quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

O futebol campeiro de Bagé

Bastou um pipocar de tiros para o coronel Apolinário Azambuja buscar a Winchester em cima do armário. Naquele instante, chutando macegas, entravam em campo as equipes do Manotaço e do Redomão, decidindo o "Campeonato Bagual da Grande Bagé".

Sentados nos pelegos, bombeando chimarrão, os torcedores se empoleiravam em bancos e barrancos. Ostentando ponchos, botas, esporas e chapéu beija-santo, os atletas posam para empinadas fotografias. O pontapé inicial é decidido no "suerte e culu" nos conformes do jogo do osso.

Desabou um temporal, e a partida decidiu-se de guarda-chuva aberto, sem prejuízo dos proveitos. Um vivaracho gringo mostra-se interessado no passe do "Felisberto Cabeleira", o famoso deflorador de redes e demolidor de traves. 

Patos, galos e galinhas não perturbam o desempenho dos atletas, vez por outra confundidos com a bola, recebendo grandes tiros de meta e arremessos laterais.

O árbitro apita montado num matungo caborteiro e recebe vaias de abigeatário. Massagista é coisa de "maricotes". Um veterinário se acomoda de jeito para as eventualidades. Lenços chimangos e maragatos diferenciam as equipes gaudérias. Os bandeirinhas em seus petiços fazem cancha-reta pelas laterais do campo.

O goleiro, patrão em seu CTG, manda e pesponteia. Com rebenques nas mãos, defende sua pequena área qual marido de mulher assanhada. O escore é marcado com ferro em brasa. Ao campeão é oferecido uma vaca que nem carece dar três mugidos para virar espeto corrido. Se um atacante dispara no rumo às traves é hábito fazer uso indiscriminado de laços e boleadeiras. A cobrança de pênalti tem outro discernimento.


Correm parelhos cinco atacantes, chuta quem por primeiro alcançar a bola e, se errar o lance, leva uma sumanta dos outros quatro. Não se enganou o coronel Apolinário quando ouviu o estopim de balas de todos os calibres fazendo algazarras no rebuliço da tarde. Se um anjo naquele instante cruzasse os céus do pampa, por certo, caia de bruços no banhado. (Por Luiz Coronel)