segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Morreu último remanescente da copa de 1930

Morreu hoje, 30 de agosto, na cidade de La Plata, vizinha a Buenos Aires o último remanescente da 1ª Copa do Mundo de Futebol, disputada em 1930 em gramados do Uruguai. O ex-atacante da seleção argentina, Francisco Antônio Varallo nasceu a 5 de fevereiro de 1910, em La Plata e este ano havia completado 100 anos de idade.

Varallo começou a carreira aos 17 anos de idade no 12 de Octubre, um pequeno clube do bairro de Los Hornos, em La Plata. Um ano depois, em 1928 decidiu fazer um teste no Estudiantes de La Plata, mas não teve sorte. Mesmo tendo marcado 11 gols em três partidas pelas divisões de base, o 12 de Octubre não o liberou, porque quase todos os seus dirigentes eram torcedores do Gimnasia Y Esgrima, o maior rival do Estudiantes.

Mesmo contra a vontade, Varallo foi parar no Gimnasia y Esgrima. Seu primeiro jogo foi defendendo o time “C”, com vitória de 9 X 1. Ele marcou todos os gols da goleada e foi imediatamente promovido a equipe principal. Foram os torcedores do Gimnasia que o apelidaram de “Cañoncito”, (Canhãozinho) ou “Pancho”. Lá, foi campeão argentino de 1929, quando o torneio ainda era amador.

No inicio de 1930 foi defender o Véles Sarsfield, quando este fez uma excursão pela América. Suas boas atuações fizeram com que o técnico Juan Tramutola o convocasse para treinar com o grupo que disputaria a primeira Copa do Mundo da FIFA da história. Varallo não fez feio: esperto, mostrou tudo o que sabia em campo e garantiu uma vaga na seleção alviceleste. Foi o mais jovem integrante da seleção vice-campeã de 1930.

Varallo marcou o seu primeiro gol no Mundial no dia 19 de julho, na vitória argentina por 6 X 3 sobre o México. Na partida seguinte, diante do Chile, ele sofreu uma lesão que o tirou da semifinal. No dia da final era dúvida. Fez um exame pela manhã e se sentiu bem, por isso, decidiu jogar. Era um risco, porque naquela época não havia substituições.

O final da história é conhecido: a Argentina foi para o intervalo com uma vantagem de 2 X 1 no placar, gols de Carlos Peucelle e Guillermo Stábile, mas os uruguaios conseguiram a virada e acabaram se impondo por 4 X 2. Varallo quase decidiu o jogo ao acertar um chute no travessão. A Argentina ainda estava na frente, vencendo por 2 X 1. No mesmo instante voltou a sentir a lesão no joelho. Ao fim do jogo mal conseguia andar. Um dos momentos mais felizes da Copa de 1930, segundo Varello, foi a visita que o grande cantor de tangos, Carlos Gardel fez aos jogadores argentinos na concentração.

Em 1931, Varallo se transferiu para o Boca Juniors,vendido por AR 8 mil, onde virou ídolo e marcou 194 gols. Esse recorde só foi superado em 2008, por Martin Palermo. Pela equipe de Buenos Aires, conquistou os campeonatos argentinos de 1931, 1934 e 1935.

Ele também deixou a sua marca na seleção argentina, com a qual conquistou o Campeonato Sul-Americano (futura Copa América) de 1937, depois de uma dramática decisão contra o Brasil, vencida na prorrogação por 2 X 0. Aposentou-se aos 29 anos, em 1939, devido a uma lesão crônica no joelho, sofrida em 1937. A partir dali, jogava e forçava muito o joelho. Ficava uma semana sem treinar, se recuperando. Dois anos depois, já andava muito mal e sua mãe lhe pediu para que não jogasse mais.

Mas viveu o suficiente para ser celebrado nas festas de centenário do Boca, em 2005. A revista “Trivela” testemunhou interessante diálogo entre Varallo e as crianças que lhe pediam autógrafos e queriam tirar fotos com ele, que dizia: “Mas vocês nunca me viram jogar”. E as crianças respondiam: “Por causa do senhor, Don Pancho, meu avô virou torcedor do Boca Juniors. E por isso, eu também sou”.

