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quarta-feira, 30 de novembro de 2011

O centenário “Leão do Norte” (I)

Não foi só o centenário do E.C. 15 de Novembro, de Campo Bom (RS), que passou despercebido por mim. A falha também aconteceu em relação aos 100 anos de fundação do Comercial Futebol Clube, da cidade de Ribeirão Preto, um dos mais importantes e tradicionais clubes do futebol do interior de São Paulo.

O clube nasceu graças a um grupo de comerciantes que almejava ter o seu próprio time de futebol. Eles se reuniram na noite de 10 de outubro de 1911 na “Casa Valeriano”, de Adaucto de Almeida, uma loja de armarinhos localizada na Rua General Osorio, número 47, onde hoje se encontra a Fonte Luminosa, com a finalidade de formar um novo time de futebol em Ribeirão Preto. Essa reunião foi até a madrugada, mas ficou acertado que a data de fundação seria mesmo o dia 10, quando a reunião teve início.

Os comerciantes considerados fundadores do Commercial F.B.C., e que participaram da histórica reunião foram Antônio Maniero, Guilherme Nunes, Francisco Arantes, Adaucto de Almeida, Timóteo Grota, Alvino Grota, Argemiro de Oliveira, Djalma Machado e Antídio de Almeida.

Durante a reunião, foram eleitos os comandantes da nova equipe, e os mesmos tomaram posse de seus cargos imediatamente. Foram eleitos: Antidio de Almeida como Presidente, Alvino de Souza Grota como Vice, Adaucto de Almeida como Tesoureiro, Djalma Machado como Secretario, Sebastião Viana como Procurador, Sebastião Ruvald como primeiro Capitão e Florentino de Almeida como segundo Capitão.

Após a posse, foi posto em votação o nome do clube, e por dez votos venceu a sugestão dada por Argemiro de Oliveira, de Commercial Football Club. As quatro primeiras propostas votadas pela recém criada diretoria comercialina foram:

I – A mensalidade e as jóias seriam de mil reis cada; II – Os considerados sócios fundadores teriam isenção das jóias e mensalidades; III – A aceitação ou expulsão de sócios seriam de responsabilidade da diretoria e IV – Isenção ou abono de mensalidade de sócios desempregados ou enfermos (impossibilitados de trabalhar) durante tal período. Todas essas propostas foram aprovadas.

O primeiro Estatuto do Commercial foi redigido ainda na reunião que deu origem ao clube. Foram responsáveis pela criação do mesmo: Alvino de Souza Grota, Argemiro de Oliveira e Djalma Machado.

Após a fundação, o primeiro problema enfrentado foi achar um bom local para treinos e jogos. O primeiro campo de treinamentos do Commercial foi onde hoje se localiza a Praça Luiz de Camões.

Em seguida o clube ganhou um outro local para os treinos, um terreno doado pela Fundação Antonio e Helena Zerrener. Depois, em 1917, teve seu espaço aumentado, quando adquiriu, por 9 contos de Reis, uma das propriedades de Emilio Moço.

O primeiro jogo da história comercialina foi um amistoso disputado no dia 15 de novembro de 1911, contra a Associação Athletico Gymnasial, tradicional equipe de Ribeirão Preto do começo daquele seculo, que venceu o confronto por 3 X 1.

O jogo foi disputado no antigo campo do Athletico Ribeirão Preto, outra tradicional equipe da cidade na época, e onde hoje localiza-se a Praça Sete de Setembro. O jornal "A Cidade", o mais antigo jornal de Ribeirão Preto ainda em atividade, fez a cobertura do amistoso.

Curiosamente, na manchete do Jornal, o Commercial foi anunciado como Sport Cub Commercial. A correção só aconteceu com o passar dos anos. Loyolla foi o autor do primeiro gol da história do Commercial.

O juiz foi Jefferson Nogueira. Os gols foram marcados por Arlindo, Luiz e J. Franco, para o Athletico Gymnasial. Loyolla descontou para o Commercial F.C.

Athletico Gymnasial: Hugo - Jonas - Luiz - Guttemberg - J. Franco - Cervantes - Gama - Luiz - Arlindo - Ortiz e José.
Commercial FC: A. Oliveira - Moreira - Fritsch - F. Almeida - Jose Grota - A. Almeida - S. Reinaldo - Djalma Machado - J. Lima - V. Mello e Loyolla.

Daí para a frente o clube começou a crescer e a jogar campeonatos amadores e partidas amistosas. Não demorou para chamar a atenção dos coronéis do café, que resolveram adotar o time.

Nos anos que seguiram, grandes vitórias animavam a crescente torcida do Commercial. Em 1915, o Commercial enfrentou uma equipe da Capital pela primeira vez em Ribeirão Preto, o S.C. Germania. Apesar de toda a tradição do time paulistano, o Commercial não se intimidou e venceu por 4 X 1.

