O
“Calouros do Ar Futebol Clube”, que hoje amarga uma terceira divisão do
Campeonato Cearense, já viveu seus momentos de glória. Fundado em 1 de janeiro
de 1952, é conhecido como o “time da Base Aérea de Fortaleza”, unidade de elite
da Força Aérea Brasileira.
Até
então o clube era apenas um despretensioso time de futebol, chamado América.
Quando foi oficialmente fundado, mudou o nome para homenagear o conjunto musical
da Base Aérea de Fortaleza e os aspirantes a oficial aviador que chegavam todo
ano à cidade.
Ascendeu
à divisão principal da Federação Cearense de Desportos (FCD) em 1953, vindo,
por uma dessas anomalias de nosso futebol, da terceira divisão.
O
Comando da corporação dava todo o apoio ao clube. A torcida era formada pelo
efetivo da Base e pessoas da população. Os jogadores eram quase todos
militares. Vez que outra vinha alguém de fora, principalmente do interior do Estado,
desde que não custasse muito dinheiro.
O
uniforme do “Calouros do Ar” lembra o do Fluminense F.C., do Rio de Janeiro,
camisas com listras verticais em vermelho, verde e branco, calção branco e
meias brancas ou verdes. A única diferença do time carioca é que esse tem a cor
vinho, em lugar do vermelho.
Seu
mascote é o “Tremendão da Aerolândia”. Também é conhecido como o “Tricolor da
Base Aérea”. O estádio onde mandava seus jogos era o “Brigadeiro-Médico José da
Silva Porto”, que se localizava dentro da Base Aérea e possuía secretaria,
lavanderia e vestiários e sua capacidade era para 3 mil expectadores. O estádio ainda existe, mas hoje é de uso
exclusivo de militares.
O
primeiro jogo do “Calouros do Ar” como clube profissional, foi no dia 10 de
maio de 1953, quando empatou com o Gentilândia por 1 X 1, em jogo válido pelo
Campeonato Estadual daquele ano. O clube não conseguiu chegar ás finais da
competição.
Em
1954, o “Calouros do Ar” surpreendeu a todos, quando derrotou o Botafogo, do
Rio de Janeiro, que foi a Fortaleza participar da festa dos 40 anos de fundação
do Ceará Sporting. O diretor do clube alvinegro cearense, Ivonisio Mosca de
Carvalho, queria que o “glorioso” se apresentasse com todas as suas grandes
estrelas da época, o que não foi possível, por problemas no calendário.
De
qualquer maneira o Botafogo, que era treinado por Gentil Cardoso, acabou por
jogar duas partidas em Fortaleza. A primeira foi no sábado, 12 de junho, no
Estádio Presidente Vargas, contra o “Calouros do Ar”, que venceu por 1 X 0. O
time carioca só trouxe de titular o atacante Garrincha. Didi e Nilton Santos
não viajaram.
O
“Calouros do Ar” tinha um time bem certinho, com muito conjunto, onde
pontificavam o goleiro Chico Martins, Zanata e Orlando Ciarlini. O empate em 0
X 0 persistia, até que no segundo tempo o time local fez uma substituição que
foi decisiva: saiu o avante Beto e entrou Orlando Ciarlini, que aos 40 minutos
marcou o gol que deu a vitória ao time da Base Aérea.
O
goleiro Chico Martins fez uma partida memorável, entrando para a história do
futebol cearense. A lenda assegura que o goleiro pegou até pênalti, batido por
Garrincha, o que não é verdade. O atacante teve, isso sim, um gol anulado porque
foi feito com a mão.
Ao
término do jogo o goleiro Chico, entre outros presentes, ganhou uma garrafa de uísque e o direito de conversar algum tempo com Garrincha. Seu nome verdadeiro é
Francisco Martins de Lima. Jogou pouco tempo no “Calouros do Ar”, pois preferiu
seguir a profissão de armador.
Sua
paixão pelo mar superou a paixão pelo futebol, o que o impediu de aceitar uma
proposta para atuar no Botafogo, do Rio de Janeiro e de defender a Seleção
Cearense, que disputava o Campeonato Nacional da época. Suas constantes viagens
de navio o impediam de dedicar mais tempo ao futebol.
Hoje,
aposentado, ele dedica a maior parte do seu tempo ao “Iate Clube de Fortaleza”,
localizado na Praia do Mucuripe, que já dirigiu por muitos anos até virar sócio
benemérito. Inclusive a sede social, que foi toda reformada em uma de suas
gestões, leva o nome de “Comodoro Francisco Martins de Lima”. “Comodoro” é um
título dado ao mais velho capitão ativo, em uma companhia de navegação.
