Hoje
em dia, quando suborno, propina, compra de resultados e uma infinidade de situações
escabrosas envolvendo o futebol brasileiro, nos dá uma idéia de que é resultado
dos tempos modernos, em que a corrupção se mostra presente em praticamente toda
a sociedade brasileira.
Mas
não é bem assim. Já ao final da década de 1920 nos deparamos com a primeira
suspeita de suborno em nosso futebol. Aconteceu no Rio de Janeiro, em 1929 quando
o proprietário do Café Estrela d’Alva foi preso em flagrante, ao tentar
subornar três jogadores do América, Sobral, Joel e Pennaforte, à véspera de um
jogo final contra o Vasco da Gama.
O
jornal “O Globo”, edição de 29 de novembro de 1929 noticiou que foram os
próprios atletas que tomaram a iniciativa de comunicar o fato a Polícia. O
comerciante foi preso ao entregar 20 contos de réis.
Mas
nem precisava ter ocorrido a tentativa de suborno, visto que o Vasco ganhou de
goleada, 5 X 0. Ao final do jogo muitas suspeitas recaíram sobre os jogadores americanos,
Floriano e Osvaldinho, mas não foram levadas adiante por falta de provas.
.
Bem
antes disso teve outro caso, quando da tentativa de se estabelecer uma competição
envolvendo os campeões carioca e paulista. A primeira edição foi em1914, entre Paulistano
X América, campeões de 1913.
O
América tinha em seu grupo os jogadores uruguaios, A. e J. Bertoni, que eram irmãos
e haviam sido protagonistas do primeiro caso de “falso amadorismo”, segundo disseram
os jornalistas Tomás Mazzoni e Rubens Ribeiro.
A
primeira partida foi realizada no dia 24 de maio de 1914, no Velódromo, e o
Paulistano venceu por 3 X 2. O jornal carioca “O Imparcial”, no dia seguinte ao
jogo levantou a suspeita de que os dois uruguaios tinham sido subornados pelo
Paulistano.
O
clube paulista reagiu, acusando o América de ser responsável pelos boatos. Este,
por sua vez, não aceitou a acusação. Como consequência os dois romperam
relações, e a segunda partida não foi realizada, e o título não foi ganho por
ninguém.
Por
via das dúvidas, o América afastou os uruguaios sob a justificativa de “disciplina
de ordem interna”.
Os
dois jogadores foram trazidos para o Brasil em 1912, por iniciativa do S.C.
Americano, de São Paulo. Com eles o time ganhou no mesmo ano o título paulista
de forma invicta.
Outras
denúncias mais recentes de subornos no futebol. O jornal “O Liberal”, de Belém
do Pará, em sua edição de 12 de novembro de 2003 publicou matéria em que o
ex-presidente do Paysandu, Miguel Alexandre Pinho, contou que o clube bicolor
subornou árbitros para conquistar o Campeonato Paraense de 2000 e os
brasileiros da Segunda Divisão de 1991 e 2001.
Miguel
Pinho disse que o árbitro Wagner Tardelli esteve envolvido no esquema do
“Parazão” de 2000, tendo dirigido o primeiro jogo da final frente o Castanhal.
O “Papão” venceu por 1 x 0 com um gol de pênalti, nos acréscimos. No lance
seguinte Edil quase empatou, carimbando a trave. Tardelli teria dito a Miguel
que se fosse gol ele teria anulado.
Também
contou ter havido esquema para beneficiar o Paysandu no clássico contra o Remo,
em que este precisava vencer por dois gols e ganhou por 1 X 0, mas teve um gol
legítimo de Robinho anulado pelo bandeirinha.
O
ex-presidente do Paysandu se incluiu entre os cartolas que praticavam suborno.
Ele revelou que tentou subornar Mário Fernando, ex-goleiro de Paysandu, Remo e
Tuna, quando o jogador atuava por um time pequeno (Sport Belém ou Pinheirense),
mas não teve êxito. Segundo Pinho, Mário Fernando não quis conversa.
Sobre
os dois títulos da Série B conquistados pelo Paysandu em 1991 e 2001, Miguel
Pinho afirmou com todas as letras que o clube bicolor se beneficiou de fortes
esquemas. Citou o árbitro baiano Manoel Serapião Filho, referindo-se a ele como
“Serapapão”.
