Boa parte de um vasto material recolhido em muitos anos de pesquisas está disponível nesta página para todos os que se interessam em conhecer o futebol e outros esportes a fundo.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Orlando "Gato Preto"

Orlando Alves Ferreira, o “Gato Preto”, nasceu no dia 25 de julho de 1940, no bairro de São Cristóvão, no Rio de Janeiro. Começou a carreira de futebolista em 1958, aos 18 anos, no São Cristóvão, que na época  era uma referência entre as equipes suburbanas cariocas. Ficou em “Figueira de Melo” até 1962. O apelido de “Gato Preto” se devia a sua grande elasticidade e agilidade, além de ser negro.

Em 1963 o goleiro foi contratado pela Portuguesa de Desportos, de São Paulo, onde foi companheiro inseparável do grande goleiro Félix, com quem revezou por muito tempo no arco da lusa. Também foi companheiro dos goleiros Aguilera, Carioca, Aguinaldo, Edson Mug e Zecão durante sua trajetória pelo Canindé.

Em 1964, numa excursão da Portuguesa de Desportos pelos Estados Unidos, após o nono gol, contra o Massachusetts, o goleiro Félix foi jogar de centroavante para permitir a entrada de Orlando. E curiosamente, Félix marcou o décimo gol da “Lusa”, numa partida que terminou 10 X 1.

Em 1973, com 33 anos de idade, Orlando foi suplente na campanha vitoriósa do título paulista naquela jornada contra o Santos. O goleiro titular era Zecão, que hoje mora na cidade de Sorocaba, no interior paulista.

No curriculo de Orlando consta um feito histórico, o de ter sido o último ganhador do “Prêmio Belfort Duarte”, em 6 de setembro de 1973. Era um prêmio concedido aos jogadores profissionais que completassem mais de 200 partidas oficiais de futebol ou ficassem durante 10 anos sem sofrer uma única punição.

Orlando ainda vestiu as camisas do Sampaio Correia (MA), Operário de Campo Grande (MS) e Operário de Várzea Grande (MT), time onde encerrou a carreira em 1976. Chegou a ser treinador de goleiros da própria Portuguesa e do Juventus. Depois, para passar o tempo, jogou no time amador do Milionários, que era formado por ex-jogadores de futebol.

A militância de Orlando no futebol aconteceu num tempo em que eram raros os goleiros negros. Até então os exemplos marcantes se resumiram a Barbosa, Veludo, Barbosinha, Ubirajara, Alcântara, Mão de Onça, Dimas Monteiro, Tobias e Jairo. (Pesquisa: Nilo Dias)

Orlando "Gato Preto", quando defendia o São Cristóvão, do Rio de Janeiro. (Foto: Museus dos Esportes)

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

A praga de "Arubinha”

O programa “Globo Esporte”, da Rede Globo, apresentou uma série de reportagens contando histórias vividas no futebol carioca. Em uma delas contou parte da famosa praga rogada pelo ponta-esquerda "Arubinha", do Andarahy, clube extinto do Rio de Janeiro. O fato teria ocorrido no dia 30 de dezembro de 1937, uma quarta-feira, depois que o Vasco da Gama aplicou uma goleada de 12 X 0 no adversário.

O time da "Cruz de Malta" lutava pelas primeiras posições no campeonato. A chuva começou cedo e continuou por toda a tarde e chegou até a noite. Normalmente, nessas condições, o jogo seria transferido. Mas ninguém lembrou disso, pois era uma partida sem muita importância, pois todos sabiam que o Vasco ia vencer. E jogo assim não se transfere.

O Andarahy alugou alguns carros, saiu com o time da praça Sete e foi sem problemas até as Laranjeiras. Às 21 horas em ponto, o juíz Haroldo Dias da Motta entrou em campo, com as calças arregaçadas. E dê-lhe apito chamando as duas equipes, pois com um tempo daqueles, quando mais cedo o jogo começasse, melhor.

O Andarahy entrou em campo, mas nada do Vasco. Fizeram a volta do gramado, levantaram urras para as arquibancadas vazias. E toca a esperar pelo Vasco. Haroldo Dias da Motta apitou com mais força, talvez os jogadores vascaínos não tivessem escutado.

Mas o imprevisto havia ocorrido, um acidente de trânsito fez com que a delegação vascaína se atrasasse em mais de uma hora. Na esquina de Figueira de Melo com Francisco Eugênio, apareceu um caminhão da limpeza pública e pegou um dos carros cheio de jogadores do Vasco, e havia feridos graves.

Oscarino fora para o raio X, estava com uma costela partida. Também Rey não poderia jogar, nem Mamede e Cuco. Os outros jogadores saíram do Pronto Socorro em direção ao estádio. Isso foi determinante para que o Andarahy esperasse pelo adversário. A voz geral era de que o Andarahy queria mais a amizade do Vasco, que os improváveis dois pontos.

O Andarahy, se quisesse teria ganho os pontos daquele jogo, mas preferiu esperar que o adversário chegasse. Isso custou caro, o Vasco não quis saber de agradecimentos e aplicou uma estrondosa goleada de 12 X 0. Dizem que antes do jogo começar, "Arubinha" teria feito uma advertência: “Eu só peço uma coisa: que o Vasco não abuse do escore".

E por aí começa a história do “Sapo de Arubinha”. Quando o jogo acabou, ele teria se ajoelhado ainda dentro do campo, juntado as mãos, olhado para cima e dito em alto e bom som: "Se há um Deus no céu, o Vasco tem de passar 12 anos sem ser campeão".  Ou seja, um ano por gol sofrido na goleada de 12 X 0. Se o clube da "Cruz de Malta" tivesse feito só 1 X 0, ou no máximo 3 X 0, nada disso teria ocorrido

Uns dizem que "Arubinha" não se contentou com isso e que no dia seguinte foi até São Januário para reforçar a praga. Entrou escondido no gramado e enterrou um sapo com a boca costurada, ao mesmo tempo em que repetia a praga dita logo após o jogo. Mas o fato é que o Vasco passou a perder jogos inesperados e acabou a temporada em terceiro lugar, oito pontos atrás do campeão, o Fluminense.

Os anos se passaram e nada do Vasco ser campeão. Os dirigentes, que a principio não acreditavam na história do sapo, mandaram revolver o campo, mas não acharam nada. O negócio foi chamar o "Arubinha" e lhe oferecer dinheiro para que contasse onde havia enterrado o sapo. Mas ele negou que tivesse feito isso. Disse que era tudo história de torcedor.

E a praga continuou a fazer estragos. O Vasco gastava rios de dinheiro contratando os melhores jogadores, mas não ganhava nada. Tudo indicava que tinha mesmo um sapo enterrado em São Januário. E ainda uma dúvida pairava sobre os vascaínos: a praga dos 12 anos começava em 1937, ou a contar de 1934, quando o Vasco fora campeão pela última vez?

