Morreu no último dia 24, em Barcelona (Espanha) onde morava, Hendrik Johannes "Johan"
Cruyff, o melhor futebolista neerlandês de todos os tempos. Ele nasceu em
Amsterdã, no dia 25 de abril de 1947. Seu sobrenome é originalmente grafado, na
língua neerlandesa, como "Cruijff", sendo mais popularmente escrito
como "Cruyff" no exterior.
Ele
foi praticamente criado dentro do Ajax. Seu pai, Manus, era dono de uma
mercearia que fornecia frutas ao clube. Sua mãe trabalhou como faxineira do
clube após tornar-se viúva.
Com
apenas quatro anos de idade, o garoto “Cruyff” frequentava os vestiários. Por
ideia da mãe, o filho entrou nas categorias de base do Ajax. Ela acreditava que
assim ele poderia superar a deficiência que tinha nos pés, cuja má formação o
obrigava a utilizar aparelhos ortopédicos.
O
garoto estreou no time principal do Ajax em 1964. Um ano depois, em 1965,
chegou Michels, que aceitou o jogo ditado por “Cruyff” e os títulos viriam em
série: o Ajax foi campeão neerlandês na primeira temporada com ambos trabalhando
juntos, a de 1965/66.
Outros
três títulos no campeonato nacional vieram em espaço de cinco anos. Cinco Copas
dos Países Baixos também foram levantadas no período.
Com
19 anos de idade estreou pela Seleção dos Países Baixos em 1966, em jogo contra
a ainda respeitada Hungria, em partida válida pelas eliminatórias para a
Eurocopa 1968, quando fez um gol.
Cruijff
transformou a Seleção Neerlandesa, então modesta, em uma potência mundial. Mas não
foi de imediato. O país não se classificou para as fases finais da própria Euro
1968 e também da de 1972, e Copa do Mundo de 1970.
A
revista brasileira “Placar”, em uma edição especial, elegeu os 100 melhores
jogadores de futebol do Século XX, sendo que ele ocupou a terceira posição,
atrás somente de Pelé e Maradona.
"Cruyff"
não tinha semelhança com o futebol de Pelé e Maradona, se assemelhava mais a
Alfredo Di Stéfano. Era um jogador de muita velocidade, intuição, inteligência
e objetividade em campo.
Era
considerado um jogador revolucionário, tático, ofensivo, coletivo, vistoso e
eficiente. Suas extraordinárias atuações no Ajax inspiraram muitos jogadores e
treinadores a partir de suas extraordinárias atuações no clube e, também na
Seleção Holandesa na Copa do Mundo de 1974.
Foi
ele e o seu treinador no Ajax, Barcelona e na Seleção Neerlandesa, Rinus
Michels que criaram o chamado futebol total, no qual os jogadores de linha se
sentem à vontade ao desempenhar todas as posições. Foi essa a última revolução
tática na história do futebol, mesmo passados mais de 40 anos da Copa do Mundo
de 1974.
O
rodízio que funcionara bem no Ajax, chamado de "futebol total",
transformou-se para os olhos do mundo no "Carrossel Holandês". Era um
grupo de grande talento que trouxe inovações para a época como a valorização da
troca de passes e posse de bola, a linha defensiva de impedimento e marcação
firme, tentando roubar a bola ainda na intermediária adversária.
“Cruyff”,
era um jogador com fome de bola. Corria o campo inteiro para marcar o
adversário e tirar-lhe a bola. Era magro e dono de um fôlego privilegiado,
sabedor como ninguém de como controlar a velocidade, sabendo de antemão o que
iria fazer, depois de receber a bola.
Foi
escolhido pelo IFFHS o maior jogador europeu do século XX, e o segundo maior do
mundo, atrás somente de Pelé. Para o colunista Maurício Barros, da ESPN Brasil,
Cruyff é o maior da história do futebol na soma jogador-treinador, mesmo sem
ter ganho nenhuma Copa do Mundo.
Ele
pode ser taxado de um revolucionário do futebol. Sabia impor suas noções de
táticas, e a negociar seus termos salariais. Foi o casamento perfeito, quando
se encontrou em 1965 com Rinus Michel, até então um professor de ginástica para
crianças surdas.