Depois que parou de jogar, Varallo costumava dizer que havia conquistado muitas coisas boas ao longo da carreira, entre elas ter defendido a seleção argentina e ter sido durante anos o recordista de gols com a camisa do Boca. Mas garantia que não não houve dor maior na sua vida do que ter perdido a final do Mundial de 1930 para o Uruguai.

Em sua carreira conquistou 3 Campeonatos Argentinos (1931, 1934 e 1935), 1 Campeonato Sul-Americano (atual Copa América, 1937) e 1 Vice-campeonato da Copa do Mundo da FIFA (1930). Em 1933, após balançar as redes 34 vezes, Varallo foi o artilheiro do Campeonato Argentino e da América do Sul.

Fora dos gramados foi distinguido com o título de “Cidadão Ilustre de La Plata” (1998), “Ordem do Mérito da FIFA” (1994), prêmio único para um argentino, uma homenagem aos maiores jogadores da história, também recebido por Yashin (URSS), Zico, Boby Moore (Inglaterra), Muller e Beckembauer (Alemanha) e Pelé, entre outros. Em 2006 ainda recebeu a “Ordem do Mérito da CONMEBOL”.

Em fevereiro, quando Varallo completou 100 anos, o presidente da FIFA, Joseph S. Blatter, fez questão de prestar-lhe homenagem, escrevendo na revista Fifa World, em sua edição de março deste ano: "Muita coisa mudou no futebol. Para poderem disputar a Copa do Mundo da FIFA de 1930, no Uruguai, as seleções da Bélgica, França, Romênia e Iugoslávia viajaram de navio. Havia poucos jornalistas presentes.

Mas de lá para cá tudo passou a ser diferente, tudo ficou mais rápido, mais espetacular, até chegarmos à tecnologia 3D. Mas independentemente de todas estas mudanças, a essência do futebol segue a mesma. Isso fica claro quando vemos a história do Francisco Varallo, que completou cem anos e a quem eu parabenizo por tudo o que ele fez". (Pesquisa: Nilo Dias)

Com a morte de Francisco Varallo, o futebol mundial está de luto. (Foto: Acervo do Boca Juniors)

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

O “Cemitério dos Elefantes”

Os argentinos gostam de dar apelidos aos seus estádios, a exemplo de nós, brasileiros. Apenas alguns exemplos: “La Bombonera”, do Boca Juniors, cujo nome oficial é Estádio Alberto J. Armando, um ex-presidente do clube. O apelido se deve ao formato do estádio que lembra uma caixa de bombons. “El Cilindro” (Avellaneda), do Racing, que assim é chamado por causa de sua arquitetura. A denominação oficial homenageia o ex-presidente argentino, Juan Domingo Perón.

O Estádio do Club Atlético Vélez Sarsfield oficialmente chama-se José Amalfitani, ex-presidente do clube. Mas é conhecido popularmente por “El Fortin de Liniers”, denominação dada pelo jornalista Hugo Marini, do jornal "Crítica", em alusão à aparência do pequeno campo e a sua fama de baluarte.

O Estádio Lisandro de la Torre, é também chamado de “Gigante de Arroyto. Fica no bairro de Arroyto na cidade de Rosario, onde o Rosario Central joga suas partidas. Temos ainda o “La Ciudadela”, localizado no bairro de igual nome, onde o San Martin, de Tucumã sedia seus jogos. Viaducto”, do Arsenal Sarandi, “Nuevo Gasômetro”, do San Lorenzo, “La Fortaleza”, do Lanús e “Coloso del Parque”, do Newell's Old Boys.

Mas nenhuma denominação é mais criativa que o “Cemitério dos Elefantes”. O nome oficial é Brigadeiro General Estanislao Lopez, mas ficou popularmente conhecido por “Cemitério dos Elefantes". Está localizado no Bairro Centenário, na cidade de Santa Fé, na Argentina e pertence ao Club Atlético Colón, time chamado pelos adversários de "Sabaleros" ou "Negros". O estádio foi inaugurado no dia 9 de julho de 1946, com a vitória de 2 X 1 do Colón sobre o Boca Juniors.

