Boa parte de um vasto material recolhido em muitos anos de pesquisas está disponível nesta página para todos os que se interessam em conhecer o futebol e outros esportes a fundo.

quarta-feira, 31 de julho de 2013

O estádio mais antigo da Argentina

Um dos estádios mais antigos da Argentina, ainda em atividade, é o “Arquitecto Ricardo Etcheverri”, localizado no bairro de “Caballito”, em Buenos Aires e inaugurado em 2 de Janeiro de 1905, um ano após a fundação de seu proprietário, o Ferro Carril Oeste. Hoje tem capacidade para 24.442 torcedores. É um dos poucos estádios da Argentina que permanece no mesmo lugar desde o início do século XX. Foi construído nos fundos de um terreno da linha de trem "Ferro Carril Oeste".

O estádio ganhou oficialmente o nome de “Arquitecto Ricardo Etcheverri” em 1995. É uma homenagem para quem serviu o clube como seu vice-presidente por cerca de 30 anos.

Para erguer o estádio o Ferro Carril Oeste usava uma política de venda de jogadores em troca de materiais de construção, como madeira e chapas de zinco. Até hoje o “Ricardo Etcheverri” possui alguns lances de arquibancadas de madeira, por isso é conhecido como "El Templo de Madera" ou "El Monumental de Madera", numa referência ao Estádio Monumental de Nuñez do River Plate.

A bela tribuna semi-coberta, construída em 1976, foi a única inovação no estádio em mais de um século. Todo o restante permanece com a mesma estrutura dos tempos da fundação. Embora a capacidade atestada seja de 24 mil torcedores, era comum o clube jogar para mais de 35 mil pessoas nos anos 1980. Hoje, o Ferro joga para plateias de, no máximo, oito ou 10 mil pessoas

Devido a sua localização privilegiada, no centro geográfico de Buenos Aires, as principais equipes argentinas já o utilizaram em oportunidades em que não podiam usam seus próprios estádios. Entre eles River Plate, Boca Juniors, Vélez Sarfield, San Lorenzo de Almagro e, mais recentemente o Argentinos Juniors. A história registra incêndios que destruíram parcialmente o estádio, em longos períodos de empréstimo a outros clubes portenhos.

O Ferro Carril Oeste já foi uma das maiores potências futebolísticas da Argentina nos anos 80. Hoje vive uma situação de imensas dificuldades. Longe da elite, o Ferro experimentou dois descensos, uma falência e um sem número de fracassos dentro e fora de campo, sendo agora um mero figurante das divisões inferiores.

A torcida, antes enorme, agora resume-se aos moradores do bairro e frequentadores da sede social. Dos 50 mil sócios de antes, hoje não passam de 10 mil.

A responsabilidade de todo esse declínio se deve a seguidas más administrações. A história vitoriosa do clube começou com um dirigente chamado Santiago Leyden (1933-2002), que presidiu o Ferro por longos 30 anos (1963-1993), período em que foi por duas vezes campeão argentino (1982 e 1984) e três vices, além de conquistas no basquete (três Ligas Nacionais e três Sul-americanos) e no vôlei (12 torneios nacionais e três continentais).

Foi Leyden que ergueu a tribuna de cimento do antigo estádio de madeira – que ganhou o nome de “Arquitecto Ricardo Etcheverry”, seu vice e responsável pelo projeto do novo setor –, um ginásio poliesportivo para oito mil pessoas e todo o sistema de iluminação do complexo. Foi o homem que colocou o clube numa situação de grandeza, mas teve um pecado fatal: não soube a hora de entregar o cargo para outro.

Sem dúvida foi um dirigente extraordinário, mas ficou tempo demais à frente do clube. E quando isso acontece, tudo se contamina e se afasta da realidade”.

Quando finalmente Leyden deixou a presidência, a situação financeira do Ferro Carril Oeste já era dramática e se agravou nos anos seguintes. Torcedores e sócios abandonaram o clube aos milhares.

A maior renda vinha da sede social, mas como parte de uma nova realidade que também se verificou nas agremiações brasileiras, estas, a partir dos anos 90, perderam a importância de antigamente. As receitas com patrocínios também despencaram, e nem de longe justificam o emaranhado de desconhecidas marcas estampadas no uniforme verde com detalhes em roxo.

Dentro de campo, os resultados também não ajudaram. Diante de tudo isso foi um passo para a falência completa, no começo dos anos 2000. Antes mesmo de ter a insolvência decretada, o Ferro desceu para a segunda divisão – e para a terceira no ano seguinte. Acabou voltando para a B Nacional, mas nunca mais para a elite.

Tudo aconteceu num cenário agravado pela crise financeira que atingiu a Argentina. O país chegou a ter cinco presidentes em 12 dias no fim de 2001, o que também colaborou para levar à bancarrota o grande Racing Club.

“No me olvido ese día/ que una vieja chiflada decía/ Que Racing no existía/ que tenía que ser liquidado”, canta “La Guardia Imperial”, em referência ao episódio em que a torcida evitou que um dos clubes mais vitoriosos da história encerrasse as atividades. Ao contrário do Racing, no entanto, o Ferro nunca mais conseguiu se recuperar, e as gestões seguintes apenas agravaram a situação.

O Ferro é atualmente o 14º classificado em um campeonato disputado por times desconhecidos como Aldosivi, Crucero del Norte, Douglas Haig e Patronato.

Os torcedores que ainda restam, não lamentam tanto a ausência de jogos contra os chamados ”grandes” do futebol argentino, Boca, River, San Lorenzo, Racing e Independiente. Mas a disputa do “Clássico do Oeste”, contra o Vélez Sarsfield, rival com quem compartilha o ramal ferroviário que cruza a cidade do centro até o limite Oeste, no bairro de Liniers.

A linha de trem, por sinal, tem importância destacada para estes dois e para grande parte dos times portenhos: enquanto o Ferro foi fundado em 1904 por um grupo de 95 funcionários da companhia inglesa “Buenos Aires Western Railway”, o Vélez emprestou seu nome a antiga “Estação Vélez Sarsfield”, hoje “Floresta”, o bairro onde se fixou outro clube, o All Boys.

Já o Vélez não encara mais a rivalidade com o Ferro, como antes. O clube está em outro patamar, tendo sido campeão da Libertadores e do Mundial em 1994. Embora não tenha deixado de ser um dos tantos clubes de bairros de Buenos Aires, como o próprio Ferro e mais All Boys, Nueva Chicago, Chacarita, Atlanta, Huracán, Argentinos Juniors, Barracas Central, Defensores de Belgrano, entre outros.

A diferença é que o Velez encara de igual para igual as equipes de maior torcida e tradição. Desde 1993, foram oito títulos argentinos – só o River ganhou mais – e cinco internacionais. Além de um estádio que pode ser considerado exemplar, o Vélez ostenta um dos elencos mais fortes e regulares do país.

Para o Ferro só resta o passado. Assistir a uma partida no antigo estádio de madeira é como voltar a tempos idos. O complexo esportivo vive um estado de abandono, o que reforça essa impressão. Fala-se que o velho estádio de “Caballito” vai passar por uma ampla e necessária reforma.