O Vasco nem contou o campeonato de 1936, que ganhou fora da Liga Carioca, onde estavam Fluminense, Flamengo e América. A Federação Metropolitana, que tinha Vasco, Botafogo, Bangu e São Cristóvão, era a entidade oficial.

A conclusão era de que se fosse contar com o campeonato de 1936, o da Federação Metropolitana, o clube teria de esperar mais tempo para que a praga se cumprisse. Talvez só fosse campeão em 1948. Por isso, todo vascaíno torceu para que a praga vigorasse a partir de 1934. O Vasco só voltou a ser campeão em 1945, onze anos depois.

Tem gente que lembra a goleada de 24 X 0 que o Botafogo impôs ao Mangueira. Mesmo sem que se tenha conhecimento de alguma praga, a verdade é que depois disso o Botafogo teve de esperar 20 anos para ser campeão de novo. Em resumo, se tivesse vencido de 4 X 0, certamente não precisaria esperar tanto tempo para levantar a taça outra vez.

Pode até ser verdade que "Arubinha" nunca tenha enterrado sapo algum no gramado de São Januário, mas a verdade é que o Vasco penou 11 anos sem ganhar nada. Teria sido efeito da praga ou apenas uma coincidência? Ninguém pode explicar. E assim vai ficar para toda a eternidade, pois "Arubinha" morreu por volta dos anos 80. (Pesquisa: Nilo Dias)

O jornalista Mário Filho escreveu um livro em que conta a história de "Arubinha". (Foto: Divulgação)

domingo, 26 de janeiro de 2014

O “Jogo da Paz”

Em 18 de agosto de 2004 a Seleção Brasileira de Futebol esteve em Porto Príncipe, no Haiti, para o chamado “jogo da Paz”, um amistoso frente a Seleção Nacional daquele país tão devastado por problemas de toda a ordem, o que chamou a atenção da sociedade internacional. Tanto é verdade que o jogo foi transmitido pela TV para mais de 100 países.

O acontecimento se deu por iniciativa do ex-presidente Luiz Inácio “Lula” da Silva, que gostou da sugestão dada pelo primeiro ministro do Haiti, na época, Gérard Latortue, que disse preferir a presença da Seleção de Futebol do Brasil, em seu país, que o envio de soldados.

O Brasil liderou a ocupação militar proposta pela ONU, iniciada em 2004. Naquele período, o Haiti, país mais pobre das Américas, passava por uma grave crise política, com 80% da população vivendo abaixo da linha da pobreza e 50% eram analfabetos.

O amistoso proporcionou uma grande festa. Até o ex-jogador haitiano Emmanuel Sanon, o “Manno”, considerado um herói nacional, voltou ao país depois de 30 anos fora, para assistir o jogo.

Em 15 de junho de 1974, na Copa do Mundo disputada na Alemanha, “Manno”, marcou o gol da Seleção do Haiti cotra a Itália, quebrando um recorde do goleiro italiano Dino Zoff, que não levava um gol havia 1.143 minutos, ou 12 jogos.

O gol foi uma pintura. “Manno” driblou Zoff e colocou a bola na rede. Embora o jogo tenha terminado com uma vitória da Itália por 3 X 1, aquele gol fez o povo haitiano, que vivia sob a ditadura de Jean-Claude “Baby Doc” Duvalier, vibrar de alegria. Depois da Copa, “Manno” foi jogar na Europa e nunca mais havia voltado ao Haiti.

O ex-presidente “Lula”, um notório fã do futebol, encaminhou a ideia a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que de imediato aceitou. A entidade dirigente do futebol brasileiro precisava estreitar seus laços com o poder público e com a FIFA, para sediar a Copa do Mundo de 2014.

Com o aval da FIFA, o “Jogo da Paz” foi oficializado. “Lula” esteve presente e fez questão de apertar as mãos de todos os jogadores brasileiros, antes da bola rolar.

Por questões de segurança, a delegação brasileira desembarcou no Haiti apenas duas horas antes da partida. O Haiti estava totalmente destruído por causa da guerra civil e não tinha condições de hospedar os jogadores brasileiros.

Por isso, a seleção ficou em Santo Domingo, na República Dominicana, e viajou por cerca de uma hora e meia de avião até Porto Príncipe, local do amistoso. Do alto, ainda no avião fretado, era possível ver a difícil situação do país.

O mar no litoral era negro, totalmente poluído pelo esgoto que era despejado sem qualquer tratamento. Não havia reservatórios de água doce, a cidade era seca. Sem prédios e com 90% das ruas sem asfalto.

Os jogadores brasileiros foram recepcionados pelo Exército Brasileiro. No comando estava o general Augusto Heleno. A seleção foi dividida em três tanques de guerra e seguiu para o estádio, que ficava a cinco quilômetros de distância. A imprensa foi em outros dois blindados e saiu atrás.

Foi um “city tour” pela miséria do país. Milhares de pessoas foram às ruas para recepcionar os jogadores. De bicicleta ou correndo, os haitianos tentavam acompanhar os ídolos brasileiros.

A pobreza impressionava. Em alguns trechos era possível observar mães dando banho em crianças com a água que saía do esgoto. Paralela ao “Jogo da Paz” foi promovida uma campanha de desarmamento junto à população.

O primeiro-ministro Gérard Latortue, chegou a oferecer US$ 1.000 para quem marcasse um gol na Seleção Brasileira. O valor era uma verdadeira fortuna no país. E também garantiu dar de seu próprio bolso, US$ 100 para cada jogador em caso de vitória. Mas o político haitiano acabou fazendo economia, pois o escore foi de 6 X 0 para o Brasil.

O jogo foi realizado no "Estádio Sílvio Cator", em Porto Príncipe. Os gols foram marcados por Ronaldinho Gaúcho (3), Roger (2) e Nilmar. O juiz foi o brasileiro Paulo César de Oliveira. Estima-se que 15 mil pessoas assistiram o jogo, entre elas 300 crianças órfãs da Aids (existem 300 mil ao todo no país), que foram convidadas pela Unicef.

O Brasil mandou a campo Julio Cesar (Fernando Henrique) – Belletti - Juan (Cris) - Roque Júnior e Roberto Carlos (Adriano) - Gilberto Silva (Renato) - Edu (Magrão) - Juninho Pernambucano e Roger (Pedrinho) - Ronaldo (Nilmar) e Ronaldinho Gaúcho. Técnico: Carlos Alberto Parreira

O Haiti jogou com Gabard (Luiogi) – Descouines - Bruny (Desir) - Jacques (Peter Germain) e Stephane – Mones – Guillaune - Bourdot (Barthelmy) e Dersi - Telamour (Gilles) e Mac Herold Max. Técnico: Carlo Marcelin.

Essa foi a segunda vitória da Seleção Brasileira sobre a haitiana, em dois jogos disputados. O primeiro foi em 21 de abril de 1974, em Brasília, goleada de 4 X 0.