O estádio, que tem capacidade para 32.500 pessoas já foi palco de importantes competições como a Copa Santa Fé, Copa Mundial Juvenil de Rugby 2010, e será um dos locais onde se disputará a Copa América do ano que vem.

No Dia 4 de agosto de 1952, o Conselho de Administração decidiu dar ao estádio o nome de Eva Duarte de Perón, em homenagem a então primeira dama do país, que apoiou a filiação do Colón a Associação de Futebol da Argentina (AFA). Eva Perón morreu em 26 de Julho do mesmo ano.

Depois, com o golpe de Estado que derrubou o presidente Juan Domingo Perón, os nomes dele e de sua esposa foram desgraçados pelos novos governantes, razão pela qual o estádio foi rebatizado com o nome de "Brigadeiro General Estanislao Lopez, que foi um caudilho na provincia de Santa Fé.

A denominação “Cemitério dos Elefantes” foi dada pelo jornalista Algel José Gutiérrez, porque lá todos os grandes clubes argentinos perderam para o Colón. O apelido se consolidou quando em 10 de maio de 1964, o Colón derrotou ao famoso time do Santos, de Pelé e companhia por por 2 X 1.

O time brasileiro fazia um giro por gramados da Argentina. Já havia ganho em Buenos Aires de dois dos grandes do futebol argentino, Boca por 4 X 3, em 5 de maio e Racing por 2 X0, em 7 de maio.A imprensa e o público consideravam o jogo contra o Colón como um simples treino para o Santos. Tudo indicava uma vitória fácil.

O Santos fez 1 X 0, aos 37 minutos do primeiro tempo.Na fase final, aos 6 minutos Lopes empatou, e Demetrio Gómez quase aos 45 minutos virou para 2 x 1. O gigante brasileiro foi mais uma vitima a cair no “cemitério dos elefantes”. Tempos depois, em 7 de setembro de 1964 o Colón também bateu a Seleção Argentina, por 2 X 0.

Entre dezembro de 1948, ano em que começou a jogar a segunda divisão, até novembro de 1952, o Colón se manteve invicto em seu estádio por 63 partidas, com 47 vitórias e 16 empates. E toda vez que jogou um amistoso contra qualquer dos cinco grandes, sempre venceu.

No dia 26 de maio de 2007 jogaram no “Cemitério dos Elefantes” o selecionardo argentino de rugby “Los Pumas”, contra a seleção da Irlanda, num teste para o pré-mundial da modalidade que foi disputado na França. No dia 20 de maio de 2009 a seleção de futebol da Argentina enfrentou a seleção do Panamá, em jogo amistoso internacional.

Em 1 de junho de 2009, en Nassau (Bahamas) durante um Coingresso extraordinário da Conmebol, o presidente da AFA, Julio Grondona, ratificou a Argentina como organizadora da Copa América de 2011 e confirmou que Santa Fé será uma das subsedes da competição.

Alguns anos depois, em 26 de março de 1967 o mítico reduto, que viu cair tantos grandes times, fez uma nova vitima internacional, dessa feita o Peñarol, de Montevidéu, tricampeão sul-americano e campeão mundial. Da mesma forma que Santos e Seleção Argentina, o Peñarol não resistiu aos “Sabaleros”, que venceram por 3 x 2, aumentando a extensão do cemitério futebolístico.

O dono do “Cemitério dos Elefantes”, o Club Atlético Colón foi fundado no dia 5 de maio de 1905, e surgiu por iniciativa de um grupo de crianças em idade escolar, que como recreação tinha adaptado a prática de futebol, em um campo vago popularizado como "campito". Entre os fundadores estavam os irmãos Ernesto e Adolfo Celli (“Alemão”), Atílio Badalini (“Gringo”), Cullen Funes, seu irmão William Cullen Funes, Geadá Montenegro, Mariano C. Rodriguez, Helvecio Fontana, John Adam, Juan Rebechi, seu irmão Antonio, Pedro Anibal Rebechi (“Galo”) e Humberto Sosa.