A curva do lado oposto à Platea Sur e a arquibancada central já foram parcialmente desmontadas. A promessa é que os dois setores serão reconstruídos, com cimento mesmo, a exemplo da tribuna principal. Mas o problema é a falta de dinheiro para levar adiante a obra.

Hoje o time joga para um público envelhecido e saudosista, muito distante da média de 20 mil torcedores dos tempos áureos. Os torcedores populares de antes não existem mais. O que se vê no estádio agora é uma torcida de classe média. Pobres não assistem mais os jogos do Ferro.

E isso tem uma razão de ser. O bairro de “Caballito” também mudou, está hoje repleto de novos condomínios de alto padrão, alguns dos quais cortando todo o horizonte que antes se tinha a partir do estádio.

É um cenário contrastante com o que se costuma observar na maior parte dos estádios argentinos: o “Arquitecto Ricardo Etcheverry” fica encravado em uma zona bastante populosa, mas tranquila ao extremo. É possível caminhar pelas avenidas paralelas, incluindo a Rivadavia, a maior do país, sem se dar conta da existência de um estádio ali perto.

Os argentinos herdaram dos ingleses o costume de apelidar os estádios que poucos são conhecidos pelos seus nomes oficiais, como mostro abaixo:


Alberto José Armando (Boca Juniors): “La Bombonera”; Monumental Antonio Vespucio Liberti (River Plate): “Monumental de Núñez”; Libertadores de América (Independiente): “Doble Visera”; Juan Domingo Perón (Racing): “Cilindro de Avellaneda”; Pedro Bidegain (San Lorenzo): “Nuevo Gasómetro”; José Amalfitani (Vélez Sársfield): “El Fortín” e “Liniers”; Tomás Adolfo Ducó (Huracán): “El Palacio” e “Parque Patricios”; Ciudad de La Plata (clubes de La Plata): “Único”; Juan Carlos Zerillo (Gimnasia y Esgrima La Plata): “Del Bosque”; Dr. Lisandro de la Torre (Rosario Central): “Gigante de Arroyito”; El Coloso del Parque (Newell’s Old Boys): “Parque Independencia”; Néstor Díaz Pérez (Lanús): “Ciudad de Lanús” e “La Fortaleza”; Chateau Carreras (clubes de Córdoba): “Olímpico”; Juan Domingo Perón (Instituto): “Monumental de Alta Córdoba”; Brigadier General Estanislao López (Colón): “Cementerio de Elefantes”; Arquitecto Ricardo Etcheverri (Ferro Carril Oeste): “Caballito”; Julio Humberto Grondona (Arsenal): “El Viaducto”; Centenário Dr. José Luis Meiszner (Quilmes): “Centenário”; Feliciano Gambarte (Godoy Cruz): “La Bodega” e José María Minella (Aldosivi): “Mundialista de Mar del Plata”. (Pesquisa: Nilo Dias)

O velho Estádio Arquitecto Ricardo Etcheverri. (Foto: Acervo fotográfico do Ferro Carril Oeste)

segunda-feira, 29 de julho de 2013

O diabo boliviano

Marco Antônio Etcheverry Vargas, ou simplesmente Etcheverry, nasceu em 26 de setembro de 1970 na cidade boliviana de Santa Cruz de la Sierra. Começou a carreira jogando no Destroyers (Bolívia), onde ficou entre 1986 e 1989. O primeiro título conquistado em sua carreira foi pelo Bolivar, em 1991, quando foi campeão boliviano.

Atualmente Etcheverry é treinador. Ele ganhou destaque internacional nas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 1994, quando teve uma atuação destacada diante da Seleção Brasileira, naquela que foi a primeira derrota do onze “canarinho” em eliminatórias.

Foi ele o autor do gol, um frango de Tafarel, a dois minutos do fim, que abriu caminho para colocar a seleção boliviana na Copa dos Estados Unidos. A Bolívia venceu o Brasil por 2 X 0. O jogador garante que em 1993 viveu o melhor momento de sua carreira. Em 14 de novembro daquele ano se lesionou e passou por momentos difíceis.

Foi no jogo contra o Brasil que Eccheverry ganhou o apelido de "El Diablo". O jogador diz que isso não é algo que lhe agrada, mas se o reconhecem dessa forma, nada pode fazer. De qualquer jeito vê o apelido como algo carinhoso.

De herói das eliminatórias, virou vilão boliviano da Copa de 1994, disputada nos EUA: visivelmente fora de forma, jogou apenas quatro minutos contra a Alemanha, pois foi logo expulso depois de cometer jogada violenta no astro alemão Lothar Matthäus. A Bolívia foi eliminada na primeira fase da competição, com duas derrotas e um empate em três jogos disputados.

No entanto o craque afirma que sua expulsão foi uma decisão localista do árbitro, que claramente quis favorecer a Alemanha. Foi assim durante toda a partida. Etcheverry  disse que não tinha condições de jogar aquela Copa, pois vinha de uma grave lesão, e a convocação foi um prêmio pela sua performance nas Eliminatórias. Acabou entrando em campo com gana e força de vontade demais.

No ano de 2006 encerrou sua carreira, aos 35 anos de idade, em um jogo festivo em Santa Cruz de la Sierra, onde reuniu os jogadores da seleção que derrotou o Brasil nas eliminatórias de 1993, mais algumas estrelas do futebol latino como José Luís Chilavert, Carlos Valderrama, Alex Aguinaga, Fernando Gamboa entre outros.

Com 109 gols na carreira e passagem por 10 clubes diferentes, assim como os jogadores Higuita (Colombia), Del Solar (Perú) e Hugo Sanchez (México), escreveu seu nome na história defendendo a seleção de seu país.  A 12 de abril foi condecorado como "Cidadão Meritório" pela Câmara dos Deputados boliviana. Em 2008, fez sua estréia como técnico, primeiro na Sociedad Deportiva Aucas, do Equador e depois na equipe boliviana do Oriente Petrolero.

Como jogador Etcheverry defendeu os seguintes clubes: Destroyers, da Bolívia (1986-1989); Bolívar, da Bolívia (1990-1991 e 2004); Albacete, da Espanha (1992 e 1993); Colo-Colo, do Chile (1994); América de Cáli, Colômbia (1995); DC United, dos Estados Unidos (1996 a 2003); Barcelona, do Equador (1997 a 1999); Emelec, do Equador (1998) e Oriente Petrolero,da Bolívia (2001). Como treinador: Oriente Petrolero, da Bolívia (2008).

Pela seleção boliviana disputou 71 jogos, tendo marcado 13 gols, mesmo atuando como meio campo, e participado de uma Copa do Mundo. Em 2010 participou da Comissão Técnica da Seleção Sub-15 da Bolívia, que participou dos Jogos Olímpicos da Juventude, realizados em Cingapura. O técnico era Douglas Cuenca.