Michel
chegou ao Ajax para ser o técnico. Ambicioso, planejava transformar o clube, até
então uma equipe semiprofissional que fazia jogos pelo leste de Amsterdã, em um
time internacional de ponta. Ele e “Cruijff” conseguiram isso em seis anos.
Frank
Rijkaard, um dos seus discípulos, afirmava que Diego Maradona poderia ganhar um
jogo sozinho, mas não tinha o talento de “Cruyff” para mudar a tática do time
para vencer a partida. Dava a impressão
de que tinha quatro pernas, sendo hábil no chute com o lado de fora do pé.
Era
capaz de dar giros em pequenos espaços, tinha chutes longos e certeiros,
driblava fácil e ainda era bom cabeceador e artilheiro. Tinha uma personalidade
forte e não aceitava ordens.
Na
Copa dos Campeões da UEFA, o Ajax chegou à final em 1969. No caminho, eliminou
o Benfica de Eusébio, mas perdeu a decisão para o Milan. Em 1971, 1972 e 1973
foi tricampeão da mais importante competição europeia.
Pelos
títulos de 1971 e 1973 foi premiado com a “Bola de Ouro”, da France Football,
sendo o primeiro neerlandês a recebê-la.
O
Ajax também venceu a Copa Intercontinental de 1972, derrotando o Independiente,
da Argentina por 3 X 0, depois de empatar em 1 X 1 fora de casa, com gol de “Cruyff”. O clube não ganhou outras Intercontinentais
pois não quis participar.
Em
1971, foi o Panathinaikos quem enfrentou os uruguaios do Nacional. Em 1973,
quando a disputa seria outra vez contra o Independiente, o Ajax voltou a ceder
a vaga para o vice-campeão
europeu,
desta vez a Juventus, de Turim (Itália).
“Cruijff
“ liderava sozinho um time de bairro, dono de um estádio pequeno até para as
segundas divisões da Itália ou Espanha, cujos jogadores não ganhavam mais do
que um bom lojista. Ainda assim conseguiu reinventar o futebol dentro do clube.
Em
1973, decidiu sair do clube, vítima do próprio poder que ajudara a deixar nas
mãos dos jogadores: seus colegas decidiram que o novo capitão do clube seria
Piet Keizer. “Cruijff” foi então para o Barcelona, onde se encontrava Michels,
o homem que o compreendera.
Chegou
ao clube espanhol na negociação mais cara do futebol mundial até então. O
Barcelona pagou cinco milhões de florins, preço tão alto que o governo espanhol
não aprovou a transferência.
Só
conseguiu ser levado porque foi registrado oficialmente como uma peça de
máquina de agricultura. O jogador justificou o alto investimento. No jogo de
estreia fez dois gols e reconduziu o Barcelona a um título espanhol que não
ganhava havia 14 anos, quando ainda jogavam pelo clube Luis Suárez, László
Kubala, Zoltán Czibor, Sándor Kocsis e Evaristo.
Foi
o melhor jogador do campeonato, ganhando sua terceira “Bola de Ouro”. O ano não
podia ter sido melhor, já que a Seleção Neerlandesa conseguiu se classificar
para a Copa do Mundo de 1974, coisa que não acontecia desde a segunda
participação, na edição de 1938.
Em
1975, 1976 e 1978, o campeão foi o Real Madrid. Na única temporada em que os “merengues”
não foram bem, ficando em 9º lugar no campeonato, o Barcelona perdeu o título,
que ficou com o Atlético, de Madrid, por um ponto.
Além
do título nacional de 1974, Cruijff só conseguiu ganhar com o Barcelona a Copa
do Rei de 1978. Ficou oito anos no clube. Quase morreu por lá, quando sofreu um
infarto, em 1991, muito provavelmente consequência dos cigarros que
inveteradamente fumava. Teve, por isso, de implantar pontes de safena.
Logo
depois se aposentou, não participando da Copa do Mundo de 1978. Ele se dizia
cansado da violência que imperava nos gramados espanhóis, onde chegou a ter uma
perna quebrada.
Cruijff
se despediu dos gramados em outubro de 1978, vestindo a camisa do Ajax, em um
jogo amistoso contra o Bayern Munique. Os alemães ganharam por 8 X 0. Mas tudo não passou
de um adeus fictício. O investimento que o jogador fez na criação de porcos, o
fez perder milhões, de dólares, o que o obrigou a voltar a jogar.
