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segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Morre atacante histórico do Flamengo

Morreu na manhã de ontem (30), aos 70 anos de idade, o ex-ponteiro esquerdo Arílson, que defendeu o Flamengo, do Rio de Janeiro, nos anos 60 e 70, tendo disputado 224 jogos com a camisa do clube carioca, alcançando 107 vitórias, 64 empates, 53 derrotas e 36 gols marcados.

Ele conquistou a “Taça Guanabara” (1970, 1972 e 1973), os títulos cariocas de 1972 e 1974, além do “Torneio do Povo” (1972) e “Torneio de Verão” (1970 e 1972).

Em seu perfil oficial no Twitter, o Flamengo lamentou a morte do ex-jogador: “Lamentamos profundamente a morte do nosso ex-ponta esquerda Arílson, que nos deixou neste fim de semana. Obrigado por tudo o que você fez com o “Manto”. Muita força aos amigos e familiares neste momento.“

Arílson Pedro da Silva nasceu no Rio de Janeiro, em 18 de outubro de 1948. Garoto bom de bola, seu futebol foi descoberto nos campinhos de terra batida do bairro Itacolomi, na “Ilha do Governador”. 

Mais tarde, o rapazola foi encaminhado aos quadros amadores da Associação Atlética Portuguesa, da “Ilha do Governador”. Jogador de rara habilidade, em pouco tempo foi aproveitado como ponteiro-esquerdo.

O futebol atrevido e vistoso logo despertou o interesse dos representantes do Clube de Regatas do Flamengo em 1965. No início de 1967, Arílson foi convocado pelo técnico Zagallo para a seleção carioca juvenil que jogaria o brasileiro da categoria em Belo Horizonte.

Na apresentação dos atletas, o repórter José Castelo, do “Jornal dos Sports”, assim definia seu futebol: “É esperança rubro-negra para 1967 e da própria seleção carioca com vistas ao penta brasileiro. Titular, tem a velocidade, o drible fácil e a potência de chute, qualidades exigidas de um bom ponteiro”.

Considerado então um jogador-chave nos juvenis do clube, Arílson tinha praticamente certa a sua promoção ao time de cima para o lugar do veterano Osvaldo “Ponte Aérea”, em vias de deixar a Gávea e retornar ao futebol paulista de onde viera.

Mas na metade do campeonato da categoria de base, o garoto sofreu uma violenta entorse no tornozelo direito que o tirou de ação por vários meses, adiando seu melhor aproveitamento.

Mesmo assim, de pé gessado, vestiria a faixa de campeão carioca de juvenis em junho. A lesão e as frequentes trocas de comando no time de cima foram minando as chances do garoto. Chegou a treinar como lateral e a ser oferecido como moeda de troca na tentativa de contratação do veterano ponteiro Dorval, ex-Santos, que estava no Atlético Paranaense.

Só no fim de 1968, durante o “Torneio Roberto Gomes Pedrosa”, ele ganhou uma certa sequência na equipe – retribuída com passes e assistências, aparecendo bem apesar da campanha fraca do time.

Sua virada aconteceria pelas mãos do técnico Tim. O experiente treinador, que chegou ao Flamengo no início de 1969, transformou o ponta o qual considerava indisciplinado taticamente – embora de inegável talento individual – num jogador solidário, que se sacrificava pelo time.

Assim, Arílson passou a ajudar a preencher o meio-campo e ajudar na cobertura do lateral, e ao mesmo tempo, aparecer mais bem colocado na frente para dar passes e até marcar mais gols.

Seu futebol cresceu a olhos vistos, e ele viveu a primeira grande fase da carreira, senão a melhor. O ano começou com uma excursão ao Suriname e ao Pará e Amazonas, nas quais o Flamengo levava como atração o velho “Mané Garrincha”, 35 anos, contratado em novembro do ano anterior.

Arílson, na outra ponta, fez bons jogos e alguns gols, mantendo o crédito conquistado pelas atuações no “Robertão”, mas sofreu uma distensão na coxa no fim de março, perdendo parte do turno do Carioca, em que o time acumulou alguns tropeços.

Com efeito, Arílson começou o ano de 1970 voando. Fez o primeiro gol do time na temporada, no empate em 1 X 1 com o América Mineiro num amistoso em Belo Horizonte.

E fez três partidas memoráveis no “Torneio Internacional de Verão”, quadrangular conquistado pelo Fla em fevereiro. Na estreia, uma folgada goleada de 4 X 1 sobre a seleção da Romênia, ele marcou dois gols – um em cobrança de falta na gaveta e outro numa inteligente tabela com Dionísio – e arrancou muitos aplausos entusiasmados da crônica esportiva.

No segundo jogo, outro massacre: 6 X 1 diante do forte Independiente, da Argentina. Arílson não balançou as redes, mas fez um lindo lançamento para Dionísio anotar o terceiro gol e foi apontado como o melhor do ataque pela imprensa, por sua eficiência e facilidade de jogar.

E no terceiro, a vitória por 2 X 0 sobre o Vasco que valeu o título, o ponta criou com Dionísio a jogada do primeiro gol, marcado por Liminha, e anotou ele mesmo o segundo, cabeceando cruzamento de Ademir da direita, sendo novamente escolhido o destaque.

Bastante elogiado também por treinadores de outras equipes que compareceram ao Maracanã para observar o torneio, Arílson caiu também nas graças de Zagallo, que em 18 de março daquele ano substituiria João Saldanha no comando da Seleção Brasileira.

Ele próprio um ex-ponta-esquerda rubro-negro e de estilo algo semelhante ao do jovem talento de 21 anos, o treinador surpreendeu ao incluí-lo, logo no dia seguinte ao que assumiu o cargo, na convocação de cinco novos nomes para os treinos de início de preparação para a “Copa do Mundo” do México.

Disputando um espaço com os mais experientes Paulo Cézar “Caju” e Edu, Arílson representava um meio-termo entre o estilo de ponta recuado, mais armador, do botafoguense e o jogo mais veloz e ofensivo do santista.

Porém, teve poucas chances de mostrar seu jogo. Nas semanas em que treinou com a Seleção, disputou apenas dois amistosos não oficiais por uma equipe B (contra a seleção amazonense B e o Olaria) e atuou até fora de sua posição, prejudicando sua observação. Acabou cortado em 27 de abril, a dois dias do amistoso contra a Áustria no Maracanã.

Reintegrado ao Flamengo, reforçou o time na reta final da “Taça Guanabara”, na época ainda um torneio separado do Estadual – e naquele ano disputada em três turnos, estendendo-se de março a maio.

Arílson chegou às vésperas do turno final, quando a equipe encaminhou o título batendo Vasco (2 X 0), Bangu (3 X 1, com dois gols seus), Botafogo (2 X 1) e América (2 X 0), finalizando com um empate em 1 X 1 diante do Fluminense que valeu o ponto necessário para a confirmação da conquista.

Só que, em meio à festa, começava um drama. Durante o jogo, Arílson dividiu uma bola com o lateral tricolor Oliveira e levou a pior, mas seguiu no jogo. Mais tarde descobriu: havia estourado os meniscos do joelho esquerdo.

Mal conseguindo suportar o incômodo das dores, uma primeira cirurgia no joelho foi marcada pelo departamento médico do clube. Depois da cirurgia, Arílson tentou voltar mas foi vencido pelas dores. Apesar do esforço, o atacante mal conseguia treinar.

O segundo parecer médico foi uma bomba. Quando Arílson revelou publicamente que ainda existiam fragmentos do menisco no joelho operado foi um escândalo. Os dirigentes então acusaram os jornalistas de sensacionalistas.

Para abafar o caso, Arílson foi proibido de falar. No terceiro andar do Hospital da Cruz Vermelha, o acesso ao quarto do jogador foi totalmente proibido e vigiado 24 horas. E como num passe de mágica, uma nova versão oficial apareceu do nada: Era o menisco externo que tinha estourado.

Em reportagem assinada por Fausto Neto, a revista “Placar” de 5 de fevereiro de 1971 ofereceu aos leitores um pouco do momento delicado vivido pelo jogador Arílson. Os médicos evitavam tocar no assunto, enquanto os dirigentes queriam mesmo era silenciar o jogador de qualquer maneira.