Títulos conquistados como jogador: Campeão boliviano pelo Bolívar (1991); Copa Chile, pelo Colo-Colo (1994); Campeão equatoriano pelo Barcelona (1997); Campeão boliviano pelo Oriente Petrolero (2001); Copa Interamericana pelo DC United dos Estados Unidos (1998); Copa dos Campeões da Concacaf pelo DC United dos Estados Unidos (1998); MLS Cup(1996, 1997, 1999 e 2004); MLS Supporters' Shield (1997 e 1999) e US Open Cup (1996), todas essas conquistas pelo DC United.

No clube norteamericano Etcheverry jogou 191 partidas, marcou 34 gols, registrou 101 assistências. Os números de jogos e assistências são recordes ainda não batidos na equipe. Em 2005, Etcheverry foi eleito por jornalistas e dirigentes um dos melhores jogadores da história da MLS, a liga de futebol dos EUA. Em outubro de 2007, Etcheverry foi homenageado pelo DC United em uma partida comemorativa dos 10 anos do título de 1997.

Como todo o jogador que se preza, Etcheverry garante que se espelhou em sua carreira profissional em dois grandes jogadores: Zico, o astro do Flamengo e Maradona, o craque argentino. Disse ainda que sempre gostou do Flamengo e lamenta não ter jogado pelo clube carioca. (Pesquisa: Nilo Dias)


quinta-feira, 25 de julho de 2013

Morreu o "homem de aço"

Faleceu na última terça-feira, 23, no Hospital Hélio Angotti, em Uberaba (MG), onde residia, o jogador bi-campeão do mundo (1958 e 1962), Djalma Santos. Seu nome completo era Dejalma dos Santos. Nasceu no bairro do Bom Retiro, em São Paulo, capital, no dia 27 de fevereiro de 1929. Ele tinha 84 anos e a morte foi decorrência de uma parada cardiorrespiratória, ocasionada por um quadro critico de comprometimento da função renal.

Era o único filho homem do casal Sebastião e Laura. Seu pai era soldado da Força Pública e foi lutar na Revolução Constitucionalista de 32 e não voltou mais. Djalma tinha apenas três anos de idade quando ficou órfão de pai. Enquanto o pai estava em batalha, a mãe, Dona Laura, lutava para que ela e os três filhos não morressem de fome.

Foram dias muito difíceis. Ainda criança escapou da morte por pneumonia. Sua mãe conheceu um carroceiro italiano, de nome Vitor e constituiu uma nova família, indo morar no bairro da “Parada Inglesa”. Mas as coisas mais uma vez correram mal para dona Laura e o padrasto de Djalma acabou morrendo num acidente. Com a morte de Vitor, a família se mudou mais uma vez, indo para uma vila próxima à “Parada Inglesa”.

As dificuldades para a sobrevivência eram enormes e o remédio era se virar como podiam. Durante algum tempo venderam quentão, pipoca e amendoim torrado na porta de um circo. Dona Laura também trabalhou como empregada doméstica, enquanto Djalma pajeava a filha da patroa em troca de gorjetas e comida.

Aos 12 anos Djalma, perdeu a mãe, vítima de câncer. Quem cuidou dele depois disso foi a sua irmã Anésia. Para ajudar nas despesas da casa, foi trabalhar numa fábrica de calçados.

Seu primeiro time foi o do Grupo Escolar da Parada Inglesa, onde estudava quando menino. Não pensava em se tornar jogador de futebol, queria mesmo era ser piloto de avião da Força Aérea Brasileira (FAB). Mas seu sonho foi por água abaixo, quando quebrou os ossos da mão direita em um acidente na máquina de costura de sapatos. O país perdeu um aviador, mas o futebol ganhou um craque.

Depois jogou no América (ou “Ameriquinha”), time de crianças do bairro. Também atuou pelo Internacional, outro time das redondezas onde morava. Eram os primeiros passos de uma longa e vitoriosa carreira.

Djalma chegou a fazer testes no Ypiranga e no Corinthians. Mas os horários dos treinos eram incompatíveis com o do seu trabalho como sapateiro. Só ficou na Portuguesa porque o patrão concordou que ele trabalhasse à noite, para compensar as horas perdidas no clube. Sua estréia na Lusa foi no dia 16 de agosto de 1948, no jogo em que seu time perdeu para o Santos por 3 X 2.

Graças ao seu extraordinário vigor físico ganhou o apelido de “homem de aço”. Fez história nos três grandes clubes por onde passou: Portuguesa de Desportos, Palmeiras e Atlético Paranaense.

No início, Djalma era chamado apenas de Santos e jogava na Lusa de centro-médio (o volante dos dias atuais). Em agosto de 1949, porém, o clube contratou outro jogador para a posição, Brandãozinho, da Portuguesa Santista, na maior transação da época. E Djalma Santos passou para a posição em que se consagraria definitivamente, a lateral-direita.

Pela Portuguesa, Djalma ganhou os Torneios Rio-São Paulo de 1952 e 1955. Foram 453 jogos entre agosto de 1948 e maio de 1959, quando se transferiu para o Palmeiras, onde jogou por quase 10 anos, tendo vestido a camisa alviverde em 498 oportunidades, sendo o sétimo jogador que mais vezes vestiu a camisa da equipe. Foi o segundo jogador que mais atuou pela Portuguesa em todos os tempos, ficando atrás apenas de Capitão, com 496 partidas.

Pelo Atlético Paranaense, onde encerrou a carreira profissional o lateral jogou até os 42 anos de idade, outra marca pouco comum para jogadores de futebol. No clube paranaense atuou ao lado do zagueiro Bellini, outro bicampeão mundial e do ex-santista Dorval.

Despediu-se do futebol em 21 de janeiro de 1971, prestes a completar 42 anos, em um jogo contra o Grêmio. Teve uma atuação soberba, digna de toda a sua brilhante carreira. Djalma Santos foi eleito para integrar o “Time dos Sonhos” do Atlético Paranaense.

Jogou ainda a tempo de ganhar seu último título estadual (1970) pelo rubro-negro, se tornando posteriormente treinador do próprio Atlético. Depois, Djalma Santos se tornou funcionário da Secretaria de Esportes, Lazer e Turismo de Uberaba, em Minas Gerais, onde coordenou a escolinha de futebol da cidade.

Djalma Santos vestiu a camisa do São Paulo F.C., no dia 9 de novembro de 1960, como convidado nos festejos da inauguração do Estádio do Morumbi, uma semana após a inauguração, na vitória sobre o Nacional, do Uruguai, por 3 X 0, com gols de Canhoteiro e Gino.

O lateral-direito havia sido convidado com Almir Pernambuquinho e Julinho Botelho para fazer parte do time e essa foi a forma encontrada para apresentar o recém-construído Morumbi aos torcedores dos outros clubes da capital paulista. Pelé também havia sido convidado, mas não pode jogar.

Em 1952, ainda como jogador da Portuguesa, Djalma Santos foi convocado pela primeira vez para a seleção brasileira. Naquele ano, disputou o Campeonato Pan-Americano de Futebol, no Chile, no qual o Brasil sagrou-se campeão.