O clube foi oficialmente fundado e batizado com o nome de "Columbus Foot-Ball Club", uma homenagem ao navegador Cristóvão Colombo, em reunião realizada no dia 5 de Maio de 1905. As cores escolhidas para as camisas foram o vermelho e preto. Cada membro do clube era obrigado a contribuir mensalmente com dez centavos, para a compra e manutenção dos equipamentos.

Tempos depois, foi descoberto que existia outro time na cidade com as mesmas cores. Então foi disputado um jogo para ver quem seguiria vestindo vermelho e preto. A partida foi disputada em um campo da zona sul da cidade de Santa Fé, conhecido por “Canchitas”. O “Columbus” venceu e ganhou o direito de continuar usando as cores que até hoje o identificam. Em Março de 1920, em assembléia geral extraordinária foram aprovados os novos estatutos do clube, e também a mudança do nome para Club Atlético Colón, que ostenta até hoje.

Entre os jogadores que passaram pelo Colon em todos esses mais de 100 anos destacam-se Rubén Ernesto Aráoz, recordista de jogos pelo clube, atuou em 284 partidas e Edgardo Roberto Di Meola, o maior artilheiro do time, com 70 gols.

Muitos também foram os técnicos de renome que dirigiram o Colón. Entre eles Juan José Pizzutti, Néstor Rossi, José María Silverado, aniel Córdoba, José Etchegoyen, Francisco Ferraro, Jorge Fossatti, que recentemente treinou o Internacional, de Porto Alegre, Miguel Angel Russo e muitos outros. Atualmente, o presidente do clube é José Vignatti. (Pesquisa: Nilo Dias)

O "Cemitério dos Elefantes", (Foto: Acervo do Club Atletico Colón)

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

O “Pai” da Medicina Esportiva no Brasil

Álvaro Lopes Cançado, o "Nariz", um dos principais zagueiros do futebol brasileiro, sério e as vezes violento nasceu em Campo Florido (MG), na época distrito de Uberaba, no dia 8 de dezembro de 1912. Começou a carreira em 1928, no Instituto Grambery, de Juiz de Fora, onde também ganhou o apelido devido ao tamanho de seu nariz. Em 1929 foi para o Tupy, também de Juiz de Fora. Em 1930, aos 18 anos de idade transferiu-se para o Clube Atlético Mineiro, onde permaneceu até 1932.

Seu primeiro jogo pelo time titular do “Galo” aconteceu no dia 22 de março de 1931, um amistoso contra o Palestra Itália (hoje Cruzeiro), com vitória atleticana por 3 x 0. Vestiu a camisa alvinegra mineira pela última vez, em 20 de novembro de 1932 no empate em 0 X 0 contra o Vasco da Gama, do Rio de Janeiro, em partida amistosa. “Nariz” jogou 32 vezes pelo Atlético, sem marcar gol. Foi campeão mineiro em 1931 e 1932.

Em 1932 o "Jornal dos Sports", do Rio de janeiro patrocinou um Campeonato Acadêmico, que foi realizado na Argentina e no Uruguai. Para representar o Brasil foi formada uma seleção formada por jogadores do Rio, São Paulo e Minas Gerais. Entre eles: "Nariz" (Atlético Mineiro),Luizinho (São Paulo), Ivan (Fluminense), Paulinho (Botafogo), Victor (goleiro Botafogo), Fernandinho, Elói, Cássio e Vicentino (todos do Flamengo), De Mori (Fluminense), etc.

Foram disputados vários amistosos preparatórios contra grandes clubes como Fluminense, Flamengo, Combinado Fla-Flu, Vasco, Palestra Itália (MG), Nova Lima (MG), Santos, Corinthians e São Paulo. Contra o São Paulo, vice-campeão paulista o famoso Friedenreich saiu de campo com uma fratura no nariz, após uma trombada com o zagueiro "Nariz".

No jogo contra o Corinthians, campeão paulista, a atriz Lia Torá, esposa do diretor de futebol do Fluminense foi convidada para ir ao hotel em que os Acadêmicos estavam hospedados e também para assistir ao último jogo. O diretor dos Acadêmicos, Duval Ernani de Paula disse a "Nariz" que Lia Torá iria ao estádio somente para vê-lo jogar, pois o considerava um dos melhores zagueiros do Brasil.

