segunda-feira, 23 de setembro de 2013

O velho (e bom) futebol goiano (1)

O futebol começou em Goiás (originalmente Vila Boa) na primeira década do século passado, mais precisamente em 1907. Seu introdutor teria sido o estudante de 15 anos de idade, Valter Sócrates do Nascimento, que retornara de São Paulo onde fez um período de estudos e conheceu o novo esporte. Valter nasceu no dia 23 de agosto de 1892, e era filho de pai capixaba e mãe goiana.

Seu retorno a Goiás (hoje Goiás Velho), na época capital do Estado, acabou com a tranquilidade até então existente no velho “Largo do Chafariz”, que hoje se localiza na Praça Doutor Brasil Caiado, próximo do Colégio Sant’Ana. Valter reuniu um grupo de estudantes do Lyceu de Goiás, organizando ali partidas de futebol, geralmente nos períodos da tarde e em qualquer dia da semana.

Valter contou com a colaboração de Renato Marcondes de Lacerda, que a exemplo dele também estudara em São Paulo, mais Odilon de Amorim, Alberico Camargo e João Monteiro, para que convidassem outros jovens a participarrm dos jogos de futebol. Foi dessa maneira que teve início o futebol em Goiás.

O terreno íngreme não era o mais apropriado para a prática do futebol, pois não tinha grama e era coberto por um cascalho fino e não obedecia às regras. Tudo era improvisado, desde as traves que não passavam de duas varas fincadas ao chão até as marcações do campo, que eram feitas com riscos no solo.

Como o campo era pequeno, os primeiros jogos contavam com apenas seis jogadores de cada lado. Não havia uniformes e muito menos chuteiras, todos usavam a roupa do corpo. A bola era de “mangaba”. O processo de fabricação era simples. Envolvia-se uma bexiga de bode no leite da “mangaba”, que funcionava como uma borracha. 

Mas existe outra versão que contempla o pastor protestante inglês, Archie Rua Mancintyre, como o verdadeiro introdutor do futebol em Goiás, isso em 1908, portanto um ano depois que Valter Sócrates do Nascimento organizou as “peladas” no “Largo do Chafariz”.

No livro "Do meu Tempo", escrito por Albatenio de Godoi, consta que Archie trouxe o futebol a Goiás durante uma visita que fez a cidade, quando em missão de catequese de índios do rio Araguaia. Dos primeiros jogos teriam participado, entre outros, Brasil Caiado, o próprio Albatenio, Claro Godoi, Alcenor Cupertino e Francisco Cardoso.  Mas essa versão não ganha força.

Ao que se sabe em 1908 os jogos já contavam com o número oficial de 11 jogadores para cada lado. As traves passaram a ser de sarrafo, o campo de terra demarcado, os times com camisetas diferenciadas e a presença de árbitros.

Em 1920, o futebol ganhou destaque na cidade de Goiás, quando muitos dos participantes das “peladas” do “Largo do Chafariz”, foram para São Paulo e Rio de Janeiro concluírem seus estudos em Engenharia, Direito ou Medicina, como era comum.

Em meados de 1920. Noticiava-se na capital a existência do União Operária Sport Club, que marcara um jogo contra um time de sargentos. O clube operário provavelmente articulava-se com ações como a criação da “Sociedade Santa Luzia Classe Operária”, organizada em 1930.

Entre 1920 e 1940, Goiás teve um significativo aumento no número de estabelecimentos industriais existentes na cidade. De acordo com dados do censo de 1920, Goiás contava, naquele ano com 16 indústrias e 244 operários. Em 1940, esses números já somavam 260 indústrias e 1.487 operários, num aumento de mais de 1.500 %.

De grande importância para o desenvolvimento do futebol em Goiás, também foi a verdadeira “febre” pelo novo esporte, que tomou conta da cidade de Uberaba (MG). Uberabenses que haviam estudado em São Paulo, especialmente no Colégio São Luis, em Campinas, voltavam trazendo consigo mais noções de regras, técnicas e táticas. Em 1906, um grupo de uberabenses cotizou-se para comprar uma bola de futebol em São Paulo.

