Quem viu Zizinho jogar, e eu tive essa honra, sabe que ele foi um dos grandes jogadores surgidos no futebol brasileiro em todos os tempos. Pena que naquele tempo quase não havia televisão e poucas são as imagens que ficaram, mostrando lances em que o grande craque participou. Por isso os torcedores da nova geração não sabem quem ele foi. Alguns até o compararam a Pelé, que dizia ter se inspirado em Zizinho, seu grande ídolo.
Eu não me arriscaria a fazer comparações entre Pelé e Zizinho. Considero Pelé o melhor de todos e dificilmente alguém virá a superá-lo. Sei que agora está brilhando o argentino Messi, mas terá que ralar muito para chegar perto do que foi Pelé, que marcou mais de mil gols e ganhou todos os títulos imagináveis. Para mim, depois de Pelé Zizinho foi o melhor. Nem tem para Zico, brilhante jogador do Flamengo.
Tomás Soares da Silva, mais conhecido como Zizinho, nasceu em São Gonçalo (RJ), no dia 14 de setembro de 1921 e faleceu em Niterói (RJ), no dia 8 de fevereiro de 2002. Começou a carreira nas divisões de base do Byron, de Niterói. Em 1939, com 18 anos de idade foi para o Flamengo, depois de uma rápida passagem pelo São Cristóvão e uma recusa do América (RJ).
No primeiro treino que fez na Gávea, entrou no time titular faltando 10 minutos para o seu término, depois que Leônidas da Silva se machucou. E partiu para o tudo ou nada. O tempo era curto, por isso Zizinho tratou de prender a bola, driblar e fazer gol. Na primeira bola que recebeu foi desarmado, na segunda partiu em zigue-zague driblando um, dois três adversários e na saída do goleiro bateu em seu contrapé. Depois marcou outro gol, encobrindo o goleiro com um leve toque.
Com 19 anos era titular absoluto em um Flamengo que contava com Domingos da Guia e Leônidas da Silva. Seu primeiro jogo no rubro-negro foi um amistoso, no dia 24 de dezembro de 1939, em que o Flamengo perdeu por 4 X 3 para o Independiente, da Argentina.
Com ele no time o rubro-negro ganhou o campeonato carioca de 1939 e ainda foi tricampeão estadual em 1942, 1943 e 1944, quando foi apontado como principal responsável pela conquista. O genial Nelson Rodrigues, quando “Mestre Ziza” jogava no Flamengo, costumava dizer: ”basta os alto-falantes do Maracanã anunciarem o nome de Zizinho, para saber quem será o vencedor da partida”.
Zizinho deixou o Flamengo antes da Copa de 50, depois de atuar em 329 partidas, quando foi vendido pelo presidente Dario de Melo Pinto ao Bangu por uma fortuna, sem ao menos ser consultado. Segundo registros 800 mil cruzeiros. Na época o Bangu era mantido integralmente pela família Andrade, onde figurava outro “Zizinho” – Zizinho Andrade, pai de Castor de Andrade – e onde o dinheiro corria “frouxo”.
O jogador assinou o contrato sem ao menos ler. E dizem que fez um único comentário: “Se o Bangu pagou tanto pelo meu passe é porque reconhece o meu futebol". No primeiro jogo contra o ex-clube deixou clara a sua mágoa. O Bangu goleou por 6 x 0, e ele teve uma atuação de gala.
No livro "Nação Rubro-negra", de Edilberto Coutinho, Zizinho desabafou: "Difícil dizer o que me magoou mais, se a perda da Copa de 50 ou a minha saída do Flamengo... acho que foi a saída do Flamengo. A maneira como os homens que dirigiam o clube fizeram a transação me machucou muito... nunca aceitei". Zizinho era apaixonado de corpo e alma pela equipe da Gávea. No Bangu ficou por 6 anos e marcou 120 gols, sendo um dos maiores artilheiros da história do clube.
Na Copa de 1950 suas grandes atuações maravilharam o público. Na vitória contra a Yugoslávia, por 2 X 0, em que ele marcou um dos gols, muitos críticos dizem que essa foi a melhor partida individual de um jogador brasileiro em todos os tempos, por uma seleção nacional. Mesmo com a inesperada derrota brasileira para o Uruguai na final, Zizinho foi eleito o melhor jogador da competição.
Ele não teve sorte na Seleção, onde jogou 54 vezes. Em 1953 houve o problema no sul-americano de Lima, no qual ele acabou rotulado de mercenário pelo escritor José Lins do Rego, chefe da delegação brasileira na ocasião. Esse episódio, inclusive, motivou Zizinho a escrever o livro “Verdades e Mentiras no Futebol”, em 2001.
Zizinho era tão bom e dono de uma classe e valentia impressionantes, que antes mesmo de completar 25 anos era chamado de "Mestre Ziza", apelido que ganhou do jornalista italiano Giordano Fatori, que cobriu a copa de 1950 para o jornal "Gazzetta dello Sport". Ele escreveu: "O futebol de Zizinho me faz recordar Da Vinci pintando alguma coisa rara", comparando o futebol do jogador com um dos maiores mestres da pintura de todos os tempos.