Talvez, o medo de revelar a evidente falta de estrutura que ainda assolava o futebol brasileiro no início da década de 1970. Mas o temor poderia ser bem maior. Quem sabe, o risco de tornar público os enganos médicos cometidos contra os jogadores Arílson, Dionísio e Tinho.

Algum tempo depois, outro diagnóstico apontou que de fato o menisco externo apresentava problemas. Todavia, os fragmentos não foram removidos totalmente na primeira cirurgia.

Sensibilizado, o jovem ponteiro-esquerdo do Flamengo agradeceu o apoio dos companheiros, principalmente do treinador Dorival Knippel, o conhecido Yustrich: “O seu Yustrich me deu muita força. Sempre perguntava como eu estava”.

Munido de esperanças para voltar rapidamente aos gramados, lá foi Arílson para o segundo procedimento cirúrgico. Na recuperação da cirurgia; algumas revistas de palavras cruzadas, embrulhos com maçãs e maços de cigarros tentavam melhorar o ambiente monótono. O tédio só era quebrado na presença do repórter da revista “Placar”.

Como a imprensa não era bem-vinda, o repórter Fausto Neto precisava mentir para o vigilante do quarto. “Sou primo dele e estou trazendo umas coisinhas”. Então Arílson acenava sorridente e o repórter tinha livre acesso ao leito do jogador.

Em sua volta aos gramados, Arílson foi aos poucos ganhando confiança. O rendimento não era mais o mesmo, mas o suficiente para colaborar nas grandes conquistas daquele período.

Arílson jogou ainda por um curto período no Corinthians em 1975. Depois, atuou pelo Americano e pelo Volta Redonda, clube onde encerrou sua trajetória nos gramados em 1977.

Conforme matéria da revista “Placar” de 16 de setembro de 1983, após deixar o futebol, Arílson dedicou seu tempo ao bar que inaugurou em 1980, no bairro carioca do Grajaú: “Minha sorte é que nos finais de semana aparecem por aqui o Carlinhos, o Dida e o Silva. Então, os clientes lotam o estabelecimento e eu faturo alto”, contou.

Posteriormente, Arílson ainda trabalhou nas categorias amadoras do Flamengo, até ser demitido sem qualquer explicação. (Pesquisa: Nilo Dias)


sábado, 28 de setembro de 2019

Um clube amador de muita tradição

Na comunidade mais antiga de Candiota, o Seival, também foi onde nasceu a equipe de futebol amador mais longeva da região, o Grêmio Sportivo Santa Rosa. Fundado em 1921 o Santa Rosa teve sua primeira ata lavrada em 16 de junho de 1927, que estabelecia a composição de sua Diretoria.

Naquele dia foi eleito o presidente Floriano Rosa, que dividia o comando da instituição com o secretário João Marimom Júnior e o tesoureiro  José Torres.

A história do  clube é contada no livro “Dentro e fora das quatro linhas”. Essa administração de 1927 semearia  o sonho de edificar uma sede. E ali começava uma tradição no Seival. O clube Santa Rosa era ativo, promovia festa todo o mês, recebendo, inclusive, pessoas de outras cidades da região.

Seus adversários mais tradicionais eram o Rio Negro, de Hulha Negra, Luz e Ordem, de Pinheiro Machado, Guarany, de Bagé e até o Brasil, de Pelotas. O time das cores vermelha e branca era respeitado e tinha fama de jogar bonito.

Sem a sede social, destruída pelo tempo, pelo descaso e vandalismo, o time também estava desativado desde 2011. Na história de quase 100 anos esta é a segunda vez que o time é retomado.

Na década de 1950, por questões de ordem financeira, o clube eu leva o nome da padroeira da localidade, foi forçado a fechar as portas por um ano. Em 1954, por conta de sua reinauguração a Diretoria foi presenteada com um poema, atribuído a Cadmo Artisone, mesmo artista que imortalizou a equipe numa tela a óleo, que até hoje está desaparecida.

Há algum tempo a retomada da equipe vinha amadurecendo. Uma nova Diretoria foi formada, tendo como presidente o desportista Danglar Azambuja.
As traves foram doadas pela UTE Pampa Sul e as obras dos novos vestiários feitas com auxilio da comunidade.

O campo de futebol do Santa Rosa, em Seival foi doado por Floriano Brisolara da Rosa. É um terreno cercado de casuarinas e eucaliptos. Os lances principais são na goleira de baixo, na direção da caixa d'àgua e da estrada antiga de quem vem de Bagé, pela estrada antiga, passando pela Trigolândia, na Hulha Negra.

A primeira vinícola registrada do Brasil ficava na Campanha Gaúcha, fundada por José Marimon. A “Vinícola J. Marimon & Filhos” iniciou o plantio de seus vinhedos em 1882, na Vila do Seival, onde hoje fica o município de Candiota. Seus primeiros vinhos foram elaborados em 1886 e manteve-se em atividade por 88 anos. (Pesquisa: Nilo Dias)

Santa Rita, o time de futebol amador mais longevo da região de Candiota. (Foto: Jornal "Tribuna do Pampa", de Candiota-RS)


Esta foto do Grêmio Sportivo Santa Rita é de 5 de agosto de 1939. (Fonte:Arquivo de Geraldo Tiaraju Barbosa)

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

"Sissi" a imperatriz do futebol feminino

Sisleide do Amor Lima, mais conhecida como “Sissi” foi uma jogadora de futebol feminino que antecedeu Marta e serviu como sua inspiração. Ela é baiana de Esplanada, onde nasceu em  2 de junho de 1967.

Começou a jogar futebol na rua, junto com os meninos, onde desenvolveu toda sua habilidade. Se descarta o rótulo de ser a “Marta antes de Marta”, "Sissi lembra" com carinho de uma transgressão tão simbólica quanto necessária: arrancar cabeças de bonecas, que faziam as vezes de bola de futebol. 

“Minha mãe ficava louca e eu quebrava tudo em casa. Quando ela descobriu que eu fui convidada para jogar em um time em Campo Formoso (na Bahia), não queria que fosse”, lembra. 

“O dono convenceu meu pai, que relutou, mas aceitou e a convenceu também. Sempre teve preconceito, é claro, mas nunca deixei que me afetasse. Só me dava mais força.”

Das ruas aos campos de terra batida no sertão baiano, a "Imperatriz do Futebol Feminino" deu seus primeiros passos no Flamengo, da Bahia. Depois, foi para o Bahia, clube no qual se desenvolveu. De lá, o voo mais distante, para a China, aos 21 anos, para representar a Seleção em 1988.

“É claro que dá orgulho ser a primeira camisa 10 da Seleção. Eu era fã do Zico, sempre quis jogar com esse número. Mas na época eu não tinha a dimensão. Era um tempo de muita luta. Mas valeu a pena, eu faria tudo de novo. Vejo a Seleção de hoje em campo e sei que elas estão lá porque nós estivemos antes”, comentou.

Aos 14 anos, a meio-campista saiu de sua cidade para ir morar em um alojamento, onde começou a treinar e profissionalizar-se.

“Sissi” foi  uma das grandes jogadoras da história do futebol feminino. Ela precisou driblar o preconceito até se tornar a primeira camisa 10 da história da Seleção. Começou em casa. Diziam que futebol não era coisa para menina e só a deixaram jogar se fosse para ser a “bobinha”, recordou.

Apareceu pela primeira vez nos “Jogos Olímpicos de Atlanta”, em 1996, levando o bom time da “Seleção Brasileira”, no entanto ainda desconhecido, para a semifinal, terminando a competição na quarta colocação.

No ano de 1999, na “Copa do Mundo Feminina”, organizada pela Fifa e disputada nos Estados Unidos, a jogadora comandou a equipe nacional que terminou a competição em terceiro lugar e ainda conquistou a “Chuteira de Ouro”, como artilheira do torneio.

A meio-campista muito habilidosa ainda participou da campanha dos “Jogos Olímpicos de Sidney”, em 2000, sempre como referência na armação de jogadas da equipe brasileira.

Disputou pela “Seleção Brasileira Feminina” duas “Copas do Mundo”: 1995 e 1999 (3º lugar), quando foi uma das artilheiras, com sete gols, empatada com a chinesa Sun Wen. Participou, também, dos “Jogos Olímpicos de 1996” (4º lugar), e dos “Jogos Olímpicos de 2000”.