Foi
para os Estados Unidos, onde poderia viver tranquilo, no anonimato. Passou dois
anos por lá, onde jogou primeiro no Los Angeles Aztecs, tendo novamente como
treinador Rinus Michels. Depois foi para o Washington Diplomats. Também fez uma
partida de exibição pelo New York Cosmos.
Se
o futebol americano era calmo, Cruijff não foi. Sempre de mau humor, deixou
quase loucos colegas e outros técnicos. Certa vez, quando o seu técnico no
Diplomats estava fazendo a preleção, ele levantou-se, limpou o quadro-negro e
disse: "É claro que faremos tudo diferente disso".
Um
dos jogadores do Diplomats teria dito que o clube, ao contratar o neerlandês,
deveria ter pago também por um estoque de algodão para que todos ali tivessem algo
mais para tapar os ouvidos.
Sem
clima para continuar nos Estados Unidos, voltou para a Espanha, dessa feita
para defender o pequeno Levante, de Valência, que estava na segunda divisão. Mas
não obteve sucesso, pois o clube estava afundado em dívidas.
Depois
disso jogou uma partida pelo Milan, em um torneio amistoso organizado por
Silvio Berlusconi, mas saiu vaiado após uma atuação apagada. Retornou aos Países
Baixos e ao Ajax. Enfrentou resistências, sendo chamado de "desbocado"
e "dinheirista". Dizem que ele cobrava para dar autógrafos.
Em
seu retorno ao Ajax foi campeão neerlandês da Copa nacional. Também causou
furor ao inventar a cobrança em dois lances de um pênalti. Em outra partida, ao
cobrar a penalidade, apenas tocou a bola para a frente, deslocando o goleiro
enquanto um companheiro corria atrás da bola para repassar-lhe para que
concluísse sem obstáculos para as redes.
Outro
lance foi de calcanhar: Cruijff certa vez avançou em direção ao gol e o goleiro
adiantava-se para tentar bloquear-lhe. Ele então virou-se e passou a correr em
direção ao próprio campo, sendo seguido pelo goleiro até perto do
meio-de-campo, quando este então percebera que em algum momento Cruijff chutara
para as redes sem interromper seu passo.
Após
duas temporadas o Ajax o mandou embora, pois já o consideravam velho demais.
Aos 36 anos, assinou contrato com o rival Feyenoord, onde jogou sua última
temporada profissional. Foi campeão da Eredivisie, quebrando um jejum de dez
anos do novo clube no campeonato nacional. Também foi campeão da Copa dos
Países Baixos.
Desde
1996, 12 anos após a aposentadoria de Cruijff, um troféu que leva seu nome foi
criado pela Real Associação de Futebol dos Países Baixos, sendo entregue ao
vencedor da partida entre os campeões do campeonato e da Copa nacionais.
No
livro de sua autoria “Futebol Total”, lançado em 1974, Cruijff antecipou que
não iria para a Copa do Mundo de 1978. De fato, acabou não indo à Argentina, o
que foi por muito tempo interpretado como um protesto à ditadura militar
naquele país.
Mas
30 anos depois, foi revelado o real motivo: ele afirmou que, já em 1978,
sofrera uma tentativa de sequestro e, temendo novos ataques, contratou
seguranças particulares por um ano e meio. E também por causa da confusão
conjugal que tivera pouco antes da final de 1974.
Dois
anos depois de deixar o Feyenoord, voltou ao Ajax, porém sem êxito. Em 1988, os
Países Baixos finalmente conquistaram um torneio, a Eurocopa, sob o comando de
Rinus Michels.
Sua
saída da direção técnica do Barcelona não foi nada amistosa: quando soube que
seria substituído, jogou uma cadeira na porta do escritório do cúpula do clube
e gritou bem alto: “Deus o punirá por esta ação, da mesma forma que o puniu
antes!", em referência a um neto recém-falecido do presidente.
Em
2009 foi técnico da Catalunha, cuja seleção não é reconhecida pela FIFA e
costuma fazer partidas apenas anuais. Deixou o comando da equipe em janeiro de
2013. Sua despedida foi em um amistoso contra a Nigéria, no Estádio Cornellà-El
Prat, em Barcelona.