Daí seguiram jogos emblemáticos, que sempre mobilizavam a torcida, até que em 1916 alguns jogos começaram a ganhar maior destaque, até nas manchetes dos jornais: Commercial F.C. 1 x 1 Amparo F.C. (28 de maio – amistoso que parou a cidade); Commercial F.C. 3 x 0 E.C. Bandeirante, de Jaú (8 de setembro – Taça Bandeirante); Commercial F.C. 5 x 0 Black Team, de Campinas (23 de setembro – amistoso); e Commercial F.C. 4 x 0 Palestra Itália E.C., de Ribeirão Preto (sem data – amistoso).

O jogador considerado pelos historiadores como o primeiro grande craque do Commercial foi o meia-atacante "Zé Macaco", que atuou pela equipe de 1916 até meados da década de 20, antes de se transferir para o Botafogo (RJ).

Em 1917, veio a primeira conquista expressiva com a vitória na "Taça Castellões". “O Commercial foi considerado um Campeão do Interior. A competiação foi organizada por uma Liga de futebol independente, criada no interior paulista, a Liga de Foot-Ball do Oeste do Estado, pois ainda não existia a Federação Paulista.

A "Taça Castellões" reuniu varios clubes do interior paulista. O troféu foi oferecido pela Companhia de Grande Manufactura de Fumos e Cigarros Castellões (daí a origem do nome do Torneio), era de prata maciça com detalhes em ouro.

Disputaram o torneio: Commercial F.C. e Palestra Itália E.C. (Ribeirão Preto); C.A. Pirassununguense (Pirassununga); A.A. São João (São João da Boa Vista); União Atletica Casabranquense (Casa Branca), E.C. Taubaté (Taubaté), e representantes das cidades de Batatais, Taquaritinga, São Simão, São Carlos, Tambaú, Piracicaba e Franca.

O Commercial foi campeão, com a seguinte campanha: Commercial 20 x 0 Taquaritinga (8 de março – maior goleada da história do clube), Commercial F.C. 3 x 1 São Carlos (22 de abril), Commercial F.C. 6 x 0 São Simão (13 de maio), Commercial F.C. 2 x 0 Palestra Itália E.C. (20 de maio), Commercial F.C. 7 x 0 Franca (8 de julho) e Commercial F.C. 4 X 1 Palestra Itália E.C. 12 de outubro).

Em 25 de março de 1917, o Commercial conquistou a "Taça Besquizza" ao vencer o C.A. Paulistano, campeão paulista de 1916 por 4 X 1, em Ribeirão Preto. Entre os anos de 1917 e 1918, eram comuns as disputas de jogos amistosos valendo algum premio ou troféu.

Destaques ficaram para as conquistas dos troféus: "Taça Café Pinho" (vencendo o Velo Clube, de Rio Claro por 4 X 1), "Taça Hotel Modelo" (vencendo o White, de Campinas) e a "Taça Clark" (ao vencer o S.C. Corinthians Paulista), todas em 1918.

Ainda em 1918, o Commercial inscreveu uma equipe extra (uma espécie de expressinho) na Liga Municipal de Clubes de Ribeirão Preto, e conquistou a "Taça Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto".

A primeira grande contratação de um atleta, que não residia em Ribeirão Preto, feita pela diretoria do Commercial, concretizou-se no dia 14 de julho de 1917, quando o clube recebeu o ponta-direita e atacante Belmácio Pousa Godinho, que vinha do XV de Piracicaba (clube ao qual a família de Belmácio participou da fundação em 1913).

Belmácio não era um craque, mas jogava muito bem. Além do mais, as contribuições que Belmácio traria ao alvinegro, não seriam só proveitosas dentro dos gramados, pois ele passaria a lutar pelo Commercial mesmo após abandonar o futebol.

Com dinheiro sobrando, não demorou para que o Commercial alcançasse uma ascensão meteórica. Em 1919, foi o primeiro time de futebol de Ribeirão Preto a disputar um campeonato importante. O torneio disputado pelo alvinegro foi o Campeonato Paulista - Divisão do Interior da APEA (Associação Paulista de Esportes Athléticos).

No torneio, o Commercial demonstrou muita força, mas na final acabou sendo derrotado pelo E.C. Taubaté, ficando com o vice-campeonato.

Em 22 de março de 1920, já completamente consolidado como clube, o Commercial foi convidado pelo Sport Club do Recife a excursionar ao Norte e Nordeste do Brasil, para realizar uma série de jogos amistosos. Outras equipes paulistas foram convidadas, mas apenas o Commercial aceitou o convite.

