domingo, 3 de novembro de 2013

O artilheiro que virou estátua

Gabriel Omar Batistuta, um dos melhores atacantes do futebol argentino de todos os tempos nasceu na cidade de Reconquista, província de Santa Fé, Argentina, em 1º de fevereiro de 1969, ano em que o homem foi à lua. Ele só começou a jogar futebol quando tinha 17 anos de idade. Seu pai preferia que ele estudasse do que ser jogador de futebol.

Até então jogava vôlei e basquetebol, devido a sua alta estatura (1m85). Em 1978, depois do título mundial ganho pela Argentina, trocou de esporte. E tudo por causa do artilheiro Mário Kempes.

Como não havia campos de futebol na sua cidade, Batistuta e seus amigos jogavam na rua, sem chuteiras, e usando árvores como traves. Com 15 anos, juntou-se ao jovem time do Platense, e depois no Reconquista, em 1987. Mas, em 1988, se mudou para Rosário.

No mesmo ano Batistuta jogou pelas categorias de base do Newell’s Old Boys, levado pelo desportista Jorge Griff. O clube de Rosário lhe pagava um salário de 20 mil dólares por ano. O jogador dormia num pequeno quarto dentro do estádio, sentia saudade da família e sempre tinha pouco dinheiro.

O Newell’s era treinado por Marcelo Bielsa que o colocou no time de cima no lugar de Abel Balbo, que fora vendido ao River Plate. Depois o time abocanhou o campeonato nacional da temporada 1987/88, com uma equipe toda formada por jogadores da casa.

Nos seus seis primeiros meses no Newell’s, Batistuta chegou à final da “Taça Libertadores da América”, contra o Nacional, de Montevidéu. No primeiro jogo, em Rosário, venceu por 1 X 0, mas no segundo, no “Centenário”, em Montevidéu, perdeu por 3 X 0, perante 75 mil torcedores. No certame argentino, temporada 1988/1989 o clube não foi bem, terminando em 12º lugar.

Em 1989 foi vendido ao agente Settimio Aloisio, que o colocou no River Plate, curiosamente para também substituir Abel Balbo, a exemplo do que acontecera quando da sua chegada ao Newell’s. Batistuta disputou a final da “Liguilla”, e marcou o único gol na decisão contra o San Lorenzo que deu o título e a vaga na “Libertadores” ao seu novo clube.

Em 1990 o River Plate classificou-se para às semifinais da “Taça Libertadores” de 1990, sendo eliminado nos pênaltis. Mas conquistou o campeonato argentino de 1989/1990. Batistuta não teve o bom desempenho do ano anterior, jogou poucas vezes, mas assim mesmo foi mais uma vez campeão nacional. Em vista disso o técnico Daniel Passarella não o aproveitou mais. Terminada a temporada transferiu-se para o eterno rival, Boca Juniors.

A ida de Batistuta para “La Bombonera” coincidiu com a introdução na temporada 1990/91 do sistema “Apertura” e “Clausura”, dividindo o campeonato. No “Apertura” o Boca terminou na oitava colocação.

No “Clausura” foi primeiro, com Batistuta fazendo grandes partidas e marcando cinco gols nos três primeiros jogos. O time azul e amarelo somou 13 vitórias e seis empates, marcando 32 gols, 20 deles pela dupla Batistuta e Diego Latorre, e apenas seis gols contra.

Batistuta chegou a errar um pênalti contra seu ex-clube, o River Plate. Mas isso não foi capaz de diminuir o brilho de sua participação naquele campeonato, o que lhe valeu a primeira convocação a Seleção Argentina, em 1991, pelo técnico Alfio Basile. A partir daquela temporada, o atacante tornou-se um “anti-River” e um dos principais jogadores a dar ao Boca Juniors uma supremacia nos clássicos.

Os dois clubes se enfrentaram duas vezes na “Taça Libertadores da América” naquele semestre, e Batistuta marcou os dois gols da vitória por 2 X 0. Antes, já havia vencido também no “Monumental”, por 4 X 3.

O Boca Juniors ainda venceu os times brasileiros do Corinthians e Flamengo no “mata-mata”, mas o sonho do título continental parou nas semifinais, quando foi derrotado pelo Colo-Colo, do Chile, num jogo cheio de polêmicas, que ficou conhecido como “A Batalha de Santiago”, repleta de catimbas, brigas e discussões.

Com a convocação de Batistuta para a Seleção, o Boca Juniors foi muito prejudicado, pois não pode contar com seu artilheiro na decisão do Campeonato Nacional da temporada 1990/1991, entre os campeões do “Apertura” e do “Clausura”.

