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terça-feira, 22 de abril de 2008

Os filósofos da bola

Confesso que não tenho muita convicção de que algumas dessas frases que proliferam na Internet, tenham sido realmente ditas por jogadores e dirigentes de futebol. Pode até que seja verdade, mas a coisa é tão descabida de lógica que penso se trate de invenção. Eu sei que nem todo o jogador de futebol é letrado, e nem teve o privilégio de frequentar bancos escolares de qualidade, exemplos dos irmãos Sócrates e Raí. Mas daí a imitar a personagem televisiva Ofélia, aquela que abria a boca só para dizer besteira, vai uma grande diferença.

Fora a turma do besteirol, existem jogadores que se notabilizaram por dizerem frases inteligentes. Dário, o “Rei Dadá” no meu modo de ver superou a todos. Folclórico? Sim. Fanfarrão? Nunca. Sou fã de carteirinha dele, até porque foi campeão brasileiro e artilheiro no meu Internacional. Selecionei algumas das filosóficas tiradas do ex-craque, hoje comentarista esportivo da Rede Globo.

"Não venha com a problemática que eu tenho a solucionática"; “Dadá não é eterno. Sua história será eterna”; “Se minha estrela não brilhar, eu passo lustrador”; “Tecnicamente, era horrível, mas na corrida, só de táxi. No ar, só de escada". “Se o gol é a maior alegria do futebol, foi Deus quem inventou Dadá, porque Dadá é a alegria do povo”; “Deus é o ser supremo, Dadá é a dádiva”; “Pelé, Garrincha e Dadá tinham que ser curriculum escolar”; “Me empolgo pelas palavras, me realizo nos atos”; “A lei do menor esforço é usar a inteligência”; “No futebol há nove posições e duas profissões: goleiro e centro avante”; “Faço tudo com amor, inclusive o amor”.

“Futebol é um universo maravilhoso, que faz as pessoas se aproximarem, que faz multiplicar os amigos, que ensina a gente a amar e a respeitar o próximo”; “O Divino Mestre é o fã mais poderoso de Dadá. Ele sempre esteve ao meu lado”; “Quando vou para o trabalho só penso em vitória”; “Eu sofri muito, minha tristeza exorbitou, meu sofrimento passou dos limites para um ser humano. Mas eu tive um auge violento, tive o mundo aos meus pés, bati recordes, fui falado em todos campos. Hoje vivo na imaginação do povo. Sou personagem do planeta bola”; "Três coisas que param no ar. Beija-flor, helicóptero e Dadá Maravilha".

Sobre seus gols de cabeça: "Isso é mamão com açucar"; "Com Dadá em campo não tem placar em branco"; "Não existe gol feio, feio é não fazer gol”; "Nunca aprendi a jogar futebol pois perdi muito tempo fazendo gols"; "Só existe três poderes no universo: Deus no Céu, o Papa no Vaticano e Dadá na grande área"; "Chuto tão mal que, no dia em que eu fizer um gol de fora da área, o goleiro tem que ser eliminado do futebol"; "Fiz mais de 500 gols, só correndo e pulando"; "O gol é o orgasmo do futebol"; "Um rei tem que ser sempre recebido por bandas de música". Dito no estádio da Internacional de Limeira, onde foi recebido por uma banda de música, já no final de sua carreira, aludindo a sua alcunha de "Rei Dadá".

Menino pobre do subúrbio carioca de Marechal Hermes, Dario ficou órfão aos cinco anos quando a mãe morreu num incêndio. Dos 10 aos 18 anos foi assaltante, cansou de apanhar da polícia, mas soube dar a volta por cima. Na Funabem, não o deixavam jogar porque era ruim demais. Aos 20 anos seu pai lhe arranjou emprego na Light. Um dia resolveu tentar a sorte no campo Grande. Depois de ser barrado por seis vezes acabou sendo aceito. E no primeiro treino disse ao técnico Gradin que estava sem café da manhã e almoço. E pediu que lhe dessem um prato de comida, que em troca teriam um goleador. Foi sincero, disse que não sabia driblar, que era ruim mesmo, e que já havia fugido muito de polícia. O Campo Grande topou, e o Dadá desencantou em 1967. O resto dessa história, todos sabem.