Em 2005, foi exibido na “Mostra Internacional do Cinema de São Paulo” o documentário de Caíto Ortiz e João Domelas, “O dia em que o Brasil esteve aqui”, que conta a história dessa partida. (Pesquisa: Nilo Dias)

O povo haitiano saiu as ruas para aplaudir a Seleção Brasileira. (Foto: Promocional)

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

O "Tigre de Atenas"

O Jaboticabal Atlético, da cidade de Jaboticabal (SP), começou a ser fundado quando os desportistas Alcides Cunha, Emydio Lino Moreira Junior e José Alampary Palhares tiveram a  idéia de preparar o Estatuto de um clube de futebol, que pretendiam organizar no futuro. Depois de concluída essa primeira tarefa, o segundo passo era visitar pessoas que pudessem fazer parte da Diretoria.

Foi assim que no dia 28 de abril de 1911 chegaram à casa de Antonio Martins Bastos, que se juntou a eles. E de imediato sugeriu o nome do engenheiro canadense, Robert Todd Locke, que morava na cidade, para liderar o movimento. Outras pessoas, porém, indicavam o desportista Alcebíades Fontes Leite para presidir o clube. Porém, este também deu apoio ao doutor Locke, que acabou eleito por consenso.

No dia 29 de abril por volta das 19h30min, uma comissão composta por Carlos Buck, Antônio Martins Bastos, Alcebíades Fontes Leite, Cosme Mendes e Antonio Severo, foi até a chácara do engenheiro para lhe fazer o convite.

No dia 30 de abril por volta das 10h30m, o doutor Locke foi até a redação do “O Combate”, quando teve uma longa conversa com o jornalista Carlos Buck, fundador e dono do jornal e ficou a par de que o novo clube tinha por alvo futebol e tênis. Na oportunidade também indicou para ser seu vice-presidente o desportista Antonio Severo, seu amigo pessoal.

E com tudo resolvido antecipadamente, no dia 30 de abril de 1911 foi oficialmente fundado o Jaboticabal Atlético com às cores branca e preta. A reunião começou por volta das 20 horas, nos escritórios de “O Combate”. A primeira Diretoria ficou assim constituída: Presidente, doutor Robert Todd Locke; Vice Presidente, Antonio Severo; 1º Secretário, doutor Alcebíades Fontes Leite; 2º Secretário, professor Emydio Lino Moreira Junior; Tesoureiro, Gomes Mendes; Diretor Esportivo, José de Alandary Pallares e membros da Comissão de Sindicância, Antonio Martins Basso, Carlos Buck e Alcides Cunha.

A origem da mascote do Jaboticabal Atlético é muito antiga e remonta ao início da década de 1930. Naquela época, a cidade de Jaboticabal era um importante centro econômico e cultural, chamada de “Atenas Paulista”. Em campo, o time passeava na disputa dos torneios do Interior pela APEA, liga de futebol da época. Seus resultados levavam temor aos adversários e a torcida passou a chamar a equipe de “Tigre da Atenas”.

Foi assim que surgiu o clube que fez história no futebol do interior paulista, sendo uma das equipes que possui o maior número de títulos das séries de acesso do Campeonato Paulista de Futebol. Em 1938 o Jaboticabal ganhou de todas as equipes da região, inclusive de Comercial e Botafogo, de Ribeirão Preto.

Depois de uma série de 34 jogos, com 24 vitórias, quatro empates e quatro derrotas, seus feitos correram as cidades, e aonde chegava, o time era chamado de “Esquadrão de Aço”.

O Jaboticabal foi campeão da 4ª Divisão, atual Série B, em 1989 e 1996, e da 3ª Divisão, atual A3, em 1990. Atualmente disputa a Série B, 4ª Divisão do Campeonato Paulista.

O clube é proprietário do Estádio Doutor Robert Todd Locke, que tem capacidade para 10.159 expectadores. Palco de grandes conquistas do clube alvi-negro, o estádio corria o risco de ser demolido depois de ter sido vendido em leilão acontecido no dia 3 de dezembro de 2009, pelo valor de R$ 1,38 milhão, para pagamento de dívidas trabalhistas.

Para garantir a preservação desta importante página da história jaboticabalense, o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico e Cultural de Jaboticabal decidiu pelo tombamento total do prédio, em reunião realizada dia 10 de outubro de 2011, na Prefeitura Municipal da cidade.

O estádio é um dos mais imponentes do interior paulista e é cheio de história. O nome é uma homenagem ao primeiro presidente e um dos fundadores do clube, no ano de 1911. O canadense Robert Locke presidiu a equipe até o ano de 1922, quando deixou o cargo por problemas particulares.

A inauguração do estádio aconteceu em 14 de abril de 1912, quase um ano depois da fundação do clube, quando este ganhou do Esporte Clube Pitangueiras por 4 X 2. O primeiro gol do estádio foi de autoria do jogador Linardi.

Títulos conquistados. Campeão do Oeste Paulista (1915); Campeão da 11ª Região (1944); Campeão da 6ª Região do Interior (1947); Campeão Interestadual de Basquete (1948); Vice-Campeão Paulista A2 (1956); Campeão Individual da 9ª São Silvestre (1957); Campeão do Jubileu de Ouro (1961); Campeão Regional Dente de Leite (1970); Vice-Campeão Paulista 2ª Divisão (1979); Campeão Regional Juvenil (1979); Campeão Paulista - 2ª Divisão (1989 e 1996); Campeão Paulista - Série A3 (1990); Campeão em Equipe da 42ª São Silvestre (1990); Vice-Campeão do Torneio Mateus Marinelli (1992); Campeão Regional de Basquete Masculino (1993); Campeão do Torneio Jardim das Rosas (2000) e Vice-campeão da Copa Futebol do Interior – Região Oeste (2002). (Pesquisa: Nilo Dias)

Fachada do Estádio Doutor Robert Todd Locke, tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico e Cultural de Jaboticabal. (Foto: Divulgação)

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Um inglês histórico treinou o S.C. Rio Grande

Pouca gente sabe e com certeza alguns estudiosos do futebol vão se surpreender com a revelação de que Charles Albert Williams, o primeiro goleiro da história a marcar um gol, tenha sido treinador do S.C. Rio Grande, da cidade gaúcha de Rio Grande, em 1912. Ele foi contratado pelo clube mais velho do futebol brasileiro, por sete contos de réis, soma considerável na época.

Num tempo em que os times de futebol existentes eram orientados tecnicamente pelos seus capitães, o S.C. Rio Grande, o clube mais velho do futebol brasileiro em atividade, também foi pioneiro no Rio Grande do Sul na contratação de um profissional específico para a função de treinador.

Williams nasceu no dia 19 de novembro de 1873 em Welling, cidade situada no condado de Kent, na região Sudeste da Inglaterra. As informações sobre a sua carreira não são muitas, mas sabe-se que ele começou a jogar futebol em 1891, no time do Arsenal, onde ficou até 1894, quando ganhou a titularidade. Mas foi também o seu último ano no clube, após a contratação de Harry Storer.