Os jogos decisivos foram disputados em datas que coincidiram com a realização da “Copa América”. Cada time venceu um jogo por 1 X 0, levando a decisão para os pênaltis. Em plena “La Bombonera” o Boca perdeu o título. Curiosamente, no ano seguinte foi determinado que os campeões do “Apertura” e “Clausura” dividiriam o título nacional.

Terminada a “Copa América”, vencida pela Argentina e com Batistuta como artilheiro, com seis gols, um deles sobre o Brasil no quadrangular final que decidiu o torneio, o craque foi vendido para a Fiorentina, da Itália por 2,5 milhões de dólares. Vittorio Cecchi Gori, então vice-presidente do clube italiano assistiu todos os jogos da Seleção Argentina e ficou encantado com o futebol do atacante.

Dois anos depois, na Copa América de 1993, foi novamente campeão. Embora tenha marcado apenas três vezes, dois desses gols foram decisivos, pois deram a vitória à Argentina por 2 X 1 sobre o México, na final, garantindo o 14º título continental ao país.

Mesmo com a vitória na “Copa América”, por pouco a Argentina não ficou fora da Copa do Mundo de 1994, disputada nos Estados Unidos. Na última rodada das "Eliminatórias", foi goleada por 5 X 0 pela Colômbia, em Buenos Aires.

Os colombianos ficaram com a única vaga direta do grupo de quatro países. A Argentina só foi à repescagem porque o Paraguai não saiu de um empate com o Peru, que até então não havia pontuado.

Na repescagem, contando com a presença de Diego Maradona, os argentinos empataram com a Austrália, em Sydney e garantiram lugar nos Estados Unidos após vencerem em casa por 1 X 0, com Batistuta marcando o gol.

A Argentina tinha um time muito forte, com Batistuta, Maradona, Fernando Redondo, Claudio Caniggia e Ramón Medina Bello. Na Copa, Batistuta fez três gols no jogo de estréia, uma goleada de 4 X 0 sobre a Grécia. No segundo jogo ganhou de virada da Nigéria.

Depois dessa partida Maradona foi expulso do Torneio, no escândalo do "dopipng". Abalados, os argentinos perderam para a Bulgária e chegaram em terceiro no grupo. Só conseguiram classificação para a fase seguinte, porque foram um dos melhores terceiros colocados, sistema que vigorou até aquela Copa.

A eliminação veio frente a Romênia. Batistuta marcou seu quarto gol na derrota por 3 X 2. O ano seguinte também foi de decepções com a "Seleção". Na Copa América, foi eliminada nas semifinais frente ao Brasil. O título ficou com o Uruguai.

O técnico da Argentina já era Daniel Passarella, com quem Batistuta não se entendia desde os tempos de River Plate. Apesar da série regular de gols na Fiorentina, Batistuta chegou a passar quase um ano afastado da “Seleção” por Passarella, que não queria jogadores de cabelos longos no seu time.

Pelo mesmo motivo não foram convocados os jogadores Redondo e Caniggia. Para ir à “Copa do Mundo” de 1998, Batistuta concordou em cortar o cabelo e lançou até um perfume: “Essenza di Campione”. Na França, marcou quatro gols na primeira fase, um contra o Japão e três na Jamaica.

Fez seu quinto gol na Copa nas oitavas-de-final, contra a Inglaterra, quando homenageou o filho recém-nascido, embalando-o na imaginação, imitando a comemoração de Bebeto em 1994. A classificação veio nos pênaltis, e deu lugar à frustração na fase seguinte, quando empatou em 1 X 1 com a Holanda.

Nesse jogo Passarella substituiu Batistuta, que era o artilheiro do "Mundial". O croata Davor Šuker só o ultrapassou em um gol, na partida pelo terceiro lugar, dois jogos depois.

Em 2002, Batistuta foi ao seu terceiro mundial, já veterano e vindo de uma temporada difícil na Roma. Começou bem na “Copa da Coreia e Japão”, marcando o solitário gol da vitória sobre a Nigéria, na primeira rodada. E foi só.

Os argentinos foram precocemente eliminados na primeira fase, depois de perderem para a Inglaterra e empatarem com a Suécia. Batistuta errou um pênalti contra os suecos. Esse foi o seu último jogo pela Seleção da Argentina, da qual é o maior artilheiro em Copas, com 10 gols e no geral com um total de 56 gols em 78 partidas. Ele marcou na “Seleção” o dobro de gols que Diego Maradona, o maior ídolo futebolístico do país em todos os tempos.

Mesmo tendo uma passagem sem títulos pelo Boca Juniors, ele garantiu um lugar destacado na história do clube e nos corações dos seus torcedores.

