Até hoje os torcedores do Clube Atlético Mineiro lembram com saudade de Armando Giorni, o “Mão de Onça”, um dos melhores goleiros que já vestiu a gloriosa camisa do “Galo das Alterosas”. Era natural de Dores de Indaiá, no interior de Minas Gerais, onde nasceu no dia 15 de novembro de 1922. Começou a carreira de futebolista no extinto 7 de Setembro, de onde saiu em 1943 para jogar no Atlético Mineiro.
Ele atuou pelo Atlético em duas passagens, entre 1946 e 1951, tendo ganho dois campeonatos mineiros e fez parte da vitoriosa excursão à Europa em 1950. Em 1959, voltou ao “Galo”, mas só jogou uma partida amistosa. Com a camisa alvinegra, atuou em 101 jogos e sofreu 130 gols. Foi campeão mineiro em 1946, 1947, 1949 e 1950. Jogou ainda pelo Bangu do Rio de janeiro.
Ganhou o apelido de “Mão de Onça” devido às suas mãos enormes e fortes. Talvez, isto se devesse pelo trabalho que exercia fora dos gramados, era lanterneiro. No bairro Floresta, Região Leste de Belo Horizonte, diziam que o ex-goleiro desamassava carros com a força das próprias mãos, sem precisar de ferramentas.
O primeiro jogo de “Mão de Onça” pelo Atlético Mineiro foi no dia 2 de maio de 1943, na vitória de 3 X 0 sobre o 7 de Setembro, pelo campeonato mineiro. E o último no dia 4 de janeiro de 1959, no amistoso Atlético Mineiro 3 X 1 América. “Mão de Onça” morreu em Belo Horizonte, aos 84 anos de idade, no dia 14 de junho de 2007.
Na década de 1940 e começo da década de 1950 o Atlético era considerado o melhor time do Brasil. O grupo de jogadores era muito forte. No gol, além de “Mão de Onça" tinha Kafunga, outra figura lendária. Na defesa e meio-campo Afonso, Oswaldo, Juca, Moreno, Vicente, Zé do Monte, Haroldo, Barbatana, Vicente Perez e Márcio. No ataque, Lucas, Lauro, Cezinho, Alvinho, Vavá, Nívio, Vaguinho e Murilinho. O técnico era Ricardo Diez.
Com essa verdadeira seleção o Atlético Mineiro foi convidado em 1950, pela antiga Confederação Brasileira de Desportos (CBD), atual Confederação Brasileira de Futebol (CBF), para representar o futebol brasileiro em uma excursão por gramados da Europa. Foi o primeiro clube brasileiro a viajar pela Europa depois da implantação do profissionalismo no futebol.
Foram 10 jogos contra equipes campeãs e vices de seus países, com 6 vitórias, 2 empates e duas derrotas, 24 gols a favor e 18 contra. Vaguinho e Lucas Miranda, com seis gols cada, foram os artilheiros do time na excursão. Alguns jogos foram disputados debaixo de neve.
Os jogos do “Galo” foram estes: Atlético 3 x 1 Schalke 04; Atlético 4 X 3 Munich 1860; Atlético 4 X 0 Hamburgo; Atlético 1 X 3 Werder Breemen; Atlético 3 X 3 Eintreicht Brauschweig; Atlético 2 X 0 Seleção de Sarrebruck; Atlético 3 X 0 Rapid Viena da Áustria; Atlético 2 X 1 Anderlecht da Bélgica; Atlético 3 X 3 Seleção de Luxemburgo e Atlético 2 x 1 Stade Français da França. O “Galo” foi proclamado pela imprensa como o “Campeão do Gelo”, conquista registrada no hino do clube composto por Vicente Mota.
A chegada ao Brasil foi apoteótica. Primeiro, no Rio de Janeiro onde a delegação atleticana foi homenageada pela CBD e pelos desportistas cariocas. O retorno da delegação atleticana a Belo Horizonte foi marcado por uma das maiores festas que a cidade já viu. A multidão se concentrou na Avenida Afonso Pena e os jogadores desfilaram em carro aberto, recebendo os aplausos e o carinho do público
Ainda em 1950, depois da vitoriosa viagem a Europa, o Atlético fez uma excursão de mais de dois meses por gramados do Nordeste do país, iniciada em Salvador (BA) e concluída em Fortaleza (CE). Na volta, a delegação ficou dois dias em Recife, onde o time já havia passado e os jogadores aproveitaram para se despedir da cidade e fazer compras.
Naquela época era comum a presença nas portas de hotéis de vendedores de animais silvestres, principalmente macacos e pássaros. Esses vendedores eram na maioria trapaceiros, que passavam tinta amarela nos canários para que as cores se destacassem. Os macacos eram dopados, apareciam dormindo, mansos, sem forças, diante de tanta cachaça.
