O
futebol da cidade serrana de 25 mil habitantes, distante 189 quilômetros de
Porto Alegre não atravessava um bom momento e a fusão foi o caminho encontrado
para tentar mudar a situação.
E
deu certo. Disputou a segunda divisão em 92 e 93, ano em que se sagrou campeão
sob o comando do técnico Tite, que hoje treina a Seleção Brasileira. Subiu para
a primeira divisão do campeonato gaúcho e nunca mais foi rebaixado.
Foi
eleito para presidir o clube o médico Giocondo Toschi, que não aguentou o
tranco e renunciou dois meses após ter assumido, alegando falta de tempo.
Ninguém se apresentou para ocupar o cargo, até que aconteceu o inesperado.
A
professora Zenaide Maria Boff, que lecionava Moral e Civismo no Colégio
Estadual e no Colégio Agrícola e Legislação na Escola Técnica de Comércio, além
de ser diretora do Colégio Divino Mestre, vereadora, presidente da Câmara
Municipal e diretora do Colégio Divino Mestre, encontrou tempo para aceitar
presidir o clube.
Sem
antes perguntar: “Não tem homem nesta terra?!” E disse em alto e bom som: “Então
aceitava”. Ninguém se zangou, já conheciam o seu jeito.
Alta,
cabelos curtos, 47 anos na época, voz grave, solteira (ela dizia que “graças a
Deus”), era conhecida na cidade como uma mulher ativa. E comprovou isso ao dizer
que aceitava o cargo com a maior naturalidade, pois na sociedade moderna não havia
mais lugar para discriminação.
E
entrou firme no desafio. Corria a cidade arrecadando dinheiro, acompanhava o
time nos dias de jogos, em Veranópolis ou fora, dava muitas ordens aos
assessores, xingava os jogadores que caiam na farra e ainda brigava com a
imprensa, pois não aceitava críticas ao clube.
Seu
problema maior era unir as torcidas de Dalban e Veranense. Uma ocasião ela
ficou na porta do clube e foi intimando quem entrava: “Quanto vai dar?”. E não
admitia que tirassem o corpo fora. E dizia: “É preciso muito peto para me dizer
não”.
Arrecadou
Cr$ 1.800.00 e a promessa de que continuariam cooperando. E avisava: “Se alguém
pensa que vai se livrar de mim, está enganado”. E ela uniu as torcidas“ no
peito”. No fim de cada mês pegava o recibo de sócios e ia em cima dos
torcedores buscar os recursos que o clube precisava.
O
técnico Paulo Velduga, na época com 27 anos, apoiava a presidente. Foi ele que
indicou seu nome para dirigir a
agremiação. O time contava com 18 jogadores que ganhavam salário mínimo e
estavam com os pagamentos em dia.
Guilherme
Giugno, diretor da Rádio Veranópolis dizia que os homens da cidade gostavam do
jeito aberto dela de administrar o clube. Contam que ela costumava ir aos bares
ou clubes da cidade e, quando via amigos reunidos, ia logo pedindo um uísque e
soltando palavrões.
Dizem
que ela era uma tremenda “boca suja”, mas não chocava ninguém, porque era
espontânea.
E
no time mostrou ser durona. Dizia que o jogador que caísse na farra ia ouvir o diabo. Até
concordava que não entendia muito de futebol, mas falava que sua experiência
como torcedora bastava para saber que uma farra na véspera de jogo, liquidava
com qualquer atleta.
Na
verdade ela já havia começado uma guerra. Na véspera de um jogo contra o
Pratense, de Nova Prata, ela estava reunida com amigos no clube, quando um
dedo-duro foi lhe contar que o ponteiro esquerdo Marquinhos estava bebendo no boliche.
Zenaide
deu um pulo da cadeira e foi lá.. Na frente de todos deu a maior bronca no
jogador. “Éramos seis”, contou Marquinhos, “bebendo três cervejas. Mesmo que eu
estivesse bêbado, um homem me chamaria do lado de fora e depois me multaria.
Mas
foram inventar uma mulher cartola, agora é fogo. Ela quase me matou de vergonha
, com aquela bronca. Por isso me invoquei e fui a um bale em Monte Berico, e
fiquei até o sol raiar. No outro dia, ela não me deixou nem trocar de roupa.
Vamos ver como é que fica”.
Mas
Zenaide não puniu e em dispensou Marquinhos. Primeiro, porque o técnico
precisava de seu futebol ofensivo. Segundo, porque ela acreditava que o jogador
não ia se meter a tomar cerveja nos sábados à noite, outra vez.
No
entender dela, os jogadores eram como os alunos, só precisavam de algumas
lições para encontrarem o caminho do dever, segundo seus métodos pedagógicos.
Se
não se abriam em elogios a presidente, os jogadores em geral sentiam-se
satisfeitos. “Eu acho meio estranho uma mulher de cartola, mas não sou eu que
vai chiar. Além disso, nos tempos de Veranense e Dalban era pior, os mais
malandros tinham de ficar concentrados no hotel.
Ela
acabou com a concentração e diz que vai usar o dinheiro economizado para
melhorar os bichos. Até agora não melhorou, mas ela diz que tem palavra e nós
estamos confiando nela.
Com
toda essa decisão, os jogadores até achavam que Zenaide jogava suas peladas
quando menina. Ela nega, dizia que ia aos jogos, mas só para ver. Dizia que
gostava mesmo era de tomar conta de seus três irmãos mais moços.
Depois,
em 1958, foi para Porto Alegre estudar. Mais tarde, enquanto cursava a
Faculdade de Direito, em Caxias, foi delegada de Ensino em Bento Gonçalves.
Quando voltou, em 1967, começou a exercer várias atividades ao mesmo tempo.
Em
sua luta para unir a cidade em torno do clube, Zenaide dava uma de cartola
típico, ao não admitir críticas da imprensa, especialmente da Rádio Veranópolis.
Depois de uma derrota o comentarista Milton Alves fez duras críticas ao time.
Foi o que bastou para Zenaide romper reações com ele. (Pesquisa: Nilo Dias)