A atleta foi um dos pilares da equipe tricolor na era de ouro da modalidade no “Clube do Morumbi”, entre 1997 e 2000, quando o São Paulo formou um grande time, que era a base da “Seleção Brasileira” do período.

Jogavam bonito, passavam por cima das adversárias e conquistaram inúmeros títulos para a equipe paulista. O auge foi na a final do “Brasileiro de 1997”, em que as tricolores venceram a Lusa Sant'Anna por 4 X 0.

Sissi ganhou tal notoriedade nessa época que a torcida tricolor chegou a "gritar para o técnico do time masculino na época, Muricy Ramalho: "Ei, Muricy, coloca a Sissi".

Atualmente, ela é a técnica da equipa feminina “Las Positas College Women's”, em Livermore, na Califórnia.

“Sissi” foi eleita pela “Federação Internacional de História e Estatística do Futebol” como a melhor jogadora de futebol do século 20 da América do Sul. Ela se constituiu no grande nome do Saad nos anos 90, quando liderou o clube na conquista de todos os títulos disputados entre os anos de 1995 e 1997.

Isso mesmo, entre 95 e 97 o Saad venceu 100% dos jogos que disputou, conquistando, a “Copa São Paulo”, a “Copa Campo Grande”, o “Campeonato Brasileiro” nas categorias adulto e Sub-17 e o “Troféu Comitê Olímpico Internacional”.

“Sissi” não brilhou apenas nos gramados. Ela chegou a ser nomeada pela FIFA como embaixadora do futebol feminino Mundial. A eterna camisa 10 do Brasil foi oficializada no cargo pelo presidente da entidade maior do futebol no mundo, na época, Joseph Blatter.

Nos Estados Unidos, ela conquistou o título de melhor jogadora da WUSA quando liderou o San Jose Ciberrays na conquista do título da mais forte liga profissional da história da modalidade.

Como jogadora no Brasil, “Sissi” foi eleita a segunda melhor jogadora do Mundo em 1999, foi pentacampeã brasileira defendendo as equipes do Saad, São Paulo e Radar. Foi tricampeã paulista com São Paulo e Palmeiras. No Futsal, ela foi Hexacampeã Brasileira defendendo as equipes do Bordon, Euroexport, Marvel e Sabesp.

Brasil: Lica – Marisa – Elane - Sandra e Fanta. Lúcia - Marcinha e Sissi. Pelezinha - Roseli e Cebola. Foi com essa escalação, no dia 1º de junho de 1988, que o Brasil fez sua primeira partida em uma competição da Fifa.

Com a base do Radar, grande time do país à época, a trajetória da “Seleção Feminina de Futebol” começou com um histórico bronze na China, sede do campeonato experimental. Dali até o reinado de Marta, seis vezes melhor jogadora de futebol do mundo, um tortuoso caminho foi percorrido pelas brasileiras. “Nunca vai ter uma seleção melhor”, resumiu a zagueira Elane.

O futebol feminino esteve proibido no País de 1941, no “Estado Novo”, até a revogação da lei, em 1979, na ditadura militar. Ainda que o esporte vivesse sob a marginalidade, a prática existia nas grandes cidades do país, onde times não oficiais se formavam em profusão.

Copacabana era o palco principal das competições no Rio. A cultura do futebol de praia no bairro, conhecido por sua diversidade, fez nascer o maior time de todos os tempos no futebol feminino do Brasil, o Esporte Clube Radar, capitaneado por Eurico Lyra. (Pesquisa: Nilo Dias)



segunda-feira, 9 de setembro de 2019

O mago do futebol uruguaio

Héctor Pedro Scarone foi um futebolista uruguaio, nascido em Montevidéu, no dia 26 de novembro de 1898 e falecido em 4 de abril de 1967, aos 69 anos. Jogava como meio-campista e atacante. Apelidado de “El Gardel del fútbol” e “El Mago”, é considerado como um dos melhores atacantes do início da profissionalização do futebol.

Seu pai era um italiano chamado Giuseppe Scarone, proveniente de Savona para trabalhar, segundo algumas versões, na ferrovia que deu origem ao Peñarol, clube ao qual Giuseppe se afeiçoou.

Em outras, Giuseppe teria trabalhado no mercado de carne de Montevidéu, ausentando-se na maior parte do dia. Héctor, na prática, acabou criado por uma irmã mais velha, pois perdera ainda bastante novo a mãe.

Carlos Scarone, irmão 10 anos mais velho, foi a primeira referência no futebol, onde jogava como centroavante. Carlos começou a jogar no River Plate uruguaio em 1908, passando em 1909 ao Peñarol. Teve destaque neste mesmo ano, quando estreou pela "Seleção Uruguaia", participando até do primeiro jogo da camisa celeste, em 1910.

Em 1911, Carlos foi jogar na Argentina pelo Racing, que fazia sua estreia na "Primeira Divisão". O uruguaio inclusive converteu o primeiro gol do clube na elite argentina, em chute potente e baixo contra o San Isidro, mas terminou jogando pouquíssimo no país vizinho.

Argumentou não ter ficado por doença e não ter sido cuidado devidamente pelo Peñarol. O rival Nacional aproveitou-se e o buscou. A insatisfação de Carlos com o Peñarol, indiretamente, originou um dos apelidos deste clube, o de “Manya”, uma deformação à língua espanhola de um diálogo na língua italiana com o pai Giuseppe, sugerindo-lhe que se ficasse no Peñarol iria "comer (mangiare) merda".

O insulto fez-se conhecido e bastante usado por Carlos nos clássicos, e com o tempo foi adotado pela própria torcida aurinegra. Carlos, o Scarone "antipático", não tardou em brilhar como tricolor.

Já Héctor, o Scarone "simpático", seguiu-o e, após uma recusa inicial aos 15 anos de idade devido ao seu físico, estreou no time adulto do Nacional quando ainda tinha 17 anos.

Tal como Carlos, Héctor logo mostrou protagonismo, marcando dois gols em vitória por 3 X 1 em clássico pela segunda rodada de um "Campeonato Uruguaio" ganho com sete pontos de diferença para o rival, um recorde para a época, e de modo invicto.

O Nacional também ganhou do Rosário Central, por 6 X 1, a “Taça Ricardo Aldao”, doada ao vencedor em tira-teima entre o campeão uruguaio e o vencedor entre o campeão argentino e o do campeonato rosarino. Héctor fez um dos gols e o irmão Carlos, três.

No ano de 1917, o Nacional foi novamente campeão uruguaio, com Héctor já se convertendo no artilheiro do elenco tricolor, com 13 gols, um deles na goleada de 4 X 1 sobre o arquirrival.

Héctor Scarone também estreou pela "Seleção", convocado junto com o irmão à vitoriosa “Copa América” daquele ano. Novos títulos vieram em 1919, com a conquista do "Campeonato Uruguaio" garantida na última rodada; e também de nova “Taça Ricardo Aldao”, derrotando na decisão o Boca Juniors (já no ano seguinte) por 3 X 0 mesmo com os uruguaios jogando a partida inteira com um a menos em função de um acidente prévio de um dos titulares. Héctor fez o primeiro gol.

O Nacional foi novamente campeão uruguaio em 1920, com Scarone sendo outra vez o artilheiro do elenco, com 19 gols, ao lado de Santos Urdinarán; e da “Taça Ricardo Aldao”, novamente em embate com o Boca Juniors (2 X 1).

Scarone também foi protagonista de um clássico com o Peñarol pela “Taça Fermín Ferreira”, na qual o Nacional conseguiu uma reviravolta sem precedentes na rivalidade: perdia de 3 X 0 e empatou, quase virando o jogo com Scarone - a jogada que daria a vitória aos tricolores terminou em bola na trave.

Em 1922, o futebol uruguaio iniciou um cisma a durar até 1925, com o Nacional permanecendo na liga reconhecida pela FIFA e o Peñarol, em outra, privando os jogadores aurinegros de integrarem a seleção uruguaia.

O Nacional, vencedor contínuo da sua liga (Scarone foi em 1923 novamente o artilheiro do plantel, com 20 gols, formou então a base da “Celeste Olímpica”.

