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quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Um gringo na Seleção

Sidney Pullen foi um dos três únicos jogadores estrangeiros que vestiram a camisa da Seleção Brasileira principal, em todos os tempos. Além dele, apenas o goleiro português Casemiro Amaral, que jogou seis vezes pela Seleção, em 1916 (Sul-Americano) e 1917, e o italiano Francisco Police, que jogou somente uma partida pelo Brasil, na derrota de 1 X 0 para o Dublin, do Uruguai, em 27 de janeiro de 1918.

O boliviano Marcelo Moreno também vestiu a camisa “canarinho”, mas somente nas Seleções de categorias de base. Alguns pesquisadores incluem nessa lista o atacante Patesko, que jogou às Copas do Mundo de 1930 e 1938 pelo Brasil, como sendo polonês. Porém, sua certidão de nascimento é de Curitiba.

Sidney Pullen nasceu em Southampton, Inglaterra em 14 de julho de 1885. Ainda criança veio para o Brasil, já que seu pai fora transferido para uma fábrica no Rio de Janeiro. Nos primeiros tempos do futebol na então capital brasileira, muitos ingleses jogavam futebol por clubes de lá, casos de Edwin Cox e Welfare, no Fluminense e Harry Robinson, Sidney Pullen e Eustace Pullen, no Paysandu Cricket Club.

Em 1910, Sidney Pullen, com apenas 15 anos de idade já jogava futebol no time do Paysandu. E com 17 anos foi campeão carioca. O título foi conquistado em cima do Flamengo, que pela primeira vez disputava o Campeonato Carioca, depois de ter criado o seu Departamento de Futebol, iniciativa de oito jogadores que deixaram o Fluminense, que fora campeão de 2011.

O Flamengo de 2012 era praticamente o Fluminense de 2011. Mas foi vice, perdendo o título para o Paysandu, que tinha uma boa equipe com destaques para dois atacantes infernais: Sidney Pullen e Harry Robinson, este, autor de 26 dos 64 gols que o time marcou na competição.

O Paysandu tinha sua sede na rua de mesmo nome, em um terreno de propriedade do Conde d’Eu. Montou um time formado somente por jogadores ingleses, que se impunham pela força física e disciplina tática de seus atletas. Nas partidas decisivas contra o Flamengo, o Paysandu venceu por 2 X 1 e, no segundo turno, segurou o empate em 1 X 1 que lhe garantiu o título.

Nos dois jogos o atacante Sidney Pullen foi decisivo, marcando gols importantes e evitando que o Flamengo tivesse a glória de ser campeão já no seu "debut" no certame carioca.


Participaram do Campeonato Carioca de 1912 os seguintes clubes: América Football Club, Bangu Atlético Clube, Clube de Regatas do Flamengo, Fluminense Football Club, Paysandu Cricket Club, Rio Cricket and Athletic Association, São Cristóvão Athletic Club e Sport Club Mangueira. 

Sidney Pullen e seu irmão Eustace ficaram no Paysandu até 1914, ano em que se transferiram para o Flamengo. No rubro-negro, Sidney jogou até 1925. Era polivalente, tendo atuado em diversas posições, dentre elas de “center-half” (volante de hoje) e de “inside-foward” (meia, de hoje).

No rubro-negro carioca Sidney Pullen chegou a condição de capitão do time, de 1915 até 1923, substituindo Alberto Borgeth, que capitaneou o Fluminense de 1911 e o Flamengo nos anos de 1912, 1913 e 1914. O jogador nascido na Inglaterra foi o principal jogador do futebol carioca nesse período, tendo sido artilheiro no campeonato de 1919, com 12 gols. Jogou 116 partidas pelo Flamengo e marcou 40 gols.

Em 1910, o Corinthians, da Inglaterra, que inspirou a fundação do Corinthians Paulista, excursionou ao Brasil e ganhou todos os jogos que disputou, alguns com goleadas incríveis, caso do Fluminense que levou 10 X 1. Em 1913, o time inglês voltou ao Brasil. Dessa feita perdeu um jogo, foi para o Selecionado Carioca, por 2 x 1, no dia 23 de agosto.

O “Jornal do Commercio”, do Rio de Janeiro escreveu o seguinte sobre o jogo: “O ataque dos brasileiros, formado por Mimi, Welfare e Sidney excedeu a toda a expectativa. Estes elementos, quer collectiva, quer individualmente foram de uma actividade à toda prova”. Uma curiosidade: o goleiro do selecionado carioca nesse jogo foi Harry Robinson, o mesmo que fora artilheiro do “Campeonato Carioca” de 1912 pelo Paysandu.

Em 1914, o Paysandu fechou seu Departamento de Futebol, em razão da Diretoria estar incomodada com a má campanha do clube no certame de 1913 e também com a necessidade de trocar de sede. Todos os seus jogadores ficaram livres, entre os quais Sidney Pullen, que optou por defender o Flamengo.

O antigo estádio do Paysandu ficava na rua homônima, no bairro de Laranjeiras, bem perto do campo do Fluminense. O clube participou do Campeonato Carioca da 1ª divisão em 1906, 1907, 1908, 1911, 1912, 1913 e 1914, quando abandonou a prática do futebol, além de ter jogado a 2ª divisão em 1909 e 1910.

Seu jogo de estréia no Flamengo foi um empate em 1 X 1 com o Vila Isabel em 21 de Abril de 1915. Seu primeiro gol pelo Flamengo foi no dia 2 de maio de 1915, no jogo em que o rubro-negro empatou por dois gols com o Rio Cricket.

