quarta-feira, 27 de novembro de 2013

O último capítulo da "Enciclopédia do Futebol"

O ex-lateral esquerdo do Botafogo e da Seleção Brasileira, Nilton Santos, morreu na tarde desta quarta-feira, aos 88 anos de idade, na Clinica Bela Lopes, bairro de Botafogo, Zona Sul do Rio de Janeiro, onde estava internado desde o último sábado em razão de complicações respiratórias.

Na terça, ele havia apresentado uma melhora no quadro de pneumonia que foi diagnosticado na segunda. De acordo com o boletim médico, Nilton morreu em decorrência de pneumonia comunitária, tendo comorbidades a doença de Alzheimer e a insuficiência cardíaca grave.

O ex-craque, que padecia do “Mal de Alzheimer” há cinco anos, vivia na Clínica da Gávea. O Botafogo, desde 2007, quando o presidente era Bebeto de Freitas, arcava com as despesas hospitalares do ídolo. Sua esposa Célia luta contra um câncer no cérebro. Eles, inclusive, tiveram que se separar por conta das doenças no fim de 2012.

O corpo do "Enciclopédia do Futebol" foi carregado para dentro da sede de "General Severiano" ao som do hino do clube e coberto pela bandeira com a "Estrela Solitária". Parentes, amigos e torcedores devem velar Nilton Santos até a zero hora.

Depois, as portas serão reabertas às 7 horas, para receber o público em geral. O ex-lateral-esquerdo deixará a sede alvinegra às 15 horas em um carro aberto do Corpo de Bombeiros, que seguirá em carreata até o cemitério São João Batista, no bairro de Botafogo, na Zona Sul do Rio, onde será sepultado.

O ex-craque nasceu em 16 de maio de 1925 no bairro carioca da Ilha do Governador. Ganhou o apelido de "Enciclopédia de Futebol", dado pelo ex-narrador esportivo Waldir Amaral, por causa de seus conhecimentos sobre o esporte e por ser completo como jogador, tendo a capacidade de encantar o torcedor.

Enquanto cumpria serviço militar foi descoberto por um oficial da Aeronáutica que o viu jogar na praia e se encantou. Foi levado por ele para jogar no Botafogo em 1948. Sua estréia com a camisa do clube da estrela solitária aconteceu num jogo amistoso contra o América, de Minas Gerais.

No campeonato carioca de 1948, entrou no time numa partida contra o Canto do Rio, em Caio Martins, vencida pelo alvinegro por 4 X 2. Não participou do primeiro jogo do Campeonato, contra o São Cristóvão, o titular foi Nilton Barbosa. O Botafogo ganhou o título daquele ano.

Nilton defendeu o Botafogo por 16 anos. Foi o único time que jogou em toda a carreira, conquistando o Torneio Rio-São Paulo em 1962 e 1964, além do Campeonato Carioca em 1948, 1957, 1961 e 1962. Também vestiu a camisa da Seleção Brasileira, onde foi bicampeão mundial em 1958 e 1962, além de participar das Copas do Mundo de 1950, da qual era o último remanescente, e de 1954. Somente deixou General Severiano em 1964 quando abandonou os gramados.

A direção do Botafogo emitiu nota oficial em que lamenta o falecimento de seu ídolo Nilton Santos, o maior lateral-esquerdo de todos os tempos, “adorado quanto Garrincha e respeitado quanto Pelé”. No Botafogo, disputou 723 partidas, e marcou 11 gols. Na Seleção, fez 84 jogos, marcando 3 gols.

Nilton estreou na seleção no Sul-Americano de 1949. A competição foi realizada no Brasil que acabou campeão. Ainda foi campeão com a camisa “Canarinho” no “Pan-Americano” de 1952. Sua despedida da Seleção ocorreu na final da Copa de 1962, contra a Tchecoslováquia.

Foi o maior responsável pela contratação de Garrincha, depois de tê-lo marcado em um treino do Botafogo e levado um drible entre as pernas. Ficou furioso, mas exigiu que o endiabrado ponteiro-direito fosse contratado e titular da equipe, pois assim, não teria que marcá-lo novamente. Em 1998, em pesquisa realizada pela Fifa foi eleito junto com Garrincha para fazer parte da Seleção Mundial de todos os tempos.

Nilton Santos foi o precursor em arriscar subidas ao ataque através da lateral do campo. Revolucionou a posição de lateral-esquerdo, utilizando-se de sua versatilidade ao defender e atacar, inclusive marcando gols, numa época do futebol que a posição tinha apenas função defensiva.

Até marcou um gol pela Seleção Brasileira, na Copa do Mundo de 1958, contra a Áustria. Ele pegou a bola no campo de defesa e driblou o time adversário inteiro, finalizando com um chute indefensável. O técnico Vicente Feola quase ficou doido com o desenrolar da jogada.