Em 1894 Charlie Williams foi para o Manchester City, onde chegou como titular absoluto e ganhou de cara o carinho da torcida, tornando-se um verdadeiro ídolo. E deu sorte também, pois com ele como goleiro, o Manchester City conquistou seu primeiro título, o de campeão inglês da Segunda Divisão, em 1898/99.

E foi lá que ele entrou para a história do futebol mundial, quando marcou um dos gols de seu time diante do Sunderland, no distante dia 14 de abril de 1900. Dizem que foi até meio sem querer. Williams deu um chutão para frente a fim de afastar a bola do ataque do adversário. O chute foi tão forte que pegou o arqueiro desprevenido e a bola acabou no fundo da rede. Oficialmente, este gol é tido como o primeiro marcado por um goleiro em todos os tempos.

Williams ficou oito temporadas no Manchester City (1894 a 1902), onde ganhou dois títulos e jogou mais de 200 partidas. Mudou-se depois para o Tottenham Hotspur, onde atuou por mais três temporadas (1902 a 1905) e levantou dois troféus, o de campeão da Segunda Divisão (1902/1903) e da “Western League” na edição 1903/04, torneio que envolvia equipes do Oeste inglês. 

Jogou também no Norwich City (1905 a 1907) e no Brentford (1907 a 1908), onde encerrou a carreira. Mesmo tendo sido um goleiro brilhante nas equipes que atuou, Williams nunca foi convocado para a Seleção de seu país. 

Depois que deixou os gramados, Williams dedicou-se a carreira de treinador. Sua primeira experiência foi dirigir a Seleção da Dinamarca, ainda em 1908. E começou com brilhantismo, tendo levado sua equipe a conquistar a medalha de prata nas Olimpíadas de Londres, onde foi vice-campeã de futebol, perdendo a final para a Inglaterra por 2 X 0.  

Em 1911 Williams foi contratado pelo Fluminense, do Rio de Janeiro para ser o técnico, recebendo por isso um salário mensal de 12 Libras Esterlinas, mais alimentação e moradia além de duas passagens para transporte Londres-Rio.

Esse foi mais um pioneirismo dele, pois tornou-se o primeiro profissional a assumir o comando técnico de uma equipe no futebol carioca, e ainda por ter participado do primeiro clássico “Fla-Flu” da história, em 7 de julho de 1912 no estádio das Laranjeiras (vitória do Fluminense por 3 X 2). No seu primeiro ano no futebol brasileiro sagrou-se campeão carioca.

Depois do tricolor carioca é que Wlliams foi ser o técnico do Sport Club Rio Grande. Além de uma pequena referência no livro “O Futebol em Pelotas”, de Eliseu de Melo Alves, nada mais se sabe da sua passagem pelo time gaúcho.

Depois de treinar o S.C. Rio Grande Williams foi para a Dinamarca onde treinou o B93. Ainda dirigiu o Olympique Lillois (atual Lille) da França, até retornar ao Brasil e ao Fluminense em 1924, quando conquistou mais um título de campeão carioca.

Contratado como treinador do Flamengo em 1930, não conseguiu fazer sucesso, levando a equipe somente ao oitavo lugar do Campeonato Carioca daquele ano e ao sexto de 1931, quando encerrou a carreira de técnico.

Seu primeiro jogo a frete do time rubro-negro foi em 6 de abril de 1930, Flamengo 3 X 1 Bonsucesso. E o último em 27 de setembro de 1931, Flamengo 1 X 2 Fluminense. No seu período a frente do Flamengo conheceu 38 derrotas, 14 vitórias e 22 empates. Como técnico o ex-goleiro foi vice-campeão olímpico em 1908 e campeão carioca em 1911 e 1924.

Depois disso ele fixou residência no Brasil e na Inglaterra, para onde viajava seguidamente. Williams faleceu em 1952 aos 79 anos. Seu bisneto Seth Burkett, nascido em Peterborough em 1991, tornou-se o primeiro jogador britânico a jogar profissionalmente no Brasil, tendo defendido o Sorriso, do Mato Grosso em 2009. Ele jogava como lateral-esquerdo.

Como no futebol sempre existem controvérsias, no livro “Guia dos Curiosos”, do jornalista Marcelo Duarte, consta que o primeiro registro de um gol de goleiro aconteceu em 25 de março de 1882. O autor teria sido James McAulay, da seleção da Escócia, em um jogo contra País de Gales.
    
No Brasil, o primeiro gol de goleiro foi obra de Anderson Williams Waterman, que jogou no Fluminense entre 1906 e 1910. O gol aconteceu no dia 5 de julho de 1908, durante uma partida contra o Riachuelo, vencida pelo tricolor pelo acachapante escore de 11 X 0. 

O Fluminense ainda teve um pênalti a seu favor, o que causou revolta aos jogadores do Riachuelo, que saíram de campo. Mesmo assim o goleiro Waterman bateu a penalidade com o arco escancarado, fechando o placar em 11 X 0.
    
O primeiro gol de um goleiro batendo tiro de meta no Brasil, aconteceu em 2 de novembro de 1962, obra do goleiro Navarro, do Noroeste, de Bauru (SP), em um jogo contra o Taubaté, válido pelo Campeonato Paulista. O lance foi validado pelo árbitro Carmelito Vói e o jogo terminou 6 X 0 para o Noroeste. Antes dele, somente em cobranças de pênaltis goleiros haviam marcado gols.
    
Outro gol famoso de goleiro ocorreu no dia 19 de setembro de 1970, num jogo realizado no Rio de Janeiro, entre Flamengo e Madureira. O goleiro rubro-negro Ubirajara cobrou um tiro de meta que fez a bola quicar duas vezes e dar um chapéu no goleiro do Madureira, antes de entrar. Apesar do lance histórico, o Madureira venceu o jogo por 2 X 1.
    
Já Hiran Spagnol, ex-jogador do Internacional, de Porto Alegre e da Ponte Preta, de Campinas, com 2,01 metro de altura foi o único goleiro em todo o mundo, que marcou dois gols de cabeça na carreira. O primeiro, em 1997 quando jogava pelo Guarani, de Campinas. Ele fez num cabeceio o gol de empate em 3 X 3 contra o Palmeiras, no “Brinco de Ouro da Princesa”, aos 48 minutos do segundo tempo.

E o segundo gol em 6 de junho de 1999, pelo Santo André, num jogo contra o Juventus, pelo Campeonato Paulista da Série A-2 daquele ano. Um historiador está procurando dados que comprovem os dois feitos de Hiran, para que ele possa ter seu recorde reconhecido pelo “Guinness Book”.
    
O primeiro gol do recordista Rogério Ceni foi marcado numa cobrança de falta em 15 de fevereiro de 1997, contra o União São João, no Campeonato Paulista. A revista “Four-Four-Two”, em sua primeira versão nacional - outubro de 2008, traz logo de cara um artigo que destaca Rogério Ceni, como um dos 12 goleiros que revolucionaram o futebol mundial.