Nesse ínterim, Héctor se firmou como "o principal Scarone"; enquanto o irmão Carlos deixou em 1922 a seleção, Héctor foi um dos cinco jogadores tricolores que em 1924 ganharam as “Olimpíadas” e um dos oito na também vitoriosa “Copa América” daquele ano, conquistas que celebraram as bodas de prata da fundação do Nacional.

Outrora apelidado de “Rasquetita” em referência ao apelido de “Rasqueta” do irmão Carlos, Héctor passou a ser apelidado de “La Borelli”, em referência à atriz Lyda Borelli, emblema do cinema mudo italiano, devido às reações imprevisíveis e caprichosas. Outra alcunha foi “El Mago”.

Não houve campeonato uruguaio em 1925, um ano ainda assim marcante ao Nacional. O clube fez uma excursão consagradora à Europa. No ano seguinte ao primeiro ouro olímpico do futebol uruguaio e sul-americano, a viagem confirmou o valor do futebol uruguaio.

Cerca de 700 mil pessoas viram a equipe ao longo de 38 partidas. Foram 130 gols marcados, somente 30 sofridos, com 26 vitórias e somente cinco derrotas.

Scarone marcou 29 gols, convertendo-se na principal referência ofensiva após a séria lesão nos meniscos que o centroavante Pedro Petrone sofreu contra o Barcelona. Nessa partida, o clube catalão abriu 2 X 0 e foi de Scarone o gol do empate em 2 X 2.

Dos outros gols que marcou, Scarone fez dois na vitória por 3 X 0 em Gênova sobre o Genoa, dono de dois títulos italianos nas três temporadas anteriores e maior campeão do “Calcio” naquela época.

Fez dois em um 7 X 0 sobre a "Seleção Neerlandesa", em Roterdã; três em vitória por 5 X 1 sobre a "Seleção Belga", em Bruxelas; dois em vitória por 6 X 0 sobre a "Seleção Francesa", em Paris; dois em 5 X 2 sobre a "Seleção Suíça", na Basileia; um em vitória por 2 X 1 sobre a "Seleção Catalã",em Barcelona; e dois na vitória por 3 X 0 sobre o Deportivo La Coruña, na cidade do adversário.

O desempenho contra o Barcelona, por sua vez, preponderou para que os “Blaugranas” o contratassem em 1926. Hugo Meisl, crítico de futebol e futuro técnico do Wunderteam austríaco, qualificou Scarone como "o melhor forward do mundo", sendo dele o gol uruguaio em uma das poucas derrotas, um 2 X 1 para o Rapid Viena.

Scarone não foi o primeiro nativo da América do Sul no Barcelona, nem mesmo primeiro de seu país, pois o clube tem registros de uma partida amistosa disputada em 1903 por um uruguaio chamado Josep Mascaró.

Scarone foi, porém, a primeira contratação que o time fez de um jogador que previamente atuava em um clube sul-americano. Foi vista já na época como a primeira grande transferência internacional do clube.

O uruguaio chegou no ano de 1926 e estreou em amistoso contra o Osasuna ganho por 5 X 1. Não marcou gols, mas foi bastante elogiado, com a revista “Fútbol Association” relatando que “Hector terminou nos dando um curso do que deve ser um meio-campista. 

Vimos um jogador completo, de excepcionais faculdades, de agudíssima percepção do jogo, magistral como complemento do ataque e efetivo na colocação defensiva. O clube campeão ganhou um grande elemento".

Porém, como chegou após o período de inscrições nas competições oficiais, só poderia inicialmente jogar amistosos. Ao todo, entrou em campo só nove vezes. Em 21 de março é que foi liberado pela “Real Federação Espanhola de Futebol” para atuar oficialmente em jogos competitivos, após entraves no envio de documentos requisitados perante a associação uruguaia.

Recebeu então uma oferta de 50 mil pesetas para assinar contrato de cinco anos. Scarone, porém, preferiu voltar, gerando versões de que seria boicotado por Josep Samitier, algo desmentido por ambos.

O uruguaio sempre justificou que o que o afastou foi o temor de não disputar as “Olimpíadas”seguintes, pois o torneio proibia atletas profissionais. Àquela altura, o Barcelona tornara-se um clube profissional, enquanto o futebol uruguaio ainda era oficialmente amador:

"Eu pensava na minha pátria, que logo viriam as “Olimpíadas” e que deveria vestir a camisa celeste. Pensei no Nacional, clube do meu coração, e decidi não assinar", explicou Scarone em depoimento registrado no “Libro de Oro de Nacional”.

A decisão aumentou sua popularidade no Uruguai. Ainda assim, o célebre goleiro Ricardo Zamora chamou Scarone de "o símbolo do futebol". Décadas depois, a primeira "peña" (torcida organizada) oficial do Barcelona em Montevidéu, criada em 2008, recebeu o nome de “Héctor Scarone”, em evento com participação de um sobrinho-neto do craque.

Scarone voltou ao Nacional em 1926, a tempo de ser convocado à vitoriosa “Copa América” daquele ano, da qual foi também vice-artilheiro. Ainda em virtude do cisma encerrado em 1925, não houve em 1926 um campeonato uruguaio oficial, segundo o clube.

Em 1927, integrou outra excursão vitoriosa, dessa vez às Américas Central e do Norte, marcando 22 gols em 18 jogos. Dois deles vieram em duas partidas contra a "Seleção Mexicana" (vitórias de 3 X 1 e 9 X 0) e outros dois, em vitória de 8 X 1 sobre a "Seleção Espanhola".

Desde 1924, o Nacional, porém, só voltaria a ser campeão em 1933, nem sempre por falta de méritos: não houve campeonato em 1930 em função da primeira “Copa do Mundo”, realizada no Uruguai e para a qual o clube foi base da seleção, com quatro titulares na decisão e nove convocados, que seriam respectivamente cinco e 10 se o goleiro Andrés Mazali não fosse previamente afastado uma semana antes da estreia, por indisciplina ao abandonar a concentração de oito semanas.

Em 1928, além de novo título olímpico, Scarone voltou a enfrentar o Barcelona. Fez o último gol da vitória por 3 X 0 no “Estádio Gran Parque Central”. Depois da “Copa do Mundo FIFA” de 1930, já tendo mais de 30 anos, foi contratado pela Internazionale, na época chamada "Ambrosiana", sendo colega de Giuseppe Meazza, que sobre Scarone comentaria ser "o maior jogador que vi".

Marcou sete vezes na temporada 1931-32, incluindo contra Lazio (os dois em triunfo de 2 X 0) e a campeã Juventus; o time de Milão terminou em sexto, mas a dois pontos do terceiro lugar.

Após uma temporada em Milão, passou duas no Palermo. Em ambas, o clube da Sicília lutou para não cair. O uruguaio contribuiu com quatro gols na de 1932-33 (incluindo contra Torino e a própria "Ambrosiana") e nove na de 1933-34 (incluindo outro sobre o ex-clube). 

A passagem de Scarone pela Itália não chegou a ser brilhante, mas, para a sua idade avançada e lesões, foi considerada digna.

Scarone voltou uma vez mais ao Nacional em 1934. Passara a ser ponta-direita. O clube foi campeão na última rodada, em clássico com o Peñarol no qual o empate em 1 X 1 favoreceu os tricolores, que conseguiram o resultado mesmo jogando a última meia hora com dois jogadores a menos, expulsos.

Também foi em 1934 que o campeonato válido por 1933 foi finalizado, mas Scarone não pôde ser inscrito para os jogos finais. A temporada válida por 1934 foi a última em que jogou oficialmente pelo Nacional, ainda que prosseguisse jogando esporadicamente amistosos pelos tricolores. Em 1939, chegou a jogar pelo Montevideo Wanderers.

Scarone estreou pela Seleção Uruguaia em 1917 e a defendeu até 1930. Totalizou 70 jogos e 31 gols oficiais (e 52 no total), que fizeram dele o maior artilheiro da “Celeste” até 2011, quando foi superado inicialmente por Diego Forlán; atualmente, está abaixo também de Edinson Cavani e Luis Suárez.

Ainda assim, detém uma média de gols que dificilmente será superada por eles. 22 dos seus 31 gols oficiais vieram em jogos válidos pela “Copa América”, pelo futebol nos “Jogos Olímpicos” (quando estes eram a principal competição mundial desse esporte) e pela “Copa do Mundo FIFA”.

