Silvio Lagreca, paulista de Piracicaba (SP), nascido no dia 14 de junho de 1895 é um personagem quase esquecido na história do futebol brasileiro, embora tenha sido o primeiro técnico da Seleção Brasileira. Foi um misto de jogador, treinador e árbitro de futebol. Começou a carreira em 1913, no Ypiranga, de São Paulo transferindo-se em 1914 para a A.A. São Bento, também da capital bandeirante, onde jogou até parar em 1921.
Na primeira partida da história da Seleção Brasileira, um amistoso disputado em 1914 contra o clube inglês Exeter City, da terceira divisão da Inglaterra, não existia um treinador oficializado. Foi indicada uma comissão técnica formada por Sylvio Lagreca e Rubens Salles, jogadores que exerciam liderança sobre o grupo. Coube a eles a tarefa de convocar, treinar e escalar o time. Sylvio Lagreca tinha apenas 19 anos, um mês e sete dias, quando se tornou o primeiro capitão e o primeiro técnico da história da seleção brasileira.
O jogo aconteceu no dia 20 de agosto de 1914, no Estádio de Álvaro Chaves, do Fluminense F.C., local onde tempos depois foi erguido o Estádio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Os visitantes jogaram três partidas no Brasil: a primeira, contra um combinado de jogadores ingleses dos clubes cariocas, a quem venceram por 3 X 0. Depois derrotaram uma seleção carioca por 5 X 3.
O último jogo foi contra um combinado de jogadores do Rio e de São Paulo que pela primeira vez vestiu a camisa da então Federação Brasileira de Sports (8/6/1914), precursora da CBD (5/12/1916) e da CBF (24/9/1979). Os brasileiros venceram por 2 x 0.
O juiz do primeiro jogo da seleção foi o inglês H. Robinson. O onze brasileiro jogou com Marcos - Píndaro e Nery – Lagreca- Rubens Salles e Rolando – Abelardo - Oswaldo Gomes – Friedenreich - Osman e Formiga. Exeter City: Pym – Forte e Strettle – Rigby – Largan e Smith – Whitaker – Pratt – Hunter – Lovett e Goodwin. Técnico: Arthur Chadwick. Os gols foram marcados por Oswaldo Gomes e Osman.
No dia 27 de setembro de 1914, a seleção do Brasil pegou um navio rumo à Argentina, onde disputou o seu primeiro jogo contra uma Seleção de outro país, valendo pela Copa Rocca, competição precursora do Sul-Americano. O torneio foi uma iniciativa do ministro das Relações Exteriores da Argentina, general Julio Rocca, que pretendia ampliar os laços de amizade entre os dois países.
A equipe brasileira era formada basicamente por atletas do Flamengo, Fluminense e Paulistano. De fora desse trio, apenas Sylvio Lagreca, do São Bento, de São Paulo e Friedenreich, do Ypiranga, também da capital paulista e maior artilheiro da época. A Argentina era favorita por vários motivos: jogava em casa, no estádio do Gimnasia y Esgrima e tinha o apoio de 17.200 torcedores. Uma semana antes havia derrotado o Brasil por 3 x 0, em um jogo amistoso.
Mas os prognósticos falharam e a Seleção Brasileira venceu por 1 x 0, gol de Rubens Salles aos 13 minutos da fase inicial. O jogo foi histórico, pois marcou a primeira vitória do scratch nacional contra uma seleção de outro país, e ao mesmo tempo a primeira conquista de uma trajetória que se tornaria plenamente vitoriosa.
O jogo foi dificílimo. Os argentinos chegaram a marcar um gol de mão por Leonardi. O árbitro da partida, o brasileiro Alberto Borgerth, não viu bem o lance e validou o gol, achando que o jogador ajeitara a bola com o peito. Porém, o próprio atleta, numa atitude digna, praticamente impossível de acontecer nos dias de hoje, confessou ao árbitro que arrumara a bola com a mão. E com isso o gol foi anulado.
No dia 12 de julho de 1916, durante o Campeonato Sul-Americano disputado na Argentina, Sylvio Lagreca foi personagem de um fato que se tornou histórico, ao salvar a bandeira brasileira de ser queimada num incêndio ocorrido no Estádio do Gimnasya Y Esgrima, em Buenos Ayres, antes do clássico Brasil x Uruguai.
O estádio estava completamente lotado, e em razão disso os portões foram fechados, embora muita gente com ingresso tivesse ficado do lado de fora. Indignados, esses torcedores começaram a gritar “ladrones”! “ladrones”! Da indignação a ação foi rápido. Os mais exaltados jogaram gasolina por baixo das arquibancadas, que eram de madeira e atearam fogo. As labaredas não demoraram a surgir ameaçadoras. O terror e o pânico tomaram conta de todos que estavam dentro do estádio. As pessoas corriam apavoradas, criando-se um clima de verdadeiro terror.
O fogo avançou pelo pavilhão e atingiu os mastros onde estavam hasteadas as bandeiras dos países que disputavam o campeonato. Os organizadores da competição conseguiram retirá-las, mas por um descuido a bandeira brasileira permaneceu em seu lugar. Os jogadores brasileiros assistiam a tudo sem saber o que fazer. Ainda não tinham trocado de roupa para enfrentar os uruguaios.
Foi quando o técnico e jogador Sylvio Lagreca, vendo que o pavilhão nacional ia desaparecer nas chamas, tirou o paletó, subiu ao topo do mastro e mesmo sofrendo algumas queimaduras, salvou a bandeira do incêndio. Assim que desceu, um policial argentino quis lhe arrancar das mãos a nossa bandeira. Lagreca não deixou e acabou recebendo voz de prisão. Foi preciso que o presidente da Associação Argentina de Futebol, interviesse para que a prisão não acontecesse de fato.
Lagreca participou de várias competições nacionais e internacionais, tais como Campeonato Paulista, tendo sido campeão com o São Bento, em 1914; foi jogador e técnico da Seleção Paulista; disputou o Torneio Rio-São Paulo; foi campeão da Copa Rocca, em 1914 com a seleção Brasileira. Disputou os Campeonatos Sul-Americanos em 1916 e 1917, ambos vencidos pelo Uruguai. Pela Seleção Brasileira participou como jogador de 15 jogos, com 6 vitórias, 4 empates e 5 derrotas, tendo marcado 1 gol. Como técnico, dirigiu a Seleção Brasileira em 10 jogos, 4 em 1914, 4 entre 1916 e 1917 e 2 em 1940.
Quando deixou os gramados passou a atuar como árbitro. Sylvio Lagreca faleceu em São Paulo, no dia 30 de abril de 1966, aos 71 anos de idade. (Pesquisa: Nilo Dias)
Sylvio Lagreca merecia um melhor tratamento histórico. (Foto: Acervo da Confederação BRasileira de Futebol-CBF)
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