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quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Um marroquino na França

Just Fontaine foi um dos melhores jogadores franceses de todos os tempos, embora não tivesse nascido na França, sim em Marraquech, no Marrocos, que na época era colônia francesa. Fontaine veio ao mundo em 18 de agosto de 1933.

De origem humilde, seu pai dava um duro danado em uma indústria de tabacos para sustentar os sete filhos. O sonho do patriarca dos Fontaine era oferecer uma formação universitária para os filhos, apesar do talento evidente do pequeno Just para o futebol, além da prática do basquete.

Quando deixou o Liceu Lyautey, Fontaine começou sua carreira profissional jogando pelo USM Casablanca em 1950, graças ao comprometimento dos dirigentes em custear o prosseguimento de seus estudos.

O USM Casablanca, em 1952, foi campeão da Liga Marroquina e da Copa dos Campeões do Norte da África, torneio que não é mais disputado e que reunia os times campeões das colônias francesas do Marrocos, Argélia e Tunísia.

Com 1;74 de altura, “Justo”, como era chamado por seus companheiros, também anotava seus tentos de cabeça. Em razão de suas boas atuações chamou a atenção dos principais clubes da França, sendo contratado pelo Nice em 1953. Em sua primeira temporada sagrou-se campeão da Copa da França de 1954.

Acabou índio para o Stade Reims, para jogar no lugar do ídolo Raymond Kopa, que se transferiu para o Real Madrid. Em seis temporadas que vestiu a camisa do Reims, Fontaine marcou 121 gols, sendo o artilheiro da Primeira Divisão em 1958, ano em que também ajudou seu clube a ganhar a Copa da França.

Essa conquista garantiu ao Reims a chance de disputar novamente a Taça dos Campeões Europeus, atual “UEFA Champions League”, torneio do qual o clube fora vice-campeão dois anos antes, perdendo a final para o Real Madrid.

Rems e Real Madrid disputaram outra vez a grande final de 1959. Fontaine, embora tivesse sido o artilheiro da competição, com 10 gols, foi bem marcado naquele jogo e não teve boa atuação e nem fez gol, enquanto o novo time de Kopa, contando com Alfredo di Stéfano e Ferenc Puskas venceu por 2 X 0.

Na temporada 1959-60 Fontaine e Kopa voltaram a jogar juntos no Rems, repetindo o trio que fez sucesso na Copa do Mundo de 1958, com Roger Piantoni.

E o Rems foi novamente campeão francês e Fontaine artilheiro, embora estivesse afastado dos gramados desde março de 1960, quando fraturou a tíbia e o perônio da perna direita em jogo contra o Sochaux. Não conseguiria recuperar-se totalmente da lesão.

O último jogo de Fontaine como profissional ocorreu em julho de 1962, poucas semanas depois de ter-se sagrado outra vez campeão francês. Como havia se precavido e feito um polpudo seguro para suas pernas, se aposentou em ótimas condições. Além do dinheiro ganho como garoto-propaganda da Adidas. No total, ele marcou 165 gols em 200 partidas no campeonato principal da França.

Jogando pela Seleção Francesa teve números estatísticos impressionantes. Na primeira vez que vestiu a camisa francesa, em 17 de dezembro de 1953, marcou um gol de chapéu numa vitória de goleada por 8 X 0 sobre a Seleção de Luxemburgo. O jogo era válido pelas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 1954, para a qual ele não foi convocado.

Já para as Eliminatórias para a Copa do Mundo de 1958, tudo aconteceu ao contrário: Fontaine não foi utilizado, mas convocado para o Mundial. O atacante titular e artilheiro francês, Thadée Cisowski lesionou-se e não pode ir a Copa.

A estreia no mundial da Suécia não poderia ser melhor: uma goleada de 7 X 3 contra o Paraguai, com três gols de Piantoni. A primeira fase encerrou-se com outros três gols de Fontaine: os dois na derrota de 3 X 2 para a Iugoslávia e um na vitória por 2 X 1 sobre a Escócia, resultado que garantiu a classificação gaulesa.

Veio o mata-mata e Fontaine marcou mais dois gols na vitória por 4 X 0 sobre a Irlanda do Norte, pelas quartas-de-final. Nas semifinais, marcou uma vez, frente o Brasil. Depois, na decisão do terceiro lugar, contra a Alemanha Ocidental, Fontaine fez quatro gols, somando um total de 13, superando o artilheiro do mundial anterior, o húngaro Sándor Kocsis, que fez 11.

Fontaine foi o jogador que mais gols marcou em uma única Copa até hoje. Somadas mais de uma Copa, o alemão Miroslav Klose é o maior artilheiro, com 16 gols: cinco em 2002, cinco em 2006, quatro em 2010 e dois em 2014.

As lesões tiraram Fontaine da Seleção. O seu último jogo pela França foi em 1960, nas eliminatórias para a Copa do Mundo de 1962, contra a Bulgária. As lesões lhe impediram de jogar as demais partidas e a França acabou perdendo a vaga justamente para os búlgaros.

Ao todo, marcou pela Seleção 30 gols em 21 partidas. Fontaine superou notáveis jogadores como Michel Platini e Zinédine Zidane em 2004, quando foi eleito o melhor jogador francês dos 50 anos da UEFA, nos prêmios do jubileu da entidade.

Curiosamente, assim como eles e como seus contemporâneos Roger Piantoni e Raymond Kopa, Fontaine tem sangue estrangeiro: é filho de mãe espanhola com um francês.

Depois de deixar os gramados Fontaine foi presidente do sindicato dos jogadores da França, lutando para garantir contratos maiores para a classe.

Pelé e Fontaine tiveram um desentendimento em 1960, quando de uma excursão do Santos pela Europa, já após Fontaine ter sofrido a fratura que interrompeu sua carreira.

Ele entregou um lápis a Pelé, pedindo que assinasse na perna engessada. Pelé não entendeu o pedido em francês. Fontaine irritou-se e perguntou se o idioma de Pelé era "africano" ou "macaquês". Indignado, Pelé atirou o lápis no francês, seguido de um palavrão - em bom português.

Fontaine chegou a ser técnico da Seleção da França em 1967, mas durou pouco tempo, apenas dois jogos amistosos que terminaram em derrota. Entre 1979 e 1981, treinou o selecionado do Marrocos, tendo chegado perto de classifica-lo para a Copa do Mundo de 1982. O time  chegou à última etapa, quando disputou vaga em duas partidas contra Camarões, que venceu ambas.

Em sua carreira ganhou prestigio como artilheiro. Na Copa do Mundo FIFA, em 1958, fez 13 gols. Na Primeira Divisão Francesa, na temporada 1957-58 marcou 34 vezes. E na temporada 1959-60, balançou as redes em 28 oportunidades. Na Taça dos Campeões Europeus, em 1958-59, estufou as redes em 10 vezes. Foi homenageado pela FFF em 2005, como o maior futebolista francês dos últimos 50 anos.

A enorme capacidade goleadora de Fontaine completava-se com sua velocidade para se infiltrar na área, seu chute forte e o bom cabeceio, qualidades que ajudou o jogador a marcar 27 gols em suas escassas 20 aparições em partidas internacionais. (Pesquisa: Nilo Dias)