Resultado, Acadêmicos 4 X 1 Corínthians, com atuações soberbas de "Nariz" e Vicentino do Flamengo, que fez os quatro gols de seu time. No outro dia os jornais estampataram em machetes: "Nariz venceu o Corinthians". Lia Torá e o marido convidaram os jogadores do Acadêmicos para jantar no hotel em que a atriz se encontrava hospedada.

Em 1933 foi para o Rio de Janeiro defender o Fluminense. Em 1934 estava no Botafogo, onde fez parte da famosa defesa conhecida como “Esquadrão de Cavalaria”, jogando ao lado de Octacilio, Affonso e Canalli. Ficou no alvi-negro até 1941, quando encerrou a carreira futebolistica. No Botafogo, "Nariz" participou de 165 jogos, tendo sido campeão carioca em 1934 e 1935 e vencedor da Copa Burgos, em 1941 no México.

Seu primeiro jogo pelo Botafogo aconteceu no dia 9 de dezembro de 1934, um amistoso contra o Vasco da Gama, em São Januário, que terminou empatado em 1 x 1. O Botafogo jogou naquela oportunidade com Victor - Sílvio Hoffmann e Nariz – Ariel - Martim (Fernando Giudicelli) e Canalli – Álvaro - Waldemar de Britto - Carvalho Leite - Nilo e Patesko.

Em 1934 foi convocado pela primeira vez para a Seleção Brasileira, mas não chegou a jogar. Com a camisa da Seleção participou de quatro partidas, três no Sul-Americano de 1937 e uma na Copa de 1938, quando também foi o médico da Seleção, tendo se formado dois anos antes. Teve a oportunidade de acompanhar o tratamento de Leônidas da Silva, o craque brasileiro, que à beira de uma distensão não teve condições de enfrentar a Itália na partida semi-final.

O técnico da Seleção na Copa de 1938, Ademar Pimenta contou que “Nariz”, aproveitando sua condição de médico da delegação brasileira, dispensava jogadores dos treinamentos, principalmente o seu companheiro Luizinho e a dupla Tim e Patesko. Ele e Luizinho tiveram privilégios. Embora a proibição de mulheres na delegação, os dois tiveram permissão para levarem suas esposas, o que causou mal estar geral entre os demais jogadores.

Os jogos da Seleção em que “Nariz” esteve presente: pelo Sul-Americano da Argentina, em 1937, no estádio da Bombonera, Brasil 6 X 4 Chile; em 13 de janeiro, no Estádio Gasômetro de Boedo, Buenos Aires, Brasil 5 X 0 Paraguai; em 30 de janeiro, no Gasômetro de Boedo, Argentina 1 x 0 Brasil. Pelo Mundial de 1938, em 14 de junho, em Bordeaux, Brasil 2 X 1 Tchecoslováquia. Nesse jogo o técnico Ademar Pimenta escalou dez reservas, permanecendo no time apenas Leônidas da Silva. “Nariz” entrou no lugar do zagueiro titular Machado.

Da seleção de 1938 muitos jogadores seguiram destinos diferentes: Jaú, companheiro de zaga de “Nariz”, se tornou "pai de santo", tendo inspirando o personagem “Pai Jaú”, do programa humorístico “Show do Rádio”. O médio Afonsinho aposentou-se como policial. O também médio Brito trabalhou como servente, e Argemiro, carcereiro. O craque Leônidas da Silva tornou-se comentarista de rádio e o ponta-direita Luizinho, advogado, tendo exercido o cargo de juiz do Tribunal de Justiça Desportiva.

Em 1940 “Nariz” fundou no Botafogo o primeiro Departamento Médico de um clube de futebol no Brasil e, por isto, é considerado o pai da Medicina Esportiva brasileira. Para ser médico do Botafogo tinha um contrato simbólico, pelo qual recebia um cruzeiro por ano. Após deixar o futebol, tornou-se um Ortopedista conceituado. Em 1954 foi um dos fundadores e primeiro professor da Escola de Medicina de Uberaba, que deu origem a atual Universidade Federal do Triângulo Mineiro.