Outra jogada que entrou para a história do futebol foi protagonizada por Nilton Santos na Copa do Mundo de 1962. Ele cometeu um pênalti escandaloso em um jogador da Espanha, que vencia o confronto por 1 X 0. A partida era válida pela última rodada da fase de classificação e decisiva. Quem perdesse, voltava para casa.

Assim que o atleta caiu, ele deu dois passos para frente e saiu da área. O árbitro, que estava longe do lance, apenas marcou a falta, em vez de pênalti. Ao lembrar o lance, Nilton dizia que foi pura malandragem, daquelas que se aprende nas peladas. Depois o Brasil virou o jogo com dois gols de Amarildo.

Nilton Santos, Gilmar, Didi e Zagalo foram os únicos jogadores da Seleção Brasileira que participaram de todos os jogos das Copas do Mundo de 1958 e 1962.

Contam que num jogo amistoso do Botafogo na cidade do México contra o River Plate, da Argentina, Garrincha estava estraçalhando o beque Vairo. Nestor Rossi, o maestro portenho, teria chamado o lateral e aconselhou: “Quer melhorar teu futebol? Então faz o seguinte, aquele ali é o Nilton Santos, beque esquerdo como você. Vai lá perto, disfarça e passa a mão na perna dele. só isso. Passa a mão que naqueles pés está o futebol de todos os beques do mundo".

Nílton Santos era um jogador clássico, elegante, raramente fazia falta e nunca jogou com violência. Começou a carreira como centroavante, mas foi colocado como quarto-zagueiro em um treino e logo em seguida firmou-se na lateral. Encerrou a carreira com os quatro meniscos inteiros, o que prova que tinha bom equilíbrio.

Romântico, não ligava para dinheiro, tinha um espirito amador. Chegou a assinar três contratos em branco, no auge de sua carreira. Mas não se arrependeu e garantia que faria tudo de novo. Agradecido, dizia sempre que tudo o que tinha, tudo o que era, devia ao Botafogo.

Ele fez parte do “Fifa 100”. E foi homenageado no “Prêmio Craque do Brasileirão de 2007”. Foi eleito pela Federação Internacional de História e Estatísticas do Futebol (IFFHS), o nono maior jogador brasileiro do século e o 28º da América do Sul. Em 2000 foi escolhido pela Fifa o melhor lateral esquerdo do mundo em todos os tempos.

Foi escolhido ainda para integrar a seleção da América do Sul de todos os tempos. A enquete foi realizada com cronistas esportivos de todo o mundo. A Seleção foi esta: Fillol (Argentina) - Carlos Alberto Torres (Brasil) – Figueroa (Chile) - Daniel Passarella (Argentina) e Nilton Santos (Brasil) – Maradona (Argentina) - Di Stéfano (Argentina) – Rivelino (Brasil) e Didi (Brasil) – Garrincha (Brasil) e Pelé (Brasil).

Em 2002, Nilton Santos recebeu uma homenagem do apresentador e jornalista Milton Neves. Um tapete vermelho foi estendido para que o eterno botafoguense pudesse participar do "Terceiro Tempo", na TV Record.

Depois de encerrar a carreira, Nilton Santos não se afastou do futebol. Em 1998, tocou um projeto de uma escolinha de futebol em Palmas, Tocantins, para crianças carentes.

Mesmo declarando que nunca sonhou em ser treinador de futebol chegou a treinar o Bonsucesso, modesto clube do subúrbio do Rio de Janeiro. Com seus grandes conhecimentos futebolísticos, montou um time até bom, considerando-se os parcos recursos de que dispunha.

Depois de sete jogos, conseguiu cinco vitórias. A diretoria do Bonsucesso não estava acostumada com aquilo e chegando à conclusão de que, pagando tantos "bichos" por vitória, o clube acabaria falindo, optaram pela solução mais "lógica" e barata. Simplesmente demitiram o técnico que estava causando tanto prejuízo.

Depois passou sem grande êxito pelo Galícia e Vitória, ambos da Bahia e São Paulo, da cidade gaúcha de Rio Grande, onde não conseguiu se adaptar ao frio e pediu para ir embora. O último time que treinou foi o Taguatinga, de Brasília. O próprio Nilton gostava de contar como aconteceu a sua saída do clube gaúcho:

Eu estava acostumado ao calor do Rio de Janeiro, e era duro enfrentar o rigoroso inverno gaúcho. Num domingo, me levaram para visitar a extensa praia do Cassino. O frio era intenso e nem saí do carro. De repente, ví um pinguim morto na beira da praia. Era a desculpa que precisava para romper o contrato: olha, pessoal, se nem pinguim aguenta o frio daqui, o que é que estou fazendo nesta cidade? Arrumou as malas e voltou ao sol da sua “Cidade Maravilhosa”.