Uma jogada característica dele se tornou bastante popular: a cobrança com força de laterais diretamente para dentro da área. Também foi um dos primeiros laterais brasileiros a apoiar o ataque.

Djalma Santos vestiu a camisa canarinho por longos 16 anos. Disputou quatro “Copas do Mundo”, sendo campeão em duas, 1958 e 1962. Participou de equipes que contavam com monstros sagrados do futebol mundial como Garrincha, Pelé, Vavá, Bellini, Zito como Zito e Nilton Santos.

Em 1954, participou de sua primeira Copa, na Suíça. Foi titular em apenas uma partida na Copa de 1958 - a final, contra os donos da casa, vencida pelo Brasil por 5 X 2 - substituindo De Sordi, que passara mal. O suficiente para ser considerado o melhor jogador da posição.

Na Copa seguinte, Djalma Santos se sagrou bicampeão mundial. Jogou mais uma Copa, a da Inglaterra, em 1966. Pela seleção brasileira, foram 111 apresentações, com 79 vitórias, 16 empates e 16 derrotas, tendo marcado três gols. Foi o primeiro atleta a superar a marca de 100 partidas pelo Brasil.

Ele e Pelé foram os únicos jogadores a iniciarem pelo menos uma partida como titulares da Seleção Brasileira em quatro Copas do Mundo. Djalma Santos e Franz Beckenbauer foram os dois únicos jogadores no mundo a terem sido escolhidos por três vezes consecutivas os melhores jogadores em suas posições em Copas do Mundo.

Graças a exuberância de seu futebol foi escolhido como o melhor lateral do mundo de todos os tempos. Foi o primeiro jogador brasileiro a integrar a seleção da FIFA. Isso aconteceu em 1963, quando se comemorou o centenário da Football Association (FA), a primeira associação de futebol do mundo e cujas regras tornaram-se a base do esporte até os dias atuais. Por isso, a data é considerada como o dia da criação do futebol.

Naquele dia a seleção dos melhores jogadores do mundo, escolhida pela “FIFA World Stars”, enfrentou o “English Team”, no lendário Estádio de Wembley, em Londres. De brasileiros, apenas Pelé e Djalma Santos foram convocados. Pelé machucado, não jogou, apenas Djalma teve tal privilégio.

Ao lado dele “feras” como Ferenc Puskás (Hungria), Alfredo di Stefano (Argentina), Eusébio Ferreira (Portugal), Francesco Gento (Espanha), Josef Masopust (ex-Tchecoslováquia) e o goleiro Lev Yashin (ex-União Soviética).

Outra grata surpresa estava prevista, além de fazer parte da seleção dos melhores jogadores do mundo. Djalma Santos ainda recebeu da FIFA outra grande honraria: fazer parte do rol da “FIFA 100”, uma lista de 123 homens e duas mulheres, considerados os melhores jogadores de futebol vivos na época. Isso aconteceu em 4 de março de 2004, como parte das celebrações do centenário da criação da Federação.

Viúvo de seu primeiro casamento, casou novamente, anos depois. Um fato notável de sua carreira foi o de nunca ter sido expulso de campo, ao longo de 23 anos de carreira e quase 1.600 partidas.

Títulos: Taça Brasil (1960 e 1967); Torneio Roberto Gomes Pedrosa (1967); Torneio Rio-São Paulo (1952, 1955 e 1965); Campeão Paulista (1959, 1963 e 1966); Campeonato Paranaense (1970); Campeão Pan-Americano pela Seleção Brasileira (1952); Campeão Mundial pela Seleção Brasileira (1958 e 1962). (Pesquisa: Nilo Dias)


segunda-feira, 22 de julho de 2013

O folclórico “Bataclan”

Cândido José dos Santos, o “Bataclan” foi uma figura como poucos. Eu cheguei a conhecê-lo nos anos 60, quando de suas visitas a Pelotas e Rio Grande. Lembro bem dele. Era um negro alto e forte, que as vezes andava de calção e camisa regata, correndo pelas ruas das cidades e outras elegantemente vestido de terno branco, camisa social, gravata, cartola e óculos de sombra.

Eu cheguei a entrevistá-lo, nos meus tempos de Rádio Tupancy, de Pelotas. Pena que não tenha guardado a gravação, senão saberia dizer com certeza detalhes da vida desse extraordinário e folclórico personagem. Pelo que sei o pesquisador Marcello Campos, autor de biografias de personagens como Norberto Baldauf e Alcides Gonçalves, estava preparando um livro sobre a história de “Bataclan”. Não sei se essa obra já foi lançada. O certo é que em Porto Alegre existe uma banda chamada “Bataclan F.C.”, que homenageia o atleta.

Talvez nesse livro o autor tire todas as dúvidas sobre a vida de “Bataclan”, um catarinense nascido em 1896, que como um verdadeiro cigano, percorreu o país quase de ponta a ponta. O certo é que ele andou por cidades como Rio de janeiro, Florianópolis e Curitiba antes de vir morar em Porto Alegre, na década de 1940.

Existem dúvidas se ele era realmente um dos membros do grupo teatral carioca “Companhia Negra de Revista”, que atuou apenas nos anos de 1926 e 1927. Ele garantia que isso era verdade. Não demorou para que “Bataclan” se tornasse famoso na cidade. Há quem diga que ele foi o mais querido personagem popular de todos os tempos em Porto Alegre.

De manhã, fizesse frio ou calor, era comum vê-lo correndo pelas ruas da capital, de calção e às vezes descalço. À tarde, exibia a herança dos tempos de teatro: vestindo terno, gravata e cartola. Percorria o centro da Capital propagandeando lojas, bares, bebidas, sabões e colchões, entre muitos outros produtos. Na época era chamado de “reclamista”.

“Bataclan” foi também um grande desportista, admirador do futebol e frequentador assíduo dos estádios. Em dias de jogos, muitas vezes distribuía alimentos para famílias pobres. Era um propagador das vantagens de uma alimentação natural.

Era vegetariano e não fumava, nem bebia. Tanto que viveu até os 94 anos. “Bataclan” faleceu em setembro de 1990, vitima de um derrame cerebral. Seu velório foi realizado no Salão Nobre da Prefeitura de Porto Alegre.

Aos fins de tarde “Bataclan” costumava sentar em um banco da Praça da Alfândega com a Rua da Praia, para descansar depois de um dia cheio de trabalho. Para todos que passavam sempre tinha um sorriso nos lábios. Chamava a atenção dos transeuntes com um aceno, tendo nas mãos um ramalhete de flores.

Ele era uma verdadeira estrela dos reclames de rua. Quase sempre levava consigo um artigo de jornal datado de 1941, em que era citado como “o popularíssimo propagandista verbal, conhecido em várias capitais do país por seus originalíssimos anúncios”.

Nos momentos de descanso e de lazer, “Bataclan” vestia seu tradicional e elegante terno branco enfeitado por um cravo vermelho preso à lapela. Contador de histórias, gostava de conversar e relatar coisas ligadas ao fisiculturismo.

