Antônio
Bezerra, o “Mocinho”, foi um dos primeiros vilões do futebol catarinense. Natural
de São Francisco do Sul (SC), onde por tradição os moradores costumam ser mais
conhecidos por seus apelidos, que mesmo pelos nomes, ganhou fama de homem mau nos campos de futebol.
“Mocinho”
deu inicio a carreira de futebolista no Ypiranga Futebol Clube, de sua cidade
natal, em 1924, atuando como ponta-esquerda. Era um jogador que tinha na velocidade a sua principal virtude.
Entre
os anos de 1925 e 1928 destacou-se em diversos jogos amistosos, tendo inclusive
marcado gols diante dos poderosos América, de Joinville e Hercílio Luz, de
Tubarão, que foram derrotados por 3 X 0 e 3 X 2, respectivamente, em jogos
bastante tumultuados.
O
Ypiranga, de São Francisco do Sul era um clube de origem humilde, composto
basicamente por trabalhadores do porto, e seus jogadores não tinham a polidez
dos clubes da elite. Por isso “Mocinho” sentia-se a vontade para jogar pesado,
sem ser repreendido.
Neste
cenário, os jogos entre Ypiranga e clubes como América e Caxias, de Joinville,
geralmente acabavam em confusão, e o pivô delas era sempre o mesmo: “Mocinho”,
mais conhecido por “quebra-canelas”.
Em
1928 ele resolveu trocar de posição, deixando de ser ponteiro-esquerdo e
passando a atuar no meio-campo. Com isso começou a arrumar ainda mais
encrencas, pois agora tinha a função de marcar.
Em
8 de Setembro, num jogo em que o Ypiranga venceu o Britânia, de Curitiba por 1
X 0, depois de incomodar tanto o jogador Basani, acabou levando um pontapé e
uma bofetada.
Ao
revidar na mesma intensidade, deu inicio a uma batalha campal que só terminou
após a intervenção dos presidentes dos clubes e da Policia, que com muito
custo, conseguiram fazer com o que o jogo fosse terminado, bem como as
festividades que o sucederam.
Ainda
nesse ano integrou a Seleção Catarinense, que em 4 de Novembro perdeu para os paranaense
por 8 X 0, em jogo valido pelo Campeonato Brasileiro de Seleções.
Em
1929 “Mocinho” quase não apareceu no cenário futebolístico catarinense, com
discretas atuações nos gramados. Mas em 1930 descontou o tempo perdido,
despontando com força total, dessa feita vestindo a camisa do Lauro Muller
Futebol Clube, de Itajaí, clube que reunia operários de uma fábrica de tecidos
e que era respeitado em razão da hostilidade com que recebia seus adversários
no campo da Vila Operária.
Em
23 de fevereiro de 1930, quando derrotou o Caxias por 3 X 2, em jogo amistoso, o
Lauro Muller conseguiu uma proeza quase inacreditável, machucar sete jogadores adversários
e não ser punido com nenhuma expulsão. O “Jornal de Joinville” narrou bem o que
aconteceu:
“Os
laurenses organizaram um ataque, mas o Caxias defendeu. Cylo atacou e Eurico
defendeu, quando “Mocinho” lhe deu uma violenta entrada. Mesmo
contundido jogou até o fim. Dorotávio chutou forte e Chiquito, ao tentar defender
fez gol contra, Lauro 1 X 0. O Caxias foi ao ataque e Lemos empatou, 1 X 1.
“Mocinho”,
com raiva, machucou Lemos que teve de ser substituído por Andrade. Este jogou
apenas cinco minutos e saiu machucado, também por “Mocinho”. O Lauro Muller teve um
escanteio, Paulo cobrou, Candinho defendeu, mas Dorotávio fez Lauro 2 X 1.
“Mocinho”,
que nem touro enfurecido, atacou de raiva, violentíssimo e o alvejado pela sua ferocidade foi
Raul Schmidlin, que levou duas pancadas na boca do estômago. Na segunda, Schmidlin
revidou e foi agredido por alguns brutamontes.
“Mocinho”
mostrou ser um elemento sem caráter e sem educação esportiva. Serenados os
ânimos, Dario fez penalti e "Marinheiro" empatou em 2 X 2. “Mocinho” e sua
sinistra sina de machucar, deu seguidas entradas violentas. Começou o segundo
tempo, o Caxias atacou e o Lauro defendeu.