Chegou a fazer parte da cúpula do futebol do Botafogo. Mas não durou muito tempo, sendo afastado após dar um soco no ex-árbitro Armando Marques, derrubando-o escada abaixo do Estádio do Maracanã, depois de um jogo em 1971.

Nilton Santos era um verdadeiro especialista em contar passagens divertidas da vida de Garrincha, seu "compadre" e amigo íntimo de muitos anos. Ele garantia que na sua frente Garrincha, um contumaz alcoólatra, nunca havia tomado um gole, pedindo sempre um "copo de água" quando o via.

Em meados da década de 1990, o ex-lateral esquerdo estabeleceu residência em Brasília e marcou época na cidade. Como coordenador de um projeto de iniciação ao futebol para crianças, Nilton Santos ensinou os segredos da bola e dos gramados a mais de mil aprendizes.

Esforçou-se o quanto pode para manter a iniciativa, mesmo nas condições mais adversas, mas foi obrigado a abandonar o programa quando deixou de ter um local para abrigar os meninos.

Na passagem pela cidade, foi ainda treinador do Taguatinga, mas a nova experiência como técnico de futebol também não foi bem-sucedida. Contratado como colunista do jornal “Correio Braziliense”, Nilton Santos revelou talento com as palavras, comentando temas esportivos e revelando histórias curiosas dos tempos de jogador. Conquistou leitores assíduos e acabou agraciado com o título de cidadão honorário de Brasília, em 1997.

De volta ao Rio de Janeiro, Nilton Santos fixou residência na cidade de Araruama, onde escreveu e lançou, em 1998, uma autobiografia de muito sucesso, intitulada “Minha Bola, Minha Vida”, pela editora Gryphus, na qual contou detalhadamente todos os passos da vitoriosa carreira.

Ele também foi homenageado no “Cantinho da Saudade”, em dezembro de 1999, no “Museu dos Esportes Edvaldo Alves de Santa Rosa – Dida”, que fica localizado no Estádio Rei Pelé, em Maceió.

Nilton Santos é nome de estádio. Fica em Palmas, Tocantins, onde morou entre 1999 e 2000, quando desenvolveu um projeto social com jovens através do futebol. Tem capacidade para receber até 8 mil torcedores.

Foi inaugurado no dia 12 de outubro de 2000. O primeiro gol no estádio foi marcado pelo atacante Malzone, que nesta ocasião jogava pela Seleção Brasileira Sub-17, no amistoso Seleção Brasileira Sub-17 2 X 2 Seleção Tocantinense Sub-20, que inaugurou a praça de esportes.

Títulos. Torneio Rio-São Paulo: (1962 e 1964); Taça dos Campeões Estaduais Rio-São Paulo (1961); Campeonato Carioca (1948,1957,1961 e 1962); Torneio Início Carioca (1961, 1962 e 1963); Torneio Municipal de Futebol do Rio de Janeiro (1951); Torneios Internacionais. 6º Torneio Pentagonal do México (1958); Torneio Internacional da Colômbia (1960); Torneio Internacional da Costa Rica (1961); 6º Torneio Pentagonal do México (1962); Torneio Jubileu de Ouro da Associação de Futebol de La Paz (1964); Torneio interclubes do Suriname (1964); Torneio Governador Magalhães Pinto (1964); Torneio Triangular de Porto Alegre (1951); Seleção Brasileira. Copa do Mundo (1958 e 1962); Campeonato Sul-Americano (1949); Taça Oswaldo Cruz (1950, 1955, 1956, 1958, 1961 e 1962); Copa Rio Branco (1950); Campeonato Pan-Americano (1952); Taça Bernardo O'Higgins (1955, 1959 e 1961) e Taça do Atlântico (1956 e 1960).

Um amigo de Nilton Santos, Damásio Desidério,autor de um enredo na Escola de Samba Vila Isabel, em 2002, que homenageou o ex-craque, ganhou de presente todo o acervo de relíquias juntadas por ele em toda a carreira. Agasalhos, chuteiras e as camisas das finais da Copa de 1958 e de 1962, utilizadas por Nilton Santos, integram uma lista de quase duas dezenas de peças de valor histórico.

Para ajudar o amigo, Desidério resolveu colocar o acervo à venda, mas pelo que sei não encontrou interessados até hoje. Nem o Botafogo, e muito menos a CBF mostraram interesse em adquirir esse verdadeiro tesouro do futebol brasileiro. (Pesquisa: Nilo Dias)


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