Zé do Monte, o craque do time mineiro, comprou um destes macacos, com mais de quatro quilos. Normalmente, as pessoas traziam os conhecidos “mico estrela”, que cabem em uma mão, mas o jogador quis um macaco de porte. Fez sucesso, principalmente ao entrar no avião. Na época não era proibido levar animais dentro das aeronaves. Todos os passageiros ficaram surpresos com a tranquilidade do macaco.
Porém, passadas duas ou três horas de vôo, o efeito do álcool passou e o macaco começou a pular de um canto para outro do avião. Os passageiros ficaram assustados, o pânico foi generalizado. Foi quando o goleiro Kafunga gritou: “Chamem o “Mão de Onça”. Mas nem ele foi capaz de dominar a fera. A solução foi fazer um pouso forçado para que o macaco fosse retirado do avião.
Durante um jogo entre as seleções de Pernambuco X Minas Gerais, no Recife, pelo campeonato brasileiro, “Mão de Onça” viu de perto que a fama de violento que acompanhava o zagueiro pernambucano “Guaberinha” não era a toa. Embora não fosse craque, o “cangaceiro” coral era seguro, marcava bem. Dava porrada até na sombra do adversário, que, para ele, era inimigo. Vez por outra, o convocavam para jogar na seleção pernambucana. Nesse jogo, “Mão-de-Onça” se contundiu num lance. Médico e massagista foram socorrê-lo.
Nisso, Guaberinha foi onde ele estava estendido e, como se fora um gentleman, quis saber: “Tudo bem com você, meu querido “Mão de Onça?” “Mais ou menos. Foi uma torção no pulso direito”. Aí Guaberinha, como quem examina, pegou a munheca machucada do golquíper e a torceu num golpe violento. O pobre rapaz deu um urro lancinante. E saiu de campo, carregado.
O nome “Mão de Onça” foi inspiração para muitos outros jogadores, principalmente goleiros, que surgiram no futebol brasileiro. O mais conhecido deles – depois do homônimo mineiro – foi sem dúvida Durval Moraes, o “Mão de Onça” do Clube Atlético Juventus, famoso por ter levado o gol que Pelé considerou o mais bonito de sua carreira.
Foi no dia 2 de agosto de 1959, num jogo Juventus X Santos, na rua Javari, pelo campeonato paulista. Eram decorridos 36 minutos da etapa complementar, o Santos vencia por 3 X 0, mas os torcedores do Juventus tentavam irritar Pelé com vaias insistentes. Foi quando o camisa 10 santista fez uma jogada magistral.
O ponteiro Dorval recebeu um passe de Jair e cruzou a bola pelo alto. Esta caiu no peito de Pelé, que foi em direção à área, deu um chapéu em Julinho, outro em Homero e um terceiro em Clóvis. Depois, aplicou um lençol no goleiro “Mão de Onça” que saiu desesperado do arco e cabeceou para as redes. Foi o gol, o mais lindo entre os 1.283 de toda sua carreira.
Pena que nenhuma câmera tenha registrado o lance. Com base em depoimentos orais, o lance foi reproduzido em computação gráfica e fez parte do documentário “Pelé Eterno”. Como homenagem ao Atleta do Século, em 2006, o Juventus inaugurou um busto de Pelé logo na entrada do estádio da rua Javari.
O ex-goleiro “Mão de Onça” não ficou no esquecimento. O cantor e compositor Edvaldo Santana faz uma homenagem aos arqueiros do futebol brasileiro, na sua canção, "O Goleiro". A música relembra o lendário goleiro do Juventus, e também o desconhecido Gilson, camisa 1 de um time de várzea de São Miguel Paulista, em São Paulo, que o artista acompanhava em sua infância.
Durval Moraes, o “Mão de Onça” nasceu em Itu (SP), no dia 2 de junho de 1931. Hoje, viúvo, aposentado e pai de seis filhos, reside em São Paulo onde se dedica a pregação religiosa pela Igreja Testemunhas de Jeová.
Athanásio de Almeida, um outro goleiro que herdou o apelido de “Mão de Onça” , marcou efetiva presença no Operário de Campo Grande (MS), no final dos anos 70. Hoje mora no Jardim Anahy, na capital sulmatogrossense, onde é acadêmico de Direto e trabalha como comerciante.
Nascido no dia 27 de setembro de 1944, em Miranda (MS) começou a carreira no Indústria Futebol Clube, de campo Grande. Em 1962, quando servia na Aeronáutica jogou pelo ASA. Em, 1964 defendeu o Juventus (SP), time em que antes havia se destacado outro goleiro chamado “Mão de Onça”. Em 1966 se transferiu para o Operário de campo Grande e em 1970 foi para o Flamengo do Rio de Janeiro. Sem chances no rubro-negro, voltou a Campo Grande onde foi contratado pela Sociedade Esportiva Industriaria (SEI). Em 1977 retornou ao Operário, onde encerrou a carreira. (Pesquisa: Nilo Dias)
"Mão de Onça", em um jogo do Atlético contra o 7 de Setembro. (Foto: Acervo do C.A. Mineiro)