No
jogo contra o ABC, Serapião realmente “fez chover”. Anulou um gol legal do ABC,
marcado por Rildon, e, de quebra, permitiu que o jogo chegasse ao final sem o
mínimo de segurança. “Existem dois tipos de torcida, a pacífica e a aguerrida.
A do Paysandu é pacífica”, justificou Serapião, para dar continuidade à
partida, vencida pelo Paysandu por 3 X 1.
Na
década de 40, o São Cristóvão tinha um goleiro que, quando queria, pegava até
pensamento. Mas do ponto de vista da honestidade não era lá muito confiável. Na
véspera de um jogo contra o Botafogo, que precisava vencer para continuar na
disputa do título com o Flamengo, ele teria se oferecido ao presidente
botafoguense, João Lyra Filho (que na época também era ministro), para amolecer
o jogo. Indignado, o dirigente recusou a oferta, considerando-a um insulto.
No
dia seguinte, o goleiro fechou o gol e o jogo terminou empatado. Ao cruzar com
João Lyra, teria comentado, ironicamente: “Tá vendo, doutor? É o que dá bancar
o honesto. Se o senhor tivesse me ouvido, agora não estaria aí desse jeito, com
cara de perdedor arrependido.”
Em
São Paulo, ficou famoso o caso do zagueiro corintiano Jaú, que em 1932 teria
sido "cantado", como se dizia à época, para facilitar uma vitória do
então Palestra Itália, atual Palmeiras. Além de não aceitar o suborno, Jaú
armou um encontro para que a pessoa que tentou suborná-lo fosse apanhada em
flagrante.
Daquele
episódio, restou uma triste e preconceituosa brincadeira entre os torcedores
dos dois times, registrada por João Máximo na primeira edição de seu livro “Gigantes
do Futebol Brasileiro”, no perfil do ex-craque palestrino Romeu Pellicciari:
"Quem é rico compra, quem é pobre se vende".
Também
nos anos 40, havia um árbitro argentino que andou apitando jogos do Campeonato
Carioca e não pensava duas vezes antes de se vender. Tanto que na semana de um
clássico contra o Fluminense o pessoal do Botafogo soube que ele havia
"fechado negócio" com o Tricolor. Chamado, o juiz confirmou, mas de
dispôs a mudar de lado caso cobrissem a proposta que lhe havia sido feita, o que
foi acertado na hora.
No
dia do jogo, o Fluminense fez o primeiro gol. O juiz argentino arranjou um
pênalti para o Botafogo, que empatou. O Flu passou de novo à frente, e de novo
o juiz deu um pênalti, que o Botafogo voltou a converter. Mas não teve jeito,
porque no último minuto o Fluminense acabou fazendo o gol da vitória.
"Maldita
hora em que troquei o certo pelo duvidoso", teria confessado o juiz a seus
amigos de bar. "Esse time do Botafogo é tão incompetente que não consegue
ganhar nem jogo comprado..." (Historinhas de suborno – de Celso Unzelte)
Nem
o ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), José Maria Marin,
escapou das nuvens negras que pairam sobre o futebol. Ele, junto de mais seis
cartolas ligados a Fifa, foram presos em 2015 pela Polícia da Suíça a pedido da
justiça dos Estados Unidos sob a acusação de corrupção e diversos outros
crimes.
Os
suspeitos foram detidos num hotel em Zurique, sob suspeita deterem recebido
propina sobre a votação para escolha das
sedes das Copas de 2018 e 2022.
Os
outros dirigentes detidos na Suíça, além de Marin, foram Jeffrey Webb (Ilhas
Cayman), presidente da Concacaf; Eugenio Figueredo (Uruguai),ex-presidente da
Conmebol; Julio Rocha (Nicarágua),
presidente da Federação Nicaraguense; Costas Takkas, braço-direito do
presidente da Concacaf; Rafael Esquivel, presidente da federação da Venezuela e
membro do Comitê Executivo da Conmebol; e Eduardo Li, presidente da Federação
da Costa Rica.
Contar
histórias de clubes, juízes, dirigentes e jogadores envolvidos em situações de
suborno, certamente daria um grosso livre. Ficam as situações contadas acima,
apenas como registro de que nem só de santos vive o futebol, de ontem e de hoje.
(Pesquisa: Nilo Dias)
Nem o ex-presidente da CBF, José Maria Marin escapu da sujeira no futebol. (Foto: Divulgação)
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