No dia 10 de junho de 1972, o doutor Álvaro Lopes Cançado foi um dos convidados especiais para os festejos inaugurais do Estádio “Uberabão”. Ele deu a volta olímpica no gramado, conduzindo a bola do jogo entre as Seleções Brasileiras, a principal e olímpica, que teve o pontapé inicial desferido por Tostão.

Foi uma festa inesquecível, que teve show da Esquadrilha da Fumaça, homenagem aos três clubes de futebol existentes na cidade, Uberaba, Nacional e Independente. Várias autoridades estiveram presentes, o governador Rondon Pacheco, o prefeito Arnaldo Rosa Prata, o então presidente da CBD, João Havelange e o idealizador do estádio e doador do terreno, Edgard Rodrigues da Cunha.

No dia 19 de setembro de 1984, em sua fazenda em Campo Florido, no chamado “Sertão da Farinha Podre”, o ex-craque”Nariz”, aos 72 anos de idade suicidou-se, sem que se soubesse as razões de tão inesperado gesto. Deixou dois filhos, Vânia e Álvaro Júnior, este também já falecido, ambos médicos. (Pesquisa: Nilo Dias)

"Nariz", quando jogou pelo Botafogo carioca. (Foto: Acervo do Botafogo de F.R.)

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

O primeiro técnico da Seleção

Silvio Lagreca, paulista de Piracicaba (SP), nascido no dia 14 de junho de 1895 é um personagem quase esquecido na história do futebol brasileiro, embora tenha sido o primeiro técnico da Seleção Brasileira. Foi um misto de jogador, treinador e árbitro de futebol. Começou a carreira em 1913, no Ypiranga, de São Paulo transferindo-se em 1914 para a A.A. São Bento, também da capital bandeirante, onde jogou até parar em 1921.

Na primeira partida da história da Seleção Brasileira, um amistoso disputado em 1914 contra o clube inglês Exeter City, da terceira divisão da Inglaterra, não existia um treinador oficializado. Foi indicada uma comissão técnica formada por Sylvio Lagreca e Rubens Salles, jogadores que exerciam liderança sobre o grupo. Coube a eles a tarefa de convocar, treinar e escalar o time. Sylvio Lagreca tinha apenas 19 anos, um mês e sete dias, quando se tornou o primeiro capitão e o primeiro técnico da história da seleção brasileira.

O jogo aconteceu no dia 20 de agosto de 1914, no Estádio de Álvaro Chaves, do Fluminense F.C., local onde tempos depois foi erguido o Estádio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Os visitantes jogaram três partidas no Brasil: a primeira, contra um combinado de jogadores ingleses dos clubes cariocas, a quem venceram por 3 X 0. Depois derrotaram uma seleção carioca por 5 X 3.

O último jogo foi contra um combinado de jogadores do Rio e de São Paulo que pela primeira vez vestiu a camisa da então Federação Brasileira de Sports (8/6/1914), precursora da CBD (5/12/1916) e da CBF (24/9/1979). Os brasileiros venceram por 2 x 0.
O juiz do primeiro jogo da seleção foi o inglês H. Robinson. O onze brasileiro jogou com Marcos - Píndaro e Nery – Lagreca- Rubens Salles e Rolando – Abelardo - Oswaldo Gomes – Friedenreich - Osman e Formiga. Exeter City: Pym – Forte e Strettle – Rigby – Largan e Smith – Whitaker – Pratt – Hunter – Lovett e Goodwin. Técnico: Arthur Chadwick. Os gols foram marcados por Oswaldo Gomes e Osman.

No dia 27 de setembro de 1914, a seleção do Brasil pegou um navio rumo à Argentina, onde disputou o seu primeiro jogo contra uma Seleção de outro país, valendo pela Copa Rocca, competição precursora do Sul-Americano. O torneio foi uma iniciativa do ministro das Relações Exteriores da Argentina, general Julio Rocca, que pretendia ampliar os laços de amizade entre os dois países.