Ele como bom vegetariano dizia que o marinheiro “Popye” adquiria sua força em virtude de uma dieta baseada em espinafres. E afirmava que ele também mantinha um físico atlético impecável, graças a seus hábitos saudáveis. E era verdade. “Bataclan” exibia os privilégios de uma constituição física olímpica praticando o seu coopermatinal pela cidade. E se não foi o primeiro corredor de Porto Alegre, certamente foi o mais ilustre.

“Bataclan” gostava de contar que certa vez correu sem parar para dormir ou descansar, durante quatro dias e três noites seguidos, margeando o Guaíba durante o crepúsculo. Não se sabe ao certo se isso realmente aconteceu, ou era apenas uma das muitas histórias que criava. Dizia ter dado uma centena de voltas no Gigante da Beira-Rio e depois, para não ser injusto, repetira o mesmo feito no Olímpico Monumental da Azenha.

De como ziguezagueara entre os túmulos dos cemitérios da Oscar Pereira orando a Deus pela alma de todos que ali jaziam e acenara de longe para os internos ao passar em frente do São Pedro; falou da cobertura da imprensa local e de como prestara esclarecimentos de seu desaparecimento a policiais que o acompanhavam numa viatura em movimento para que ele não perdesse o ritmo.

Lembrou a multidão que o ovacionara ao cruzar o Parque da Redenção e a bronca que levara da mulher ao chegar em casa. E concluiu dizendo que não se sentira exausto e nem angustiado. (Pesquisa: Nilo Dias)
A elegância de Bataclan contador de histórias. (Foto: Luiz, BD, 22/9/1976)

sábado, 20 de julho de 2013

“Charuto”, o torcedor símbolo

O torcedor símbolo do S.C. Internacional, de Porto Alegre nas décadas de 1930 e 1940, era um negro forte e folclórico que fazia biscates nas docas do caís do porto, na capital gaúcha, onde carregava caixas de frutas, verduras e legumes e guardava chuchus estragados para no domingo lançá-los na torcida gremista.

Todos os torcedores que frequentavam o velho Estádio dos Eucaliptos o conheciam. Andava sempre com roupas puídas e seu estado normal era alcoolizado. Como nunca tinha dinheiro para comprar ingressos em dias de jogos, contava com a ajuda dos porteiros que o mandavam entrar, ou com algum torcedor que lhe pagava o ingresso e de lambuja algumas cervejinhas.

Como estava quase sempre bêbado, em algumas ocasiões era proibido de entrar no estádio. Mas como era malandro, entrava nas arquibancadas de costas, para fingir que estava saindo, ao invés de estar entrando no estádio. Costumava sentar sempre na primeira fila. Nos anos 1940 o Internacional tinha um elenco poderoso, que formou o inesquecível "Rolo Compressor”.

Não raras vezes “Charuto”, já devidamente “calibrado” dormia deitado nas arquibancadas, depois de ter andado de um lado e outro do estádio gritando “Co-ro-ra-do! Co-ro-ra-do!" O curioso é que ele não assistia os jogos, costumava ficar de costas para o gramado.

O hoje escritor e comentarista, Luis Fernando Verissimo, colorado desde criança, lembra muito bem de “Charuto”, um personagem que o fascinou em seus tempos de infância. Ele chegou a lembrar em uma de suas crônicas daquele torcedor único, que foi para ele um exemplo de amor perene e incondicional pelo Internacional.

No dia 7 de dezembro de 1952, houve um Gre-Nal e o Inter venceu por 5 X 1. Entre os milhares de torcedores que lotavam os Eucaliptos, faltava um. Três dias antes da partida, “Charuto” envolveu-se numa briga e foi morto com uma facada nas cercanias do Mercado Público. Morreu assim.

Viveu como pôde, mas foi enterrado como príncipe, quando seu ataúde foi carregado pelos jogadores colorados devidamente fardados. Para aqueles que o conheceram, ainda faz falta. Hoje em dia, quando a “Popular” canta a estrofe "com a cachaça na mão", lembra que lá nos primórdios deste Internacional, tinha um colorado que iniciou tudo isso. (Pesquisa: Nilo Dias)

"Charuto'" dormindo sentado em um banquinho, no velho estádio dos Eucaliptos. (Foto reprodução: Revista do Globo)

quarta-feira, 17 de julho de 2013

O centenário estrelado

O Esporte Clube Cruzeiro, de Porto Alegre, completou no último domingo, 14, a marca histórica de 100 anos, sendo o quarto clube da capital gaúcha a alcançar esse status. Antes, Grêmio, Internacional e São José já haviam comemorados seus centenários.

O Cruzeiro por pouco não se chamou 14 de Julho, data de sua fundação. O nome foi proposto por um dos fundadores, mas rejeitado pelos demais. O primeiro estádio do clube foi na Vila Cruzeiro, que estava localizada na Estrada do Mato Grosso, atual Avenida Bento Gonçalves, no Bairro Partenon. Em 1920 mudou-se para o Caminho do Meio, onde ficou durante 18 anos.

O E.C. Cruzeiro desde os primórdios sempre se caracterizou como um pioneiro. Assim foi em 1914, quando criou as categorias inferiores (infanto-juvenil e juvenil), os chamados “filhotes”. E não demorou muito tempo para sugerir à presidência da Liga de Futebol Porto-alegrense que fosse criada a Liga Infantil de Futebol e organizado um campeonato só para meninos.

Foi o Cruzeiro que em 1917 propôs que fosse regulamentada a entrada de estrangeiros nos clubes gaúchos, a exemplo do que já ocorria em São Paulo e Buenos Aires.

No ano de 1929, depois de ter vencido o Citadino pela segunda vez, antes já fora campeão em 1918, também se sagrou campeão estadual em sua primeira participação na fase final da competição. O time era formado na quase totalidade por alunos universitários e estudantes da Escola Militar de Porto Alegre.

Em 1918, quando de seu primeiro título municipal de Porto Alegre, não havia ainda o campeonato do Estado. O representante da Capital no torneio foi o Grêmio, campeão da Associação Portoalegrense de Futebol (APAF), liga dissidente existente nos anos 1920.

A história do Cruzeiro é cheia de altos e baixos. Nos seus primeiros 50 anos de vida destacou-se pelas dificuldades que impunha dentro de campo aos clubes grandes, por isso era chamado de a terceira força da Capital, atrás apenas de Grêmio e Internacional.

Em 1935 sagrou-se campeão da “Taça Farroupilha”, certame realizado para assinalar o centenário da Revolução Farroupilha.

Em 7 de março de 1941 o clube inaugurou o seu novo “Estádio da Montanha”, no bairro Medianeira. O jogo inaugural foi um amistoso contra o São Paulo F.C., da capital paulista, vencido pelo Cruzeiro por 1 X 0, gol de Gervásio. Mais de 20 mil pessoas assistiram o confronto.

Quando da inauguração era o maior estádio de Porto Alegre, com capacidade para 20 mil expectadores, e o primeiro do Rio Grande do Sul a ter túnel de acesso para os jogadores saírem do vestiário para o gramado. O estádio também era chamado de “Colina Melancólica”, por estar localizado na região dos cemitérios porto-alegrenses.

