Os meios artísticos brasileiros perderam hoje um de seus mais legítimos representantes: morreu Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho, conhecido como Chico Anysio, nascido no dia 12 de abril de 1931, na cidade cearense de Maranguape. Foi um pouco de tudo, humorista, ator, dublador, escritor, compositor e pintor.
Chico Anysio aparece neste blog porque também teve uma ligação muito forte com o futebol, ao início de sua carreira. Na Rádio Guanabara, do Rio de Janeiro, foi narrador e repórter de campo. Foi nesse tempo que surgiu a sua paixão pelo futebol.
A emissora havia contratado Raul Longras, “o homem do gol eletrizante”, e passou a transmitir futebol nas ondas do rádio. Com enorme talento e disposição, não demorou para Chico conseguir um lugar ao seu lado. Além dos comentários fazia narrações dos jogos e era repórter de campo.
Morador do Catete, era declaradamente torcedor do Vasco da Gama, o que contrariou a vontade do pai e do irmão mais velho, botafoguenses convictos. Mas trocou de camisa várias vezes: já torceu por outros clubes, só o Palmeiras jamais deixou de ter espaço. Vasco, América e Flamengo já se revezaram na preferência carioca. Mas também gostou do Cruzeiro, Grêmio, Santa Cruz e por último o Inter do amigo Falcão. Chico chegou a sonhar em ser jogador de futebol, mas desistiu cedo da idéia, porque a bola não era o seu forte.
Chico levou sua paixão pelo futebol para muitos de seus personagens. O principal deles foi “Coalhada”, que tinha o sonho de ser jogador de um grande time de futebol, mas era o maior perna de pau. Era ajudado pelo empresário “Bigode” (Amândio Silva Filho). Tinha o “Alfacinha”, um vendedor natural de Lisboa e torcedor do Benfica que vivia batendo de porta em porta, tentando vender seus produtos exóticos.
Quem não lembra do “Azambuja”, um malandro carioca, que foi jogador de futebol do Bonsucesso e participou de um conjunto musical na juventude. Vivia aplicando golpes em parceria com “Lingüiça” (Wilson Grey).
E o "Bolada", sujeito fanático por futebol, que tinha o cachorro “Jorge”, que era malufista, como seu melhor amigo. Havia também o “Fumaça”, um português e vascaíno, dono do Boteco do Idalino, conhecido por seus frequentadores como “Boteco do Fumaça”, nome pelo qual não gostava de ser chamado. Recebeu esse apelido por fumar escondido de todos.
E para completar a lista, não se pode esquecer do “Meinha”, que usava uma meia-calça na cabeça. O personagem era um jogador de futebol que saiu de times sem expressão no Brasil diretamente para a Europa.
Ao longo de seus 65 anos de carreira, Chico Anysio criou mais de 200 personagens, com destaque no rádio, na TV, no cinema e no teatro. Aos 80 anos, o humorista estava internado no Hospital Samaritano, na Zona Sul do Rio de Janeiro. Completaria 81 anos dia 12 de abril.
Anysio apresentou uma piora nas funções respiratórias e renal na quarta-feira (21) e voltou a respirar com ajuda de aparelhos durante todo o dia. Ele estava no CTI do hospital carioca desde 22 de dezembro do ano passado por conta de um sangramento.
O comediante chegou a ter o problema controlado, mas apresentou uma infecção pulmonar e retornou à internação. Ele seguiu em sessões de fisioterapia respiratória e motora diariamente, somadas a antibióticos.
Chico foi internado pela primeira vez em maio de 2009, quando teve pneumonia. Em agosto de 2010, precisou ser internado para a retirada de parte do intestino grosso, após ser constatado um quadro de hemorragia no aparelho digestivo. Em 2 de dezembro de 2010, deu entrada no hospital devido a falta de ar. Na avaliação inicial, detectou-se obstrução da artéria coronariana, assim, foi submetido à angioplastia. Chico Anysio ficou 109 dias internado, recebendo alta apenas no dia 21 de março de 2011. Neste período, o humorista, na maior parte do tempo esteve na UTI.