Estreou em 2 de setembro de 1917, data de vitória por 1 X 0 sobre a Argentina pela “Copa Newton”. Meses depois, participou junto com o irmão Carlos Scarone (que defendia a seleção desde 1909) da “Copa América” daquele ano, a primeira realizada no Uruguai.

O país venceu e Héctor foi vice-artilheiro com três gols, incluindo um na vitória por 4 X 0 sobre o Brasil e o do título, o único na vitória por 1 X 0 na rodada final contra a Argentina. Héctor terminou eleito o melhor jogador do torneio.

Na edição seguinte, a de 1919, os irmãos perderam para o Brasil, que sediava pela primeira vez a competição. Ainda assim, foi a muito custo e ameaçando os anfitriões, que só conseguiram garantir a conquista após 90 minutos regulamentares e duas prorrogações de meia hora cada uma, em uma das partidas mais longas da história do futebol, com Arthur Friedenreich marcando no minuto 122 o único gol.

O goleiro brasileiro Marcos Carneiro de Mendonça declararia ter feito "a defesa de sua vida" em lance de Héctor Scarone nessa partida.

Na “Copa América” de 1920, somente o irmão Carlos jogou. Nenhum deles esteve na de 1921, nem na de 1922, o último ano de Carlos Scarone pela seleção. Nessas edições, o Uruguai foi campeão apenas na de 1920.

Héctor Scarone voltou a participar na edição de 1923, marcando um gol, no 2 X 0 sobre o Paraguai. O Uruguai voltou a ser campeão. A edição também qualificava para as “Olimpíadas de 1924”.

A principal referência ofensiva do Uruguai nas “Olimpíadas de Paris” foi Pedro Petrone, artilheiro da competição. Mas Scarone também entrou nas estatísticas daquela edição, marcando em cada jogo até a final e ficando em terceiro na artilharia.

Fez o segundo no 7 X 0 na estreia contra a Iugoslávia; novamente o segundo no 3 X 0 na segunda rodada, contra os Estados Unidos; os dois primeiros no 5 X 1 sobre a anfitriã França, nas quartas-de-final; e o gol da vitória de virada, a nove minutos do fim, no 2 X 1 contra os Países Baixos, na semifinal - um gol polêmico, feito de pênalti no qual a bola batera na realidade no braço de Scarone e não no de um oponente.

Após a conquista, os uruguaios deram uma volta completa no campo, andando pela pista lateral e acenando para a plateia, inaugurando o gesto que ficaria conhecido como "volta olímpica", repetido por eles nas duas conquistas mundiais seguintes e posteriormente adotado por todos os países. Ainda em 1924, Scarone e a “Celeste” também ganharam a “Copa América” daquele ano.

O Uruguai ausentou-se da “Copa América” de 1925, voltando a participar do torneio na edição de 1926, da qual Scarone terminou campeão e na vice artilharia, com seis gols. Cinco deles foram na Bolívia, um recorde individual em uma só partida na competição.

Essa marca de cinco gols em um só jogo de “Copa América” ainda não foi superada, sendo posteriormente igualada pelos argentinos Juan Marvezi em 1941 (6 X 1 no Equador) e José Manuel Moreno em 1942 (12 X 0 no Equador); e pelo brasileiro Evaristo de Macedo em 1957 (9 X 0 na Colômbia).

Na edição de 1927, o Uruguai foi vice-campeão. Scarone teve a artilharia da competição, com três gols, marcando os dois gols uruguaios na derrota de 3 X 2 para a campeã Argentina na rodada final; seu segundo gol empatou em 2 X 2 a 11 minutos do fim, mas pouco depois o colega Adhemar Canavesi marcou contra. O vice-campeonato, porém, bastou para qualificar a “Celeste” às “Olimpíadas de 1928”.

Nos Jogos de Amsterdã, Scarone fez menos gols que em Paris, três, mas todos decisivos: o primeiro na vitória por 2 X 0 para eliminar ainda na fase inicial os anfitriões Países Baixos, cuja torcida passaria a vaiar e torcer contra os uruguaios; o último da “Celeste” na vitória por 3 X 2 sobre a Itália na semifinal; e o gol do título, no 2 X 1 sobre a rival Argentina, em notável chute de longa distância, a 40 metros do gol adversário.

Naquelas “Olimpíadas”, Scarone ausentou-se de algumas partidas por lesões, sendo substituído por Héctor Castro, que, embora tenha marcado no 4 X 1 sobre a Alemanha, sempre voltava à reserva assim que Scarone se recuperava.

Haviam sido necessárias duas partidas contra os argentinos após o empate na primeira, em que Castro jogou em seu lugar. Para a segunda, porém, o capitão José Nasazzi preferiu “El Mago”.

Tornou-se famoso o grito proferido por Nasazzi de "tua, Héctor!", quando Scarone recebeu passe de René Borjas para marcar o gol do ouro. A frase viraria no Uruguai sinônimo de uma entrega adequada para um companheiro ficar em condições de definir, sendo usada para além do âmbito esportivo.

Scarone esteve pela última vez na “Copa América”, edição de 1929, mas não jogou nenhuma partida e o Uruguai ficou em terceiro. Ao todo, marcou 13 vezes na competição, números que fazem dele o terceiro maior artilheiro da história do torneio, ao lado dos argentinos Gabriel Batistuta e José Manuel Moreno e dos brasileiros Jair da Rosa Pinto e Ademir de Menezes.

Na altura de 1929 Scarone era o maior artilheiro - apenas posteriormente é que foi igualado pelos outros quatro e superado por Severino Varela, Teodoro Fernández (que somaram 15) e os recordistas Zizinho e Norberto Méndez (17). Naquele mesmo ano, o país bicampeão olímpico foi escolhido por aclamação para sediar no ano seguinte a primeira “Copa do Mundo FIFA”.

Scarone não se fez presente na estreia, contra o Peru, em função de outra lesão. Tal como nas “Olimpíadas de 1928", Héctor Castro o substituiu, inclusive marcando o gol da vitória. Mas, também como em 1928, Castro voltou à reserva diante da recuperação de Scarone.

A partida, que inaugurou oficialmente o “Estádio Centenário”, foi vista com decepção por público e crítica após vitória magra por 1 X 0 contra uma seleção criada apenas três anos antes.

O jornal “El País” chegou a escrever que "os Deuses estão cansados!". Scarone voltou à titularidade na partida seguinte e o Uruguai bateu por 4 X 0 a Romênia, marcando todos os gols nos primeiros 35 minutos. Scarone fez o segundo deles, aos 24 minutos.

O "eterno reserva" Castro voltou a jogar a final da “Copa”, na qual faria o último gol, apenas porque outro titular, Peregrino Anselmo, se machucou na semifinal.

A decisão, contra a rival Argentina, teve duas viradas no placar: o Uruguai abriu 1 X 0, mas terminou o primeiro tempo perdendo por 2 X 1. Scarone sobressaiu-se especialmente na jogada do gol do empate, aos 13 minutos do segundo tempo: dominou a bola fora da área, pela meia-esquerda, marcado por dois adversários, mas sendo capaz de rolar a bola para José Pedro Cea ao vê-lo livre pelo centro.

Cea marcou de carrinho e acabou recebendo o apelido de “El Empatador Olímpico”. Adiante, a “Celeste” anotou 3 X 2 aos 23 minutos da segunda etapa, passando a ser bastante pressionada e só conseguindo garantir a conquista ao marcar o quarto (com Castro concluindo contra-ataque) já no penúltimo minuto.

A final, travada em 30 de julho, foi seu último jogo pelo Uruguai. Dos titulares campeões, somente Scarone havia nascido ainda na década de 1890. Além dele, o outro único jogador vencedor de “Copa do Mundo FIFA” nascido naquela década foi o colega Domingo Tejera, participante somente da estreia contra o Peru.

Scarone foi o primeiro técnico do Millonarios, de Bogotá no período conhecido como "Eldorado Colombiano", quando o campeonato da Colômbia, desfiliado perante a FIFA, tornou-se um atrativo polo de jogadores de todo o mundo, incluindo europeus.

O clube, a contar com Alfredo Di Stéfano, Adolfo Pedernera, Néstor Rossi e outros, foi a grande força nacional daquele período, conseguindo resultados expressivos também fora do país, como na vitória sobre o Real Madrid nas comemorações dos 50 anos da equipe espanhola.

