quinta-feira, 9 de maio de 2013

Um técnico vitorioso

Sir Alex Ferguson, o treinador mais bem sucedido na história do futebol inglês - ninguém ganhou mais títulos que ele - anunciou nesta quarta-feira, 8, que está se aposentado, depois de ter dirigido o Manchester United, por 26 anos ou 9.681 dias e ter conquistado 28 títulos pelo clube. Esteve a frente da tradicional agremiação inglesa em cerca de 1.500 partidas, tendo superado a marca de sir Matt Busby, que foi técnico do Manchester por 24 anos.

Ferguson encerrará a carreira de técnico em 19 de maio, ao final da temporada, após o jogo contra o West Bromwich. Pelo trabalho histórico que desenvolveu no Manchester United, Ferguson recebeu em 1999, das mãos da rainha Elizabeth II, o título de Sir, a mais alta honraria da coroa britânica. Como reconhecimento ao seu trabalho, em 2012 o Manchester United ergueu em seu estádio, o “Old Trafford”, chamado de “O Teatro dos Sonhos”, uma estátua em sua homenagem.

Nesse longo período colecionou troféus, tendo ganho a “Premier Ligue”, o campeonato mais importante da Inglaterra, em 12 oportunidades: 1992/93, 1993/94, 1995/96, 1996/97, 1998/99, 1999/2000, 2000/01, 2002/03, 2006/07, 2007/08, 2008/09, 2010/2011/e 2012/2013).

Sua carreira foi recheada de fatos inéditos. Em 1999, foi o primeiro treinador de uma equipe inglesa a ganhar a “Tríplice Coroa”, sendo campeão da “Premier League”, ‘‘FA Cup” e “UEFA Champions League”. Também foi o único  a ganhar a “FA Cup” cinco vezes e a vencer sucessivamente três “Premier League” a frente de um mesmo clube (1998/1999, 1999/2000 e 2000/2001).

Quando Ferguson chegou ao Manchester United, o clube tinha sete troféus de campeão inglês nas vitrinas do seu museu, bem distante dos 16 do glorioso rival Liverpool. Em 2011, 25 anos depois de se tornar o técnico, o United havia se tornado o clube inglês com mais campeonatos conquistados (19), ultrapassando a cifra do Liverpool.

No momento em que Ferguson anunciou o seu «adeus» ao futebol, o United já tinha assegurado o 20º título de campeão da Inglaterra, 13 conquistados em 26 anos. Uma média sem par no futebol inglês faz de Sir Alex, um caso à parte na história do país que deu ao mundo o futebol.

Alexander Chapman Ferguson, mais conhecido como Sir Alex Ferguson, nasceu em Glasgow, Escócia, no dia 31 de dezembro de 1941, num período difícil que o mundo atravessava. Glasgow era diariamente assolada por bombardeamentos alemães e o pequeno Alex teve uma infância dura, com os primeiros anos a ficarem marcados pelas sirenes de alarme que anunciavam mais uma noite de blitz.

Começou a carreira de jogador no clube amador Queen’s Park, aos 16 anos na posição de atacante. Lembra de seu primeiro jogo, uma vitória de 2 X 1 frente o Stranraer, tendo marcado um gol. Como o Queen’s Park era um time amador, também trabalhava nos estaleiros de River Clyde como aprendiz de ferramenteiro, para depois se tornar um comissário de bordo ativo da loja do sindicato.

Por ironia do destino, a partida em que mais se destacou vestindo a camisa do Queen’s Park , foi uma derrota de 7 X 1 para o Queen of the South, fora de casa, em 1959. Artilheiro do time em 31 jogos, tendo marcado 20 gols, chamou a atenção de outras equipes, tendo em 1960 se transferido para o St. Johnstone.

Embora tenha continuado a marcar gols, não conseguiu ser titular no novo clube, por isso pediu para sair. Ferguson pensou em ir para o Canadá. O técnico até consentiu que ele fosse embora, mas antes disso o selecionou para um jogo contra o Rangers, em que ele marcou um “hat-trick” (três gols), em uma surpreendente vitória. Em 1964, finalmente deixou o St. Johnstone, para assinar contrato de profissional com o “Dunfermline”, filiado a Scottish League (Liga Escocesa).