No Estádio da Montanha na década de 40, funcionou a Faculdade de Educação Física (FEF), hoje Escola Superior de Educação Física (ESEF), da Universidade do Rio Grande do Sul (URGS).

Um dos apelidos do Cruzeiro é ”Leão da Montanha”, referência a um dos muitos estádios que o clube já possuiu.

Em 1944 o alviazul se tornou o primeiro clube gaúcho a contratar um técnico estrangeiro, o húngaro Emerich Hirschl, que trouxe consigo a famosa dupla de atacantes italianos Enrique Flamini e Alejandro José Lombardini, jogadores que já haviam defendido a Seleção Nacional, clubes argentinos e a Lázio, da Itália.

Na década de 40, o Cruzeiro formou grandes equipes e conquistou títulos importantes, como a “Taça Cidade de Porto Alegre”, em triangular com a dupla Gre-Nal, o Campeonato Extra da Cidade de 1943, o Torneio Início no mesmo ano e os vice-campeonatos da cidade em 1942, 1945 e 1947.

Apesar de todo o esforço, o Cruzeiro encontrou na época um Internacional forte demais, o que talvez tenha evitado um crescimento maior do time azul e branco.

Na virada dos anos 1953/1954, o Cruzeiro tornou-se o primeiro clube gaúcho a excursionar pela Europa, Ásia e Oriente Médio. A delegação estrelada enfrentou 11 dias de viagem a bordo de um navio.

Jogou contra times poderosos como Real Madrid (0 X 0), Lazio, Fenerbahçe, Beşiktaş e Galatasaray, além da Seleção de Israel (foi o primeiro time brasileiro a jogar em Israel) e da Seleção da Turquia.

O saldo da excursão foi altamente positivo: jogou 15 partidas, venceu sete, empatou quatro e perdeu quatro, marcando 28 gols e sofrendo 20, com um aproveitamento percentual de 55,55%.

Em 1960 o Cruzeiro realizou nova excursão, quando enfrentou equipes do nível de um Sevilla, SpVgg Bayern Hof (da 1ª divisão alemã, antes da criação da Bundesliga), Dínamo de Zagreb e outros, além de seleções como da Tchecoslováquia, Olímpica da Dinamarca e Bulgária.

O aproveitamento foi parecido com o da excursão anterior, 54,16%. Foram 24 jogos, com 11 vitórias, seis empates e sete derrotas, 39 gols pró e 35 contra. Essa excursão rendeu ao clube um título internacional, o de campeão do “Torneio de Páscoa de Berlim”, uma competição importante para a época. Foi o primeiro título intercontinental de futebol de um clube gaúcho.

No torneio, o Cruzeiro bateu o Bayern de Munique no jogo final. Uma prova do êxito dessa excursão, é uma carta que o clube guarda até hoje como verdadeira relíquia, enviada por dirigentes da agremiação dinamarquesa Randers FC, um dos adversários, que afirmavam que nunca iam esquecer do time que os tinha derrotado.

Além desses títulos, o Cruzeiro conta na sua galeria com o primeiro “Torneio Internacional de Páscoa de Mar del Plata”, na Argentina, em 1961. Também sagrou-se o primeiro Campeão da Copa Governador do Estado do Rio Grande do Sul, em 1970, tendo como treinador Sérgio Moacir Torres Nunes, que foi goleiro da dupla Gre-Nal nos anos 50.

Em 1968, o Cruzeiro chegou em terceiro lugar no Campeonato Gaúcho e disputou a sua primeira competição nacional, o “Torneio Centro-Oeste”.

O Cruzeiro começou a viver um período de decadência no final da década de 1960, quando o presidente Rafael Peres Borges vendeu o “Estádio da Montanha” para a construção do Cemitério Ecumênico João XXIII. O último jogo do time na “Montanha” aconteceu no dia 8 de novembro de 1970, com uma vitória por 3 X 2 sobre o Liverpool, do Uruguai. Muitos torcedores deixaram o local chorando.

Ainda hoje o Cemitério João XXIII tem uma parte da arquibancada. Isso foi lembrado por um dos mais célebres cruzeiristas, o escritor Moacyr Scliar (1937-2011), no livro ”A Colina dos Suspiros”, uma ficção inspirada no Cruzeiro e seu campo mais famoso.

“A “Colina dos Suspiros” (Editora Moderna) é uma leitura leve e divertida. Conta a história do “Pau Seco”, seu estádio, numa colina, vendido a um cemitério, pagamento em jazigos, jogadores negociados em troca de túmulos, a rivalidade com o União e Vitória, coronéis, empresários, exportação de jogadores… Ironia e tragédia se misturam. Final surpreendente.

Depois da morte de Moacyr Scliar, o Cruzeiro entrou em campo com uma tarja preta de luto, na partida contra o Grêmio, pela semifinal da Taça Piratini (1º turno do campeonato gaúcho), em 2011. O escritor herdou a paixão do pai, José Scliar. Em 2010, Moacyr escreveu uma coluna no jornal Zero Hora, festejando a volta do “Leão” à elite do futebol gaúcho. Na crônica, Moacyr Scliar citou o livro “A Colina dos Suspiros”.

Na década de 1970, o clube construiu o “Estádio Estrelão”, no final da Avenida Protásio Alves, atualmente Jardim Carvalho. Inaugurado em abril de 1977, o “Estrelão” foi a casa do Cruzeiro até 2012. Em 1979, o futebol profissional do clube entrou em recesso, só voltando em 1991, quando disputou a Segunda Divisão Gaúcha.

Em 16 de junho de 2010, depois de derrotar o Brasil de Farroupilha por 3 X 2 no “Estrelão”, o Cruzeiro voltou a elite do futebol gaúcho. Foram 32 anos de espera. E não ficou só nisso, de lambuja conquistou o título da Série B, ao derrotar o Lajeadense por 3 X 0, em 27 de junho.

Em 30 de julho de 2010, o Cruzeiro vendeu a área onde se encontrava o estádio "Estrelão" e adquiriu outra com sete hectares no Pólo Industrial de Cachoeirinha, na região metropolitana de Porto Alegre, onde está sendo erguido o novo estádio. Ele terá o formato de arena, com 16 mil lugares, nos padrões exigidos pela FIFA, credenciando o município a ser a sede de treinamento para as seleções que vão disputar a Copa do Mundo FIFA de 2014 no Brasil.

E não é só o estádio que o Cruzeiro está construindo. Paralelamente o clube ergue um Centro de Treinamento em Cachoeirinha e a nova sede social e administrativa em Porto Alegre. O novo estádio tem previsão de ser inaugurado ainda em 2013. O clube disputou o campeonato gaúcho do ano passado no “Estrelão”.

Em 2011 o Cruzeiro alcançou classificação para disputar a Série D do Campeonato Brasileiro, retornando a uma competição nacional após 43 anos. Até então a única disputa oficial interestadual do clube estrelado havia sido o Torneio Gaúcho Qualificatório ao Torneio Centro-Sul de 1968.