Foi o que bastou para que o futebol se tornasse popular na cidade e conhecesse um desenvolvimento muito grande. A fama do Ginásio Diocesano como um brilhante estabelecimento de ensino e o melhor do Brasil Central, se espalhou rapidamente, chamando a atenção de famílias goianas, especialmente das cidades de Itaberaí, Itumbiara, Catalão e Morrinhos, que mandavam seus filhos estudarem lá.

Foi no Ginásio Diocesano que muitos jovens goianos aprenderam a jogar futebol. De volta a Goiás, alguns desses jovens acabaram tendo atuações determinantes no esporte do Estado, caso de Edmundo Pinheiro de Abreu, que jogou no ataque do time da escola. Depois esteve entre os primeiros jogadores de futebol de sua cidade natal, Itumbiara.

Já na nova capital de Goiás, Goiânia, teve intensa participação nas administrações do Goiás Esporte Clube e da Federação Goiana de Futebol, criada em 1944.

Em 1913, as primeiras locomotivas da Estrada de Ferro Goiás atravessavam a ponte sobre o Rio Paranaíba, estabelecendo, finalmente, ligação férrea entre Goiás e Minas Gerais.

No mesmo ano foi fundado o Catalão Futebol Clube, que depois se tornou uma potência futebolística da região. Até o fim da década de 1910, a organização de times e a realização de partidas foram registradas, pelo menos, em Anápolis, Pirenópolis e Catalão.

Nessa época, o Catalão Futebol Clube já possuía um terreno para a construção de uma praça de esportes, onde outros times da cidade, como o Operário, o Americano e o Brasil Futebol Clube debateram-se contra o chamado “Leão do Cerrado”.

Em 1923 o futebol já havia chegado também em cidades do norte de Goiás, atualmente o Estado de Tocantins, especialmente em Natividade e Porto Nacional. A difusão do futebol nessas localidades se deveu aos estudantes, que retornavam da Bahia e o implantaram nos rincões goianos.

Em dezembro de 1979, houve uma significativa melhora para o futebol local com a inauguração do Estádio Lauro Assunção, sem arquibancadas, que reuniu na partida inaugural as seleções de Araguaína e de Tocantinópolis.

O jogo chamou a atenção de importantes autoridades políticas do Estado de Goiás e do município de Tocantinópolis. A seleção de Tocantinópolis venceu por 3 X 1, gols de Guinha, Emiliano e Ademir.

No início da década de 1980, mesmo contando com o Estádio Lauro Assunção, o futebol local não conseguia evoluir, em razão das cansativas viagens e da falta de apoio.

O poder público municipal destinava a seleção tocantinopolina, apenas um caminhão caçamba, que comportava toda a delegação, e era parcialmente cheio de areia e coberto por uma lona para dar mais "conforto" aos atletas.

O estremo norte de Goiás era esquecido tanto em termos sociais quanto em termos de futebol, pois os principais clubes goianos, Goiás, Vila Nova, Atlético Goianiense e Goiânia, levavam vários anos para atuarem nos péssimos gramados da região. Quando isso ocorria, em jogos amistosos, verdadeiras multidões lotavam os estádios.

Em 1986, em Porto Nacional, aconteceu um jogo entre a Seleção Tocantinense e a Seleção Brasileira de Novos, que tinha em seu elenco jogadores que depois seriam verdadeiros astros do futebol brasileiro, casos de Cafu, Túlio, Marcelinho Carioca e Márcio Santos. Também teve outro jogo contra a “Seleção de Ouro”, que tinha como maior astro o artilheiro Dadá Maravilha.