Na temporada 1964/1965, a equipe do “Dunfermline” tinha ambições de chegar a final da “Scottish Cup”, mas não conseguiu, tendo perdido a final para o Celtic por 3 X 2. Na temporada, Ferguson marcou 45 gols em 51 jogos e dividiu a artilharia do Campeonato Escocês com Joe McBride, do Celtic, com 31 gols.

Em 1967 foi contratado pelo Rangers por £65,000, o que na época foi considerada uma transferência recorde entre dois clubes da Escócia. Depois de ter se casado com a jovem Cathie, passou a sofrer discriminação de parte do clube, por questões religiosas. Ele deixou claro em sua autobiografia que o Rangers sabia da religião de sua mulher quando ele entrou no clube.

O Rangers não quis renovar o seu contrato, devido um suposto erro na final da “Scottish Cup”, quando foi responsabilizado pelo gol do Celtic, no jogo final. Naquela ocasião, Ferguson ficou tão frustrado com a derrota que jogou para longe a medalha de vice-campeão.

Em outubro de 1968, o Nottingham Forest mostrou interesse em contar com Ferguson, mas sua esposa não estava disposta a mudar-se para a Inglaterra. Por isso assinou contrato com o Falkirk, onde foi jogador e treinador por um período. Depois o clube contratou John Prentice para técnico. Ferguson não gostou e se transferiu para o Ayr United, onde encerrou a carreira de jogador em 1974.

Como treinador começou no East Stirlingshire, em Junho de 1974, quando tinha 32 anos de idade. Era um trabalho de meio período, seu salário era de £40 por semana, e nesse tempo o time não tinha um único goleiro. Imediatamente ele ganhou a reputação de disciplinador. Tanto é verdade, que um de seus jogadores chegou a dizer que nunca tinha tido medo de qualquer um antes da chegada de Alex Ferguson. Seus jogadores o admiravam pelas decisões táticas, e com isso o time ganhou melhoras consideráveis.

Em outubro seguinte, Ferguson foi convidado a treinar o St Mirren. Embora abaixo do East Stirlingshire na Liga, ele estava entre os maiores clubes. Mesmo tendo um sentimento de lealdade ao East Stirlingshire, decidiu-se por ir para o St Mirren, onde ficou até 1978.

Mesmo sendo um clube de poucos recursos, conseguiu classificá-lo para a Primeira Divisão Escocesa em 1977. Mas teve problemas com o presidente da entidade, pois queria fazer mudanças estruturais profundas. Por isso foi demitido em 1978. O St Mirren entrou para a história como o único clube a despedir Ferguson.

Em junho de 1978 foi para o Aberdeen, onde substituiu Billy McNeill que fora para o Celtic. Ali, Ferguson teve a oportunidade de mostrar toda a sua competência como treinador, ganhando quatro campeonatos nacionais em oito anos, um ótimo desempenho, visto que a Liga era dominada pelos rivais Celtic e Rangers.

O Aberdeen não ganhava o título nacional desde 1955. Mesmo sendo campeão, Ferguson não teve vida fácil no clube, pois sendo mais jovem que alguns atletas penou para ganhar o respeito de jogadores, tais como Joe Harper. Com a conquista do título escocês, temporada 1979/1980, após 15 anos de jejum, Ferguson finalmente conquistou o respeito de todo o grupo de jogadores.

Devido a sua rigidez com a disciplina, foi apelidado de “Furious Fergie” (Fergie Furioso). Uma ocasião Ferguson multou um de seus jogadores, John Hewitt, por ultrapassá-lo em uma estrada publica. De outra feita, deu um pontapé no galão de chá dos jogadores no intervalo de um jogo, depois de um primeiro tempo fraco. A equipe continuou seu sucesso, ganhando a “Scottish Cup” em 1982. Chegou a receber convite para treinar o Wolves, mas recusou.

O Aberdeen alçou voos mais altos, ao se classificar para a “European Cup Winners”, em 1982/83, por ter ganho a “Scottish Cup” na temporada anterior. E se deu bem, eliminando o FC Bayern Munique, que tinha batido o Tottenham Hotspur por 4 X 1 na rodada anterior. Em 11 de maio de 1983, o grande feito ocorreu, ao derrotar no jogo final ao Real Madrid, por 2 X 1. O Aberdeen foi a terceira equipe escocesa a ganhar um troféu europeu.