“El Mago”, ex-jogador do Barcelona, treinou o próprio Real Madrid posteriormente, sendo presentado com um anel com a insígnia do clube, o qual passou a sempre carregar consigo. Outra versão aponta que na realidade tal anel seria do Barcelona, e que Scarone não teria deixado de usa-lo mesmo enquanto treinava o Real.

Como treinador ou como aposentado, Scarone gostava de demonstrar suas habilidades; um dos exercícios era, em tempos em que era comum o travessão em treinamentos ser segurado, além das duas traves laterais, por uma terceira ao meio para impedir que ele se curvasse, arredar a trave "central" (todas eram de madeira naquela época) para um dos cantos - Scarone então mirava a bola com precisão no espaço oco que deixava entre a trave lateral e a trave que havia sido deslocada para perto deste.

Sofreu, porém, a tragédia de perder seu filho único, que fraturou um membro enquanto praticava “Rugby Union”, não foi devidamente engessado e acabou sofrendo uma embolia que chegou ao coração.

Títulos. Competições nacionais: Campeonato Uruguaio: (1916, 1917, 1919, 1920, 1922, 1923, 1924 e 1934 - todos pelo Nacional); Competições internacionais pela Seleção Uruguaia. Copa do Mundo FIFA (1930 - 1 gol); Campeonato Olímpico: (1924 e 1928); Campeonato Sul-Americano: (1917, 1923, 1924 e 1926); Torneios internacionais pelo Club Nacional. Copa Ricardo Aldao ou Campeonato Rio-Platense (contra o campeão argentino): (1916, 1919 e 1920).

Foi eleito pela “Federação Internacional de História e Estatísticas do Futebol”, em rankings alusivos ao século XX, como o 21º melhor jogador sul-americano e o 40º maior jogador do mundo. (Pesquisa: Nilo Dias)



quinta-feira, 5 de setembro de 2019

Morre o goleiro que levou o gol 1000 de Pelé

Morreu na noite de ontem, (4/9) Edgardo Andrada, ou simplesmente Andrada, aos 80 anos de idade. O ex-goleiro argentino, também conhecido por "El Gato" ficou marcado no futebol brasileiro por ter sofrido o milésimo gol de Pelé em 1969 e por ter conquistado o título nacional de 1974 pelo Vasco.

Segundo os jornais argentinos "Olé" e "Clarín", a causa da morte não foi divulgada.

Nascido em Rosário em 1939, deu seus primeiros passos no futebol com a camisa do Rosário Central. Goleiro ágil e elástico, aos poucos ganhou projeção no clube, a ponto de ter se tornado titular absoluto entre 1960 e 1969. E se tornou o goleiro que mais atuou na meta da equipe, com 284 jogos.

Em 1969, desembarcou em solo brasileiro para vestir a camisa do Vasco. E ficou marcado logo por um lance para a posteridade: em jogo válido pelo “Torneio Roberto Gomes Pedrosa”, "El Gato" sofreu o milésimo gol de Pelé.

No “Maracanã”, o argentino quase alcançou o pênalti cobrado pelo "Rei" e, enquanto Pelé comemorava naquele dia 19 de novembro, Andrada dava socos na grama. O argentino também não escondia seu incômodo cada vez que falavam sobre o tema.

Em entrevista ao “SportTV”, em 2012, Andrada disse que “como todo goleiro, eu não queria leva o gol. Menos ainda um que vai sair por todo mundo. Mas o gol veio e em pouco tempo você vai se acostumando e acaba o adotando como um filho”.

Em 1970 ajudou a equipe a faturar o “Campeonato Carioca” daquele ano, ao lado de nomes como Gilson Nunes, Alcir, Eberval e Fidélis.

Em 1971, Andrada se consagrou como o melhor goleiro do “Campeonato Brasileiro”, e seguiu titular absoluto do Cruz-Maltino ano a ano até que em 1974 fez parte de uma campanha histórica para os vascaínos, que foram campeões brasileiros.

Ele era o “Camisa 1” daquele time que derrotou o Cruzeiro por 2 X 1, no “Maracanã”. "El Gato" conviveu com nomes como Roberto Dinamite, Ademir, Jorginho Carvoeiro e Zanata. O goleiro ainda vestiu a camisa cruz-maltina em 1975, no qual o time disputou a “Copa“ pela primeira vez.

Mesmo não tendo conquistado títulos importantes no Rosário Central, suas grandes atuações o levaram a ser convocado para a “Seleção da Argentina”, com a qual teve bom rendimento na “Copa América” de 1963.

Ele foi pré-relacionado para o “Mundial de 1966”, na Inglaterra, mas acabou cortado devido a uma lesão.

Após encerrar a sua passagem pelo Vasco em 1975, ano em que disputou a “Copa Libertadores da América”, primeira na história do clube, Andrada atuou pelo Vitória, da Bahia, em 1976, tendo como companheiros, entre outros, seu compatriota Rodolfo Fischer e Osni.

Ele permaneceu no clube baiano até novembro, quando optou por voltar ao seu país de origem, onde jogou pelo Colón a partir de 1977. E ele só encerrou a carreira aos 43 anos, em 1982, então pelo desconhecido clube “Renato Cesarini”, também do seu país.

Pouco depois de se aposentar, Andrada viu a sua biografia como futebolista ser manchada, por envolvimento com a ditadura militar argentina.

Em 1983, ele chegou a cooperar com o “Pessoal Civil de Inteligência” (PCI), órgão que reunia civis que agia em práticas de espionagem e repressão para o governo autoritário da época.

O ex-goleiro ainda chegou a ser acusado de ter participado da execução de dois militantes políticos contrários ao regime vigente, mas negou envolvimento nos assassinatos de Osvaldo Agustín Cambiaso e Eduardo Pereyra Rossi.

Andrada foi identificado pelo repressor Eduardo Constanzo entre os membros do grupo do “Cargo Operativo 4”. Assim que o ex-goleiro foi citado, o Rosário Central pediu sua saída do clube. "El Gato" negou, em entrevistas, ter participado dos crimes.

Muitos anos depois disso, em 2007, Andrada voltou a fazer parte do mundo do futebol profissional ao trabalhar como preparador de goleiro do Rosário Central.

E em fevereiro de 2012, o juiz federal Carlos Villafuerte Ruzo considerou o ex-jogador inimputável, em decisão justificada por falta de provas contra ele. (Pesquisa: Nilo Dias)

Pelé e Andrada. 

terça-feira, 3 de setembro de 2019

Tragédia em estrada de Minas Gerais

Um acidente de carro, registrado neste domingo (1º) na cidade de Cajuru (SP), pôs fim a carreira do jogador de futebol de campo e futsal Jeferson Henrique de Souza, de 26 anos, conhecido como “Doka”. Na sexta-feira ele concedeu a última entrevista à “Rádio Capital” e à “Rede Hoje”, na abertura da “Segunda Liga de Futsal”, de Patrocínio.

“Doka” estava jogando pelo “Spasso Café/ Via Transportes”, de Patrocínio, que venceu o “Barbers Brothers”, de Ibiá por 5 X 4. O técnico Roberto Avatar (“Tatá”) muito abalado e o subsecretário de esportes, Mauro Henrique Nogueira, disseram que será preparada uma homenagem póstuma nos jogos de hoje, da competição, no “Ginásio da Matinha”.

No domingo, dia do acidente, “Doka” havia participado de um torneio de futebol amador em Ribeirão Preto (SP). Além dele, morreu também a sua namorada, Dayane Damasceno, de 32 anos, e Liniker Ramos, de 28 anos, que estava dirigindo. Eles voltavam para Uberlândia (MG).

A Polícia Rodoviária Federal (PRF) informou que o acidente aconteceu por volta das 18h10 de domingo. O carro em o jogador estava acabou derrapando devido à chuva, capotou e bateu em um barranco no km 324 da “Rodovia Joaquim Ferreira”, em Cajuru (SP).

Os corpos foram encaminhados para o “Instituto Médico Legal” (IML) de Ribeirão Preto e a previsão é que sejam sepultados hoje, terça-feira em Uberlândia.