A participação na Série D foi curta, pois o clube foi eliminado antes do fim da primeira fase. Na competição, o Cruzeiro mandou seus jogos no Estádio Passo D'Areia, do seu co-irmão, E.C. São José.

Uma curiosidade na vida do Cruzeiro, foi o fato de ter sido o segundo clube do mundo a ter sua camiseta usada em uma Copa do Mundo de Futebol. Isto ocorreu em 1950, na partida entre México X Suíça, disputada em Porto Alegre. As duas seleções tinham fardamentos vermelhos e era preciso distingui-los. Os mexicanos jogaram listrados de azul e branco e a Suíça venceu por 2 X 1. O primeiro foi o Napoli, em 1934, cedendo seu uniforme para a Áustria num jogo contra a Alemanha.

O Cruzeiro é o único clube gaúcho a ter se sagrado campeão em todas as seguintes modalidades esportivas: futebol, basquete, futebol de salão e vôlei. O cantor Diogo Nogueira foi jogador do clube na sua tentativa de se tornar jogador profissional.

O Cruzeiro foi o primeiro time gaúcho a vencer o Internacional no seu novo Estádio Beira Rio, no dia 1º de maio de 1970, pelo placar de 1 X 0. E também, o primeiro time brasileiro a derrotar o Grêmio, na sua nova Arena, no dia 28 de março de 2013, pelo escore de 2 X 1.

O deputado Edson Brum (PMDB) ocupou a Tribuna da Assembleia Legislativa do Estado, no último dia 10, para prestar significativa homenagem ao E.C. Cruzeiro, por seu centenário. Com a presença nas galerias de muitas pessoas ligadas ao clube, o parlamentar fez um relato da história cruzeirista, uma das mais antigas e queridas agremiações esportivas do Rio Grande do Sul.

O Jockey Club do Rio Grande do Sul também prestou homenagem ao centenário estrelado, com um "Páreo Festivo" e depois com uma Missa em Ação de Graças, realizada na Catedral Metropolitana de Porto Alegre.

Títulos: Campeão Gaúcho (1929); Campeão Gaúcho da Série B (2010); Campeão Citadino de Porto Alegre (1918, 1921 e 1929); Campeão do Bronze Farroupilha de Atletismo (1935); Campeão da Taça Cidade de Porto Alegre (1943 e 1947); Campeão do Campeonato Extra de Porto Alegre (1943); Campeão do Torneio Início de Porto Alegre (1943, 1951 e 1962); Campeão da Copa Governador do Estado (1970); Campeão do Torneio da Páscoa de Berlim, na Alemanha (1960); Campeão do Torneio Internacional de Mar del Plata, na Argentina (1961); Bicampeão Gaúcho de Futsal (1958 e 1959); Campeão Gaúcho da Série Prata de Futsal (2011); Campeão Gaúcho de Basquete adulto masculino (1945, 1948, 1949, 1950, 1951, 1952, 1953, 1956, 1968, 1970, 1972 e 1973); Campeão Gaúcho de Vôlei adulto masculino (1972) e Campeão da Taça Cidade de Pelotas 200 Anos, em Futebol Feminino (2012).

No sábado, 13 de julho, aconteceu o “Jantar do Centenário do Esporte Clube Cruzeiro”, realizado no Clube Campestre, em Ipanema, com a presença de aproximadamente 300 convidados. No domingo, 14, data do centenário, o clube organizou uma carreata e o Almoço do Centenário, no CTG Rancho da Saudade, em Cachoeirinha.

O Cruzeiro desde a sua origem revelou grandes craques e muitos atletas que chegaram à Seleção Brasileira, como Aníbal Candiota, Moderato Wisintainer (primeiro gaúcho a jogar uma Copa do Mundo em 1930), Juvenal Amarijo, Luizinho, Irno, Claudio Danni, Alfredo Mostarda, Picasso, Valdir de Morais, Airton Ferreira da Silva, Ortunho e Batista.

E tantos outros grandes jogadores que já vestiram a camisa estrelada como Espir Rivaldo, Marne Demeneghi, Mario Andrade, Jorge Andrade, Hermes, Henrique, Arlem, Pio, Vieira, Cacildo, Marino, Arceu, Miguel, Bido, Canavieira, Bezerra, Antunes (irmão do Zico), Jarbas, Daizon e João Pontes, Laoni Luz, Julio César, Heraldo, Paraguaio, Serginho, Nicola, Chico Spina, Lettieri, Itamar, Doraci, Claudio Leite, Marcelo Rosa, Djair, Vergara, Paulo Santos, Pinga, Manú, Jair Gomes, Elton Correia, Zé Luís, Michel Bastos, Diguinho e Rafael Sobis. (Pesquisa: Nilo Dias)

Viagem de návio em 1973, na primeira excursão de um clube gaúcho à Europa.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

O dia que os gaúchos vaiaram a Seleção Brasileira

Em 1972, dois anos após a conquista do tri-campeonato mundial, mais de 106 mil torcedores vaiaram a Seleção Brasileira. Isso aconteceu no Estádio Beira Rio quando de um jogo amistoso entre os selecionados do Brasil e do Rio Grande do Sul. Tudo aconteceu porque os gaúchos resolveram declarar guerra a Seleção, pelo fato de jogadores do Estado não terem sido convocados pelo técnico Mário Lobo Zagalo.

O país vivia no duro regime militar. O então presidente Médici via no hino “Prá frente Brasil”, de Miguel Gustavo, combustível para seus planos de governo, especialmente na frase “Noventa milhões em ação”, cantado e decantado na Copa de 70. Num jogo da Seleção no Maracanã, o próprio Presidente criara mais um lema ufanista, “Ninguém segura este país!”.

O regime usava o futebol para uma propaganda otimista. Por quase todo o país se vivia um clima de euforia pela conquista do tri. Menos no Rio Grande do Sul. O copo d’água transbordou quando foram convocados os jogadores para a "Taça Independência", também chamada de “Mini-Copa”, em comemoração aos 150 anos da emancipação do país, que seria realizada de junho a julho de 1972.

Naquele tempo quem mandava no futebol nacional era a Confederação Brasileira de Desportos (CBD), que tempos depois mudou o nome para Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que persiste até hoje. O técnico Zagalo não convocou nenhum jogador do Rio Grande do Sul, esquecendo até de Everaldo Marques da Silva, lateral-esquerdo do Grêmio que havia sido titular na Copa de 70, tendo participado dos sete jogos da Seleção.

Depois da Copa ele ainda foi chamado em 1971, por isso a surpresa pela sua não convocação. Também esperava-se que o centro avante Claudiomiro, do Internacional, fosse lembrado, já que havia jogado duas partidas pela Seleção. Foi igualmente ignorado. A discussão nem era com relação a jogadores cariocas e paulistas, mas sim pela convocação de quatro mineiros, pois o futebol de Minas e Rio Grande do Sul se equivaliam.

