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sábado, 15 de agosto de 2015

Dirceu "Pantera", o craque que driblou a morte

Dirceu Francisco, mais conhecido por “Dirceu Pantera”, nasceu em Leopoldina (MG), na "Zona da Mata" mineira, no dia 15 de outubro de 1935. Começou a jogar futebol quando tinha apenas 17 anos, no time do Colégio Leopoldense, que era filiado a Liga Esportiva Leopoldinense.

Depois prestou serviço militar obrigatório, no "Tiro de Guerra", que em Leopoldina, na época, era feito em parceria com o Ginásio Leopoldinense. Trabalhou como pintor na oficina do saudoso José Ferreira Nunes, mais conhecido como “Macarrão”, que lhe ensinou a sua primeira profissão.

Em 1954, Dirceu entrou para o juvenil do E.C Ribeiro Junqueira, de sua cidade natal, e em menos de um ano foi promovido para o time profissional no qual foi tetracampeão da "Zona da Mata" (1954, 1955, 1956 e 1957).

Quando da conquista do tetra, Dirceu foi decisivo num jogo contra o Recreio E.C, em que seu time ganhou por 3 X 1, dois gols de Raul e um dele. Mas não foi uma vitória fácil, pois foi preciso até enfrentar um tumulto generalizado, que fez com que torcedores e jogadores saíssem correndo mato a fora e se escondessem atrás de morros, com medo da pancadaria e até mesmo de tiros.

A coisa foi tão feia, que nem a Rádio Leopoldina pode transmitir o jogo, em razão de ameaças de alguns torcedores recreenses. Para quem não sabe, existe uma rivalidade acirrada entre os times de Leopoldina e Recreio.

Serenados os ânimos e com os torcedores separados, o jogo teve sequência. Foi uma das últimas apresentações de Dirceu com a camisa do Ribeiro Junqueira, que na época era dirigido tecnicamente pelo professor Getúlio Subirá.

Em sua carreira jogou pelo Colégio Leopoldinense, Ribeiro Junqueira, Cruzeiro, Botafogo, América (MG), Vila Nova e Deportivo Itália da Venezuela.

Em 1957 surgiu a grande oportunidade da carreira de Dirceu. Nesse ano ele havia se sagrado tetra campeão da "Zona da Mata", e foi um dos destaques do time do Ribeiro Junqueira.

Seu amigo e ex-companheiro de time, Elmo Correa Lima, que também nasceu em Leopoldina, o convidou para fazer testes no Cruzeiro, de Belo Horizonte, de onde era jogador. Elmo morava no distrito de Tebas.

Dirceu, que trabalhava com o desportista José Ferreira Nunes, mais conhecido por “Macarrão”, teve de pedir uma licença de 15 dias para se deslocar até Belo Horizonte e fazer testes no Cruzeiro.

Ele ia com a responsabilidade de substituir o craque Nilo, que havia ido para o Palmeiras, de São Paulo. O Cruzeiro passava por um longo período sem títulos.

Dirceu foi muito grato ao patrão, que não colocou nenhum obstáculo para que viajasse.  Pelo contrário, lhe disse que poderia ir tranquilo “que o seu emprego estava garantido em sua volta”.

A oficina de "Macarrão" estava localizada na Avenida Getúlio Vargas, onde atualmente se encontra a "Auto Peças Zangale Zaquine". Naquela época, para se chegar a Belo Horizonte vindo de Leopoldina, tinha que passar pela cidade de Juiz de Fora, e o trajeto era marcado por estradas de chão.

Chegando a Belo Horizonte, bastante cansado pela exaustiva viagem, Dirceu foi de imediato dormir no quarto que lhe foi reservado na sede do Cruzeiro. No dia seguinte o time estrelado iria jogar um amistoso contra o Democrata, de Sete Lagoas.

O treinador do Cruzeiro, na época, era Ayrton Moreira, o responsável pela montagem da equipe que ficou conhecida como a "fabulosa máquina de jogar futebol". Dirceu foi chamado por Ayrton, que lhe comunicou que sairia jogando com a camisa nove. Dirceu ficou surpreso, pois imaginava que ficaria na reserva.

Percebendo o susto de Dirceu, Ayrton Moreira disse: “Você vai jogar! Por acaso está com medo?”. Dirceu respondeu que medo de jogar não tinha, apenas que não conhecia a forma de jogar do time, pois chegara na noite anterior.

O técnico disse então, que o Elmo (ex-colega de Dirceu em Leopoldina), falou que Dirceu sabe jogar. E finalizou a conversa: “Jogue do jeito que joga em Leopoldina”.

O time do Cruzeiro não foi bem, pois perdeu o amistoso para o Democrata por 4 X 2. Mas Dirceu foi muito bem, escolhido até como o melhor jogador em campo. Ele marcou os dois gols do time azul celeste.