No campo jogava como atacante, enquanto no futsal atuava como pivô esquerdo. Ele jogou em clubes amadores de Uberlândia, como o “Luizote”, de Freitas e passou pelo salão do “Praia Clube”, por onde se sagrou campeão mineiro em 2018. Jogou também no Uberlândia Esporte Clube e integrou a Seleção Brasileira de Futsal.

O jogador era muito querido na região, inclusive em Tupaciguara, município que ele defendeu na "Copa Inconfidentes de Futsal Band". (Pesquisa: Nilo Dias)

“Doka", campeão mineiro de Futsal, de 2018, pelo Praia Clube.

segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Brasileiro foi trabalhar na Rússia e acabou preso

O volante brasileiro Fernando Lucas Martins, 27 anos, que jogava pelo Spartak, de Moscou e desde julho se transferiu para o Beijing Guoan, da China , está sendo acusado de abandonar na prisão e sem qualquer auxílio um funcionário que contratou para lhe prestar serviço ainda na Rússia.


Robson Nascimento de Oliveira, 46 anos, ex-fuzileiro naval foi detido por estar com comprimidos pedidos por Fernando, mas que são proibidos na Rússia.  Ele foi contratado por Fernando, para ser seu motorista.

Ele foi preso no dia 18 de março no aeroporto Domodedovo, em Moscou. O homem está preso há quatro meses no presídio de Kashira, cidade a 110km de Moscou e, segundo a família do motorista, não recebeu nenhuma ajuda de Fernando.

a uma vida bem humilde em Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro, quando recebeu o convite para trabalhar com o jogador. Estava desempregado. Sua esposa, Simone Damazio de Barros, com quem se uniu cinco anos atrás é cozinheira de mão cheia.

No fim do ano passado ela foi indicada por uma amiga para trabalhar na casa de Sibelle Rivoredo, sogra do jogador Fernando, que a contratou para um período de experiência na casa da família na Barra da Tijuca, no Rio.

E tinha a promessa de, depois, ir para a Rússia, trabalhar com Fernando e sua esposa, Raphaela, em um condomínio de luxo na “Rezidentsiya Rublovo”, casa 50-A, em Moscou, onde um imóvel de dois andares não sai por menos de R$ 3,4 milhões.  

Simone falou da proposta de ir trabalhar no exterior para o marido, que ficou reticente por conta da distância e do tempo que ficariam sem se ver.
Ela, então, pediu um emprego também para Robson, o que foi aceito por Sibelle, a sogra de Fernando. A história foi revelada em reportagem da “TV Globo” e do “GloboEsporte.com” levada ao ar neste domingo.

O personagem central dessa história, o volante Fernando, cria do Grêmio Porto Alegrense, foi convocado para todas as seleções de base e esteve no grupo da equipe principal que conquistou a Copa das Confederações de 2013 no Maracanã.

O jovem cuja carreira decolava foi logo seduzido pelos dólares do então emergente mercado ucraniano, que desembolsou R$ 36 milhões para levá-lo. Campeão pelo Shakhtar Donetsk, depois jogou na Sampdoria, da Itália, até ser vendido, em 2016, para o maior clube da Rússia, o Spartak Moscou.

Mesmo longe dos holofotes e, naturalmente, das listas da Seleção, o jogador angariou respeito na Rússia e virou ídolo da fanática torcida do Spartak. 
Fernando faz parte dessa lista de casos raros de meninos que desejam ganhar a vida jogando bola e conseguem chegar lá. E foi na esteira desse sucesso que outro personagem começou a sonhar.

O casal ganharia um total de R$ 14 mil - R$ 6 mil para ele ser motorista e ajudar em coisas da casa e outros R$ 8 mil para ela ser a cozinheira da família de Fernando. Em 9 de fevereiro deste ano, Robson e Simone embarcaram para a Rússia.

A proposta de largar tudo no Brasil e seguir para a Rússia era assustadora - cultura e hábitos totalmente diferentes, distância, língua estranha e um país de inverno rigoroso -, mas ao mesmo tempo tentadora, em razão da proposta salarial de R$ 14 mil - praticamente sem gastos, já que teriam teto e comida em Moscou.

O casal sabia que não seria fácil, mas valia o sacrifício. Trabalhando um ano ali, construiriam a casa deles. Nunca tinham viajado de avião na vida. Não tinham passaporte, nada. O estafe de Fernando, então, deu início ao processo para levá-los a Moscou. Fizeram os passaportes em Niterói, porque sairia mais rápido. Eles pagaram e marcaram tudo.

No dia 9 de fevereiro, Robson e Simone fizeram um registro fotográfico já dentro do avião, orgulhosos, rostos colados e sorrisos abertos. Era a decolagem em busca da melhoria de vida. Ou deveria ser.

Minutos antes do embarque, porém, o motorista da família de Fernando, identificado como Leandro, chegou ao “Aeroporto Tom Jobim” com três malas. Dentro delas havia encomendas da família do jogador. Cerca de 18 horas depois, ambos desembarcaram no país europeu.

Simone e Robson desconheciam que, em meio às encomendas, havia remédios tarja preta que, no Brasil, só podem ser adquiridos com receita médica. E eles atravessaram o portão de embarque no Rio de Janeiro sem as receitas prescritas na bolsa.

Dezoito horas mais tarde, o voo da Lufthansa de número LH-1446 pousou no Aeroporto Internacional de Domodedovo, conhecido como o mais rigoroso de Moscou. 

Eram 17h46 do dia 10 de fevereiro quando o casal pegou as malas na esteira. Ansiosos, estavam tomados pelo frio na barriga para encontrar o "funcionário" de Fernando que iria buscá-los: William Rodela. Não deu tempo.

Nove minutos depois, no hall de saída para o saguão do aeroporto, Robson e Simone escolheram o corredor verde, quando não se tem nada a declarar. 

Foram parados pelo funcionário A.L. Elisov, agente operacional do “Setor de Controle de Circulação de Drogas da Diretoria Linear do Ministério do Interior”, no “Aeroporto de Demodedovo”, além do major K.S. Losev e do tenente-coronel N.V. Antipov.

Não havia muito o que temer, imaginavam, além do constrangimento e da dificuldade de comunicação, já que as orientações de Sibele eram claras. Em outro áudio, inclusive, ela fala de um possível questionamento sobre um par de alianças do casal Fernando e Raphaela que Simone carregava na bolsa de mão:

"Se eles pararem, as alianças são sua e do Robson. Vocês são casados, se não vai entender o que eles estão falando. Você mostra o seu dedo que é de vocês", orientou.

O problema estava longe das alianças. Misturadas numa mala preta, em meio a comidas e roupas de criança, havia duas caixas do remédio “Mytedom – Cloridrato de Metadona – 10mg”, um potente comprimido para quem convive com dores, principalmente, mas também bastante utilizado no tratamento de recuperação de viciados em ópio e heroína.

Daí o problema principal. Na Rússia, a substância é considerada entorpecente. E a quantidade, 40 comprimidos, com a massa de 5,60g de opioide, encaixava-se na nomenclatura da lei que prevê um "volume grande" da droga, infringindo o artigo 229.1, parte 3, do Código Penal da Federação da Rússia.

Os dois avistaram William Sa Silva Sousa, o “Rodela”, estudante de Medicina em Moscou e espécie de “quebra-galho” da família de Fernando. Ele fora buscar Robson e Simone no aeroporto.

O funcionário autorizou que “Rodela” fosse até eles para ser uma espécie de tradutor. Simone, nervosa, mandou mensagens a Sibele, que de férias por Grécia e Itália com a família, respondeu a acalmando e explicando que tinha receita e que já a tinha enviado para “Rodela”.

A receita existe mesmo, foi feita e assinada pelo médico Marcelo Tayah e está com a data de 26 de fevereiro deste ano. Para quem era o remédio, tarja preta? Para William Pereira de Faria, pai de Raphaela e, consequentemente, sogro de Fernando.

Ele usa a medicação para as crônicas dores que sente na coluna. O médico disse à Globo: "O senhor William é meu paciente desde 2017 e faz uso deste medicamente... A senhora Sibele me ligou dizendo que precisava dessa declaração para resolver o problema de um rapaz na Rússia..."

Após 17 longas horas no aeroporto e de muita explicação, dada por “Rodela”, e desespero de Simone e Robson, o casal foi liberado, mas com o aviso de que a investigação sobre o motorista seguiria.