De cara foi campeão carioca, com o Flamengo conquistando o título de forma invicta, com goleadas de 5 X 0 no Fluminense e 4 X 2 no América, os principais rivais na época. Pullen e Riemer formaram uma dupla avassaladora nesse ano.

Hugh Pullen, pai de Sidney acompanhou o filho na ida para o Flamengo. Tempos depois foi tesoureiro do clube e também o responsável pela importação do uniforme com as cores vermelho, preto e branco e que ficou conhecido como “Cobra Coral”.

Com o advento da 1ª Guerra Mundial, o Flamengo teve que retirar o branco do uniforme, pois vermelho, preto e branco eram as cores da bandeira alemã.

De acordo com o livro “Um jogo inteiramente diferente”, o anglo-brasileiro Sidney Pullen (anglo por parte do pai e por ter nascido em Southampton e brasileiro por parte da mãe) foi de considerável influência para a retirada do branco do uniforme flamenguista. 

Até o ano de 1916, o uniforme preto e vermelho era exclusivo do remo do Flamengo, na época o esporte mais popular da cidade, mas de prática acessível apenas à elite.

Ainda em 1916, foi convocado para a Seleção Brasileira que disputou o 1º Campeonato Sul-Americano (atual Copa América), que foi realizado em Buenos Aires. De acordo com o livro “O negro no futebol brasileiro”, escrito pelo jornalista Mario Filho, a Seleção teve grandes dificuldades para poder inscrever Sidney Pulllen, pois ninguém acreditava que ele fosse brasileiro. Era naturalizado.

Solucionado o problema, Pullen jogou três partidas pela Seleção, que foi terceira colocada na competição: empates em 1 X 1 com Argentina e Chile e derrota para o Uruguai,que viria a ser o campeão, por 2 X 1. Nesse jogo havia sido acordado entre as duas equipes que poderia haver substituições.

O zagueiro brasileiro Orlando se contundiu e seria substituído, mas o capitão uruguaio, Jorge Germán Pacheco, não concordou com a alteração e o Brasil teve que ficar até o final do jogo com 10 atletas em campo. Nossa seleção vencia por 1 X 0, com magnifica atuação de Arthur Friedenreich. Mas com um jogador a menos, acabou sofrendo a virada.

A partida entre Argentina e Chile ia ser cancelada por falta de árbitro, mas as duas equipes concordaram que Sidney Pullen apitasse. A Argentina goleou por 6 X 1.

Sidney Pullen foi um dos principais jogadores do Flamengo em toda a sua história. Ficou no clube de 1915 a 1923, quando encerrou a carreira. Jogou 130 partidas pelo Flamengo e marcou 47 gols.

Em 1925, aceitou o desafio de integrar a Comissão Técnica do Flamengo, ajudando a montar aquele que talvez seja o primeiro grande esquadrão da história do clube, uma máquina de jogar futebol com vários jogadores de seleção, como Hélcio, Penaforte, Candiota, Nonô e Moderato. Era um timaço que não tomava conhecimento dos rivais, a ponto de conquistar o título carioca goleando o América por 4 X 0 no jogo decisivo.

Como jogador conquistou nada mais, nada menos que 16 títulos pelo Flamengo, sendo os principais os bi-campeonatos de 1914/1915 e 1920/1921. Em 1916 foi convocado pelo Exército inglês e lutou por seu país na 1ª Guerra Mundial. Dizem que também teve uma passagem pelo Fluminense, porém, não há registros do período em que atuou pelo tricolor.

Antes de ir para a Guerra, Sidney deixou as suas chuteiras com o jovem "Back", jogador do segundo quadro do Flamengo. Após voltar da guerra, em 1917, ainda conquistou os Campeonatos Cariocas de 1920 e de 1921 pelo Flamengo, sendo, ao lado de Junqueira em 1920 e de Nonô em 1921, um dos grandes destaques do time.

Títulos conquistados. Paysandu: Campeão Carioca (1912); Flamengo: Campeão Carioca (1914, 1915, 1920 e 1921; Troféu Artístico do Pará (1916); Taça Tricentenário de Belém (1916); Taça Madame Gaby Coelho Neto (1916); Troféu Asilo do Bom Pastor (1916); Taça Sport Club Juiz de Fora (1917); Torneio Triangular do Rio de Janeiro - Troféu América Fabril (1919, 1922 e 1923); Torneio Início do Campeonato Carioca (1920 e 1922); Taça Sport Club Mackenzie (1920); Taça Ypiranga (1921); Troféu Carioca Football Club (1923) e Troféu Petropolitano (1923).

Sem a giga e a malicia do jogador brasileiro, Pullen era dotado de extrema mobilidade, o que o tornava quase imarcável, e dono de uma mortífera perna esquerda. Possuia uma extraordinária capacidade de enxergar o jogo e colocar a bola onde quisesse, com assistências notáveis o que o diferenciava dos outros jogadores. Além disso, Pullen "cantava" o jogo o tempo todo, orientando, motivando e esbravejando, como um verdadeiro líder que era.

Até o final de sua vida nos anos 50, Sidney Pullen jamais se afastou do ambiente do futebol. Carismático, transitou livremente por vários clubes, sendo muito bem aceito em todos eles. Costumava jogar tênis nas Laranjeiras, reduto do Fluminense. (Pesquisa: Nilo Dias)

Time do Paysandu, campeão carioca de 1912. Sidney Pullen é o segundo sentado.