Em 23 de abril de 2011, Chico Anysio retornou ao programa "Zorra Total" interpretando a personagem Salomé. No quadro, Salomé conversa de mulher para mulher com a presidenta Dilma Rousseff.
No dia 30 de novembro de 2011, foi internado novamente, devido a uma infecção urinária, tendo recebido alta em 21 de dezembro. Um dia depois, voltou ao Hospital Samaritano.
Chico Anísio deixou oito filhos. O ator Lug de Paula, do casamento com a atriz e comediante Nancy Wanderley, com quem se casou aos 22 anos; o também comediante Nizo Neto e o diretor de imagem Rico Rondelli, da união com a atriz e vedete Rose Rondelli; André Lucas, que é filho adotivo; o DJ Cícero Chaves, da relação com a ex-frenética Regina Chaves, de quem dizia quase não se lembrar; e o ator/escritor Bruno Mazzeo, do casamento com a ex modelo e atriz Alcione Mazzeo, casamento terminado por conta de um ensaio nu.
Também teve mais dois filhos com a ex-ministra Zélia Cardoso de Mello, Rodrigo e Vitória.Foi a união que provocou mais polêmica. Chico contava que Zélia passou a ser uma pessoa de seu desagrado total, tendo sido um biombo para ela.
Era irmão da falecida atriz Lupe Gigliotti, com quem contracenou em vários trabalhos na televisão; do cineasta Zelito Viana; e do industrial, compositor e ex-produtor de rádio Elano de Paula. Também era tio do ator Marcos Palmeira, da atriz e diretora Cininha de Paula e é tio-avô da atriz Maria Maya, filha de Cininha com o ator e diretor Wolf Maya. Era casado com a empresária Malga Di Paula, com quem não teve filhos.
Quando tinha apenas sete anos de idade, os pais de Chico mudaram-se para o Rio de Janeiro, após a falência da empresa de ônibus da família. Ainda jovem resolveu fazer um teste para locutor de rádio, junto com uma irmã sua. Saiu-se muito bem, ficando em segundo lugar, somente atrás de outro jovem iniciante, Sílvio Santos.
Seu primeiro emprego foi na “Rádio Guanabara”, onde exerceu várias funções: radioator e comentarista de futebol, entre outras. Participou do programa “Papel Carbono”, de Renato Murce. Na década de 1950, trabalhou nas rádios "Mayrink Veiga", "Clube de Pernambuco” e “Clube do Brasil”. Nas chanchadas da década de 1950, Chico passou a escrever diálogos e, eventualmente, atuava como ator em filmes da Atlântida Cinematográfica.
Na TV Rio estreou em 1957 o “Noite de Gala”. Em 1959, estreou o programa “Só Tem Tantã”, lançado por Joaquim Silvério de Castro Barbosa, mais tarde chamado de “Chico Total”. Além de escrever e interpretar seus próprios textos no rádio, televisão e cinema, sempre com humor fino e inteligente, Chico se aventurou com relativo destaque pelo jornalismo esportivo, teatro, literatura e pintura, além de ter composto e gravado algumas canções.
Chico Anysio foi um dos responsáveis pela intermediação referente ao exílio de Caetano Veloso em Londres. Quando completou dois anos de exílio, Chico enviou uma carta para Veloso, para que este retornasse ao Brasil. Caetano e Gilberto Gil haviam sido presos em São Paulo, duas semanas depois da decretação do AI-5, o ato que dava poderes absolutos ao regime militar.
Trazidos ao Rio de carro, os dois passaram por três quartéis, até viajarem para Salvador, onde passaram seis meses sob regime de prisão domiciliar. Em seguida, em meados de 1969, receberam autorização para sair do Brasil, com destino a Londres, onde só retornariam no início de 1972.
Chico Anysio, além de seu humor fino, compôs mais de 300 músicas (algumas gravadas por grandes cantoras como Dolores Duran e Dalva de Oliveira). Esteve à frente de diversos espetáculos teatrais (“Uma noite com Chico Anysio”, “Olha Eu Aí Outra Vez” e “O Fofo”.