O começo na Itália não foi dos melhores, porque o jogador encontrou dificuldades de adaptação. Mas algum tempo depois reencontrou seu bom futebol. Na 18ª rodada da temporada 1991-92, Batistuta marcou seu primeiro gol pela Fiorentina, na vitória de 2 X 0, sobre a Juventus. Na primeira temporada marcou 13 gols. Na segunda, 16 em 27 jogos. O seu clube, a Fiorentina acabou sendo rebaixado.

Mesmo disputando uma divisão secundária, Batistuta continuou na Fiorentina e, com seus gols, ajudou o clube a retornar à "Serie A" na temporada seguinte, 1994/1995. De regresso à elite do futebol italiano, foi o artilheiro da competição com 26 gols, um recorde no campeonato. Também superou outra marca no futebol italiano, quando marcou 13 gols em 11 partidas consecutivas.

A fama de Batistuta correu mundo. Já era considerado um dos melhores atacantes do planeta. Surgiram propostas de todos os lados da Europa.

O Manchester United, da Inglaterra chegou a oferecer 44 milhões de dólares para contratá-lo, mas ele preferiu continuar por várias temporadas na “Associazione Calcio Firense Fiorentina”, que é um clube mediano da Europa. Essa dedicação à agremiação valeu-lhe uma estátua de bronze em tamanho natural, na “Curva Fiésiole”, no “Estádio Artemio Franchi”, na cidade de Florença.

Batistuta ganhou a fama de “sex symbol”, tal era a admiração das mulheres pelo seu amor incondicional a Irina – sua esposa. A maior prova foi em 1996, quando marcou o gol decisivo na vitória por 2 X 1 sobre o A.C. Milan e disse para a câmera: “Amo-te Irina”.

A sua fama com a camisa da Fiorentina foi tanta que Florença decretou 30 de Outubro como “o Dia de Batistuta”, uma homenagem ao artilheiro que tantas alegrias deu à cidade.

A relação de Batistuta com os torcedores da Fiorentina era muito especial. Com ele em campo, era questão de tempo até o grito de gol ecoar nas arquibancadas. Um deles entrou para a galeria de imagens imortais do futebol italiano: o gol de empate contra o Barcelona em pleno “Camp Nou”, na semifinal da “Taça das Taças”, em Abril de 1997. Com o dedo em riste nos lábios, calou 100 mil adeptos do Barcelona, ao vencer com classe e garra o conhecido goleiro Vítor Baía.

No tempo em que defendeu a Fiorentina, atuou junto de destacados jogadores como o meio-campo português Rui Costa, o alemão Stefan Effenberg, o dinamarquês Brian Laudrup, o sueco Stefan Schwarz, o russo Andrey Kanchelskis, os selecionáveis italianos Michele Serena, Stefano Borgonovo, Sandro Cois e Angelo Di Livio e cinco brasileiros: os tetracampeões mundiais de 1994 Dunga, Mazinho e Márcio Santos, Edmundo e Luís Oliveira (naturalizado belga). E fez uma grande dupla ofensiva com Abel Balbo, de quem foi sombra no início de carreira.

Mesmo com toda a fidelidade ao clube, conquistou poucos títulos. Consta um terceiro lugar na temporada 1998/99, em que foi vice-artilheiro, com 21 gols, o que classificou a equipe para a “Liga dos Campeões da UEFA”. A Fiorentina foi eliminada da competição, em casa, na última rodada da segunda fase de grupos, quando apenas empatou nos acréscimos do jogo contra o Bordeaux, da França.

Além da "Serie B" de 1994 e de pequenos torneios amistosos, o único grande título de Batistuta pela Fiorentina foi a “Copa da Itália” de 1996, com ele marcando nos dois jogos da decisão contra o Atalanta.

Em 1999, no time italiano da Fiorentina, Batistuta adotou a comemoração de “matador”, nos seus gols, simulando portar uma metralhadora. Ainda nesse ano, ficou entre os três melhores jogadores do mundo, perdendo a eleição da FIFA para Rivaldo (1º) e Beckham (2º). Omar Batistuta foi “batizado” pelos “tifolis” de “Batigol” e “Rei León”.

Em 2001, depois de vestir a camisa da Fiorentina por 10 anos, período em que marcou 40% de todos os gols da equipe, foram 207  em 332 jogos, foi vendido para a Roma, por quase 30 milhões de dólares, protagonizando a segunda mais cara transferência da história do futebol mundial, na época.

Na Roma, Batistuta jogou ao lado de consagrados jogadores como Cafu, Vincenzo Montella, Marco Delvecchio e Francesco Totti. No seu primeiro ano no novo clube, o artilheiro marcou 20 gols, ajudando na conquista do campeonato italiano, algo que não acontecia desde a temporada 1982/1983, quando jogavam na equipe Falcão e Bruno Conti.

Dizem que a Roma está quebrada até hoje porque bancou essas contratações da fase do “scudetto”: Batistuta, Nakata, Emerson e Samuel.