O atleta são-paulino aparece junto de James McAulay, "o Príncipe dos Goleiros"; Leigh Richmond Roose, "o Soldado"; Ricardo Zamora, "o Divino"; Amadeo Carrizo, "o Maluco"; Apostol Sokolov, "o Diabo Loiro"; Lev Yashin, "o Aranha Negra"; Robert Mensah, "o Yashin Africano"; Ubaldo "Pato" Fillol; Hugo "El Loco" Gatti; Bruce Grobbelaar, o "Pernas de Espaguete" e Peter Schmeichel "o Viking Dinamarquês". (Pesquisa: Nilo Dias)

 
Charlie Willians (marcado pela seta), quando defendia o Manchester City, em 1899. (Foto: Autor desconhecido) 



quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Quando o futebol vira guerra


Em 1969 aconteceu uma das mais fantásticas histórias envolvendo o futebol mundial em todos os tempos, quando Honduras e El Salvador disputavam classificação para a Copa do Mundo de 1970, no México e entraram num conflito armado e verdadeiro fora dos gramados. O futebol foi apenas um pretexto para que os dois países pegassem em armas.   

Honduras e El Salvador mantinham já há alguns anos um quadro de hostilidades crescentes. Além dos interesses das elites nacionais envolvendo oportunidades abertas – e fechadas – pelo Mercado Comum Centro Americano (MCCA), a imigração de salvadorenhos para Honduras, disputando empregos e oportunidades, incitava a xenofobia e alimentava tensões.

Para piorar, leis hondurenhas impediam que empresas tivessem mais de 10% de salvadorenhos em seus quadros. E esses também não podiam escriturar terras em Honduras. Neste quadro, o futebol seria o elemento catalisador de conflitos que iam muito além do campo de jogo.

Em apenas três jogos ocorreram fatos tristes e incríveis. O primeiro deles foi num domingo, 8 de março de 1969, em Tegucigalpa, capital de Honduras. É verdade que os jogadores salvadorenhos não tiveram a recepção que pediram a Deus. Pelo contrário. Ninguém dormiu na noite que antecedeu o jogo.

Os torcedores hondurenhos foram para a frente do hotel, jogaram pedras nas janelas dos quartos, bateram em tambores e latas, explodiram foguetes e buzinaram seus carros sem parar. Ao mesmo tempo assobiavam, berravam e gritavam palavras de ordem, para que os adversários entrassem em campo cansados e nervosos.

Tais fatos são comuns na América Latina, não espantam a ninguém.
Mesmo sem dormir um minuto sequer, o onze de El Salvador portou-se valentemente em campo, só cedendo a vitória para os locais no último minuto do segundo tempo, quando o atacante Roberto Cardona fez o gol único da partida.

Mesmo assim a seleção visitante foi vaiada, debochada e ofendida até no aeroporto de Tegucigalpa, quando retornava ao seu país num avião especial, naquela madrugada. Os sete mil torcedores salvadorenhos presentes em Tegucigalpa foram hostilizados de todas as maneiras, nos hotéis, restaurantes, nas ruas e no estádio.

Como se isso não bastasse, na zona rural de Tegucigalpa algumas casas de salvadorenhos foram atacadas, mulheres violentadas e uma bandeira de El Salvador profanada.

Logo após o apito final do árbitro aconteceu o impensável, o imprevisto, a tragédia, bem longe do local do jogo. Uma jovem torcedora salvadorenha, Amélia Bolanios, de apenas 18 anos, que via à partida pela televisão em San Salvador, levantou-se da cadeira, foi até uma escrivaninha, pegou o revólver de seu pai e deu um tiro no próprio coração.

No dia seguinte o jornal “El Nacional”, de San Salvador estampou em manchete: “Jovem não suportou ver seu país de joelhos”. O sepultamento de Amélia Bolanios foi acompanhado por todo o país, já que a televisão transmitiu tudo. Parecia que uma grande autoridade do país tivesse morrido, pois o cortejo fúnebre foi acompanhado de um destacamento militar, com estandarte e tudo.

O caixão estava coberto pela bandeira nacional. O presidente da República e todos os seus ministros estavam presentes, seguidos pelos jogadores da seleção salvadorenha. O que deveria ter sido tratado como um ato tresloucado, acabou por virar comoção nacional.

Os salvadorenhos estavam dispostos a dar o troco no jogo seguinte, que ocorreu uma semana depois, no “Estádio Flor Branca”, em San Salvador. O time de Honduras provou do mesmo veneno destilado na véspera do jogo anterior. Dessa feita foram eles que não dormiram nas duas noites que passaram em San Salvador.

Os enfurecidos torcedores salvadorenhos quebraram as vidraças de todas as janelas do hotel, ao mesmo tempo em que jogavam toneladas de ovos podres, ratos mortos e panos fedorentos.

O time de Honduras teve de ser levado até o estádio escoltado por carros de combate da Divisão Motorizada de San Salvador, o que impediu que fossem linchados pela multidão, que acompanhou o trajeto carregando fotografias da agora heroína nacional Amélia Bolanios.

Em volta do estádio soldados da tropa de elite da "Guardia Nacional", munidos de metralhadoras. Quando da execução do hino hondurenho, nada se ouvia além de vaias e assobios. A bandeira de Honduras foi queimada e em seu lugar colocaram no mastro oficial um pano esfarrapado, para delírio da multidão.

Os jogadores de Honduras se sentiram prisioneiros a beira de uma execução. Ninguém estava interessado no jogo, sim em sair dali com vida. E respiraram aliviados com a derrota de 3 X 0. Foram até o aeroporto levados pelos mesmos carros de combate.

Mas os torcedores não tiveram a mesma sorte, foram agredidos a pauladas e pontapés na fuga em direção à fronteira. Pelo caminho, dois foram mortos e dezenas de outros acabaram hospitalizados. E ainda 150 automóveis dos visitantes foram incendiados. Horas depois, a fronteira entre os dois países foi fechada.

No dia seguinte em Honduras grupos paramilitares atacaram os salvadorenhos. Na zona rural, hondurenhos atacaram os salvadorenhos residentes, roubando seus pertences e forçando suas fugas. Em 25 de junho, o governo de El Salvador acusou Honduras de genocídio e logo os países romperam relações diplomáticas e comerciais.

Dois dias depois, em 27 de junho, em razão de cada país ter vencido um jogo, as duas seleções decidiram a vaga num confronto extra, realizado no “Estádio Azteca”, na Cidade do México. No tempo normal houve empate de 2 X 2.

E na prorrogação El Salvador, com um gol de Rodrigues se garantiu na Copa do Mundo de 1970, lá mesmo, no México. Nesse dia do desempate, os dois países fecharam suas fronteiras e mobilizaram suas tropas. O jogo estava terminado, agora era a vez da guerra de verdade entrar em campo.

Em 14 de julho, as tensões eram enormes, e a guerra começou com um ataque aéreo de El Salvador. No total, às 100 horas de conflito deixaram quatro mil mortos e milhares de camponeses desabrigados.

