Eu cheguei a pegar a romântica época do bonde, que dava seus últimos suspiros. Acredito que no Rio Grande do Sul só havia esse meio de transporte em três cidades, Porto Alegre, Pelotas e Rio Grande. Quando fomos morar em Pelotas, o bonde já havia sido desativado, mas ainda era possível ver alguns trilhos pelas ruas, principalmente da linha do Bairro Fragata. Em Porto Alegre o transporte findou em 1970.
Já em Rio Grande o bonde resistiu mais tempo. Eu até fui em alguns jogos no estádio do São Paulo em bondes lotados de torcedores, que trafegavam pelas ruas 24 de Maio, avenida Rheingantz, Presidente Vargas e iam até o Parque, depois da Junção. Por isso até hoje algumas pessoas chamam o Estádio Aldo Dapuzzo, de Linha do Parque.
Eu até pensei que bonde só existisse na saudade. Mas, não. No Rio de Janeiro continua em plena atividade o Bonde de Santa Teresa, verdadeiro símbolo do tradicional bairro carioca, que funciona desde 1872, ligando o bairro ao centro da cidade pelos Arcos da Lapa, um antigo aqueduto. O bondinho transporta moradores e turistas pelas ladeiras íngremes do bairro, sendo um cartão-postal da cidade e um verdadeiro museu ambulante desse antigo meio de transporte.
A última vez que ví um bonde foi em Santos (SP). E faz tempo, nem lembro bem o ano. A prefeitura de lá restaurou um velho veículo que estava se deteriorando em uma praça da cidade e criou o Bonde Turístico do Centro Histórico, que percorre pontos históricos do Centro Velho. Porto Alegre também estudava por em prática um projeto parecido. Não sei se chegou a sair do papel.
O termo bonde é uma alusão aos cupons ou bilhetes utilizados como pagamento das passagens, e que nos Estados Unidos eram conhecidos como bonds. A partir daí, teriam os passageiros passado a chamar tais veículos de bond, tendo o termo sido posteriomente aportuguesado para "bonde". Foi daí que surgiu a denominação "bonde" para o veículo coletivo, que nos primeiros tempos era movido a tração animal e depois elétrica. O bonde fez parte da vida urbana das grandes cidades brasileiras até meados da década de 1960.
Ele foi realmente um transporte muito popular e ensejou boas histórias e comparações. Quem não ouviu falar do caipira que foi a São Paulo ou Rio de Janeiro e se encantou com um bonde e acabou “comprando” o veículo de alguém que lhe foi apresentado como seu proprietário. Daí surgiu a expressão "comprar um bonde", fazer um mau negócio. E da mesma forma, quando se entra no meio de uma conversa, é sempre feita a ressalva: "Estou pegando o bonde andando, mas, mesmo assim...". E quando toma partido em algo que não dá certo, vem logo a desculpa, “tomei o bonde errado”.
E o bonde foi até motivo para piadas infames, como esta: “Você já ouviu falar da mulher que morreu de bom dia? Ela foi atravessar a linha do bonde, pensou que o bonde vinha, mas o bom dia (bonde ia)”.
Como esta página é dedicada ao futebol, também encontramos nesse esporte referência ao bonde. É o jogador muito limitado, o "perna de pau", também chamado de "cabeça de bagre", aquele que é execrado pelos torcedores e pela imprensa esportiva. A origem esportiva do termo vem do ano de 1942, quando o famoso Leônidas da Silva, o “Diamante Negro”, foi do Flamengo para o São Paulo. Quem explica isso é o jornalista Boris Fausto, na coluna “A dança das palavras”, no Jornal Folha de São Paulo.
O jogador, que custou uma verdadeira fortuna para a época, demorou a entrosar-se no novo clube, proporcionando aos adversários corinthianos e palestrinos (palmeirenses de hoje), gostosas gozações. Em clara alusão ao antigo negócio caipira, diziam que o São Paulo havia comprado um "bonde". Isso durou até meados de junho daquele ano, quando São Paulo e Palestra Itália disputaram uma partida importante pelo campeonato paulista. O locutor Geraldo José de Almeida, sãopaulino fanático, assim narrou um gol de seu time: "Gol do São Paulo! Gol do São Paulo! O "bonde" de 200 contos marca um gol espetacular de bicicleta". Daí em diante o termo pegou e persiste até hoje. (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
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