A delegação comercialina embarcou na estação da Mogiana em Ribeirão Preto na manhã de 29 de abril, passando por Campinas (SP), até chegar ao Rio de Janeiro, onde embarcou no navio "Itapuy", que seguiu viagem até a Bahia, e depois a Pernambuco, onde chegou as 6 horas da manhã do dia 7 de maio de 1920. Ao todo o Commercial disputou oito partidas, vencendo sete e empatando apenas uma. Foram estes os resultados dos jogos:

09/05/1920 - Combinado América/Santa Cruz F.C. 0 X 1 Commercial F.C.
13/05/1920 - Sport Club do Recife 2 X 3 Commercial F.C
16/05/1920 - Liga Pernambucana de Desportos Terrestres 2 X 2 Commercial F.C.
20/05/1920 - Santa Cruz F.C. 0 X 1 Commercial F.C.
23/05/1920 - América 1 X 2 Commercial F.C.
26/05/1920 - Clube Náutico Capibaribe 0 X 2 Commercial F.C.
28/05/1920 - Liga Pernambucana de Desportos Terrestres 1 X 5 Commercial F.C.
01/06/1920 - Liga Baiana 1 X 2 Commercial F.C.

A vitória mais festejada foi sobre o Santa Cruz, que contou com a ajuda do arbitro que foi a campo com um revolver para favorecer na marra, o time local. Mas de nada adiantou a intimidação, o Commercial marcou um gol de fora da área, logo ao início do jogo. E o escore se manteve até o último minuto, quando o juiz marcou um pênalti inexistente contra o Commercial, que o goleiro defendeu. No retorno a São Paulo a torcida fez uma grande festa, ocasião em que surgiu o apelido de “Leão do Norte”, que acompanha o clube até hoje.

Em 10 de outubro de 1920, o Rei Alberto da Bélgica, esteve no Estádio da Rua Tibiriçá para assistir um jogo do Palestra Itália, de São Paulo (atual Palmeiras) contra o Palestra Itália, de Ribeirão Preto. O time da capital venceu por 4 X 1.

Em 1921, durante um torneio amistoso chamado "Taça Círculo Italiano", o Commercial, que entrou como convidado, derrotou a já poderosa equipe do Palestra Itália, de São Paulo, atual Palmeiras, por 5 X 2.

O primeiro jogo internacional do Commercial terminou empatado em 1 X 1, e foi contra a Seleção Argentina. O jogo aconteceu em 1922, num amistoso realizado no então Estádio da Rua Tibiriçá, em Ribeirão Preto. A Argentina estava no país para disputa do Campeonato Sul-Americano e Copa Rocca, ambos vencidos pelo Brasil.

Em 1923, o Commercial jogou pela primeira vez contra equipes cariocas. Enfrentou em 24 de junho o C.R. do Flamengo, e perdeu por 5 X 1. No mesmo ano, em 26 de dezembro, empatou em 0 X 0 com a Seleção da Bahia, que estava em São Paulo disputando o extinto Campeonato Brasileiro de Seleções Estaduais.

Em 1927 e 1928, se tornou a primeira equipe da região de Ribeirão Preto a disputar o Campeonato Paulista da 1ª Divisão. O primeiro jogo do Commercial na elite do futebol paulista aconteceu no dia 3 de maio de 1927, e seu adversário foi o poderoso Palestra Itália, atual Palmeiras, que terminou campeão daquele ano.

A primeira vitória na primeira divisão aconteceu no dia 15 de maio de 1927, 3 X 0 sobre o Ypiranga. O Commercial só voltou a vencer em 21 de agosto de 1927, por 2 X 1 sobre a A.A. São Paulo de Alpargatas, tradicional time da capital paulista. A terceira vitoria do "Leão", foi no dia 4 de setembro de 1927, com o placar de 2 X 1 sobre o Corinthians, de São Bernardo do Campo.

Em 1928 enfrentou o time do Peñarol Universitário (atual Peñarol) e venceu por 2 X 0, com gols de Vespu e Chapa. O jogo foi em Ribeirão Preto, no Estádio da Rua Tibiriçá, e aconteceu no dia 1 de julho de 1928.

Mesmo com a má campanha na Divisão Principal de 1927, onde só somou 6 pontos, em 1928 o Commercial disputou novamente o Torneio Início e a 1ª Divisão. No Torneio Início empatou por 2 X 2 com o Guarani Futebol Clube, mas no critério de desempate, que era na época, escanteios, o Commercial acabou eliminado, derrotado com 2 escanteios a 0 para o Bugre de Campinas. Este jogo fez com o que o Commercial abandonasse a APEA e se transferisse para a LAF. (Pesquisa: Nilo Dias)

Plantel da década de 20 antes de jogo na Rua Tibiriçá. (Foto: Aquivo Histórico Municipal)