quinta-feira, 8 de agosto de 2019

A torcedora símbolo do Vasco da Gama

A torcedora Dulce Rosalina dedicou toda a sua vida ao Clube de Regatas Vasco da Gama, do Rio de Janeiro e fez história nas arquibancadas. Dulce Rosalina foi uma figura icônica, não só para os cruzmaltinos, mas também para todas as mulheres, configurando um exemplo de pioneirismo em sua luta por espaço e voz dentro do futebol.

Com dois anos de idade, já era sócia do “Gigante da Colina”, aprofundando o seu amor a cada ano graças ao pai português que, assim como o “cruzmaltino”, pregava igualdade e combatia o preconceito racial. Um vascaíno convicto.

Era um tempo em que ela, apesar de mulher, se impunha e tinha o respeito dos demais chefes de torcida da época. A Dulce era uma pessoa muito especial, que protegia as outras mulheres torcedoras, e se precisasse até brigava, saía na mão mesmo, era mulher de fibra, vascaína de verdade.

Encantada com os ideais do clube de São Januário, Dulce se tornou frequentadora assídua dos jogos vascaínos, tendo se tornado a primeira mulher a assumir a presidência de uma torcida de futebol, a “Torcida Organizada do Vasco“ (TOV), quando tinha 22 anos, em 1956.

Levada a TOV pelo Presidente Artur Pires, recorda que no primeiro jogo em que ficou comandando os torcedores, o técnico Martin Francisco, compadre de Dulce, lhe disse:

“Organize a Torcida que eu lhe darei o campeonato”. E, realmente isso aconteceu, pois os Vascaínos foram campeões com uma antecipação de duas rodadas. 

Já presidente da TOV, decidiu deixar de trabalhar para não se privar da maior alegria de sua vida: o Vasco. Dedicando boa parte de sua energia à sua paixão, marcou seu nome ao introduzir nas arquibancadas cariocas a bateria, o concurso de torcida e o papel picado, verdadeiras inovações na época.

Posteriormente casou-se com o então jogador de futebol, “Ponce de León”, com quem teve os seus dois filhos. Ponce de Leon foi um craque que teve o seu nome ligado a história do futebol brasileiro.

Ele jogou pela "Seleção Paulista de Novos" contra os cariocas, na inauguração do então "Estádio Ângelo Mendes de Moraes", mais tarde na intimidade do torcedor, carinhosamente chamado de "Maracanã", e por decisão do legislativo guanabarino, hoje "Mário Filho".

Sua influência transcendia as arquibancadas, tanto que era amiga de jogadores como Vavá e Bellini, que compareciam a festas de aniversário em sua casa.

Certa vez, foi barrada junto a seu filho “Poncinho” na entrada do Maracanã por levar papel picado, sendo presa em seguida ao chamar o policial de flamenguista.

Sabendo do ocorrido, os jogadores do Vasco se recusaram a entrar em campo até que a torcedora-símbolo fosse liberada. Dito e feito, foi solta pouco tempo depois, já estava na arquibancada para apoiar o clube.

Atuante, viajava Brasil afora pelo “Time da Colina”. No entanto, em 1976, quando apoiou a candidatura de Medrado Dias à presidência do Vasco, foi obrigada a desvincular-se da torcida. Fundou, em seguida, a ”Renovascão”. Em 1991, um problema na visão a obrigou a se afastar dos jogos noturnos.

No início da década de 1960, venceu o concurso de melhor torcedor do Brasil, realizado pela prestigiada “Revista do Esporte”, e doou o prêmio ao Vasco da Gama. Ela foi um exemplo de pioneirismo na luta das mulheres por espaço e voz dentro do futebol.

A entrega ao Vasco ultrapassava barreiras. Em 1968, numa caravana para São Paulo, um dos 30 ônibus no qual Dulce fazia parte sofreu um grave acidente.

Ninguém morreu no episódio, mas ela ficou afastada das arquibancadas por dois anos devido a uma fratura na clavícula e no braço, além do afundamento do crânio.

Por incrível que pareça, quis ir ao Maracanã logo após se recuperar, segundo relatos do seu próprio filho, “Poncinho”. Também optou por não fazer a cirurgia, pois as cicatrizes, segundo ela, eram provas de sua dedicação à “Cruz de Malta”.

Dulce foi convidada pelo escritor Claudio Aragão para narrar a trajetória do clube desde sua fundação, no final do século 19, até a conquista do título carioca de 2003. Seus relatos deram origem a obra “A História do Vasco da Gama em Cordel”, da editora Bom Texto.

Dulce Rosalina faleceu no dia 19 de janeiro de 2004, comovendo a nação cruzmaltina e permanecendo em sua memória até hoje Homenagens não faltaram, tanto que, por decreto da prefeitura do Rio de Janeiro, mudaram o nome da antiga “Rua do Reservatório” para “Dulce Rosalina”, próxima à sua casa, e de todos os vascaínos, São Januário.

DECRETO Nº 23925 DE 22 DE JANEIRO DE 2004

Altera a denominação do logradouro que menciona, situado no bairro Vasco da Gama, na VII Região Administrativa – São Cristóvão. O prefeito da cidade do Rio de Janeiro, no uso de suas atribuições legais e, considerando o recente falecimento de D. Dulce Rosalina, aos 79 anos, torcedora-símbolo do Clube de Regatas Vasco da Gama, exemplo da paixão carioca pelos times de futebol da cidade, decreta:

Art. 1.º A Rua do Reservatório, CL 08023-4 reconhecida pelo Decreto n.º 1165, de 31 de outubro de 1917, passa a denominar-se Rua Dulce Rosalina.

Art. 2.º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Rio de Janeiro, 22 de janeiro de 2004 – 439º ano da fundação da Cidade.  

Cesar Maia - Prefeito.

Esta é a história de Dulce Rosalina, que remota ao tempo em que o brado de guerra e do incentivo aos seus favoritos no campo da luta, era feito das sociais, com os gravatinhas e os chapéus de palhinha. Não existia o tom da Escola de Samba, embora o calor humano do aplauso e do entusiasmo fossem os mesmos de hoje. (Pesquisa: Nilo Dias)