Seu sucesso no Aberdeen chamou a atenção de outros clubes, que desejavam contar com seu trabalho. Entre eles, o Tottenham e o Arsenal, ambos da Inglaterra. Mas Ferguson rejeitou as duas propostas.

O técnico do Aberdeen já era considerado o melhor da Escócia, por isso assumiu temporariamente a Seleção de seu país, após a morte do treinador Jock Stein, ocorrida em setembro de 1985. Ferguson comandou a Seleção Escocesa na Copa do Mundo de 1986, antes de se tornar em 7 de novembro daquele mesmo ano, o treinador do Manchester United, da Inglaterra.

Quando chegou no clube inglês, encontrou sérios problemas. Alguns jogadores como Norman Whiteside, Paul McGrath e Bryan Robson, estavam bebendo muito e se encontravam deprimidos. Mas Ferguson conseguiu elevar o ânimo do grupo, com disciplina e união. A equipe ainda terminou a temporada em 11° lugar.

Três semanas depois de ter chegado ao Manchester United, o treinador sofreu uma tragédia pessoal, com o falecimento de sua mãe Elizabeth, de 64 anos, vitimada por um câncer pulmonar.

Na temporada seguinte, Ferguson indicou grandes contratações, como Steve Bruce, Viv Anderson, Brian McClair e Jim Leighton. Com os reforços, o time chegou em segundo lugar no campeonato.  Na temporada 1988/1989, com o retorno de Mark Hughes, que estava no Barcelona, esperava-se uma grande performance, mas acabou em decepção, classificando-se em 11º lugar.

Na temporada 1989/90, chegaram mais reforços, os meio-campistas Neil Webb e Paul Ince, bem como o defensor Gary Pallister, que custou £ 2.3 milhões pagos ao Middlesbrough, um recorde nacional. Mas nova decepção no campeonato, incluindo uma goleada de 5 X 1, sofrida ante o seu feroz rival, o Manchester City. Muitos jornalistas e defensores pediam a demissão de Ferguson. O treinador descreve esse período, como o mais negro em toda sua permanência no clube.

Depois de sete jogos sem vitória no campeonato inglês, o Manchester United foi jogar em Nottinghan, pela terceira rodada da “FA Cup”, contra o Nottingham Forest. Esperava-se uma derrota do Manchester e a demissão de Ferguson. Mas o Manchester ganhou por 1 X 0, e chegou a final. Esta vitória é constantemente citada como a que salvou a carreira de Ferguson no “Old Trafford”.

Na final, jogando contra o Crystal Palace, houve empate em 3 X 3 no tempo normal. Na prorrogação o Manchester United venceu por 1 X 0, garantindo a Ferguson o primeiro grande troféu no comando do clube inglês.

O Manchester United também chegou à final da “European Cup Winners' Cup”, superando o campeão da liga espanhola, o Barcelona, por 2 X 1. Na temporada 1991/92, o United venceu a “League Cup” e a “Super Cup”, mas perdeu o título da liga para seu rival Leeds United.

Em 1992 o clube contratou o atacante Dion Dublin, de 23 anos, que veio do Cambridge United e custou £ 1 milhão. Foi a única grande contratação do verão.

Na temporada 1992/93, finalmente o Manchester United acabou com 26 anos de espera pelo maior título nacional e Alex Ferguson foi eleito o “Treinador do Ano“, pela “League Managers' Association”.

Na temporada 1993/94, na final da “FA Cup”, o Manchester United conseguiu uma impressionante goleada de 4 X 0 contra o Chelsea. Ferguson conquistou uma dobradinha, com seu segundo Campeonato Inglês e Copa da Inglaterra.

A temporada 1994/95 foi difícil para Ferguson. O jogador Cantona agrediu um torcedor do Crystal Palace, em um jogo no Selhurst Park, e parecia que ele iria deixar o futebol inglês. Um banimento de oito meses fez com que Cantona perdesse os quatro últimos meses da temporada. Ele também recebeu uma pena de prisão de 14 dias, mas a sentença foi anulada e substituída por 120 horas de serviço comunitário.

O time perdeu o campeonato num empate inesperado de 1 X 1, com o West Ham United, no último jogo da rodada, quando uma vitória lhe teria dado o título do campeonato pela terceira vez consecutiva. O United também perdeu a final da “FA Cup” em uma derrota por 1 X 0, para o Everton.