A desconformidade serviu para uma coisa quase impensável, unir colorados e gremistas, numa mostra de fortalecimento da identidade gaúcha. Tudo isso exatamente no momento em que a ditadura buscava maquiar um país de fantasia, dando ideia de que vivíamos num lugar próspero e feliz, muito bem representado pela seleção.

Na tentativa de contornar a situação, o presidente da Federação Gaúcha de Futebol (FGF), Rubens Hoffmeister, desafiou a seleção brasileira para uma partida contra um combinado estadual. Depois de muitas negociações, o jogo foi marcado para o dia 17 de junho de 1972.

A escolha do técnico gaúcho recaiu sobre o jornalista Aparício Vianna e Silva, o "Apa", o que mereceu críticas do treinador Zagalo, da Seleção Brasileira. Mas o endereço correto era João Saldanha, que o antecedera na seleção e que tivera em "Apa" o seu olheiro.

Mesmo sem ter nada a ver com isso, Zagalo questionou a convocação de somente jogadores de Grêmio e Internacional, perguntando se o futebol gaúcho se resumia só aos dois. Isso só serviu para por mais lenha na fogueira, visto que Aparício era uma unanimidade e não havia qualquer dúvida sobre a legitimidade da convocação só de atletas da dupla Grenal.

A "batalha" começou ainda antes do jogo: o ponteiro-direito Jairzinho teria dito que "só havia faltado pedirem o passaporte" na chegada da Seleção ao Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre.

Depois vieram os boatos de que os jogadores gaúchos poderiam machucar propositalmente os da Seleção Brasileira. O time gaúcho era tratado pejorativamente de “Combinado Grenal” ou “Combinado Sul-americano, tendo em vista as presenças do uruguaio Ancheta , do chileno Figueroa e do argentino Oberti . Os gaúchos responderam agressivamente, apelando para os símbolos mais caros ao Estado.

Chegou o dia do jogo. As manchetes dos jornais estampavam o clima de guerra que havia sido criado. O Rio Grande do Sul inteiro estava unido em torno de sua equipe. Naquele sábado, o Beira-Rio recebeu o maior público de toda a sua história: 106.554 pagantes.

A equipe do Brasil usava seu tradicional uniforme amarelo canário, já o uniforme da Seleção Gaúcha levava as cores da bandeira do Estado e o brasão da Federação Gaúcha de Futebol no peito. Naquela tarde todos os gaúchos esqueceram para que clube torciam, todos cantavam e alentavam junto pelo Rio Grande do Sul.

Os ânimos estavam tão acirrados que até bandeiras do Brasil foram queimadas pelos torcedores gaúchos, o que não chegou a ser noticiado pela imprensa. Os dois times entraram em campo carregando uma grande bandeira brasileira. Foi o momento em que uma vaia ensurdecedora tomou conta de todo o estádio, não permitindo que o Hino Nacional fosse ouvido.

As vaias continuaram mesmo depois do árbitro ter iniciado o jogo. Cada vez que os jogadores da Seleção Brasileira tocavam na bola, "dá-lhe vaia". Isso não parou durante os 90 minutos, o que deixou tensos os membros da comissão técnica e os jogadores verde-amarelos. Parecia que estavam jogando em outro país.

De um lado Leivinha, Jairzinho e Rivellino. De outro o uruguaio Ancheta, o chileno Figueroa e o gigante Valdomiro. O Brasil tinha um time de muita técnica, com um toque de bola rápido e o ataque matador. O selecionado gaúcho era pura marcação e força.

Quando a seleção brasileira conseguiu o empate, em 3 X 3, ao final do jogo,o técnico Zagallo abraçou-se eufórico ao preparador físico, pulando feito criança, pois, ali, o onze verde e amarelo livrara-se da derrota.

Muitas pessoas contam um fato bastante pitoresco, que eu duvido que realmente tenha ocorrido. O estádio lotado, e lá pelo meio da partida, o Brasil marca um gol, e um torcedor solitariamente comemora. Quase ao mesmo tempo, um torcedor do combinado gaúcho grita: "mata que é 'brasileiro." Eu acho que isso está mais para folclore, do que para verdade.

O jogo terminou empatado em 3 X 3. Os gaúchos sempre estiveram na frente do marcador, e não faltou quem afirmasse que o resultado foi “arranjado”.

O Brasil jogou com Leão (Sérgio) - Zé Maria – Brito - Vantuir e Marco Antônio – Clodoaldo - Piazza e Rivelino – Jairzinho - Leivinha e Paulo César Caju. Os gaúchos atuaram com Schneider – Espinosa – Figueroa – Ancheta - Everaldo e Carbone – Tovar - Torino e Valdomiro - Claudiomiro e Oberti (Mazinho).

Os gols do Brasil foram marcados por: Jairzinho, Paulo César Caju e Rivellino. Anotaram pela Seleção Gaúcha: Tovar, Carbone e Claudiomiro.

Os comentaristas esportivos do restante do país não perdoaram os gaúchos e criticaram o resultado do jogo e as vaias. O protesto não surtiu efeito. O desprezo ao futebol gaúcho continuou nas convocações seguintes. Ainda hoje, são atribuídas ao futebol no Rio Grande do Sul características diferentes do resto do país: mais virilidade que habilidade e mais força que malícia.

Essa não foi a última vez que o Selecionado Gaúcho enfrentou a Seleção Brasileira. Em 1978, o último jogo preparatório da equipe antes da Copa na Argentina foi justamente contra o time gaúcho, novamente no Beira-Rio, jogo que terminou empatado em 2 X 2.

Outra vez o clima foi hostil à Seleção Brasileira, mas um pouco menos que no jogo anterior, devido à não-convocação do meia colorado, catarinense, de nascimento, Paulo Roberto Falcão, alegadamente, por estar, então, em fase final de recuperação de uma lesão de alguma gravidade.

Até hoje existe uma desconfiança dos homens que mandam no futebol brasileiro, em relação ao futebol gaúcho, embora o clube de futebol mais antigo do Brasil, em atividade, esteja em território sul-riograndense, o Sport Club Rio Grande, da cidade portuária de Rio Grande.

O Rio Grande do Sul é o primeiro Estado brasileiro com mais clubes centenários, 16 ao todo (junto com São Paulo) : Internacional, Grêmio, São José e Cruzeiro (Porto Alegre), Rio Grande, São Paulo e Rio-Grandense (Rio Grande), Brasil e Pelotas (Pelotas), 14 de Julho e Grêmio Santanense (Santana do Livramento), Novo Hamburgo (Novo Hamburgo), Lajeadense (Lajeado), Santa Cruz (Santa Cruz do Sul), Riograndense (Santa Maria) e Guarany (Bagé),

O futebol gaúcho tem quatro conquistas da Taça Libertadores da América (duas do Grêmio e duas do Internacional, dois títulos mundiais interclubes (um do Grêmio e um do Internacional), cinco campeonatos brasileiros (três do Internacional e dois do Grêmio), seis Copas do Brasil (quatro do Grêmio, uma do Internacional e uma do Juventude, de Caxias do Sul). (Pesquisa: Nilo Dias).