A Seleção Tocantinense venceu por 1 X 0.O futebol do norte de Goiás só evoluiu quando as seleções das cidades se transformaram em clubes, como o Gurupi E.C., de Gurupi,  Kaburé E.C., de Colina e, Trastrevo E.C., de Araguaína, entre outros. Isso, depois da implantação do Estado do Tocantins que ocorreu em 1989. (Pesquisa: Nilo Dias)

Em 1924, por exemplo, na cidade de Jaraguá eram disputadas partidas envolvendo os moradores da “Rua Direita” contra o “Resto”. Em Pires do Rio era criada a primeira equipe de futebol da cidade, que tinha nos times de Iparemi seus principais adversários.

Belavistense, Bonfim Esporte Clube, Leopoldo de Bulhões Futebol Clube, Vianápolis Esporte Clube, Associação Atlética Rio Verde, Rio Bonito Futebol Clube, foram algumas das equipes criadas no Estado, na ocasião.

Em Goiás, que era a capital, foi fundada a Associação Athlética União Goyana, que teve papel importante no futebol goiano até meados da década seguinte. Foi nessa época que surgiram os times dos Sargentos, dos Operários, do Tiro 78, do Ibsen Caiado, do Anhauguera, do América e do Brasil Central.

Foi um tempo em que qualquer povoação do interior e até mesmo as diversas fazendas existentes nas zonas rurais, praticavam o futebol, lotando os gramados nas tardes de domingo.

A presença das mulheres nos “grounds” começou a ganhar constância. No começo eram apenas “senhorinhas”, madrinhas dos times. Depois a “moda” se espalhou e as “damas”, de todas as idades, passaram a frequentar os campos de futebol.

Na cidade de Goiás, a partir de 1925, já aconteciam jogos entre os times locais e os de Itaberaí, Ipameri, Anápolis e Bela Vista. Em um desses jogos esteve presente o então governador do Estado de Goiás, Brasil Caiado de Castro.

Em 1928 teve inicio a grande rivalidade entre equipes da capital e o Annapolis Sport Clube. Por volta de 1928, já se verificavam jogos entre equipes de Goiás e de fora do Estado. Os times de Catalão foram pioneiros nesse intercâmbio, enfrentando, sobretudo, adversários do “Triângulo Mineiro”.

Teve uma época que era difícil a realização de jogos, pois nem sempre as cidades mantinham em atividade as suas equipes. Era comum uma estar em atividade e outra inativa. Essa situação só foi melhorar depois do advento das estradas de rodagem, cujo processo de construção começou a partir de 1917. Em 1920 já havia 1.200 quilômetros. Em 1921, mais de 28 estradas ligavam vários pontos do vasto Estado.

Anápolis, Curralinho, Roncador, Trindade, Goiabeira, Morrinhos, Caldas Novas, Goiás, Capelinha, Pirenópolis, Santa Rita do Paranaíba, Pouso Alto, Cachoeira, São José Mossamedes, Bela Vista, Ipameri, Cristalina, São José do Duro, Barreiras, Rio Verde, Jataí, Mineiros, Barro Preto, Barro Branco, Pilar eram algumas das cidades atendidas por estradas nessa época. No fim de 1927 já eram mais de 3.500 quilômetros de rodovias.

Em dezembro de 1925 uma equipe de Anápolis foi de caminhão até Goiás para jogar contra um time daquela cidade. Alguns anos depois, os clubes passaram a utilizar automóveis nesses jogos intermunicipais, como aconteceu na partida entre o Burity Futebol Clube X Santa Rita do Paranaína, em novembro de 1935.

Em 1930 teve inicio o processo de criação em Goiás, de uma associação ou liga esportiva, para organizar as competições estaduais. Em comparação com outras regiões do país, no que se referia aos esportes, era notória a preocupação das elites goianas com o fato de não ter uma representação estadual no campeonato nacional de futebol.


A foto acima tem 100 anos. É de 1913, um verdadeiro tesouro da história do futebol em Goiás. É o primeiro registro fotográfico que se tem conhecimento do esporte no Estado. (Foto: Arquivo de Sylvim Netto)

Nenhum comentário:

Postar um comentário