A expressão gol de letra de há muito faz parte do vocabulário do futebol. É até nome de uma Organização Não-Governamental (ONG), a “Fundação Gol de Letra”, criada pelos ex-jogadores de futebol, Raí e Leonardo, para atendimento a crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social. O nome é bonito, soa bem, mas sua origem, poucos sabem. Primeiro, é preciso explicar como é a jogada que merece ser chamada assim. É o gol em que o jogador trança as pernas, como quem faz um xis e muda o pé que chuta.
Quem batizou a jogada foi o jornalista Mário Filho, hoje nome oficial do Estádio do Maracanã. Foi num jogo pela oitava rodada do segundo turno do Campeonato Carioca de 1942, no Estádio das Laranjeiras entre Fluminense e Madureira. O time dono da casa ostentava o título de bicampeão e era forte candidato ao tricampeonato. O onze do Madureira, nada mais tinha a fazer na competição, apenas cumpria carnê. Mas seu time era muito bom, principalmente o ataque onde despontava o trio Lelé, Isaías e Jair, que a imprensa apelidou carinhosamente de os “Três Patetas”, pois faziam com a bola o que queriam, em jogadas talentosas que surpreendiam os adversários e arrancavam risos dos torcedores.
Nessa tarde de 2 de agosto os “Três Patetas” estavam infernais. Sem tomar conhecimento do adversário e suas pretensões, o Madureira aplicou uma goleada de 4 x 1. O centroavante Isaias foi o autor de um gol, que pela técnica e beleza, até hoje dá o que falar. Ele chutou a bola com as pernas cruzadas em X, e Mário Filho, não teve dúvidas e criou na hora a expressão gol de letra. Como no futebol quase tudo ganha contornos extras, o tempo se encarregou de transformar o ocorrido naquele jogo em lenda, ou quase isso. Não existe nada oficial, mas os mais velhos garantem que por causa do gol chamado de “letra”, a torcida tricolor não queria deixar Isaías sair vivo do estádio.
O autor de tão inusitado gol, já falecido, teve que suportar por muitos anos a ira dos torcedores do Fluminense, que consideraram a jogada uma humilhação ao time, visto que naquela época um simples drible a mais era visto como tentativa de desmoralização. Não era a toa que os zagueiros, geralmente chamados de “guarda-roupas”, não levavam desaforo para casa e o “pau” corria solto. Terminado o Campeonato Carioca de 1942, o Vasco da Gama contratou os três atacantes. E com eles foi campeão invicto de 1945.
Coisa incrível, difícil de acreditar, mas é verdade. Os torcedores presentes ao Maracanã, em 2003, 60 anos depois do gol fantástico de Isaias Benedito da Silva, nas Laranjeiras, presenciaram um lance digno de filme: Léo Lima (Leonardo Lima da Silva), bisneto de Isaias e na época jogador do Vasco da Gama, também originário do Madureira fez um cruzamento de letra que foi encontrar a cabeça de Cadu e dali, para o pé de Souza, hoje no Flamengo, que mandou para o fundo da rede. Vasco campeão. E, pasmem, o adversário foi o mesmo Fluminense. E a reação não foi diferente de parte dos tricolores. O técnico Renato Gaúcho ameaçou Léo Lima de agressão. Sem saber, o técnico vice-campeão estava revivendo um histórico trauma tricolor.
A obra de arte de Léo Lima mereceu estátua no saguão de entrada de São Januário, ao lado do busto do Almirante, com as pernas eternamente entrelaçadas. Léo Lima e Souza, crias do mesmo Madureira, transferiram-se para o Vasco ainda como juniores, e juntamente com Cadu, também promovido das divisões de base vascaínas, formaram o trio que criou o gol inesquecível.
Nestes mais de 50 anos que acompanho futebol, foram poucas as vezes que vi alguém fazer um “gol de letra”. Lembro de um, marcado pelo jogador Canário, que defendia o Brasil de Pelotas, lá pela década de 1960. O adversário há muito tempo esqueci, mas a jogada está até hoje bem viva na minha memória. Ele recebeu a bola pela direita e de fora da área, cruzando as pernas e trocando o pé, marcou um golaço. Foi na goleira de fundo do Estádio Bento Freitas. (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
bacana saber a origem do nome. em espanhol essa jogada se chama rabona. coloco aqui o link da jogada do leo lima.
ResponderExcluirhttp://www.youtube.com/watch?v=Pr4A-3S0-xw
saudações rubro negras
gustavo berocan
engraçado que a reação provocada pela jogada é semelhant à provocada pela cavadinha, também chamada de panenka na europa.
ResponderExcluirLéo lima fez no grêmio a mesmíssima jogada em 2006. Só que mano Menezes, ditador de plantão na época, chamou o jogador de irresponsavel e o sacou do jogo.
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