O saudoso jornalista polonês Ryszard Kapuscinski, único correspondente estrangeiro a fazer a cobertura desses jogos escreveu o livro "A Guerra do Futebol" (Companhia das Letras, 2008), em que relata o episódio que se concretizou em conflito armado por causa de uma partida de futebol. Em ano de Copa do Mundo, vale a pena ler. (Pesquisa: Nilo Dias)

 Monumento a "Guerra do Futebol", em Honduras.

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

O futebol brasileiro começou por Paranapiacaba (SP)

São diversas as lendas e histórias que circulam por lá. Eu freqüento a vila há quase 5 anos,  pois faço trilha na região. Lá cheguei a ouvir as seguintes histórias:

A verdadeira história do futebol brasileiro ainda não está devidamente esclarecida. Muitas são as versões que contam a chegada do esporte criado pelos ingleses ao nosso país. A maioria dos historiadores atribui a Charles Miller o feito. Mas não é unanimidade.

Existem registros que comprovam a prática do esporte no país já em 1874, quando marinheiros estrangeiros disputaram uma partida na praia do Botafogo. Fala-se também que entre 1875 e 1876, no campo do Payssandu Atlético Clube, no Rio de Janeiro, funcionários de duas companhias teriam jogado uma partida. Em 1878 tripulantes do navio “Criméia” jogaram futebol em um terreno descampado, frente à residência da Princesa Isabel, no Rio de Janeiro.

Em 1886, o Colégio Anchieta, em Nova Friburgo (RJ), por influência de padres jesuítas promovia regularmente a prática do novo esporte. É dito também que em 1882, um homem chamado Mr. Hugh teria introduzido o futebol em Jundiaí (SP), entre seus funcionários.

Historicamente o Bangu A.C., tradicional time do Rio de Janeiro também vem contestando o pioneirismo de Charles Miller. Para o clube de “Moça Bonita” teria sido o escocês Thomas Donohe o introdutor do futebol em terras tupiniquins. Thomas era um técnico da firma inglesa “Platt Brothers and Co.”, de Southampton, e tinha sido contratado para ajudar na implantação da fábrica textil de Bangu.

Em 1894, quatro meses antes de Charles Miller, Thomas teria ido a Inglaterra e de lá trazido uma bola de futebol, dando o pontapé inicial ao esporte no Brasil, em maio daquele ano. 

Já o historiador Loris Baena Cunha fala da existência de registros de uma partida entre funcionários ingleses da “Amazon Steam Navigation Company Ltd.”, da “Parah Gaz Company” X “Western Telegraph”, no Pará, em 1890.

Também se diz que o primeiro jogo de futebol realizado no Brasil, dentro das regras estabelecidas na Inglaterra, foi disputado no dia 14 de abril de 1895 na Várzea do Carmo, em São Paulo, reunindo os times da “San Paulo Gás Company” e da “Estrada de Ferro São Paulo Railway”, vencido por este pelo escore de 4 X 2. Os dois times eram formados por amigos de Miller, todos da elite de São Paulo, filhos de barões do café e engenheiros.

Mas essa versão pode não ser verdadeira. Na pequena vila de Paranapiacaba, hoje pertencente ao município de Santo André (SP), ainda resiste ao tempo o campo de futebol mais antigo do país, inaugurado em 1894, um ano antes do jogo promovido por Charles Miller na Várzea do Carmo. Hoje, ostenta o nome de “Campo Charles Miller” e se localiza na Avenida Fox, S/N.

Para quem não conhece, Paranapiacaba é um distrito, que pertence a Santo André, embora seu território não esteja dentro da cidade. A história do lugar começou com a chegada da Companhia Inglesa de trens, a “São Paulo Railway”, que operava a estrada de ferro Santos-Jundiaí. Atualmente a Vila é um “museu a céu aberto” sobre o transporte ferroviário.

As primeiras casas rústicas foram construídas por volta de 1867 até a década de 30. Nos anos 40 a vila e a ferrovia foram incorporadas à malha ferroviária do Estado, a antiga Fepasa. A partir desta época começou um processo de degradação nas casas.

Muitos ingleses que moravam por lá voltaram ao seu país de origem, com as famílias levando inclusive os restos mortais que estavam no cemitério da antuiga Vila Inglesa, que em 1907 passou a se denominar Paranapiacaba.

Sabe-se da existência de outros gramados históricos no Brasil, mas nenhum que resista há tanto tempo e receba partidas até hoje em caráter de amistosos. O campo da Vila, localizado na parte baixa da Vila, se encontra abandonado, com grama alta e gols sem rede, cercado de árvores, ruas ainda de terra e é vizinho de casas de madeira do século XIX. Os moradores, entretanto, garantem que de vez em quando a bola rola por lá.

Mas essa situação de abandono pode estar com os dias contados. A vila de Paranapiacaba foi contemplada com recursos do “PAC Cidades Históricas” e, dentre os projetos, há um de restauração do campo de futebol, que deve passar por uma boa reforma.
A antiga Vila Inglesa que guarda mais de um século de vida, atualmente não tem um projeto oficial para a Copa de 2014. Mas sabe-se que Paranapiacaba deseja "oficializar" que abriga o campo de futebol mais antigo do Brasil, num amistoso entre Seleção do ABCD e Seleção de ex-jogadores italianos (masters), com presença do neto de Charles Miller, Charles Miller Neto. Neste evento, também vai ser descerrada uma placa de prata à entrada do estádio municipal do União Lyra Serrano.

Não se tem registros que comprovem, mas sim suspeitas de que ali naquele pedaço vivo da história Anglo-Brasileira, tenha sido realmente jogada a primeira partida de futebol no país. É certo que o legado britânico não se estendeu apenas ao universo ferroviário. A vila abriga um dos campos de futebol mais antigos do Brasil, aberto no final do século 19, onde, reza a lenda, jogou Charles Miller, ele próprio um ex-funcionário da SPR.

Historiadores, livros e autoridades atestam que nesse local foi escrita uma das histórias mais românticas do futebol no País. O secretário de Gestão de Recursos Naturais de Paranapiacaba e Parque Andreense, Ricardo Di Giorgio, não tem dúvida em dizer que ali ocorreu o primeiro chute na bola no Brasil.

E desafia quem for contra a sua tese de que o futebol nacional começou naquele campo que prove o contrário com os devidos documentos. Di Giorgio está apoiado em registros bibliográficos.

Por exemplo: o livro “Caminho do Café”, de Cremilda Medina, cita em um trecho que “Do chute inicial em 1894, aos dias atuais, mudanças radicais mexeram com a história do futebol que se propagou pelo País inteiro”. Já o escritor inglês John Robert Mills também escreveu sobre o assunto em 2003, afirmando que o futebol chegou primeiro em Paranapiacaba.

O escritor e historiador esteve há seis anos na Vila numa homenagem ao neto de Charles Muller, em festa que aconteceu na sede do clube do União Lyra Serrano, que jogaram contra os veteranos do Corinthians, que trouxeram Zenon e Dinei, entre outros.