O jogo perdia em beleza devido a “Mocinho”, que machucou José, mas este continuou em
campo. Em seguida “Mocinho” agrediu Cyrillo que se lesionou. O jogo virou uma
verdadeira tourada.
Vendo
em “Marinheiro” a principal estrela da defesa caxiense, “Mocinho”, depois de
várias tentativas o machucou, sendo que este foi levado a uma pharmácia ondedepois de medicado regressou ao Hotel.
Depois
de bons lances ocorreu um penalty de Chiquito que Dario cobrou e errou. Foi
quando começou uma chuva torrencial. Em um ataque o Lauro fez 3 X 2, e pouco
depois o jogo acabou.
Apesar
de tudo, o juíz Emilio Sada foi muito criterioso e imparcial. Esperamos que o Lauro
Muller não apoie o jogo violento de “Mocinho”. O Caxias agradeceu a Pharmácia
Santha Terezinha por ter tratado
de “Marinheiro”.
Mas
nada aconteceu com “Mocinho”, que seguiu atuando normalmente pelo Lauro Muller,
pois se tratava de um de seus principais jogadores. Já havia se tornado famoso
em todo o Estado.
Naqueles tempos o Lauro Muller enfrentava em igualdade de condições
os principais clubes de Joinville, Florianópolis e Blumenau, a quem vencia com
frequência.
Em
Outubro de 1930, a desgraça marcou encontro com “Mocinho”. Convocado pelo Exército
para lutar no “Movimento Libertador”, que conduziu o ditador Getúlio Vargas á
presidência do Brasil, quando servia em Florianópolis foi atingido por uma
granada que lhe arrancou o braço direito.
A
população de Itajaí se comoveu com o ocorrido. O Clube Náutico Marcilio Dias e
o Lauro Muller Futebol Clube organizaram jogos para arrecadar fundos, para
ajuda-lo na recuperação. Talvez para qualquer outro, a perda de um braço
significasse o fim de uma carreira futebolística.
Mas
para “Mocinho” não foi assim. No inicio de 1931, ele estava de volta ao posto
de titular do meio-campo do Lauro Muller. E da mesma maneira de antes, não
dispensando uma boa briga, estivesse ou não dentro de campo.
Prova
disso, que em 14 de junho de 1931, quando assistia a um jogo entre Brusquense e
Lauro Muller, em Brusque, se envolveu em uma confusão que por muito pouco não
terminou em tragédia, conforme noticiou o jornal “O Libertador”:
“No
final, quando os nossos rapazes preparavam-se para o regresso, houve uma
desavença entre o "chauffer" João Pereira e um dos rapazes visitantes. Houve a
intervenção de três outros presentes que o referido "chauffeur" tentou agredir a
faca, tendo conseguido ferir de leve o nariz de um deles.
Foi
quando surgiu Antônio Bezerra, mais conhecido por “Mocinho”, que foi em socorro
de um irmão, a quem Pereira também tentava ferir. “Mocinho”, que só tem o braço
esquerdo, pois que o direito perdeu durante a revolução com a explosão de uma
granada, entrara em luta armado de bengala, sendo esfaqueado pelo alludido
"hauffer", recebendo dois ferimentos, sendo um no braço esquerdo e outro no
ventre.
O
criminoso refugiou-se num hotel, sendo afinal preso, bem como o seu primeiro
contendor. “Mocinho”, cujo estado não é grave, que ahi fora assistir o match,
acha-se internado no Hospital de Azambuja, daquella cidade”.
Em
Julho, mesmo ainda machucado pelas facadas, “Mocinho” voltou a jogar no time
principal do Lauro Muller, que nesta ocasião, preparava-se para a disputa do
Estadual de 1931, campeonato este, que após muita confusão por parte da
Federação, terminou somente em janeiro de 1932, com o titulo sendo homologado
a ele, devido a desistência do Athletico Catharinense.
Embora
não fosse mais titular do time, “Mocinho” fazia parte do grupo. Deste modo,
colocou o seu nome no rol dos jogadores campeões do Estado.
A
partir de 1933 seu nome deixou de figurar no noticiário esportivo. O que fez de
sua vida dai para frente não se sabe com certeza, embora existam evidencias que
tenha iniciado a carreira de Delegado de Policia na cidade de Penha. (Pesquisa:
Nilo Dias)
"Mocinho" topava qualquer parada. (Foto: Cacellain)
"Mocinho" topava qualquer parada. (Foto: Cacellain)