Já no fim de carreira em 1957, aos 35 anos, os companheiros de equipe o chamavam de "Seu Zizinho", tamanho o respeito. Também foi um fantástico artilheiro marcando 336 gols em sua carreira. Com a camisa do Flamengo foram 145; no Bangu 120; na Seleção Brasileira, 31; no Audax Italiano (Chile), 16 e ainda 24 pelo São Paulo. Mesmo com sua grande identificação com o Flamengo foi no Bangu que Zizinho conseguiu ser artilheiro de um campeonato carioca ao marcar 19 gols em 1952.
Em 1957, já com 35 anos, foi jogar no São Paulo F.C. por indicação do técnico húngaro Bella Gutman, onde ficou até 1958 e conquistou seu quinto título estadual (1957), marcando 24 gols.
Seu último clube foi o Audax Italiano, do Chile. Aos 39 anos, depois de ficar três anos fora do futebol, foi chamado para ser técnico do clube chileno. Atendendo ao pedido de fazer um jogo de exibição acabou atuando por toda a temporada, encerrando a carreira em 1962 aos 40 anos e ainda deixando 16 gols nas redes adversárias. Era chamado pelos companheiros de equipe de "professor" ou "doutor".
Zizinho foi protagonista de uma das mais interessantes histórias do futebol. Jogavam Bangu e Vasco no Maracanã, na decisão do campeonato carioca de 1956, vencido pelos cruzmaltinos por 2 X 1. O árbitro era Eunápio de Queiroz. Quando acabou o primeiro tempo, o repórter de rádio Luiz Fernando levou seu microfone até Zizinho para algumas declarações sobre a primeira etapa. O Bangu estava perdendo. “Que tal o jogo, Zizinho?”, perguntou. E Zizinho respondeu: “Está difícil porque esse juiz não é Eunápio de Queiroz, é Larápio de Queiroz”.
O repórter não perdeu tempo e contou tudo ao árbitro. Quando os times voltaram a campo, Eunápio perguntou a Zizinho: “É verdade que o senhor disse que eu deveria me chamar Larápio de Queiroz?”. E Zizinho confirmou: “Foi, eu disse”. E Eunápio: “Então pode voltar para o vestiário, o senhor está expulso de campo”. E foi assim que Zizinho transformou-se num dos raros jogadores da história expulso no intervalo.
Certa vez, dois times argentinos, o Independiente e o Racing, vieram participar de um torneio quadrangular no Maracanã, o “Torneio do Atlântico”, juntamente com o Vasco e o Flamengo. Terminava o ano de 1955 e o Vasco resolveu reunir a famosa dupla Ademir e Zizinho.
O Bangu cedeu Zizinho por empréstimo e aconteceu o que parecia impossível: “Mestre Ziza” vestido de vascaíno. Zizinho foi, assim, vascaíno não somente por um dia, mas sim dois. O Vasco perdeu a primeira partida para o Independiente e venceu o Racing na disputa do terceiro lugar. O Flamengo foi o campeão do torneio.
Vale recordar que tempos depois, já como técnico, Zizinho trabalhou no Vasco em duas oportunidades, 1967 e 1972. Em ambas, a equipe não realizou boa campanha e ele durou poucos meses no cargo.
Títulos conquistados. Pelo Flamengo: Torneio Inicio Carioca (1946); Campeonato Carioca: (1939, 1942, 1943 e 1944); Torneio Relâmpago do Rio de Janeiro (1943); Troféu Cezar Aboud (1948); Troféu Embaixada Brasileira na Guatemala (1949); Troféu EL Comite Nacional Olímpico da Guatemala (1949) e Taça Cidade de Ilhéus (1950).
Pelo Bangu: Torneio Início Carioca (1950 e 1955); Torneio Triangular do Equador (1957); Torneio Triangular do Rio de Janeiro (1957) e Torneio Triangular de Porto Alegre (1957). Pelo São Paulo: Campeão Paulista (1957). Pela Seleção Brasileira: Copa Rocca (1945); Copa America (1949); Taça Oswaldo Cruz (1950); Copa Rio Branco (1950); Campeonato Pan-Americano (1952); Taça Oswaldo Cruz (1956) e Taça do Atlântico (1956).
Prêmios: Melhor jogador da Copa do Mundo (1950); Craque do time das estrelas da Copa do Mundo (1950); Artilheiro do Campeonato Carioca pelo Bangu, com 19 gols (1952); Quarto Maior jogador Brasileiro do Século XX pela IFFHS (1999) e Décimo Maior jogador Sulamericano do Século XX pela IFFHS (1999).
Após encerrar a carreira, Zizinho tornou-se fiscal de rendas do Estado do Rio de Janeiro, função que exerceu até a aposentadoria. Morreu em 8 de fevereiro de 2002, aos 80 anos, após sofrer um ataque cardíaco na casa da filha, em Niterói, no Rio de Janeiro.
No dia em que Zizinho completaria 89 anos, a filha Katia Regina, e as netas Simone e Suzana levaram as bisnetas Milena e Maria Eduarda, que estava completando 6 anos (nasceu na mesma data que Zizinho), para conhecerem as marcas dos pés do famoso bisavô, imortalizado na “Calçada da Fama”, do Maracanã. A filha Katia estava presente, do dia 16 de junho de 1950, quando Zizinho participou da festa que homenageava 51 dos maiores jogadores do futebol brasileiro de todos os tempos. (Pesquisa: Nilo Dias)
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