O historiador Ademir Médici, autor de mais de 25 livros de diversos temas sobre a região do ABCD paulista, garante com base em sua longa experiência no jornalismo, que o futebol sequer passaria perto de Paranapiacaba, caso não fosse os ingleses. Eles chegaram na Vila por volta de 1861 às margens dos trilhos da São Paulo Raillway (SPR), verdadeiro canteiro de obras, na construção da estrada de ferro.

Assim, em meados de 1894, chegou à Paranapiacaba aquele que é proclamado como o pai do futebol brasileiro, Charles Miller, que estudou na Inglaterra e, em férias, trouxe ao Brasil duas bolas de futebol e regras do jogo, e quatro ou cinco pares de chuteiras. Charles foi telegrafista da São Paulo Raillway.

O mini-documentário “Estádios Extintos, do Apogeu ao Ostracismo”, trabalho apresentado na Universidade Metodista, em São Bernardo do Campo (SP) pelo jornalista Diego Salgado, buscou saber onde ficavam os primeiros campos de futebol. Se em Paranapiacaba, histórica vila ferroviária inglesa, no alto da Serra do Mar, ou no centro de São Paulo, no miolo do Velódromo criado em 1892 por Veridiana Prado para seu filho Caio Prado.

A equipe responsável pelo filme ouviu pesquisadores e fanáticos por futebol . O documentário começa em um local histórico: o quarteirão do Teatro de Cultura Artística, no bairro paulistano da “Consolação”, onde ficava o antigo estádio do Velódromo, o primeiro campo oficial da cidade, palco dos primeiros campeonatos paulistas. E fala sobre os campos da “Chácara Dulley”, no Bom Retiro, o primeiro “Palestra Itália”, e a construção do “Pacaembu”.

O primeiro time de futebol que se tem notícia em Paranapiacaba foi o Serrano Atlético Clube, fundado em 1903. Não existem muitos registros que contem a trajetória do clube. Sabe-se de um fato que até hoje orgulha os habitantes da Vila: em julho de 1925, no histórico campo mais velho do Brasil, o Serrano Atlético Clube derrotou o poderoso Corinthians Paulista por 2 X 1. A taça que lembra o feito, está até hoje exposta na Sala de Troféus do clube.

O Serrano A.C. foi o primeiro time de futebol de toda a região do ABC a ser fundado. Congregava ferroviários da “São Paulo Railway”. Chegou a enfrentar grandes clubes do futebol paulista como Santos e Corinthians. Em 1930 fez fusão com a Sociedade Recreativa Lyra da Serra, quando passou a se chamar Clube União Lyra Serrano.

O edifício do clube União Lyra Serrano, no Alto da Serra, representa um dos mais antigos clubes de "football" do Estado. Aos domingos à noite havia uma sessão de cinema mudo, geralmente com filme em série. No salão cada grupo de família tinha os seus lugares certos. A orquestra era composta de músicos locais.

Também existia um salão para jogo de bilhar, e nos fundos dois campos para bochas. A Sociedade Recreativa Lyra da Serra, hoje, União Lira Serrano, em razão da união feita com o Serrano Football Club, tem sede ampla com salões para cinema e bailes, jogos diversos e biblioteca e o campo de futebol, que ocupa local de destaque, dentro da Vila.

Em 1907, começaram as construções da sede atual que, em 1938, foi ampliada adquirindo a feição hoje existente: um grande edifício de dois andares, totalmente construído em madeira de lei, principalmente pinho-de-riga, importada da Inglaterra.

Antigamente, ao final da escada de madeira, na porta de um camarote, podia-se: “Este reservado é de uso exclusivo dos senhores Mr. Alfred E. Whitton, Dr. Jorde A. Boeri, Arno L. M. da Veiga e respectivas famílias”. Outrora, os degraus de todas as escadas internas recebiam tapetes de veludo.

Quem chega hoje em Paranapiacaba certamente não pode imaginar que aquele campo com grama alta e uma arquibancada pequena, um dia sediou jogos de times profisionais. O União Lyra Serrano jogou divisões inferiores do “Campeonato Paulista”, enfrentando os tradicionais Jabaquara, Portuguesa Santista e Nacional, fundadores da Federação Paulista de Futebol (FPF).

Foi assim até 1935, quando o clube abandonou o futebol profissional e se dedicou ao amadorismo, até paralisar as atividades. Hoje, realiza apenas jogos amistosos. Mas tem quem queira levantar o time. Antonio Fernando, espécie de presidente, que tem um bar perto do campo, o “Bar do Paulo”, busca meios para levantar o União novamente.

Nas prateleiras do bar, dona Silvia, uma das funcionárias, mostra alguns troféus, diversas bolas e camisas do Lyra, em branco e preto. E um exemplar de camisa que poderia valer hoje mais de R$ 250. E sempre nas cores branca e preta.

Os ex-jogadores mais antigos lembram que o Serrano sempre teve muitos atletas com apelidos, casos de “Fanta”, “Índio”, “Pícoli”, “Bitelo”, “Panqueca”, “Bocudo”, “Redondo”, “Hervedera”, “Zé Grandão”, “Zé Galinha”, “Tartucci”, “Frujuelli”, “Cachaça”, “Pau Mandado”, “Cirillo Gago”, “Jumento”, “Rolha”, “Chamuscado”, “Valtão”, “Boquita”, “Sarampo” e “Juca Pato”, entre outros.

“João Gordo”, 67 anos, ex-maquinista de trem, lembra que os jogadores de outras cidades adoravam jogar na Vila porque viajavam de trem. Aos domingos, logo pela manhã, o trem chegava apitando no pequeno vilarejo e acordando os seus moradores.

Mas o futebol pode estar retornando a antiga Vila Inglesa. Em 14 de abril de 2010 foi fundado o União Esportiva Charles Miller. O novo clube surgiu na mesma data em que foi realizado o primeiro jogo de futebol no Brasil.

O evento teve início no Clube Lira Serrano, onde foi apresentado a todos o neto do pai do futebol, Charles Miller Júnior, que acompanhou a homenagem à seu avô, mostrado através do telão a história de Charles Miller.

O escritor John Robert Mills, autor da biografia de Charles Miller, disse estar feliz pela iniciativa da criação do time e não poderia ser em um lugar melhor, pois Paranapiacaba era a rota obrigatória dos europeus, que chegavam no Porto de Santos e subiam a Serra em direção à São Paulo. “Charles Miller, em uma de suas viagens, trouxe na bagagem a bola, a chuteira e as regras do jogo”, conta Mills.

O presidente do União Esportiva Charles Miller, Carlos Machado, conta que a idéia do time começou com jovens da escola municipal de Paranapiacaba e, dentre os nomes sugeridos, escolheram Charles Miller, com objetivo de homenageá-lo. Contou que jamais esperou que tivesse tamanha repercussão.