Além disso publicou diversos livros: “O Batizado da Vaca”, “Como Segurar Seu Casamento”, “O Enterro do Anão”, “A Curva do Calombo”, “Feijoada na Copa”, “O tocador de Tuba”, etc.).
Além de se dedicar ao humor, Chico também foi artista plástico. Apaixonado pela pintura, retratou paisagens ao redor do mundo a partir de fotografias que tirava dos países que visitava. Realizou exposições de seus quadros em diversas galerias do Brasil e chegou a afirmar que gostaria de ter dedicado mais tempo à atividade.
Desde 1968 encontrava-se ligado à Rede Globo, onde conseguiu o status de estrela num "cast" que contava com os artistas mais famosos do Brasil; e graças também a relação de mútua admiração e respeito que estabeleceu com o executivo Boni. Após a saída de Boni da Globo nos anos 1990, Chico perdeu paulatinamente espaço na programação, situação agravada em 1996 por um acidente em que fraturou a mandíbula.
Em 2005, fez uma participação no Sítio do Pica-pau Amarelo, onde interpretava o "Dr. Saraiva" e participou da novela “Sinhá Moça”, na Rede Globo. Chico tinha contrato com a emissora até este ano.
Dirigiu e trabalhou ao lado de grandes nomes do humor brasileiro no rádio e na televisão, como Paulo Gracindo, Grande Otelo, Costinha, Walter D'Ávila, Jô Soares, Renato Corte Real, Agildo Ribeiro, Ivon Curi, José Vasconcellos e muitos outros. Tornou-se um dos mais famosos, criativos e respeitados humoristas da história do país.
No cinema participou de vários filmes: 1959, “Entrei de Gaiato”; 1981, “O Mundo Mágico dos Trapalhões”; 1996, “Tieta”; 2009, “Se Eu Fosse Você”; 2009, “Up - Altas Aventuras”; 2009, “Simonal - Ninguém Sabe o Duro que Dei” e 2010, “Uma Professora Muito Maluquinha”.
Em 2009, Chico foi tema da escola de samba “Unidos do Anil”, do Rio de Janeiro, desfilando com o enredo "Chico Total! Sou Anil e Faço Carnaval".
O seu personagem mais famoso foi o “Professor Raimundo”, cuja primeira aparição no vídeo aconteceu em 1957, na extinta TV Rio, no programa “Aí vem dona Isaura”. Até então o programa só havia sido veiculado pelo rádio. Mas outros personagens também ficaram famosos como o ator canastrão Alberto Roberto, o pão-duro Gastão Franco, o coronel Pantaleão, o pai-de-santo Véio Zuza, o velhinho ranzinza Popó, o alcoólatra Tavares e sua mulher Biscoito (Zezé Macedo) e o revoltado Jovem.
Com o passar dos anos, novos tipos foram criados e incorporados ao programa: o funcionário da TV Globo Bozó, que tentava impressionar as mulheres por conta de sua condição; o mulherengo e bonachão Nazareno, sempre de olho nas serviçais; o político corrupto Justo Veríssimo; e o pai de santo baiano e preguiçoso Painho são alguns dos mais populares.
Chico também atuou em novelas e especiais da Globo, como “Pé na jaca” (2007), “Sinhá Moça” (2006), “Guerra e paz” (2008) e “A diarista” (2004). Chico Anysio também teve um quadro fixo no Fantástico por 17 anos (de 1974 a 1991), e supervisionou a criação no programa “Os Trapalhões” no início dos anos 90.
Chico Anysio recebeu no ano 2000, em Brasília, uma homenagem que o colocou entre os 20 brasileiros vivos mais importantes deste século, ao lado de pessoas como Pelé, Raquel de Queiroz e Emerson Fittipaldi.
Em novembro de 2009 foi agraciado com a “Ordem do Mérito Cultural”, a mais alta comenda do governo brasileiro na área. Da vida, dizia levar apenas um arrependimento: “ter fumado durante 40 anos”. (Pesquisa: Nilo Dias)
Chico, com a camisa do Vasco.
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