Esse
triunfo sobre o Botafogo é considerado o maior feito da história do clube,
somente comparado ao título estadual de 1955. Orlando Ciarlini saiu de campo
como um verdadeiro herói, e seu gol é lembrado até hoje pelos torcedores mais
antigos.
O
“Calouros do Ar” venceu com: Chico Martins - Pedrinho e Azevedo – Jandir -
Helder (Zanata) e Índio – Luciano – Zezinho - Beto (Orlando Ciarlini) -
Nelsinho e Zuzinha. Botafogo: Pianoswisky - Gerson e Floriano - Arati, Bob e
Juvenal – Garrincha – Dino – Carlyle - Paulinho e Vinícius. Juiz: José Tosta,
da Federação Cearense de Desportos (FCD).
No
dia seguinte, domingo, com a festa dos 40 anos perdendo seu brilho pela vitória
do “Calouros do Ar”, na véspera, o Botafogo conseguiu a reabilitação,
derrotando o aniversariante Ceará Sporting, por 2 X 0.
Após
esse feito o clube começou a ser mais respeitado, e provou sua qualidade no Estadual
de 1955, quando tinha apenas três anos de existência e conquistou outro feito
histórico: foi campeão cearense. Sua equipe era formada, na maioria, por
elementos do efetivo da Base Aérea de Fortaleza.
O
Ferroviário ganhou o primeiro turno invicto. No returno, a surpresa, ficou com
o “Calouros do Ar”, que chegou em primeiro. Na decisão do Campeonato, o time da
“Base Aérea” ganhou a primeira partida por 2 X 0 e perdeu a segunda por 3 X 0,
o que provocou um terceiro jogo.
A
grande finalíssima só ocorreu no dia 11 de março do ano seguinte, e o “Calouros
do Ar” repetiu o escore do primeiro jogo, 2 X 0, gols de Zezinho e Zuzinha, se
sagrando campeão cearense. É o único título de expressão do clube em toda a sua
existência.
O
“Calouros do Ar” foi campeão jogando com Jairo - Pedrinho e Coité – Luciano -
Jandir e Jesus - Edilson Araújo – Zezinho – Beto - Hélder e Zuzinha.
O
ano de 1955 foi o de “ouro” para o “Calouros do Ar”, que conquistou os três
títulos disputados pelos clubes da Divisão Principal cearense, uma verdadeira
“tríplice coroa”. Orientado pelo treinador Paulo Salgueiro, o time ganhou o
“Torneio Preparatório”, o “Torneio Início” e o “Estadual”.
A
campanha do time, no campeonato de 1955: Calouros do Ar 1 X 1 Ceará; Calouros do
Ar 0 X 0 Ferroviário; Calouros do Ar 1 X 2 América; Calouros do Ar 1 X 1
Nacional; Calouros do Ar 2 x 2 Fortaleza; Calouros do Ar 1 X 0 Usina
Ceará; Calouros do Ar 4 X 0 Gentilândia; Calouros do Ar 4 X 2 Ceará; Calouros do Ar 3
X 0 Fortaleza; Calouros do Ar 2 X 2
Ferroviário; Calouros do Ar 3 X 2 América; Calouros do Ar 0 X 1 Usina Ceará;
Calouros do Ar 2 X 0 Ferroviário; Calouros do Ar 0 X 3 Ferroviário e Calouros
do Ar 2 X 0 Ferroviário.
Foram
15 jogos, com sete vitórias, cinco empates e três derrotas. O ataque marcou 26
gols e a defesa sofreu 16 gols.
Os
mais antigos contam que o segredo do sucesso daquela equipe era sua
homogeneidade. Ela era toda integrada por jovens com idades entre 18 e 24 anos
e sem nenhuma “estrela” no grupo. Outro fato que deve ser levado em conta é que
durante todo o Campeonato foram utilizados apenas 13 jogadores, o que significa
dizer que manteve quase sempre a mesma formação.
O
grupo tinha: Jairo (goleiro), 23 anos; Pedrinho (zagueiro-direito), 22 anos;
Coité (zagueiro-central), 21 anos; Luciano (médio-direito), 22 anos; Jandir
(centro-médio), 23 anos; Jesus (médio-esquerdo), 24 anos; Edílson (ponta-direita),
18 anos; Zezinho (meia-direita), 22 anos; Beto (centro-avante), 23 anos; Helder
(meia-esquerda), 21 anos; Zuza (ponta-esquerda), 28 anos; Azevedo (zagueiro),
25 anos e Vandir (avante), 20 anos.
Dos
13 integrantes do plantel, apenas dois não eram cearenses: o gaúcho Jesus e o
potiguar Jairo.
O
título do “Calouros doAr” só é comparado ao feito de um outro jovem clube, o
“Tramsways”, que ganhou o campeonato de 1940. O “Tramsways” foi fundado em 1933
e era ligado a “The Ceará Tramsways Light”, empresa inglesa fornecedora de luz,
força, bondes e ônibus em Fortaleza.
