O
futebol brasileiro perdeu na noite de ontem (20) um de seus mais legítimos
símbolos. O ex-jogador e treinador, Mário Travaglini faleceu aos 81 anos de
idade, depois de heroica luta contra um câncer no cérebro. Ele estava internado
na Unidade Pompéia do Hospital São Camilo, em São Paulo, desde 6 de janeiro e
não resistiu a complicações respiratórias associadas ao câncer.
O
seu estado de saúde deteriorou muito no último mês, por isso a família chegou
até a vetar visitas de amigos. Durante sua estada no Hospital São Camilo, os
médicos notaram que o câncer no cérebro havia se espalhado para o pescoço e o
pulmão. O sepultamento acontecerá às 17 horas de hoje no Cemitério do Araçá, na
capital paulista. Travaglini era solteirão convicto e não tinha filhos.
Travaglini
nasceu no dia 30 de abril de 1932, no bairro do Bom Retiro, em, São Paulo,
local que desde o início do século 20 sempre reuniu vários clubes de várzea e
foi o berço de fundação do S.C. Corinthians Paulista.
Desde
pequeno Travaglini mostrou que tinha bola no pé. O talento como zagueiro
impressionou Francisco Minelli, pai do ex-treinador Rubens Minelli, que o levou
para fazer testes no Clube Atlético Ypiranga.
E
não deu outra. Com apenas 16 anos de idade começou a jogar pelo time infantil
ipiranguista, onde foi campeão paulista de 1948, seu primeiro título. Estreou
no time profissional em 12 de setembro de 1953, quando o técnico Sastre o
escalou num jogo frente o Corinthians, no Pacaembu, pelo Campeonato Paulista,
que terminou empatado em 1 X 1.
Travaglini
lembra que não estava preparado para jogar no time de cima. Estava no estádio
para atuar pela equipe de aspirantes, quando foi surpreendido pelo técnico
Sastre, que o escalou no lugar de Giancoli, que era o beque central e teve um
problema de saúde. Jogou bem e a partir dali se firmou como jogador
profissional.
Depois
foi jogador do Palmeiras, em 1955. O time base era Laércio – Manuelito – Mário
Travaglini – Valdemar Carabina (que já tinha jogado no Ypiranga)- Dema – Lima –
Humberto Tozzi – Nei – Jair Rosa Pinto e Rodrigues.
Devido
a uma contusão ele foi emprestado para o Nacional, de São Paulo. Jogou três
meses lá. Como em 1955 havia se formado em Economia, conseguiu um emprego na
Estrada de Ferro Santos - Jundiaí, e abandonou o futebol.
Vale
ressaltar que na sua trajetória pelos gramados, Travaglini fez grande sucesso
com o público feminino, que muitas vezes comparecia em massa aos estádios para
vê-lo jogar e contemplar suas pernas.
Como
jogador, a maior recordação foi ter enfrentado Pelé. Sobre o “Rei”, Travaglini
costumava dizer que não o marcou, mas sim contemplou seu futebol. E foi
adiante: “Era um cara tão fantástico que o que ele fazia com a bola é
impossível de descrever".
Quem
o viu jogar garante que se tratava de um zagueiro clássico, inteligente, no
Ypiranga, no Palmeiras e no Nacional, capaz de achar um tempinho diário para se
diplomar em Economia. Respeitava os adversários e a bola, também.
Passou
um tempo e o Palmeiras o chamou para trabalhar nas Divisões de Base, pois o
técnico Rubens Minelli havia sido contratado por outro clube, iniciando assim a
carreira de treinador.
Começou
em 1963. Foi Campeão Infantil, Juvenil e Aspirante. Era também auxiliar. Na
interinidade, dirigiu o Palmeiras por 10 vezes, ganhando o Campeonato Paulista
de 1966, quebrando a hegemonia do Santos, de Pelé, a Taça Brasil no ano
seguinte e também o “Robertão”. Ficou praticamente até 1971, quando começou a
carreira como supervisor, que hoje chamam de gestor.
Ele
pode ver as duas “Academias”, pois em 1971, quando Oswaldo Brandão estava
chegando, foi Vice-Campeão Paulista contra o São Paulo. O técnico da primeira
“Academia” foi Filpo Nuñes.
Travaglini
dirigiu uma equipe dos sonhos: Valdir - Djalma Santos - Djalma Dias - Valdemar
Carabina – Zequinha – Dudu - Ademir da Guia – Julinho – Servilio - Tupã e
Rinaldo.