E a turma do lado de lá, os aficionados do besteirol, o que disseram? Começo pelo português João Pinto, que atuou pelo Futebol Clube do Porto. É considerado o “Pelé das asneiras”. Eis algumas de suas obras primas: “Não foi nada especial, chutei com o pé que estava mais à mão"; "O meu clube estava à beira do precipício, mas tomou a decisão correta: deu um passo à frente".

O saudoso presidente do Corinthians Paulista, Vicente Mateus, foi uma figura folclórica. Não sei se ele inventava as frases, ou realmente falava sério: "O difícil, vocês sabem, não é fácil"; "Jogador tem que ser completo como o pato, que é um bicho aquático e gramático”; “Haja o que hajar, o Corinthians vai ser campeão”; "Se entra na chuva é para se queimar”; "O Sócrates é invendável, inegociável e imprestável” (recusando uma oferta para vender o jogador); “O maior general da França é o General Eletric” (respondendo aos franceses que queriam comprar Sócrates).

Outras “maravilhas” atribuídas a nossos “inteligentes” craques: "No México que é bom. Lá a gente recebe semanalmente, de quinze em quinze dias (Ferreira, ex-ponta-esquerda do Santos); "Tenho o maior orgulho de jogar na terra onde Jesus nasceu" (Claudiomiro, ex-meia do Internacional (RS) ao chegar em Belém do Pará para disputar uma partida); "Tanto na minha vida futebolística quanto com a vida ser humana" (Nunes, ex-jogador do Flamengo); "Nem que tivesse dois pulmões eu alcançava essa bola" (Bradock, amigo de Romário, reclamando de um passe); "Realmente minha cidade é muito facultativa" ((Elivelton, ao repórter, que falava das muitas escolas de ensino superior existentes na cidade natal do jogador); "A partir de agora meu coração tem uma cor só: é rubro-negro" (Fabão, zagueiro baiano ao chegar no Flamengo).

Se tudo isso for verdadeiro, não vale a pena estudar. O melhor é fazer do filho um jogador de futebol. Se o cérebro é pequeno, a grana é grande: "Eu disconcordo com o que você disse” (Vladimir, ex-meia do Corinthians, em uma entrevista à Rádio Record); “Que interessante, aqui no Japão só tem carro importado” (Jardel, ex-Vasco e Grêmio, referindo-se aos Toyotas e Mitsubishis); “Nós vamos recuar para trás e depois atacar com tudo para frente" (Correia, jogador do Palmeiras em entrevista a TV Bandeirantes dizendo como o time iria jogar contra o Vasco).

Sei que não tem nada a ver com futebol, mas alguns dos vestibulandos de nossas faculdades, dão goleada de 10 X 0 nos futebolistas. Só a título de curiosidade e ilustração mostro algumas preciosidades retiradas de redações do provão do ENEM:

"Os desmatamentos de animais precisam acabar"; "É um problema de muita gravidez"; "Devido aos raios ultra-violentos"; "Na televisão o governo vem com aquela prosopopéia flácida"; "Todos os fiscais são subordinados, é a propina"; "Os lagos são formados pelas bacias esferográficas"; "No paiz enque vivemos, os problemas cerrevelam"; "A natureza foi discuberta pelos homens a 500 anos atrás"; "Não preserve apenas o meio ambiente, mas sim todo ele"; "O maior problema da floresta Amazonas é o desmatamento dos peixes"; "Hoje endia a natureza não é mais aquela"; "Vamos mostrar que somos semelhantemente iguais"; "Vamos deixar de sermos egoístas e pensarmos um pouco mais em nós"; "Por isso eu luto para atingir os meus obstáculos". (Texto e pesquisa: Nilo Dias)
Dario, com a camisa da Ponte Preta, em jogo contra o Corinthians (Foto: Acervo pessoal de Dario)