Com isso Dirceu foi contratado. O Cruzeiro ganhou um grande reforço e o seu José Ferreira Nunes, o “Macarrão”, perdeu o seu jovem pintor. Foi no Cruzeiro que Dirceu ganhou o apelido de “Pantera”. 

Havia mais dois atletas no time com o mesmo nome, Dirceu Lopes e Dirceu Trapatone. Para diferenciar e facilitar a narração esportiva foi lhe colocado o apelido de “Pantera”, por causa do estilo guerreiro dentro de campo

Dirceu “Pantera” ficou no Cruzeiro de 1957 a 1964. Mas em 1961 foi emprestado ao Botafogo, do Rio de Janeiro, quando jogou ao lado de "monstros sagrados" como Garrincha, Didi, Manga, Nilton Santos, Zagalo, Quarentinha, Amarildo, Pampoline, Zé Maria, Rildo e outros.

Nesse ano foi campeão pelos dois times. Aliás, pelo Cruzeiro, tri-campeão, pois o time já havia ganho os certames de 1959 e 1960. Na rápida passagem que teve pelo time carioca, Dirceu foi reserva de Amarildo.

Dirceu "Pantera", é até hoje o maior artilheiro do Cruzeiro na história dos clássicos no “Independência”, com cinco gols. O ex-atacante era titular da equipe que acabou com a hegemonia do Atlético, que durava desde 1954, quando da inauguração do estádio.

Dirceu conta que não era fácil vencer o Atlético, pois eles tinham muito entusiasmo, e o Ubaldo dava muita sorte contra a gente. “Fazia até gol sem querer”, brinca. 

Lembra a vitória de 1 X 0, na primeira partida da decisão do Estadual de 1962, em que fez o gol do título. “Mandei a bola quase do meio de campo e o Marcial (goleiro) nada pôde fazer”.

Juiz parcial não é coisa de hoje, já no tempo de Dirceu “Pantera”, existiam alguns que eram bem mais que árbitros, sim torcedores. De acordo com o ex-craque tinha o “Cidinho”, o “Joaquim Cocó”, o “Luiz Guarda”, atleticanos doentes. Mas também o “Witan Marinho”, que era cruzeirense.

Dirceu conta um fato ocorrido em um clássico, quando o atacante cruzeirista, Gradim, sofreu falta dentro da área e o “Cidinho” nada marcou. Em resposta aos gritos de protesto da torcida atleticana ele disse: “O cara não sabe nem cair na área”.

Em 1964 teve uma rápida passagem pelo Vila Nova, de Nova Lima. Em 1965 foi vice-campeão mineiro pelo América. Logo em seguida saiu do país para jogar no Deportivo Itália, um time de imigrantes italianos na Venezuela, por indicação de seu amigo e conterrâneo Elmo Correa Lima, que já fazia parte do time venezuelano e que jogou com Dirceu no Ribeiro Junqueira e o indicou também ao Cruzeiro.

Dirceu foi destaque no clube, sendo campeão venezuelano em 1966 e disputando campeonatos como “Copa da Venezuela” e”Taça Libertadores” (1966 e 1967). No Deportivo Itália jogou com Moacyr, o “Cici”, também filho de Leopoldina, que não se adaptou ao país e voltou ao Brasil por saudades da família.

Em 1967, já sentindo o peso de seus 32 anos, Dirceu resolveu pendurar as chuteiras. Em sua vitoriosa carreira marcou um gol inesquecível do meio do campo, façanha que nem Pelé conseguiu fazer.

Dirceu disse que não chegou a ficar rico com o futebol, mas conseguiu muita coisa, a casa própria, por exemplo, e a tranqüilidade financeira em Belo Horizonte, onde reside há mais de 40 anos com a esposa Maria da Glória, no bairro Dom Bôsco. É pai de cinco filhos: Helton, Elen, Eliane, Dayse e Dirceu.

Dirceu Pantera quase perdeu a vida em 1967, quando do acidente com um ônibus que caiu no elevado. O que aconteceu com ele foi igual ao ocorrido com o alemão Ernst Erich Schmitz. Ambos se atrasaram por cerca de 5 minutos para o embarque, o que salvou suas vidas.

A sorte de Dirceu foi que o taxi que o levaria até a rodoviária para embarcar para Belo Horizonte, furou um dos pneus durante o trajeto, o que foi fundamental para que perdesse o ônibus. 

Quando perguntado sobre o episódio, Dirceu costumava dizer que driblou a morte por pura sorte. Dirceu só ficou sabendo do ocorrido no dia seguinte. (Pesquisa: Nilo Dias)


Dirceu ""Pantera". (Foto: Arquivo particular de Dirceu)