Depois
foi para o Rio de Janeiro, onde começou no Fluminense, que precisava de um
treinador para resolver alguns problemas, porque havia eleição no clube. Em
vista disso assinou um contrato de risco, pois se a oposição vencesse, estaria
fora.
O
título de 1972 foi decidido contra o Flamengo, pois o Fluminense havia vencido
a Taça Guanabara. E o rubro-negro foi campeão. Travaglini foi muito bem tratado
nas Laranjeiras e aceitou o contrato de risco. As portas se abriram para ele,
que foi para o Vasco em 1973.
No
Vasco ficou mais tempo, cerca de três anos, sendo Campeão Brasileiro em 1974.
Andrada – Fidélis - Miguel (que depois foi para o Fluminense) – Moisés –
Alfinete - Alcir, Lê – Zanata - Jorge Carvoeiro e tinha o Luiz Carlos como
quarto homem pelo meio. Na frente havia o Dé. Esse o time. Foi Travaglini que
lançou Roberto “Dinamite” no time titular, com apenas 18 anos de idade.
Saiu
do Vasco para ir para o Sport, de Recife. Lá ele ganhou o título do primeiro
turno. Como teve um problema com um diretor, em razão de não ter vencido o
segundo turno também, preferiu sair.
Voltou
ao Fluminense em 1976 para ser campeão carioca, num time que tinha Renato -
Carlos Alberto Torres – Miguel - Edinho e Rodrigues Neto - Carlos Alberto
Pintinho - Paulo Cesar Caju - Rivellino e Dirceu - Gil e Doval. O esquema
tático era o 4-4-2. O time era uma máquina.
Em
1978 fez parte da Comissão Técnica da Seleção Brasileira, na Copa do Mundo da
Argentina, sendo supervisor técnico de Cláudio Coutinho. Passado isso,
continuou na CBF (na época era CBD) e foi nomeado para dirigir as Divisões de
Base.
Disputou
o Campeonato Sulamericano, do qual foi Vice-Campeão, e depois o Panamericano de
Porto Rico em 1979, quando o Brasil foi medalha de ouro. Em 1980 foi técnico da
Portuguesa de Desportos, que tinha um jogador maravilhoso, o Enéas, que morreu
tempos depois em um acidente de carro.
A
Portuguesa ganhou o primeiro turno, e o Santos, o segundo. Um dia antes do jogo
final o clube vendeu Enéas para o Bolonha, da Itália, e o Santos foi campeão.
Entre
1981 e 1983 comandou o Corinthians em plena “Democracia Corinthiana”, movimento
idealizado pelo jogador Sócrates. Conquistou o título paulista já de cara. Foi
Travaglini quem revelou o centroavante Casagrande, vindo das categorias de base
do clube. Dirigiu o Corinthians em 122 jogos, com 63 vitórias, 39 empates e 20
derrotas.
Saindo
do Corinthians foi dirigir o São Paulo, que já o havia convidado anteriormente,
quando estava no Rio de Janeiro, treinando o Vasco da Gama. No tricolor
paulista foi apenas vice-campeão em 1983, perdendo o título para o Corinthians.
Em
1984 voltou ao Palmeiras. Treinou novamente o Corinthians, em 1985. Em 1987
comandou o Vitória, da Bahia, onde foi campeão estadual. Em 1988 foi técnico do
XV de Novembro, de Piracicaba. Teve uma passagem pelo Botafogo, de Ribeirão
Preto, em 1989. Em 1992 dirigiu a Ferroviária, de Araraquara e no mesmo ano o
São Bento, de Sorocaba (SP), onde encerrou a carreira de treinador. Ainda foi
supervisor do Corinthians, em 1993.
A
atividade com os treinadores seguiu também fora do campo: foi presidente quase
eterno do Sindicato dos Treinadores do Estado de São Paulo, que ele ajudou a
fundar. Também foi presidente do Centro Acadêmico Leão XIII, por ser formado em
Economia pela Universidade Católica, de São Paulo.
Mário
Travaglini não foi só um grande técnico, que dirigiu equipes que entraram para
a história, como a “Academia do Palmeiras”, a “Democracia Corinthiana” e a
“Máquina Tricolor” (Fluminense). Foi também responsável pela introdução de
estratégias adotadas na Europa, que modernizaram os esquemas táticos no futebol
brasileiro.
Em
2006 sua vida virou livro: “Mário Travaglini – da Academia à Democracia”,
produzido em parceria com os jornalistas Mário Trevisan e Hélvio Borelli.
(Pesquisa: Nilo Dias)
Aos
81 anos de idade morreu um dos maiores técnicos do futebol brasileiro, em todos
os tempos. (Foto: LancePress)
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