Na Copa do Mundo de 1950, disputada no Brasil, aconteceu o jogo que até hoje é apontado como a “mãe de todas as zebras”: a vitória impensável dos Estados Unidos sobre a toda poderosa Inglaterra, inventora do futebol. Passaram-se 62 anos desse jogo, que a maioria das pessoas nem ouviu falar. E nem existia o termo zebra, inventado pelo técnico Gentil Cardoso, em 1964.
Foi num jogo em que a modesta Portuguesa Carioca derrotou o grande Vasco da Gama, por 2 X 1, pelo Campeonato Carioca, em partida disputada no Estádio das Laranjeiras. Antes do jogo Gentil comentou: “Se meu time vencer hoje vai ser como dar "zebra" na cabeça no jogo do bicho”, sabendo que ela não existe na loteria zoológica.
Com o surgimento da Loteria Esportiva em 1970, a expressão “zebra” se tornou popular e passou a designar todo e qualquer resultado que não fosse a vitória dos favoritos, evitando que as pessoas fizessem os tão sonhados 13 pontos e ficassem milionárias.
A Inglaterra até 1950 nunca havia participado de uma Copa do Mundo. Foram disputadas três, no Uruguai, na Itália e na França. Prepotentes, achavam que eram os melhores do mundo. Nas eliminatórias, não tomaram conhecimento dos vizinhos Escócia, Irlanda do Norte e Gales e carimbaram o passaporte para o Brasil, certos de que a Copa seria uma barbada. Como treino golearam a Seleção da Europa por 6 X 1.
A Chave em que caíram foi tipo "mamão com mel": Espanha, Chile e os Estados Unidos. Estes disputaram as eliminatórias contra o México, e levaram duas surras, 6 x 0 e 6 x 2, mas ganharam de Cuba por 5 X 2 e empataram em 1 X 1. O Canadá não participou. De última hora alguns países desistiram e acabou sobrando uma vaguinha para os americanos.
O time deles nem parecia americano, pois em sua formação tinham nomes como Barghi, Maca, Colombo, Pariani e João Souza. Naquele tempo não havia futebol profissional nos Estados Unidos, nem mesmo campeonatos nacionais. Por isso um time, na maioria, só de esforçados imigrantes.
Os Estados Unidos tinham participado das Olimpíadas de 1948 em Londres, quando tiveram desastrosa atuação. Perderam de 9 X 0 para a Itália na primeira rodada. Depois levaram 11 X 0 da Noruega e 5 X 0 da Irlanda do Norte.
Pensando em evitar nova humilhação no Brasil, a Federação dos Estados Unidos foi buscar novos e melhores jogadores de fora da tradicional St. Louis. Da equipe olímpica de 1948 alguns foram selecionados para a equipe de 1949, e desta havia cinco ou seis que foram selecionados para jogar em 1950.
Formar o time não foi tarefa simples. Ninguém vivia só do futebol, todos tinham um emprego. Bahr, um dos remanescentes da equipe olímpica de 48, por exemplo, era professor de ginásio na Filadélfia. Mas nem todos os empregadores foram compreensivos, caso de Ben McLaughlin, da Filadélfia, que teve de se retirar da equipe, porque não foi possível deixar o seu trabalho. Os jogadores receberiam US$ 100 por semana na Copa do Mundo.
Cinco ou seis eram de St. Louis e dois rapazes da Filadélfia. A equipe tinha alguns jogadores muito bons, mas sem experiência. Não houve nenhum treinamento ou qualquer tipo de preparação, antes da viagem para o Brasil. Um dia antes de sair para o Brasil, três jogadores foram adicionados ao grupo: Joseph Maca, que nasceu na Bélgica; Ed McIlvenny, um escocês; e Joe Gaetjens, haitiano.
Todos os jogadores praticamente se conheceram durante a viagem e no período que antecedeu o jogo contra a Espanha, em Curitiba. Os “americanos” estrearam na Copa no dia 25 de junho de 1950, no Estádio Dorival de Brito e Silva, em Curitiba, quando perderam de 3 X 0 para a Espanha. O resultado foi festejado quase que como uma vitória.
O jogo seguinte, no Estádio Independência, em Belo Horizonte, seria no dia 29, contra a Inglaterra. E nem por isso o jogo foi tratado de maneira diferente. Já os ingleses começaram a Copa no Maracanã, no Rio de Janeiro, ganhando do Chile sem maiores dificuldades, por 2 X 0.
O Jogo Inglaterra X Estados Unidos estava sendo tratado pela imprensa mundial como um combate entre Davi e Golias. O próprio técnico americano, Bill Jeffrey, estava conformado e dizia que sua equipe era como "ovelhas prontas para serem abatidas”. As apostas na Bolsa de Londres eram de 500 por 1.
No estádio havia um público calculado em 10 mil expectadores, a maioria de brasileiros que torceram para os Estados Unidos, porque não queriam uma final contra os ingleses. Americanos mesmo, tinham poucos, vindos de uma base da Marinha ou força aérea. Uma rádio brasileira transmitiu o jogo.
Como era esperado, a Inglaterra dominou todo o jogo e teve a maior parte das chances, que redundaram em nada. Aos 37 minutos do primeiro tempo, um lançamento do lateral McIlvenny foi recebido no lado direito por Bahr. Este tentou um tiro diagonal de longa distância. O goleiro inglês Bert Williams correu em busca do que parecia ser uma bola fácil, quando surgiu Gaetjens, que de cabeça marcou o gol que deu a vitória aos americanos.
Depois a Inglaterra perdeu de 1 X 0 para a Espanha e não avançou à fase final. Os Estados Unidos perderam seu último jogo para o Chile, por 5 X 2 e terminaram em último lugar no grupo 2.
O zagueiro americano Colombo, que usava luvas com dedos cortados em todos os jogos que participou, não importando se estava quente ou não, teria recebido proposta para contrato profissional com um clube brasileiro um dia após o jogo. Ele recusou e voltou para St. Louis.
Os serviços de telégrafo publicaram com precisão o resultado de 1 X 0 para os Estados Unidos. Mas muita gente, mundo afora pensou, que o operador de telex tinha cometido um erro, e que o resultado seria 10 X 0 ou 10 X 1 para os ingleses. Um punhado de fotógrafos tinha assistido o jogo, mas não há nenhuma imagem conhecida do gol de cabeça de Gaetjens. Os fotógrafos tinham passado a maior parte do jogo atrás do gol dos Estados Unidos. (Pesquisa: Nilo Dias)
Time americano que derrotou a Inglaterra, na Copa de 1950. Em pé: Jack Lyons - Joe Maca - Charlie Colombo - Frank Borghi - Harry Keough - Walter Bahr - Bill Jeffrey.Agachados: Frank Wallace - Ed McIlvenny - Gino Pariani - Joe Gaetjens - John Clarkie Souza e Ed Souza.
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