Lá o casal ficou exatos 35 dias apenas cuidando da casa vazia. Passado o susto inicial do aeroporto, era hora de curtir os momentos de folga para passear e conhecer os pontos turísticos da capital russa. Apesar do inverno rigoroso que fazia Robson tirar com a pá o acúmulo de neve da porta da casa, os dois estavam animados.

Em 17 de março, um domingo, Fernando e a família voltaram para Moscou, com os sogros Sibele e William juntos. Robson e “Rodela” foram buscar todos no aeroporto em dois carros.

No dia seguinte, 18 de março, uma segunda-feira, os integrantes da família tomaram café juntos à mesa. Robson ajudava a esposa a lavar louça, quando Raphaela o chamou: "Vamos para sua primeira missão."

Fernando, a esposa, Raphaela e o amigo “Rodela” entraram no carro, e Robson o dirigiu com destino ao aeroporto, aquele mesmo no qual chegara vindo do Brasil. Lá, foram direto para a delegacia de polícia.

Em casa, Simone perguntou a Sibele o porquê de William, o sogro, não ter ido junto e ter levado a receita médica. A sogra respondeu que a filha sabia o que estava fazendo. A receita médica, em território russo, não serve como uma defesa, isso não livra ninguém nesse caso.

É apenas uma receita que mostra que a pessoa necessita de tal remédio, mas ela não livra a pessoa de responder por uma acusação, explisou Gennady Esakóv, professor de Direito Penal Criminal russo.

Por volta de 15h daquele dia, Robson falou com a esposa por telefone e já previa o pior: "Simone, acho que tá dando ruim aqui. Eu vou ficar preso!" Ficou. De lá, saiu algemado algum tempo depois para a “Unidade Penal de Kashira”. Raphaela prometeu a Simone "que até quarta-feira isso será resolvido".

Não foi. Fernando trocou o Spartak Moscou pelo Beijing Gouan em julho e foi com a família para a China. Simone voltou para o Brasil. Robson segue preso, cerca de 20 quilos mais magro em relação a quando chegou a Moscou.

Na denúncia que o levaria aos tribunais, a Justiça russa descreveu: "Estando no território do Brasil (local e hora não determinados, mas o mais tardar em 10 de fevereiro de 2019) e tendo intenção criminosa de transporte ilícito de substâncias estupefacientes através da fronteira aduaneira da União Aduaneira da Comunidade Econômica Euroasiática, Robson do Nascimento Oliveira adquiriu de pessoa não identificada uma substância estupefaciente com objetivo de seu transporte em aeronave ao território da Federação da Rússia".

Ou seja: para o Ministério Público local, Robson teve a intenção de preparar a mala com remédios escondidos a fim de cometer o tráfico internacional da substância ilícita. Assim, infringiu também o artigo 30, parte 1, da lei, e o artigo 228.1, parte 4, parágrafo d (preparação do tráfico de substâncias estupefacientes em volume grande).

Sem visitas de ninguém em nenhum momento: Simone não pode, por não ser casada legalmente com ele. As acusações contra o ex-fuzileiro naval são: tráfico internacional de drogas e preparação para o tráfico.

Sibele ficou em Moscou por mais quase três meses, retornando ao Brasil em 14 de junho. Ela tampouco prestou depoimento no inquérito. Fernando e Raphaela, sim. Ele, em 6 de junho; ela, em 12 de julho.

Ambos negaram qualquer relação com Robson. Em discurso afinado, contaram à polícia que não conheciam Robson, que havia sido contratado por Sibele, mãe de Raphaela.

Em seu depoimento à polícia russa, Raphaela Rivoredo lembrou de um fato que considerou importante para o enredo da apreensão dos remédios na mala do motorista. 

Ela relatou que teve uma "conversa séria" com Robson no dia 17 de março, quando voltou de férias com Fernando e teve o primeiro contato com o motorista em Moscou.

"(...) Disseram que ele seria demitido caso continuasse a consumir drogas, porque eles tinham a criança menor e não queriam ter em casa uma pessoa drogada. Robson respondeu que isso nunca mais aconteceria. Por isso, ele e Simone continuaram a trabalhar em casa até o momento de detenção dele".

Na verdade, Robson só trabalhou até o dia seguinte à conversa, quando foi levado até a delegacia do aeroporto e preso.

Os exames feitos pela polícia russa no motorista na data de chegada a Moscou - 35 dias antes da volta da família de Fernando das férias - apontaram vestígios de cocaína. 

Advogado da família de Robson, Olímpio Soares reconhece que seu cliente usou a droga numa festa de despedida no Rio pouco antes da viagem, mas diz que ele não é viciado, o que é corroborado pelo exame de sangue feito pelas autoridades russas e a perícia psiquiátrica número 1158, realizada em 15 de abril de 2019:

"Não mostrou nenhum sinais clínicos (sic) da dependência de substâncias narcóticas, tóxicas e de álcool, por isso não precisa de tratamento médico de narcomania ou reabilitação médico-social".

A família de Robson pediu ajuda oficial à embaixada brasileira em Moscou para que fosse contratado um advogado, já que não tem recursos para pagar. O processo parou nas mãos da Defensoria Pública. A indicada foi Liudmila Dubrovina, que começou a ter embates técnicos na estratégia de defesa com o advogado do Brasil.

A mãe da esposa do jogador mandou esse remédio para o marido dela que estava na Rússia, mas provar isso ninguém consegue. Se Robson assumir a culpa, o juiz tem o direito de diminuir a pena dele, por exemplo, para cinco anos.

Mas, se ele não assumir a culpa, ele deve pegar 13 a 15 anos de prisão.
Simone, a mãe e o filho do motorista, à Globo, acusam Fernando e sua família de terem abandonado Robson. O advogado da família, Fernando Cassar, nega e garante que toda a ajuda possível foi oferecida.

Simone, que chorou em parte da entrevista, desabafou: "A proposta era para mim. E ele acabou indo junto comigo. E lá ficou. Como eu não queria ter conhecido essa família, meu Deus!"

A TV Globo ouviu especialistas que atuam na Rússia para entender se a quantidade de remédios havia sido determinante para o flagrante. A resposta é não. Qualquer opioide (como a Metadona) é proibido no país. (Pesquisa: Nilo Dias)


Fernando, ex-jogador do Grêmio, de Porto Alegre.


Jornal O Dia

Ex-jogador da Seleção admite que brasileiro preso na Rússia levava remédios para seu sogro

No entanto, em depoimento, o atleta contou uma versão diferente às autoridades
Por O Dia

Publicado em 08/09/2019

O volante Fernando, ex-Seleção e que atualmente está no Beijing Guoan-CHN, falou pela primeira vez sobre o caso do brasileiro Robson Oliveira, preso desde o dia 18 de março na Rússia acusado de tráfico por levar medicamentos a pedido de sua família para o país.

Em entrevista ao "Esporte Espetacular", o jogador admitiu que o remédio era para uso de seu sogro, William Faria.

"Eles foram parados no aeroporto e a gente imediatamente mandou o prontuário, receita, passaporte do meu sogro, tudo que fosse necessário para provar que o remédio era do meu sogro, porque realmente o remédio era do meu sogro. Em momento algum a gente escondeu qualquer coisa do tipo. Se não ficou claro, estou aqui abertamente falando: o remédio era para o meu sogro", disse o atleta.

No entanto, a declaração é diferente da que foi dada por Fernando em depoimento às autoridades russas, em que disse desconhecer o modo que os remédios foram recebidos no Brasil e que não mantém contato com o sogro.

O jogador ainda afirmou que tentou de todas as formas ajudar Robson a sair da cadeia.
"Desde o começo, a gente fez de tudo para que o Robson saísse de lá. Mas, infelizmente, só com as nossas forças isso não está sendo suficiente.

Eu venho aqui, através da minha imagem, pedir para que as autoridades da Rússia e do Brasil, principalmente, possam se sensibilizar com essa situação do Robson. Para que possam entrar em contato com o governo da Rússia e dessa forma possam pedir a deportação do Robson o mais rápido possível".

Robson Oliveira está preso por ter entrado na Rússia com comprimidos do remédio Mytedom, medicamento a base de metadona, usado para dores crônicas. No Brasil, a substância é legalizada. Porém, ilegal na Rússia.