Em 2001/2002 quase que a Roma foi campeã de novo. A Internazionale liderou o certame até a última rodada, quando o time de Batistuta conseguiu ultrapassá-la em um ponto. Mas o campeão foi a Juventus, que somou um ponto a mais.

Naquela temporada Batistuta não foi bem e acabou sendo emprestado à Internazionale. Com isso, a equipe de Milão conseguiu substituir Ronaldo “Fenômeno”. Junto com Batistuta também foi contratado Hernán Crespo, vindo da Lazio.

A temporada 2002/2003 rendeu um vice-campeonato a Internazionale. Mas Batistuta não ficou até o final do contrato. As constantes lesões o atrapalharam demais. Uma irresistível proposta financeira o fez ir para o Qatar, onde já se encontrava Romário. Lá jogou futebol e paralelamente golfe, enriquecendo a sua reforma de luxo.

No pequeno país do Oriente Médio, em uma liga bem menos técnica, foi campeão e artilheiro pelo Al-Arabi Doha, onde encerrou a carreira em 2005, aos 36 anos, após não conseguir um acerto com o Boca Juniors, devido a uma séria lesão em um dos tornozelos. Ele queria encerrar a carreira no time argentino e aumentar o número de gols que fez pelo clube, mais de 300.

Sua passagem pelo Qatar, posteriormente, fez com que fosse chamado para ser garoto-propaganda da vitoriosa campanha do país para ser sede da Copa do Mundo de 2022.

Batistuta era um jogador completo, emérito cabeceador, chutava forte com os dois pés, tinha arrancada e velocidade e esbanjava raça e oportunismo. É verdade que as vezes abusava do individualismo. O craque argentino foi sempre um grande homem, dentro e fora de campo, um marido exemplar, um pai amoroso, enfim, um exemplo a ser seguido, ao contrário de muitos ex-jogadores de futebol.

Títulos conqistados: Campeonato Argentino, pelo Newell's Old Boys (1987/88); Liguilla Pré-Libertadores, pelo River Plate (1989); Campeão da Recopa Sulamericana pelo River Plate (1990); Campeonato Argentino pelo River Plate (1989/90); Campeão do Torneio “Di Viareggio” pela Fiorentina (1992); Campeão da Copa Kirin, pela Fiorentina (1992); Campeonato Italiano da Série B, pela Fiorentina, da Itália (1993/94); Campeão da Copa da Itália, pela Fiorentina (1995/96); Campeão da Supercopa da Itália, pela Fiorentina (1996); Campeão Italiano pela Roma (2000/01); Campeão da Supercopa da Itália, pela Roma (2001); Campeão Italiano pela Internazionale (2002/03); Campeão do Qatar pelo Al-Arabi Doha (2004); Campeão da Copa América pela Seleção Argentina (1991 e 1993); Campeão da Copa das Confederações pela Seleção Argentina.. (1992) e Troféu Artemio Franchi, pela Seleção Argentina (1993).

Batistuta também ganhou muitas premiações em sua vitoriosa carreira: “Chuteira de Bronze da Copa do Mundo da Fifa” (1994 - 4 gols); “Chuteira de Prata da Copa do Mundo da Fifa” (1998 - 5 gols); “Melhor Jogador Estrangeiro do Ano na Serie A” (1999); “3o Melhor Jogador do Mundo da FIFA” (1999); “Chuteira de Ouro da Liga do Catar” (2004); “Melhor Jogador Argentino do Ano” (1998); “Maior Artilheiro da História da Fiorentina na Serie A” (152 gols); “Segundo Maior Artilheiro da História da Fiorentina” (207 gols em 332 jogos no total); “Maior Artilheiro da História da Seleção da Argentina” (56 gols em 78 jogos) e “Prêmio Fifa 100” (2004)

Logo depois que deixou os gramados, Batistuta teve problemas até para andar, devido a dores nos joelhos, herança das infiltrações que fez ao longo da carreira para aliviar a dor e reduzir o tempo de recuperação das lesões.

Além disso, ele foi submetido a diversas cirurgias nas pernas. Teve uma época em que chegou a pedir ao médico para lhe cortar uma perna, de tantas dores que sentia. Mas foi operado e melhorou bastante.

Batistuta desmentiu às notícias que davam conta de que ele mal se aguentava ficar de pé. E disse que está praticando esportes, como tênis e pólo, uma de suas paixões, defendendo a equipe do “Loro Plana”, de Santa Fé.

Só não pode mais jogar futebol, correr muito ou fazer piques. E ainda encontra tempo para assuntos burocráticos do futebol, como ser dirigente do “Cólon”, time de futebol da Argentina. (Pesquisa: Nilo Dias)


A estátua de Batistuta, em Florença, Itáli. (Foto: Divulgação)