Em
1956 o principal feito do clube foi uma goleada de 6 X 1 sobre o Clube do Remo,
de Belém do Pará, em Fortaleza. Foi terceiro colocado no Campeonato Cearense em
1953, 1956, 1960 e 1968. Em 1960, Juarez, atacante da equipe, foi artilheiro do
campeonato com 14 gols. Em 1968, o artilheiro foi Célio, com 9 gols.
Nos
anos 90 o time tricolor ficou sempre nas últimas posições do estadual. Em 1995
chegou a levar 10 X 1 do Tiradentes, um vexame. Até que no ano de 1998 foi
rebaixado para a Segunda Divisão, ficando na antipenúltima posição de seu grupo,
sem nenhum ponto, após 44 anos de participações ininterruptas na elite
cearense.
Na
Segundona não obteve êxito de voltar à elite, tendo chegado perto em 1999 e
2003, quando foi terceiro colocado. Em 2004, após péssima participação no
estadual da Segunda Divisão, o clube foi rebaixado para a Terceira Divisão.
Em
2005 o clube foi definitivamente desligado da Base Aérea, o que acelerou mais a
sua debacle. Um ano antes, a equipe já
havia caído para a Terceira Divisão do Campeonato Cearense, de onde não saiu
mais.
Em
2008 fez uma boa campanha na “Terceirona”, mas acabou por não subir. E em 2009,
após uma eliminação precoce o clube se licenciou das competições e ficou
suspenso por suspeita de manipulação de resultado, na derrota por 8 Xa 0 para o
Tauá, no desfecho da Terceira Divisão de 2008.
Em
2010, não participou de nenhuma competição, por falta de condições financeiras
e se licenciou por um ano. Retomou as atividades em 2011, quando assumiu nova
diretoria que lançou um projeto para o reerguimento do clube. O ex-jogador
Gilberto Alenquer assumiu como presidente e técnico, renovando todas as funções
do clube.
Mas
a situação da agremiação é muito difícil. O quadro de sócios, que no passado
foi bastante expressivo, hoje se resume a apenas 20 pessoas, que na maioria nem
assiste os jogos da equipe. Apenas comparecem nas assembleias que definem novas
diretorias. É o resultado de anos de maus resultados.
Muitos
torcedores recordam com saudade uma partida realizada na década de 1960,
reunindo o América, campeão de 1966, e o “Calouros do Ar”, vencedor de 1955,
que levou uma grande multidão de torcedores ao “Estádio Presidente Vargas”.
Em
âmbito nacional o “Calouros do Ar” chegou a disputar o “Torneio Norte-Nordeste
“de 1968 e a 2ª Divisão brasileira em 1971 e 1972, sem conseguir passar da primeira fase.
Nesses
últimos dois anos o clube teve a presença de Gildo, maior artilheiro da
história do Ceará.
Títulos:
Campeão Cearense (1955); Campeão do Torneio Preparatório (1955); Campeão do Torneio
Início (1955, 1958, 1968 e 1971).
Competições
oficiais disputadas: Campeonato Brasileiro da Série B (1971 e 1972); Campeonato
Cearense da Primeira Divisão (1953 a 1998); “Torneio Norte-Nordeste” (1968); Campeonato
Cearense da Segunda Divisão (1999 a 2004); Campeonato Cearense da Terceira
Divisão (de 2005 até hoje).
O clube tem apenas dois torcedores que se pode dizer
“de coração”. Eliseu Alves Feitosa, de 72 anos, que foi massagista e roupeiro
do clube. Trabalhou lá de 1965 a 2009. E guarda até hoje a camisa do time.
O
outro é o militar reformado da Aeronáutica, Wambar Menescal, considerado o
grande baluarte do clube. Ele guarda até hoje fotos, camisas, documentos raros
e até o troféu do Campeonato Cearense de 1955, a maior conquista do “Calouros
do Ar”.
Tudo
o que ele tem sobre o “Calouros do Ar” é bem organizado e conservado, até a
partitura do hino e as letras do primeiro e segundo hino do clube. Além da taça
de 1955, traz na memória a emoção vivida quando da vitória sobre o Botafogo, do
Rio de janeiro, em 1954.
Seu
Wambar é o próprio “Calouros do Ar”. A história mais vitoriosa do clube está
com ele, em documentos e na memória. (Pesquisa: Nilo Dias)
1955
- Campeão Cearense da Divisão Principal. Em pé: Jairo - Pedrinho - Coité -
Luciano - Jandir - Jesus e o major Salgueiro (diretor). Agachados: Porenga
(massagista) - Vandir - Zezinho - Beto - Hélder e Zuzinha. (Foto: Acervo de
Jurandy Neves)