terça-feira, 21 de março de 2017

O árbitro que expulsou o próprio filho

Existem árbitros de futebol mais enérgicos que outros. Não tem caras de bons amigos, não aceitam provocações de jogadores e não poupam cartões amarelos e vermelhos.

Poderia até fazer uma análise mais alongada do comportamento de conhecidos profissionais do passado ou do presente, mas não o farei. Vou procurar me ater em um personagem que foi marcante nos anos 50 e 60 no futebol carioca e paulista.

A maioria dos leitores, principalmente os mais jovens certamente nunca ouviram falar de Paul Katchborian. Ele foi apenas mais um personagem entre tantos outros que percorreram os caminhos do futebol, sem ter seu nome gravado na história como ídolo, ou ao menos reconhecido pelo trabalho exercido, que nem sempre foi fácil.
Katchborian não era brasileiro.

Nasceu na França em 6 de fevereiro de 1928 e morreu no Brasil em 2015, aos 87 anos. Seus pais eram armênios e se refugiaram na França. Quando tinha apenas quatro anos de idade sua família veio morar no Brasil. Não tenho maiores detalhes sobre a sua vida de menino ou o que fazia antes de se tornar juiz de futebol.

Modesto, gostava de lembrar passagens de sua carreira como juiz de futebol. Era torcedor declarado do Santos Futebol Clube, e tinha orgulho em dizer que apitara jogos em que estava em campo “um tal de Pelé”.

Apenas como curiosidade, transcrevo aqui dados de um jogo apitado por Paul Katchborian. Foi entre Corinthians X Guarani, de Campinas, disputado no dia 31 de outubro de 1959, um sábado, no Estádio Alfredo Schurig, mais conhecido por “Parque São Jorge”, na capital paulista.

O Corinthians venceu por 2 X 0, gols de Joãozinho, aos 32 minutos do primeiro tempo e Miranda, de pênalti, aos 18 minutos da etapa final. A renda do jogo somou Cr$ 271.275,00.

Corinthians: Gilmar – Valmir - Olavo e Ari. Roberto e Oreco. Miranda – Joãozinho – Joaquinzinho - Luizinho e Tite. Técnico: Sylvio Pirillo.

Guarani: Dimas - Belluomini e Ditinho. Válter - Eraldo e Bombinha. Ferrari – Fifi – Rodrigo - Benê I e Leal.

Como não poderia deixar de ser, Paul passou aos filhos e netos a paixão pelo time alvinegro santista. Pasmem. Mesmo tendo apitado muitos jogos na Vila Belmiro, quando no auge de sua carreira como árbitro, Katchborian só entrou no estádio na condição de torcedor, em 2005, quando já somava 77 anos de idade.

Quem o levou a Vila Belmiro foi um de seus filhos e o neto Pedro. O Santos enfrentou nesse dia ao Atlético Paranaense pela Copa Libertadores daquele ano. O Santos perdeu por 2 X 0, com dois gols de Aloísio Chulapa, mas para Paul o resultado pouco importou.

Pedro, que hoje é jornalista também foi a Vila pela primeira vez naquele dia. Lembra de tudo, embora só tivesse 13 anos, até mesmo da reação do seu avô. O Santos perdeu, mas isso não fez muita diferença para ele, que não fez nenhuma critica ao time. Disse que o jogo tinha sido bom na Vila.

O neto Pedro, trabalhou no Esporte Interativo, Veja São Paulo e youPIX. Começou no esporte, mas depois se especializou em cultura pop, internet e tecnologia. Séries, filmes e futebol são os seus principais hobbies.

Apesar da experiência no futebol profissional, o maior feito do ex-árbitro aconteceu em uma peladinha, na praia de Mongaguá. Os amigos de Artur, filho de Paul, pediram para ele apitar o jogo.

Paul aceitou, mas com uma ressalva: não ia roubar a favor do time do filho. Em certo momento da partida, Artur foi reclamar com Paul por conta do posicionamento da barreira adversária no momento de uma falta.

- Ah, pai... “Aqui não sou teu pai”, disse Paul, mostrando o cartão vermelho e mandando pra rua o próprio filho, sem titubear.

Depois que deixou a arbitragem Katchborian trabalhou nos Correios. Nos últimos anos de vida conviveu com as dificuldades da idade, especialmente com a pouca audição. O que não atrapalhava que pudesse acompanhar o Santos, no rádio, TV ou ao vivo no estádio.

Em 2007, após o título paulista, Paul enviou uma foto para o neto. Sem ter uma camisa do alvinegro praiano, improvisou, segurando sua carteirinha de sócio em uma mão, e na outra um “mousepad” com o escudo santista. Uma brincadeira simples, mas que se transformou em uma valiosa recordação.

O “mousepad” continua na casa do avô de Pedro, em Mongaguá. O jornalista conta que seu avô não tinha camisa do Santos, e seu pai, Artur, nunca quis dar por que achava que não ia caber nele. Então, na hora de comemorar, acabava improvisando. A carteirinha de sócio, ainda deve estar guardada com a viúva do ex-árbitro, que ainda é viva. (Pesquisa: Nilo Dias)



Dois momentos marcantes da vida de Paulo. Acima, dirigindo um clássico paulista entre São Paulo X Palmeiras. Abaixo, uma recordação com o escudo do Santos, a mão.

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