Também
chegou a jogar uma partida pela Seleção Catalã. O jogo realizou-se em 9 de
junho de 1976. Cruijff atuou ao lado de pelo menos dois outros não-catalães,
sequer espanhóis: o compatriota e colega de Barcelona Johan Neeskens (autor do
gol da Catalunha) e o chileno Carlos Caszely, do Español.
O
Ajax não teve vida fácil com Cruijff. No final de março de 2011, toda a
diretoria, incluindo o presidente do clube, entregou seus cargos por discussões
com ele. Seu radicalismo era tanto, que chegou a declarar que iria torcer
contra o próprio país na final da Copa do Mundo de 2010. O adversário foi a
Espanha, repleta de jogadores do Barcelona.
Se
o Ajax não deu andamento aos projetos de Cruijff, om o Barcelona foi diferente.
Graças a ele foram montadas 12 equipes, cada uma com até 24 jogadores, que são
orientados por técnicos licenciados pela UEFA.
As
categorias inferiores do Barcelona são consideradas as maiores produtoras de
jogadores de alto nível, chegando a levar até 15 anos para formar um atleta. Josep
Guardiola foi um dos garotos levados diretamente por Cruijff ao time principal.
Em
2010, foi nomeado presidente de honra do Ajax. Meses depois, porém, a honraria
lhe foi retirada pelo presidente do clube, Sandro Rosell. Rosell, sob a
justificativa que a decisão do mandatário anterior, Joan Laporta, fora
antidemocrática, sem consulta aos sócios.
Cruijff
foi condecorado com a classe de cavaleiro da Ordem da Casa de Orange.
Era
também membro honorário da Real Associação de Futebol dos Países Baixos e do
Ajax. Foi eleito em 2004 o sexto maior neerlandês da história, estando à frente
de nomes como Anne Frank, Rembrandt e Vincent van Gogh.
Além
do futebol, também gostava de jogar golfe. Na década de 1970, ele chegou a
gravar uma música de relativo sucesso nas paradas neerlandesas, "Oei Oei
Oei (Dat Was Me Weer een Loei)" - em português, "Oi Oi Oi (Que belo
chute)", que foi relançada após sua transferência para a Espanha, onde foi
ainda mais popular.
Era
casado com Danny Coster desde antes da fama internacional, em 1968, e a
considerava a pessoa mais importante da sua vida. O casal escandalizava a
conservadora sociedade espanhola nos tempos franquistas, em que agiam como
jovens europeus modernos, fumando e usando cabelos compridos (no caso de
Cruijff) e minissaia (no caso da mulher). Tiveram três filhos, Chantal, Susila
e Jordi.
Sua
fama de rebelde também se fez presente na Espanha, onde desafiava árbitros e
policiais. Mas se identificou com a cultura catalã, tanto que batizou o filho
mas novo com a versão local do nome de São Jorge, o santo padroeiro da região,
além de viver na cidade até morrer. Falava o espanhol com sotaque catalão. E se
considerava “um cara do mundo”.
Títulos.
Campeonato Neerlandês (1965-66, 1966-67, 1967-68, 1969-70, 1971-72, 1972-73,
1981-82 e 1982-83); Copa dos Países Baixos (1966-67, 1969-70, 1970-71, 1971-72
e 1982-83); Copa dos Campeões da Europa (1970-71, 1971-72 e 1972-73); Copa
Intercontinental (1972); Supercopa Europeia (1972 e 1973);
Barcelona:
Campeonato Espanhol (1973-74); Copa do Rei (1977-78); Feyenoord: Campeonato
Neerlandês (1984); Copa dos Países Baixos (1984).
Como
técnico. Ajax: Copa dos Países Baixos (1985-86 e 1986-87); Recopa Europeia (1986-87);
Barcelona: Campeonato Espanhol (1990-91, 1991-92, 1992-93 e 1993-94); Supercopa
da Espanha (1991, 1992 e 1994); Copa do Rei (1989-90); Copa dos Campeões da
Europa (1991-92); Supercopa Europeia (1992); Recopa Europeia (1988-89).
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