A equipe brasileira era formada basicamente por atletas do Flamengo, Fluminense e Paulistano. De fora desse trio, apenas Sylvio Lagreca, do São Bento, de São Paulo e Friedenreich, do Ypiranga, também da capital paulista e maior artilheiro da época. A Argentina era favorita por vários motivos: jogava em casa, no estádio do Gimnasia y Esgrima e tinha o apoio de 17.200 torcedores. Uma semana antes havia derrotado o Brasil por 3 x 0, em um jogo amistoso.

Mas os prognósticos falharam e a Seleção Brasileira venceu por 1 x 0, gol de Rubens Salles aos 13 minutos da fase inicial. O jogo foi histórico, pois marcou a primeira vitória do scratch nacional contra uma seleção de outro país, e ao mesmo tempo a primeira conquista de uma trajetória que se tornaria plenamente vitoriosa.

O jogo foi dificílimo. Os argentinos chegaram a marcar um gol de mão por Leonardi. O árbitro da partida, o brasileiro Alberto Borgerth, não viu bem o lance e validou o gol, achando que o jogador ajeitara a bola com o peito. Porém, o próprio atleta, numa atitude digna, praticamente impossível de acontecer nos dias de hoje, confessou ao árbitro que arrumara a bola com a mão. E com isso o gol foi anulado.

No dia 12 de julho de 1916, durante o Campeonato Sul-Americano disputado na Argentina, Sylvio Lagreca foi personagem de um fato que se tornou histórico, ao salvar a bandeira brasileira de ser queimada num incêndio ocorrido no Estádio do Gimnasya Y Esgrima, em Buenos Ayres, antes do clássico Brasil x Uruguai.

O estádio estava completamente lotado, e em razão disso os portões foram fechados, embora muita gente com ingresso tivesse ficado do lado de fora. Indignados, esses torcedores começaram a gritar “ladrones”! “ladrones”! Da indignação a ação foi rápido. Os mais exaltados jogaram gasolina por baixo das arquibancadas, que eram de madeira e atearam fogo. As labaredas não demoraram a surgir ameaçadoras. O terror e o pânico tomaram conta de todos que estavam dentro do estádio. As pessoas corriam apavoradas, criando-se um clima de verdadeiro terror.

O fogo avançou pelo pavilhão e atingiu os mastros onde estavam hasteadas as bandeiras dos países que disputavam o campeonato. Os organizadores da competição conseguiram retirá-las, mas por um descuido a bandeira brasileira permaneceu em seu lugar. Os jogadores brasileiros assistiam a tudo sem saber o que fazer. Ainda não tinham trocado de roupa para enfrentar os uruguaios.

Foi quando o técnico e jogador Sylvio Lagreca, vendo que o pavilhão nacional ia desaparecer nas chamas, tirou o paletó, subiu ao topo do mastro e mesmo sofrendo algumas queimaduras, salvou a bandeira do incêndio. Assim que desceu, um policial argentino quis lhe arrancar das mãos a nossa bandeira. Lagreca não deixou e acabou recebendo voz de prisão. Foi preciso que o presidente da Associação Argentina de Futebol, interviesse para que a prisão não acontecesse de fato.

Lagreca participou de várias competições nacionais e internacionais, tais como Campeonato Paulista, tendo sido campeão com o São Bento, em 1914; foi jogador e técnico da Seleção Paulista; disputou o Torneio Rio-São Paulo; foi campeão da Copa Rocca, em 1914 com a seleção Brasileira. Disputou os Campeonatos Sul-Americanos em 1916 e 1917, ambos vencidos pelo Uruguai. Pela Seleção Brasileira participou como jogador de 15 jogos, com 6 vitórias, 4 empates e 5 derrotas, tendo marcado 1 gol. Como técnico, dirigiu a Seleção Brasileira em 10 jogos, 4 em 1914, 4 entre 1916 e 1917 e 2 em 1940.

Quando deixou os gramados passou a atuar como árbitro. Sylvio Lagreca faleceu em São Paulo, no dia 30 de abril de 1966, aos 71 anos de idade. (Pesquisa: Nilo Dias)

Sylvio Lagreca merecia um melhor tratamento histórico. (Foto: Acervo da Confederação BRasileira de Futebol-CBF)