese ao dizer que o Internacional nasceu de valores sólidos, nunca de uma rejeição.
Além do mais, sabe-se agora que além do Internacional, Henrique fundou outras entidades: o “Círculo de Imprensa”, o “Clube Dançante Caixeiral”, o “Sport Club Municipal”, o “Club Político 17 de Junho”, o “Filhos do Progresso” e a “Liga de Foot-Ball do Rio Grande do Sul”.
A história do Sport Club Internacional começou a ser escrita no dia 4 de abril de 1909, em uma velha casa, na antiga avenida Redenção, 211 (hoje Avenida João Pessoa, 1025), onde residia o jovem João Leopoldo Seferin, de 17 anos, que seria aclamado como o primeiro presidente do clube. Na reunião estiveram presentes mais de 40 desportistas, a maioria estudantes e comerciários.
De acordo com os discursos proferidos na ocasião, estava sendo criado um clube para brasileiros e estrangeiros. O nome Internacional foi inspirado no clube homônimo existente em São Paulo, então campeão paulista e pelo qual torciam os irmãos Poppe. O nome "Internacional" tinha por escopo identificar um clube em que "todos pudessem jogar, independentemente de origem, raça ou status social, um clube genuinamente democrático e sem preconceitos”.
A versão de alguns pesquisadores que atribuem a escolha do nome ao homônimo italiano é totalmente improvável, já que este foi fundado em 1908, apenas um ano antes, numa época em que as informações demoravam meses, se não anos para atravessar o oceano. No ano de sua fundação, a Internazionale de Millão tinha jogado somente três partidas e perdera todas. Em 1909, o clube italiano não tinha a menor expressão, nem conquistara qualquer título, sendo um clube ainda desconhecido.
Já a escolha das cores provocou discussões. A decisão veio do carnaval de rua, onde predominavam duas entidades, “Venezianos”, vermelho, e “Esmeraldas”, verde. O resultado da votação tirou da ata de fundação os nomes dos que defendiam o verde. Mas o racha não esvaziou a reunião, muito menos o clube. Ficou vermelho e branco para o resto da vida. O primeiro uniforme do Internacional foi feito por Humbertina Fachel, mãe de dois fundadores do clube. A camisa possuía listras verticais simétricas vermelhas e brancas, gravatas nas duas cores, calções brancos e meias pretas.
O primeiro símbolo do Sport Club Internacional tinha as iniciais “SCI” bordadas em vermelho sobre o fundo branco, sem a borda também vermelha que apareceu logo em seguida. Já na década de 50 aconteceu a inversão, com a combinação de letras passando a ser branca sobre o fundo vermelho. Hoje, sobre o distintivo, o clube sustenta orgulhosamente as sete estrelas que lembram três campeonatos brasileiros, uma Copa do Brasil, uma Copa Libertadores da América, o Campeonato Mundial de Clubes FIFA e a Copa Sulamericana.
Com a escolha de um quase menino para presidir o clube, foi necessário buscar um presidente de honra mais velho e com prestígio indiscutível na cidade. E assim ocorreu. Foi escolhido para o cargo o diretor da Limpeza Pública e líder político distrital, capitão Graciliano Ortiz, homem de prestígio junto ao intendente José Montaury. Foi através de Ortiz que o Inter, recém-fundado, obteve junto à Intendência o seu primeiro campo, a Ilhota, atual Praça Sport Club Internacional, ao lado do Hospital Porto Alegre, no bairro Azenha.
Para os demais cargos da Diretoria foram escolhidos: vice-presidente, Pantaleão Gonçalves de Oliveira; 1º secretário, Legendre das Chagas Pereira; 2º secretário, Manoel Lopes da Costa; 1º tesoureiro, Antonio Cícero; 2º tesoureiro, Waldemar Fachel; orador oficial, Henrique Poppe Leão; comissão de campo, Irineu dos Santos, Luis Madeira Poppe e Alcides Ortiz.
É possível que Ortiz não tenha sido convidado por Henrique apenas para emprestar prestígio à entidade. Por trás deste convite havia um romance. Sete meses após a fundação do Internacional, Henrique casou-se com Maria Conceição Ortiz, filha de Graciliano. Henrique sempre foi o homem por trás do clube. Jamais jogou pelo Inter, presidiu a entidade em 1910, enquanto seus irmãos, José e Luiz, foram os primeiros titulares.
O jornal “A Rua”, edição de 19 de agosto de 1916 publicou o obituário de Henrique Poppe Leão, falecido três dias antes, aos 35 anos de idade, vitimado por uremia, doença provocada pelo mau funcionamento dos rins, incapazes de filtrar as impurezas do sangue. Segundo a publicação, Henrique não teve filhos e foi enterrado no cemitério da Santa Casa, na sepultura número 68 do terceiro quadro. Disse ainda, que ele foi o principal responsável pela fundação do S.C. Internacional.
A página do jornal é guardada até hoje por Carlos Bandeira Poppe, que vive no Rio de Janeiro. No próximo dia 4, aniversário dos 100 anos ele doará ao museu do Internacional o original de “A Rua” e uma caixa contendo cartas da família, além de fotos dos Poppe.
Logo após a morte de Henrique, José e Luiz deixaram Porto Alegre e o Inter. José foi para São Paulo, enquanto Luiz mudou-se para o Rio de Janeiro. Lá, casou-se e envolveu-se com a política. Trabalhou no Ministério da Agricultura, durante a presidência de Getúlio Vargas, e perdeu contato com o clube que ajudou a fundar. Luiz morreu no Rio, em 1960, aos 69 anos. (Pesquisa: Nilo Dias)
Pintura a óleo de Henrique Poppe Leão, principal fundador do S.C. Internacional, pertencente ao "hall" dos presidentes do Clube, na sala do Conselho Deliberativo.
COMENTÁRIOS DE LEITORES
E.C.P disse...
Muito legal seu blog Nilo, sou tordedor do Esporte CLube Pelotas, parabéns!
31 de março de 2009 18:13
JOAO MUNARI disse...
Parabéns pela qualidade do material apresentado no seu blog.Tambem me interesso muito pela pesquisa do Internacional,com enfase nos anos 70.
Se não for um abuso,peço que dê uma olhada no blog www.omundovermelho.blogspot.com
Joao Munari
19 de junho de 2009 11:21