Depois o União Esportiva Charles Miller realizou um jogo amistoso contra equipe Master do S.C. Corinthians Paulista, que trouxe entre outros os ex-jogadores Dagoberto (suplente de Ronaldo nos anos 80 e 90), Pavão (lateral), os zagueiros Guinei e Dama, Ezequiel (volante), Agnaldo (ponta direita) e Zenon (meia e ex-seleção brasileira).

Também foi apresentado o uniforme do time, vermelho e branco, com o escudo mostrando uma locomotiva, que simboliza a chegada da ferrovia no Brasil e, à frente, a bola trazida por Charles Miller e o limpa trilho com as cores da Inglaterra.

Quantos gols já teriam sido marcados nesse velho estádio de Paranapiacaba? Quantos sonhos este campo teria alimentado? A arquibancada singela ao fundo segue preparada para receber torcedores que queiram assistir a um jogo amador, e reviver parte do passado do futebol no Brasil.

Paranapiacaba é considerada um museu a céu aberto, pois a Vila remete todos às épocas do século XIX, com construção inglesa, possuindo inclusive a réplica do “Big Bem”. Traz em seu campo de futebol o mesmo clima da primeira partida realizada em 1894.

E se tiver sorte, vai apreciar um lindo espetáculo da natureza, a neblina, que cobre histórias, campos, trens Em questão de minutos, o sol some e a neblina cobre toda a Vila.

Uma pena que os trilhos que levam até a vila estejam cada vez menos utilizados (apenas para transporte de cargas e trens turísticos, com passagens mais caras). Mas de qualquer maneira seria bom fazer essa atraente viagem ao passado, e conhecer um local de muita história para o futebol brasileiro. (Pesquisa: Nilo Dias)

O histórico campo de Paranapiacaba, o mais antigo do futebol brasileiro

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

O time dos ferroviários de Pernambuco

A Associação Atlética Great Western foi fundada em 17 de março de 1928, em Recife (PE), por funcionários da "Great Western of Brazil Railway Company Limited", empresa encarregada da construção de ferrovias no país. O uniforme do clube tinha as cores vermelha e branca.

Na época o futebol era o hobby de ingleses residentes na cidade, que praticavam o novo esporte até nos quintais das suas casas. A maioria era funcionários de companhias britânicas como a "Great Western" e a "Pernambuco Tramways and Power Company Limited", responsável pelos serviços de bonde e energia elétrica no Recife.

A A.A. Great Western realizava seus jogos no "Estádio Jefferson de Freitas", em Jaboatão dos Guararapes, que tinha capacidade na época para abrigar até cinco mil espectadores. O estádio ainda existe, mas não está mais apto para receber jogos de profissionais, pois suas medidas estão fora dos padrões exigidos pele Federação Pernambucana de Futebol (FPF).

Até 1995 o América, do Recife, que já foi campeão pernambucano em 1918-1919, 1921-1922, 1927 e 1944, realizava seus jogos no "Jefferson de Freitas". Antigamente existia em Jaboatão da Serra um time de futebol chamado Portela, que pertencia a fábrica de papel e que também jogava no estádio local. Até chegou a disputar o Campeonato Pernambucano.

Um de seus maiores incentivadores foi o oficial da Marinha, Heleno Gomes Nunes, que mais tarde foi almirante e presidente da Confederação Brasileira de Desportos (CBD), entre os anos de 1975 e 1979, e da atual Confederação Brasileira de Futebol (CBF), de 1979 a 1980.

Como A.A. Great Western, o clube participou de 16 campeonatos pernambucanos em sua divisão principal com o seguinte desempenho: 203 jogos, 122 pontos ganhos, 51 vitórias, 20 empates, 132 derrotas, gols pró 324 e gols contra 675.

Em 1955 mudou seu nome para Clube Ferroviário do Recife, e até 1994 quando foi rebaixado para a 2ª divisão estadual, disputou 39 campeonatos com o seguinte desempenho: 708 jogos, 442 pontos ganhos, 154 vitórias, 134 empates, 420 derrotas, gols pró 697 e gols contra 1458.

Disputou o primeiro Campeonato Pernambucano de futebol em 1932 na “Série Branca”, com a seguinte campanha:

1º turno. 17-4, 2 X 3 Fluminense do Recife; 8-5, 1 X 5 Santa Cruz; 5-6, 6 X 2 Israelita; 3-7, 2 X 9 América e 24-7, 3 X 4 Flamengo. 2º turno. 28-8, 5 X 3 Fluminense do Recife; 11-9, 3 X 4 Santa Cruz; 2-10, 3 X 1 Israelita; 9-10, 3  X 4 Flamengo e 23-10, 2 X 2 América.

O time terminou na 7ª colocação com 7 pontos ganhos, conquistando 3 vitórias, 1 empate e 6 derrotas. O ataque marcou 30 gols e a defesa sofreu 37 gols.

Em 19-07-1936 o Great Western sofreu uma goleada de 13 X 1 do campeão Tramways. Foi o pior resultado obtido em toda a sua história. A equipe retornava ao campeonato pernambucano, depois de ter ficado fora das disputas de 1934 e 1935.

Mesmo sem participações brilhantes no certame estadual, o time conseguiu alguns resultados expressivos: 30-5-1937, 4 X 2 Sport Recife; 14-8-1938, 4 X 1 Tramways; 18-8-1940, 3 X 1 Naútico; 6-3-1941, 3 X 1 América e 3-7-1941, 5 X 2 Santa Cruz.

Em 1955 o nome de A.A. Great Western mudou para Ferroviário Esporte Clube do Recife e depois para Clube Ferroviário do Recife, denominação que mantém até hoje. A sede atual pertencia ao senhor Soares Raposo, rico fazendeiro e o maior abatedor de gado do Estado. Em 1928, ele vendeu todo o seu patrimônio à Empresa Great Western. Os ingleses cederam esse patrimônio a Associação Atlética Great Western.

Com o nome de Ferroviário o clube participou do Campeonato Brasileiro da Série B, em 1972. Na ocasião o bairro de "Afogados", no Recife viveu momentos de grande mobilização popular. Infelizmente o time não fez uma boa campanha e terminou na 21ª colocação geral.

Vale dizer que a ferrovia iniciava no bairro de "Afogados", próximo à Casa de Detenção, atual Casa da Cultura, passando por Vitória de Santo Antão, Gravatá, Bezerros e terminando em Caruaru.

Nessa época, Vitória de Santo Antão possuía mais de 70 engenhos, Bezerros, mais de 20 fábricas de rapadura e Caruaru exportava para o Recife uma grande quantidade de solas, couros, algodão, queijo, feijão, além de realizar uma das maiores feiras de gado da região.

Apesar do Ferroviário estar fora da 1ª divisão pernambucana há muito tempo, sua colocação no ranking estadual ainda é boa, ficando atrás somente dos quatro chamados grandes, América, Sport, Náutico e Santa Cruz e do Central, de Caruaru, força emergente do interior. O time está fora até da 2ª divisão, desde 2009, por falta de estádio para mandar seus jogos. (Pesquisa: Nilo Dias)

 Escudo da extinta A.A. Great Western