Na temporada 1995/96, com um grupo de jogadores todo renovado, com o aproveitamento de muitos jovens, o time se encontrava 10 pontos atrás do Newcastle United, no Natal de 1995. Uma vitória por 2 X 0 em casa sobre o Tynesiders em 27 de dezembro, reduziu a diferença para sete pontos. E uma outra vitória sobre o QPR, diminuiu para quatro pontos. Mas uma derrota por 4 X 1 para Tottenham, no dia do Ano Novo de 1996 e um empate em 0 X 0, em casa com o Aston Villa restabeleceu a ampla vantagem do Newcastle.

Apesar de seu êxito como treinador, Ferguson não era bem quisto por muitos jogadores que foram dirigidos por ele. É considerado um homem autoritário, capaz de intimidar a todos, desde companheiros de direção, até os melhores jogadores e os jornalistas. Dizem que exerce um controle absoluto no vestiário e se enfurece por qualquer motivo, por mais banal que seja. É autor da frase "Nenhum jogador é maior que o clube".

Uma ocasião ele jogou um par de chuteiras no rosto de Beckham. O jogador levou cinco pontos no supercílio, mas fez questão de não levar o incidente adiante. Assim que pôde, Beckham mudou de clube.
Mas não foi só David Beckham que teve problemas com Ferguson.

Também Gordon Strachan, Paul McGrath, Paul Ince, Andriy Kančelskis, Jaap Stam, Dwight Yorke, Diego Forlan e mais recentemente, Roy Keane e Ruud van Nistelrooy deixaram o clube após conflitos com o treinador. Essa linha disciplinar é creditada como uma das razões para o sucesso dele no Manchester United.

Em 2009, quando o Real Madrid buscava a contratação do ídolo do United, Cristiano Ronaldo, Ferguson afirmou que não venderia a eles um vírus sequer. Meses depois, Sir Ferguson faria referências à histórica ligação dos merengues com o ditador Francisco Franco, dizendo que o clube, como o de predileção do “Generalíssimo”, contratava quem queria. Mas citou que a democracia já chegara à Espanha.

Sobre o campeonato mundial conquistado em cima do Palmeiras, ele foi ainda mais firme em suas declarações: “Não jogamos com todo o nosso potencial e, mesmo assim, passeamos no jogo. O campeonato mundial é uma grande falácia, é um campeonato de segunda linha. Ganhamos, mas, com toda certeza, a “Champions League” foi o ápice da temporada”.

Ferguson era uma espécie de Deus vestido de vermelho. Ele podia tudo no clube, contratava e demitia, definia o orçamento, enfrentava árbitros e adversários. Os jogadores, todos, perto do poder de Ferguson eram como se fossem pigmeus, passavam, e o treinador ficava.

Em momentos difíceis, quando deixava o reservado especial dos técnicos e chegava na linha branca lateral, o estádio descia junto, os jogadores ganhavam uma dose extra de adrenalina, os adversários recuavam e a arbitragem corria com um olho na bola e outro na beira do gramado. As vitórias nos finais das partidas viraram marca registrada do United.
  
Títulos ganhos por Ferguson: St. Mirren: (1977, 2ª Divisão Escocesa); Aberdeen: (Campeonato Escocês de 1980, 1984 e 1985); Copa da Escócia (1982, 1983, 1984 e 1986; Copa da Liga (1986); Recopa Européia (1983); Supercopa da Europa (1983); Manchester United: campeonato Inglês (1992/93, 1993/94, 1995/96, 1996/97, 1998/99, 1999/00, 2000/01, 2002/03, 2006/07, 2007/08, 2008/09, 2010/11 e 2012/13); Copa da Inglaterra (1989/1990, 1993/1994, 1995/1996, 1998/1999, 2003/2004); Copa da Liga Inglesa (1992, 2006, 2009 e 2010); Supercopa da Inglaterra (1990, compartilhada com o Liverpool, 1994, 1997, 2003, 2008, 2010, 2011); Liga dos Campeões da UEFA (1998/1999, 2007/2008); Recopa Européia (1991); Supercopa da Europa (1991); Taça Intercontinental (1999); Copa do Mundo de Clubes da FIFA (2008) (Pesquisa: Nilo Dias)


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